História Oito Estações - Outono - Imutável

“Você pode dizer que o verão se foi pelo cheiro de folhas
Caídas por aí como brinquedos para a brisa de outono
As coisas nunca mudam não importa o quando você implore
As noites estão ficando frias, logo estará congelante”

Hooverphonic – Bad Weather

Ele se sentou ao lado dela no banco, suspirou e lhe entregou um copo fumegante de chá, bastante leite, dois tostões de açúcar, do jeito que ela gostava.

– Ah! – ela exclamou, sinceramente surpresa, mas sorrindo ao notar a presença do amigo – obrigada, Naruto.

– Outra vez aqui, Sakura-chan?

Ela provou um gole de sua bebida, fazendo um barulho gutural de apreciação antes de se virar para ele com um estalar de língua.

– Do que você está falando? Você não está aqui também?

– É, mas eu não estava aqui antes de ontem – acusou.

– Ele poderia chegar cedo – se justificou escondendo o rosto dentro do cachecol marrom que usava em volta do pescoço.

– E quando foi que isso aconteceu alguma vez’ttebayo?

Ela não respondeu e ele tampouco insistiu, a ansiedade eram algo que ambos compartilhavam em igual nível, ele sabia. Só tinham modos diferentes de demonstrar.

– Ele está atrasado – constatou desnecessariamente, tentando preencher o silêncio, talvez. Naruto não gostava de silêncios – eu queria ir atrás dele, mas Kakashi-sensei não deixou. Algo sobre como eu deveria “sossegar durante a minha folga”, já que, chegaram aos ouvidos dele, que eu tenho “pegado missões consecutivas demais” e “minha saúde pode ser comprometida”. Parece familiar pra você, Sakura-chan?

Ela corou e mordeu a bordinha do copo de papel antes de responder.

– Culpada, mas não me arrependo, você anda se sobrecarregando. Você não é ferro sabe?

Ele somente revirou os olhos e chutou o montinho de folhas secas que se formava no meio fio. Dizem que Konoha recebeu seu nome pelas folhas verdes de suas muitas árvores no verão, mas era no outono que Naruto percebia o quanto de fato havia folhas em Konoha, pois essas, embora desaparecessem de seu lugar costumeiro nas copas das árvores, estavam em todo lugar. E, embora fosse irritante ter que varrê-las de seu apartamento toda vez que abria as janelas, ele gostava de como o mundo ficava colorido em tons mornos de marrom, amarelo e seu adorado laranja.

De repente, ela que também estivera inerte em seus próprios pensamentos, soltou uma risada seca, sem humor, que estarreceu Naruto, fazendo-o voltar a olhar para ela, perceber o gesto nervoso de beber um gole enorme da bebida que provavelmente lhe havia queimado a garganta, mas ele sabia que as águas que marejavam os olhos verdes não tinham nada a ver com a possível queimadura.

– Eu devo parecer patética, não é mesmo? Eu não mudei nada, ainda estou aqui nesse banco idiota, esperando, esperando... – ela apertou os olhos om força, talvez para deter as lágrimas. Nessas horas, Naruto sinceramente odiava Sasuke.

Ele apenas lhe deu um sorriso gentil e apertou a mão enluvada que ela descansava no colo.

– Tem coisas que não mudam mesmo. Kakashi-sensei é pervertido, Tsunade-baa-chan é azarada, você ama o Teme.

– Amar o Sasuke – disse ela de modo contemplativo – que sorte triste a minha. Mas bem, pelo menos, eu não estou sozinha nessa – se livrou da mão dele e secou uma lágrima teimosa com um sorriso maroto – obrigada, Naruto.

– De nada – e então os olhos dele se arregalaram e ele pulou em pé protestando – o que?! Sakura-chan o que você está insinuando.

– Insinuando, eu? – ela levou a mão livre ao peito numa pose ofendida. – Só estou constatando que eu não sou a única pessoa patética por aqui que morre de amores pelo Sasuke-kun.

– Mas! – ele engasgou com as palavras. – Eu não amo o Teme, dattebayo!

– Se você quer viver em negação... – disse ela com um dar de ombros e o tom mais cínico.

– Sakura-chan!

Ela riu, dessa vez realmente aparentando sinceridade no gesto e, embora Naruto estivesse em completo desacordo com suas alegações, ele se sentia mais tranquilo em vê-la menos melancólica.

– Anda, senta aqui – ele a olhou desconfiado, o rosto ainda corado – anda, Naruto! Eu prometo que não vou mais comentar dos seus sentimentos amorosos pelo Sasuke-kun.

– Não tem sentimento nenhum! – mas ele se sentou.

– Você finge que é verdade e eu finjo que acredito.

– Sa-ku-ra-chan!

Ela riu outra vez, ele cruzou os braços e virou para o outro lado.

– Não seja assim! Geez! Tão dramático.

Ele soltou uma risada sarcástica, ainda se recusando a se virar para ela.

