História O que resta de nós? - Fins e Recomeços

Kara:

- Toma essa!- Diz Mon-El, enquanto me acerta um soco, fazendo meu corpo ir para atrás.

Treinar com ele era bom, mantinha minha mente ocupada. Mon-El havia melhorado muito, mental e fisicamente, desde que chegou a Terra. Fico feliz em ajudá-lo a ser um herói. E também em passar mais tempo com ele. Apesar de ele não ser o amor da minha vida, eu o considero muito.

- Não é tão fácil vencer a Supergirl, amor!- Digo ao me recompor, voando para cima dele e jogando-o para longe.

Mon-El desfalece no chão, com um pequeno sorriso de rendimento. Me aproximo dele e lhe dou um selinho, enquanto ajudo-o a levantar. 
Ele me puxa pela cintura e inicia um beijo profundo. Gosto da sintonia que temos. Gosto da forma carinhosa que ele me trata, do jeito que ele me faz rir e, principalmente, gosto de poder confiar nele. Desde que cheguei nesse planeta, minha adaptação tem sido constante. Não só pelo fato de eu ser alienígena, mas também pelo fato de eu ser diferente, fisicamente. Ser bissexual já é complicado aqui, mas ser interssexual também, é mais ainda. Por conta disso, sempre tive poucos amigos, e sempre tive medo do que as outras pessoas pensam sobre mim. Me tornei uma garota insegura e fechada. E isso durou até o momento em que eu a conheci. Lena Luthor. O amor que, por um erro meu, sumiu da minha vida há 4 anos. Mas essa é uma história que eu prefiro não lembrar. Principalmente quando estou beijando Mon-El.
Me afasto com um leve sorriso, quando ouço os passos da Alex se aproximando. Menos de dez segundos depois, ela adentra a sala de treinamento.

- Aliens estão assaltando um banco na Rua Penn com a Harley- Alex avisa, apressadamente- Há reféns!

Antes que ela termine a última frase, já estou voando sobre a cidade, em direção ao local. Eu gosto do que faço. Gosto de salvar as pessoas. Sinto que nasci pra isso. Mas também gostaria de ter uma vida normal. De casar. Ter filhos. Um cachorro. Talvez até um gato. Enfim, uma família. Mas quando Lena se foi, vi toda a possibilidade de isso acontecer ir pelo ralo. 

Antes das 19:00h eu já estou de volta a minha casa para a noite de jogos. Arrumo a sala rapidamente e logo ouço a campainha tocar. Abro a porta dando de cara com James, Winn e J'onn.

- Garotos! Entrem! - Digo sorridente, dando espaço para eles entrarem- Há bebidas e comidas na mesa de centro, fiquem a vontade. Após algum tempo, Alex chega acompanhada de Maggie, sua namorada. 

A noite passa de forma rápida e divertida. Uma pena Mon-El ter que assumir o turno de um colega, no bar, ele adora a noite de jogos. Enquanto o pessoal se organiza para a última rodada, Alex me arrasta para a cozinha.

- Podemos conversar?- Ela diz tensa.
- Claro!- Sorrio levemente- Aconteceu algo?
- Então, eu deveria ter contado isso antes, mas não quis estragar a noite de jogos- Ela diz mexendo no anel do dedo indicador. Está nervosa, Penso.
- Alex, está me deixando tensa- Digo- Fala logo.
- Antes de sairmos do DEO, J'onn e eu recebemos uma notícia do Superman- Ela começa a falar- Lex Luthor tentou atacar o Superman há dois dias com uma nova arma e...ele está morto. Lex Luthor está morto!Superman o matou.

Sento em uma das cadeiras da bancada e inconscientemente coloco a mão no peito. Minha respiração fica um pouco ofegante e minha mente viaja. Lex sempre foi um dos maiores inimigos do meu primo e, consequentemente, meu também. Ele comandava a Luthor-Corp de NC, e usava toda a capacidade da empresa para realizar projetos horríveis de vingança. O único motivo que me impedia de matá-lo com minhas próprias mãos, era Lena e meu amor por ela. Lena.

- Lena... Ela... Ela sabe?- Pergunto à Alex.
- Eu não sei - Ela revela- Mas acredito que sim, ele era o irmão dela.
- Isso sig-significa q-que... que ela irá voltar pra NC- Digo em estado de choque.
- Sim, ela provavelmente voltará!- Alex concorda.

