História October - Imaginary

Um arrepio desce por minha espinha e meu corpo treme. Abro meus olhos e focalizo o teto de madeira acima de mim. Odeio sonhos.

Sento-me e fecho os olhos, ainda sentindo sono, mas não dormirei novamente. Toda vez que fecho os olhos imediatamente sou tomada por sonhos, sonhos reais demais.

Abro os olhos e remexo na mochila, procurando o celular de Zayn. Desbloqueio; dando de cara com uma foto minha grávida, um sorriso leve se abrindo em meu rosto com a lembrança do álbum que Zayn cismou de fazer; e as horas informam que dormi exatamente por meia hora, é um avanço. Levanto-me e caminho até a porta do quartinho.

Encontramos uma cabana, acho que era de caçadores, e resolvemos parar essa noite. Foi ideia minha, mesmo que relutando em parar achei melhor, quero evitar o espírito mal da floresta, e à noite acho que é uma péssima hora para encontrá-lo, apesar de eu ser uma criatura para a noite.

Na sala encontro Fairy e Dante dormindo juntos, e continuo até a porta da frente e saio da cabana.

- Você deveria estar dormindo. – Olho para cima e encontro Zayn sentado na beira do telhado da frente da casa, suas pernas balançando.

- Não consigo. – Minto, não vou contar a ele sobre os sonhos. Dou um salto rápido e estou sentando-me ao seu lado. Mesmo daqui, algumas árvores ainda estão muito acima de nós.

- Você quer dizer que não consegue dormir por causa dos sonhos. – Viro o rosto e focalizo uma mariposa. – Você não tem o sono mais tranquilo.

- Err... – Comento e apoio minha mão sobre a de Zayn no telhado. Um morcego passa voando a centímetros de meu rosto, fazendo um som tão agudo que cubro minhas orelhas com as duas mãos. – Como poderiam achar que nos transformávamos nessa coisinha!

Zayn ri e passa um braço ao redor nos meus ombros. A floresta é escura e silenciosa daqui de cima, seus arbustos podem estar escondendo de tudo.

- As pessoas são criativas. – Zayn comenta. – E você precisa dormir.

- Quando você vai parar de implicar com meu sono? – Resmungo olhando para a tela do celular, não mexendo em nada especificamente. Droga, meu celular sumiu, e nele havia tantas fotos perfeitas que eu queria ter comigo.

- Alguns costumes nunca se perdem. – Ele sussurra. – Mas você ainda precisa dormir.

Reviro os olhos e me deito sobre o telhado reto de madeira, apoiando minha cabeça no colo de Zayn. Não quero sair de perto dele.

- Okay. – Zayn diz sorrindo e tira o celular da minha mão. Levanto os olhos para seu rosto, que é tão perfeito que parece tirado de um retrado de um deus. – Agora feche os olhos.

Os olhos dele brilham mesmo nessa escuridão total. Acho que são os refletores atrás da pupila, como nos leões, que refletem a luz e nos fazem enxergar melhor no escuro.

Sinto o sono me levando, aos poucos, como uma neblina branca cobrindo minha mente. Aconchego-me mais e meus olhos param numa mariposa que voa a frente dos meus olhos, suas asas incandescentes brilhando transparentes, cada fibra visível. Suas asinhas batem, produzindo um som agradável e harmonioso. E a névoa chega com essa imagem, dessa mariposa inocente em seu voo noturno.

Dou um tapa na samambaia a minha frente e sigo em frente, chutando outra que está na altura dos meus pés. Ouço Zayn reclamando que a samambaia bateu nele, mas nem ligo, ele é alto e está acima das plantas do caminho, e eu não, que por ser baixa estou no nível delas e o nível delas é bem no meio da minha cara.

Fairy que está na minha frente tira uma do seu caminho e como eu estava bem perto e distraída com um cipó que não porque diabos estava no chão e se enrolou no meu tornozelo, o galho acerta meu rosto em cheio.

Minha paciência já passou dos limites. Pego uma faca que prendi no cinto e saio cortando todos os galhos no meu caminho. Sei que não deveria fazer isso porque estou no meio da Floresta Westshowess e ela é mágica e ela pode não gostar disso e blá-blá, mas não ligo, estou mesmo a fim de uma briga.

- Kathy! – Ouço Zayn dizer mas não dou atenção, sei que ele vai vir com uma bronca e coisas do tipo. – Katherine, me escute!