– Então, deixando Sasuke-kun de lado, junto com a minha ridícula vida amorosa, como vai a sua?

– A minha o que’ttebayo?

– Sua vida amorosa, anta! Você e a Hinata não deveriam estar andando por aí causando epidemias de cáries e diabetes pela vila?

– Como você sabe sobre a Hinata?! – ele se virou tão rápido que ela pôde jurar ouvir o pescoço estalar perigosamente.

– O que? Que ela te ama ou que você finalmente ficou ciente do fato?

– Os dois’ttebayo!

– Primeiro, sua anta, todo mundo sabia.

– O que?!

– Porque você acha que ela sempre ficava vermelha, tinha desmaios e não conseguia falar direito toda vez que te via, idiota? – conforme ela ia falando a boca dele ia abrindo mais e mais, por seu rosto passando diversas expressões hilárias entendimento tardio. Sakura precisou de muito esforço para não cair na gargalhada e terminar seu raciocínio. – E segundo, sobre ela já ter te contado há meses atrás – continuou ela num tom de acusação – Ino me contou.

– Ino?

– Ela está saindo com o Kiba, sabe...

– Aquele cachorro fofoqueiro... – ele fendou os olhos e estalou as juntas dos dedos, imaginando mil modos de destruir a cara do Inuzuka.

– É uma vila, anta. Ninguém consegue guardar segredo por muito tempo. Mas eu estou mais ofendida – ela o cutucou dolorosamente com o indicador – é que eu não ouvi isso de você. Nós não supostamente deveríamos ser amigos ou coisa do tipo?

– Foi naquela época que, você sabe... – ele mordeu o lábio inferior e desviou os olhos, acariciando o braço vítima da violência sofrida. – Você estava tentando me fazer desistir do Teme.

A mão de Sakura caiu sobre o banco e ela ficou em silencio alguns segundos, a boca formando um “oh” antes de ela recolher o próprio braço e tomar outro gole do chá.

– Eu nunca... Nunca pedi desculpas por aquilo – ela respirou fundo – eu sinto muito mesmo, Naruto. Foi horrível o que eu fiz... Tentar manipular você daquela forma...

– Está tudo bem Sakura-chan – ele riu fracamente, daquele jeito tão dele, meneando o corpo em direção ao dela num empurrão de leve – eu entendo, estava todo mundo desesperado naquela época. O importante é que tudo deu certo no fim’ttebayo.

Ela retribuiu o sorriso e lhe deu uma amigável cotovelada nas costelas que o fez uivar de dor.

– Mas você ainda não me disse por que não está com a Hinata. Você... não gosta dela? Não vai me dizer que não acha ela bonita ou coisa do tipo? Você pode ser tapado, mas é pupilo do Jiraya-sama e do Kakashi-sensei.

Ele revirou os olhos, ainda esfregando onde ela lhe havia atingido.

– Eu sei que ela é bonita, ok? Eu tenho olhos – então, finalmente se dando conta de tudo que ela disse e o modo como tinha respondido, ele se virou pra ela erguendo o punho em ultraje – hey! O que você quer dizer com isso, Sakura-chan?!

– Naruto, nem tente negar o quão pervertido você é, se eu me lembro bem, você já tinha inventado aquele jutsu depravado antes de ter sequer virado gennin – ele ainda tentou se defender, mas ela apertou os lábios dele com os dedos, os fechando como um bico de pato – mas não mude de assunto.

Ele empurrou a mão dela e a olhou feio enquanto massageava os lábios agredidos.

– E daí que eu acho ela bonita? Você acha que eu vou gostar dela só porque ela é bonita’ttebayo?!

– Ai, Naruto. Você nem tem direito de ficar ofendido. Um, você é longe de ser a pessoa mais profunda que eu conheço e dois, você gostou de mim porque me achava bonita.

Ele corou.

– M-mentira’ttebayo! Você não pode me acusar disso, meus sentimentos eram sinceros!

– A é? Então porque a primeira coisa que você me disse quando eu tinha quase morrido tentando proteger você e o Sasuke-kun na Floresta da Morte foi perguntar o que tinha acontecido com o meu cabelo?

– Porque eu era muito observador? – respondeu ele numa voz pequenininha.

Ela o olhou de cima a baixou balançando a cabeça e estalando a língua com um ar de reprovação.

– Que vergonha, Naruto, que vergonha. Coitada da Hinata. Ela deve ser doida pra gostar mesmo de você. E você, sua anta, devia ir atrás dela. Eu sei que você tem fangirls agora te seguido, mas assim que elas descobrirem sobre a sua personalidade horrível vão fugir correndo de você, assim ó – ela estalou os dedos na frente da cara dele para ilustrar, Naruto se encolheu – já com a Hinata, é amor de verdade – ela terminou voltando a beber o chá e fazendo barulhos guturais de afirmação. Satisfeita com o quão silencioso ele ficou, quase era possível ouvir as rodinhas enferrujadas da cabeça dele começando a girar, Sakura quase riu.