Flashback Kara:

Conheci Lena durante uma entrevista, para a CatCo. Foi minha primeira entrevista solo e eu queria saber mais sobre uma dos herdeiros de Lionel Luthor, dono de uma das empresas mais promissoras no ramo de pesquisas farmacêuticas. Na época, Lena e Lex eram apenas aprendizes na empresa do pai, mas Lex já odiava o fato de ter Lena por perto. Isso tudo piorou quando Lex descobriu que Lionel queria que Lena assumisse seu lugar como CEO. Assim, quando o Sr. Luthor morreu, misteriosamente, Lex, com o apoio da mãe, assumiu a empresa de imediato, sem dar chances de Lena argumentar. Ele transformou a Luthor-Corp em um lugar temido por aliens. Mudou totalmente o futuro que Lionel queria para a corporação e ainda expulsou Lena da mesma.
Durante todo esse período, Lena e eu nos aproximamos e nos tornamos grandes amigas. Com sua inteligência muito acima da média, ela logo soube que eu era a Supergirl. Fiquei aliviada por ter mais alguém, além dos meus poucos amigos, para conversar sobre isso. E ao mesmo tempo com medo, de alguém machucá-la, para me atingir.
Ficar perto dela parecia extremamente natural. Como se eu a conhecesse da vida toda. Me sentia confortável e segura. Era como se o tempo nunca passasse. Logo percebi que um sentimento a mais estava crescendo. Foi quando decidi contar sobre minha interssexualidade, com o maior medo de perdê-la. Ela riu tanto quando soube o que eu queria contar, disse que eu era tão boba por pensar que ela se afastaria por conta disso, me abraçou forte e então me deixou mais segura do que nunca. 

- Eu já sabia disso também- Ela disse rindo, na sacada do seu apartamento- Seu uniforme de Supergirl não disfarça muito.

Senti meu rosto ruborizar e ela me puxou carinhosamente. Tocou meus lábios com as pontas dos dedos e me beijou. Naquele momento, eu tive certeza de que queria passar o resto de minha vida ao seu lado.
Não levou muito tempo até eu e Lena começarmos a namorar. Nosso encaixe era perfeito. Haviam brigas, sim, mas nós sempre resolvíamos da melhor maneira possível. Eu planejava tudo ao lado dela. Uma vida toda. Ela entendia quando eu precisava sair no meio de um jantar para salvar o planeta e melhor, sempre me apoiava.
No dia do meu aniversário de 24 anos, Lena me fez uma surpresa. Havia tudo que eu tinha direito. Flores, música, comida. Ah sim! Comida, muita comida. Naquela noite eu a amei como nunca tinha amado, até nossos corpos se esgotarem, bom, até o corpo dela se esgotar.
Meses após isso, precisei salvar algumas pessoas, em um prédio. Foi quando fiquei exposta à Kryptonita Vermelha. Tudo mudou. Eu estava em uma luta interna dentro de mim mesma, contra uma personalidade que não era minha. Meu verdadeiro eu gritava e gritava cada vez que a falsa Kara feria alguém. Eu tentava ser mais forte, mas era em vão. Depois de machucar minha própria irmã, no DEO, a falsa Kara foi para meu apartamento, mas Lena estava lá. Lena estava lá e pela primeira vez eu desejei que não estivesse. Ela estava nervosa e feliz ao mesmo tempo. Gesticulava muito e eu notei que ela queria me contar algo.

- Eu quero conversar com você- Ela disse sorrindo levemente.
- Ah... Fala!- A falsa Kara revirou os olhos e eu torci para Lena não reparar. 
- Eu andei me sentindo mal...- Ela olhava para o chão, enquanto falava- então eu decidi... decidi ver o que havia de errado.
- E...?- A falsa Kara gesticulou para ela ir direto ao ponto.
- Kara... Eu tô grávida!- Lena solta.

Nesse momento o mundo inteiro para. Toda a luta que havia dentro de mim acaba. Sem audição. Sem visão. Eu queria muito ter uma vida com Lena. Filhos. Mas estava em choque. Tão em choque que quase não percebi a falsa Kara sorrir debochada. Ela começou a falar coisas horríveis para Lena, que a olhava, me olhava, sem entender nada. Eu gritava mais forte. Tentava fazer a falsa Kara parar, mas nada adiantava. Eu chorava por dentro. Era como se eu estivesse presa em uma cela à prova de som. E de fato estava. 