Oh, ficou irritado.

Continuo como se ele não tivesse aqui, estou cansada de ser sempre repreendida e não poder fazer o que eu quero.

No meio de um movimento para cortar um galho a minha frente Zayn segura meu pulso. Puxo-o, mas ele o segura com força, e mesmo que eu tente puxar com toda força é o mesmo que nada.

Respiro fundo, o cheiro da floresta úmida e de fungo que estou começando a odiar, solto o ar, e então olho para ele.

- O que foi?

- Não sei – Zayn diz, pelo canto do olho vejo que  Fairy e Dante se sentaram. – Talvez você estiver violentando a floresta.

- Desculpe Zayn, mas nem todos são altos e estão livres de alguns galhos na cara. – Digo e puxo meu pulso e dessa vez ele solta.

- Não precisa descontar em mim.

- Não estou descontando em você! – Digo meio alto, mas nem me importo. Pego minha faca que caiu no chão e continuo cortando as plantas do meu caminho, com mais raiva que antes. – Só não aguento mais nada verde! Odeio essa floresta, não suporto esse cheiro, e aquela vagabunda está enfiada nessa merda em algum lugar!

Lanço a faca a minha frente e ela acerta um tronco a alguns metros, a lâmina enterrando até o cabo. Respiro fundo e olho para trás, para o três que ainda estão parados no mesmo lugar, olhando para mim.

- O que estão fazendo? Vão ficar ai parados? – Digo e volto a andar, e quando tento tirar a faca do tronco ela se agarra ali, puxo-o com mais força e ela se quebra, apenas o cabo se soltando.

Jogo essa porcaria às minhas costas e volto a andar, usando meus braços para abrir o caminho. Ouço os outros começando a andar atrás de mim, e Zayn sussurra:

- Estressadinha.

E então eu explodo. Viro-me e volto até ele, empurrando-o e jogando-o no chão.

- Seu idiota! Estou me matando para seguir e você fica me chamando disso! – Chuto o chão e algumas folhas nele e ele olha para assustado. – Porque você não cala essa boca e anda?!

- Eu disse em geral. – Zayn diz se levantando.

- O que? – Fairy se manifesta. – Está dizendo que todas as mulheres são estressadinhas?

Olho para Fairy, que está olhando indignada para Zayn enquanto caminha e para ao meu lado.

- Sim. – Zayn diz, calmamente. Não posso acreditar que ele disse aquilo mesmo.

Fuzilo-o com o olhar, sentindo a raiva se apossar de mim, e Fairy avança, não tento contê-la, mas Dante sim.

- Pare com isso! – Dante diz, tentando conter Fairy. – Você sabe que é verdade!

Oh-oh.

Fairy para de se sacudir e ele a coloca no chão. Ela olha para ele de forma tão fria que suponho que ele congele. E então dá um tapa na cara dele.

E tenta bater nele novamente, gritando com ele. Fico olhando tudo parada, sem reação, e então Zayn resolve abrir a boca dele:

- Ficar estressadinha por que alguém diz isso só prova que isso é verdade.

Vou para cima dele. Quem ele pensa que é para ficar falando assim? Zayn vê meu avanço e me segura, sorrindo debochado, e minha raiva duplica.

Nós dois caímos no chão, ele rindo e eu sobre ele. Odeio ele ser mais rápido e forte que eu, e ele para meus movimentos rápido demais, e fico frustrada. Mas eu não sou só vampira, tenho o sangue daquela vadia correndo em mim.

Digo as palavras baixinho e com um sorriso vejo Zayn arregalar os olhos enquanto um cipó lhe corre nos braços e pernas e o prende no chão.

Levanto-me do chão e olho para ele, vitoriosa.

- Solte-me. – Ele diz, uma veia pulsando em seu braço enquanto ele faz força.

- Não. – Digo e me agacho ao seu lado. – Peça desculpas.

- Não. – Ele me lança um olhar desafiador.

- O que você está fazendo? – Uma voz desconhecida diz às minhas costas e eu giro rápida, xingando-me por ter sido tão estúpida.

Uma mulher de cabelos pretos e vestido branco está parada a alguns metros de mim, com os braços cruzados sobre o peito, olhando para o chão aos seus pés e balançando a cabeça. O Espírito da floresta.

Desço meus olhos e aos pés um garotinho de cabelos dourados ri.

- Não pode fazer isso! – Ela diz e se abaixa.