– Sakura-chan, as coisas não são simples assim e... Não é que eu não goste dela, eu gosto, mas bem... Eu sei tão pouca coisa da Hinata e ela disse que me ama – ele disse a ultima palavra bem baixinho, com bastante cuidado, como se fosse um objeto que ele tivesse medo de quebrar. – Eu quero conhecer mais a Hinata, se eu sou tão especial assim na vida dela eu gostaria de retribuir isso de alguma forma’ttebayo...

Sakura lambeu os lábios, expectante. Não esperava que ele fosse dizer coisas tão sinceras assim.

– E?

– Bem, ela tem me evitado – ele suspirou pesadamente. – Como se á não bastasse eu não ter ideia do que dizer a ela, aconteceu tudo tão rápido e depois, o Neji... Urgh dattebayo! Porque as coisas tem que ser tão complicadas?

Ela deu dois tapinhas afetuosos no ombro dele.

– Seja bem vindo a vida adulta. Mas sinceramente, Naruto, seria realmente uma pena depois de todo esse tempo de espera, mas se você realmente não gosta da Hinata, diz logo pra ela, é bem cruel da sua parte deixar a menina ter esperança esse tempo todo...

– Não é isso, Sakura-chan! No enterro do Neji ela disse que... Bem, eu acho que ela não gosta mais de mim. Eu acho que ela se arrependeu de ter se colocado na minha frente’ttebayo...

Fez-se um momento de silêncio em então Naruto ouviu “Shanaroo!” de Sakura antes de ela lhe atingir com um soco do lado direito da cabeça, e aquela foi a última coisa que escutou com aquele ouvido por um longo tempo.

– Impossível! Hinata gosta de você desde a academia, sua anta!

– Precisava me bater com tanta força dattebayo?! – choramingou esfregando a área atingida.

– Precisava! Pra ver se esse seus neurônios pegam no tranco! Hinata não gostar de você... – ela bufou – até parece!

– Então porque ela não quer nem falar comigo’ttebayo?

– Ela está sofrendo, imbecil! Está de luto e está se sentindo culpada! Também pudera! Ter alguém que te amava tanto a ponto de morrer pro você e pela pessoa que você ama deve ser, no mínimo, aterrorizante!

– O que? – ele fez uma careta incrédula. – Alguém que amava a Hinata? Do que você tá falando’ttebayo?!

– Do Neji, é claro.

– Neji amava a Hinata? ‘Tá doida, Sakura-chan?

– Quando você vai parar de agir como se ninguém tivesse feito coisa alguma desde que você saiu da vila da com Jiraya-sama? Neji e Hinata eram próximos! Muito por culpa sua até – ela fez uma careta – pelos céus, ele nunca tirava os olhos dela... – Sakura, então, soltou um suspiro exasperado – Eu também não tinha percebido antes que chegava a tanto, mas olhando agora, era bem óbvio, ainda mais para um sujeito como Neji... Ai, aposto que a Hinata percebeu também! Ela deve estar se sentindo horrível... – Sakura mastigou o lábio inferior numa expressão pensativa – coitada.

Naruto não sabia o que dizer, simplesmente deixou as informações entrarem por seu ouvido – o que não estava surdo e latejante – e simplesmente passou a encarar o chão contemplativamente.

– Bem, mesmo que ela tenha pedido distância, ainda acho que é importante que você demonstre que está disponível pra ela – disse Sakura, finalmente, após mais um gole de sua bebida. – Você pode até não amar a Hinata – “ainda” ela completou mentalmente – mas acredito que ela seja uma das suas pessoas preciosas, estou certa?

– Yeah’ttebayo.

– Então, se tem uma coisa que você é bom, além de em comer ramen e ser irritante...

– Hey! – ele protestou.

– ...é em ser um bom amigo – ela completou numa voz divertida. – E eu aposto que a Hinata está precisando de um agora.

Naruto levantou o olhar para o rosto sorridente da amiga antes de envolvê-la num abraço de urso.

– Obrigado, Sakura-chan.

Ela soltou uma exclamação abafada pela jaqueta dele.

– Cuidado com o chá!

– Dobe, o que diabos você está fazendo? – Sasuke anunciou sua presença com uma voz gélida.

Naruto sorriu largamente ao sentir o coração de Sakura disparar, o choque a fez soltar o copo meio vazio de chá molhando as botas de Naruto.

– Roubando a Sakura-chan pra mim – ele a apertou mais forte – você demorou muito Teme, perdeu.

– Me solta, Naruto! – rebelou-se ela, o empurrando com as duas mãos, Naruto ainda tentou, mas logo se viu jogado no chão, observando Sakura se voltar para Sasuke com um sorriso radiante – Sasuke-kun, seja bem vindo!

O moreno respondeu com um de seus “hn”, mas Naruto pode notar que pelo modo como deus ombros relaxaram, ele parecia satisfeito em ter a atenção de Sakura para si.

De fato, nada havia mesmo mudado.