- Você acha mesmo que eu queria ter uma família com você?!- minha falsa personalidade diz irônica.
- Kara...- Lena estava quase chorando. O amor da minha vida estava ali, na minha frente, despedaçada, e eu não podia fazer nada.
- Eu só queria te foder, Lena- falsa Kara diz olhando nos olhos de Lena- e aceitar namorar com você foi apenas uma tática pra conseguir isso. Eu não quero casar com você. Eu não quero ter filhos com você. Aliás, eu não quero ter filhos nunca. Você é uma Luthor, e tirando seu corpo bonito, eu te desprezo por isso. Então, eu sugiro que você suma da minha vida.

Lena encara meus olhos e eu vejo a dor no seu olhar. Ela não se incomoda de deixar as lágrimas escorrerem por sua bochecha. Pega sua bolsa e vai em direção a porta. 

- Ah... Lena?- A falsa Kara diz, fazendo Lena se virar- Se quer um conselho, deveria abortar!

Lena sai do apartamento, me deixando sozinha e com o coração destroçado. Eu não conseguia fazer mais nada. Nem lutar contra essa Kara horrível que tomou conta de mim. Eu só queria desaparecer.

Abro meus olhos lentamente e vejo que estou em uma maca, no DEO. Alex e J'onn estão ao meu lado. Aos poucos as lembranças horríveis vêm em minha mente. Lembro de tudo o que fiz e tudo o que disse. Tento levantar, mas Alex me impede.

- O que... O que eu...- Tento formular uma frase, mas minha cabeça dói demais.
- Você foi exposta à Kriptonita Vermelha. Uma Kriptonita sintetizada por Maxwell Lord, que deu errado. Ao invés de te deixar mais fraca, ela mudou sua personalidade. Nós conseguimos um antídoto, e então precisamos capturar você para conseguir usá-lo. Você ficou desacordada por dois dias.
- O que?- Pergunto incrédula- Dois dias? Ah Rao! Lena! Eu preciso falar com ela.

Alex e J'onn trocam olhares tensos.

- O que houve? Cadê a Lena?- Indago.
- Eu fui atrás dela, para avisar sobre você- Alex diz- Kara... Lena foi embora. Sumiu do mapa.
- Não... Droga!- Coloco uma das mãos na cabeça- Precisamos achar ela. Eu vou encontrar a Lena. Eu preciso disso.

Passei meses ao lado de Alex e Winn, tentando achar Lena. Mas no fundo, eu sabia que nunca a encontraria. Lena é a pessoa mais inteligente que eu conheço, e se ela não quer que eu a encontre, então eu realmente não iria conseguir isso.
Me recuperar foi muito difícil. Eu me culpava todos os dias por tudo que aconteceu. Mal conseguia me olhar no espelho. Me afundei no trabalho, para tentar esquecer tudo. Me perguntava todos os dias se Lena levou a gravidez a diante, mas depois cheguei a conclusão de que ela seguiu o conselho da falsa Kara. Já era difícil lidar com a perda de Lena e ter que lidar com a perda do meu filho, ou filha... Era insuportável. Depois de muito tempo sofrendo, Alex me convenceu de que eu fiz todo o possível para encontrar Lena e consertar tudo, mas que teria que seguir em frente. Foi quando comecei dar um passo de cada vez, e decidi enterrar o mais fundo possível qualquer sentimento ou lembrança de Lena Luthor.

- Eu procurei tanto por ela - Digo à Alex, enquanto ouço o pessoal jogando- E agora ela estará de volta. Eu nunca pensei que a veria de novo. 
- Eu entendo- Ela segura minha mão- Mas você é forte, vai conseguir encarar isso. Deveria falar com ela, ter uma conversa de adultos.
- Não, ela não vai querer me ver- Digo tristemente- Você não viu Alex, não viu a mágoa nos olhos dela, quando aquela maldita personalidade criada pela Kryptonita Vermelha falou aquelas coisas horríveis. E eu segui em frente, não é? Eu segui. Eu tenho o Mon-El. Eu recomecei. Eu sou feliz, certo?
- Está me perguntando isso?- Alex ergue uma sobrancelha.
- Não... Não... Eu... Estou afirmando- Digo incerta.

Após o pessoal sair, deito em minha cama, desejando que o sono venha. Mas no seu lugar, o que vem são lembranças e mais lembranças de Lena. Lembranças essas que eu guardei tão fundo, que só vieram a tona quando soube que ela voltará. Quando ela se foi eu quis tanto encontrá-la, mas agora não sei se estou preparada para vê-la novamente. Fecho meus olhos de novo, e me concentro para dormir, com a sensação de que o dia seguinte seria longo e turbulento.