- Só estou me divertindo. – O menino responde, e então olha para mim. Seus olhos são dourados. – Oi.

Olho para o meu lado, onde Fairy ainda tenta bater em Dante, e para Zayn, que está desesperado tentando se soltar. E então tudo faz sentido.

Esse garoto é o Espírito Mal da floresta.

- Não teve graça. – Digo para o menino e solto Zayn.

- Teve sim. – Ele responde se deitando no chão de folhas secas. – Não é sempre que temos visitantes.

Vou até Fairy e Dante e afasto-os.

- Parem! – Digo e seguro Fairy, que está vermelha de raiva. – Foi o Espírito Mal que nos controlou, parem!

Fairy olha para mim sem entender, mas não fico para explicar nada. Caminho até o menino e abaixo-me ao seu lado, seus cabelos brilhantes refletem a luminosidade, algo sobrenaturalmente lindo.

- Você sabe onde o castelo está?

Ele olha para mim com os olhos semicerrados, brilhantes sobre a luz do sol que consegue escapar entre as árvores.

- Depende. – Ele diz. – O que ganharei?

- O que você quer? – Digo, e eu não quero fazer isso, mas a outra sumiu e só me resta ele.

- Hm... – Ele diz sorrindo, rolando sobre as folhas. – Eu quero... uma flor igual a sua!

Olho para ele sem entender, e então ele toca meu pulso esquerdo, e então entendo.

- Ok. – Puxo seu pulso e digo algumas poucas palavras, e quando retiro-o minha mão, uma flor de lótus está desenhada em seu pulso estreito.

- Suba nas árvores! – Ele diz sorrindo e então some. Desgraçado. Levanto-me e ando por alguns metros em círculo, chamando por ele, mas ele sumiu.

Depois de alguns minutos volto para onde os outros estão. Fui enganada por aquele garotinho, mas claro, fui pedir ajuda ao Espírito Mal, o mesmo que incitou a briga entre nós.

Levanto os olhos e olho para Zayn, que está sentado no chão, olhando para o outro lado.

Vou até ele e me sento ao seu lado, pegando sua mão entre as minhas. Mas ele não olha para mim.

- O que você tem?

- Desculpe. – Ele diz baixinho. E então ele olha para mim. Um raio de sol entre por entre as árvores e cai diretamente sobre seu rosto, seus olhos ficando quase dourados e suas feições iluminadas. Fico encarando ele, totalmente admirada e absorta por ele. – Fui enganado por um espírito idiota.

- Todos fomos. – Fairy diz, tirando as palavras da minha boca. Olho para ela e sorrio quando encontro ela e Dante abraçados.

- Isso mesmo. – Digo e me viro para Zayn e sua magnificência. – Ele me disse que diria onde o castelo está, mas sumiu quando eu dei o que ele queria.

- Ele não disse nada?

- Disse para eu subir nas árvores.

- Então suba.

- Não. – Digo e rio dessa ideia estúpida. E eu estava enganada, ele não me enganou.

Dou-me conta disso quando vejo uma torre do castelo ao longe, sua ponta se sobressaindo das árvores.

- Encontrou? – Zayn diz e sai das folhas, parando ao meu lado no galho. Ele olha ao redor e quando vê a torre, abre um sorriso. – Lá está.

Sorrio e olho para a torre, sentindo a esperança crescer em meu peito. Finalmente poderei ter meu bebê em meus braços.

Passo um braço ao redor de Zayn e o abraço, me aconchegando nele. Ele sorri tão lindamente, seus olhos brilhantes. Olho novamente para a torre, a alguns quilômetros, perto, bem perto do nosso bebê e do fim disso.

Aumento o passo, está perto, bem perto. Sinto o cheiro da água e seu barulho, está à frente daquelas árvores.

Saio da proteção das árvores e o castelo se eleva sobre mim, e então sou puxada de volta para as árvores.

- O que está fazendo? – Pergunto a Zayn que se ajoelha na minha frente. Curvo-me para tentar ter uma visão do castelo de pedra.

- Eles não vão nos deixar entrar com isso. – Ele diz soltando a sua mochila e colocando uma faca dentro da minha bota e outra na sua.

Solto minha mochila e Fairy e Dante fazem o mesmo. Viro-me para o castelo e pego a mão de Zayn, nós dois saindo das sombras das árvores juntos.

Daqui para frente, tudo pode mudar.