História One Mississipi - Criminal

-O que está acontecendo? - comecei a perguntar enquanto éramos levados até a viatura. - Por que vocês estão prendendo a gente? Ei! Me responde!!!

Os policiais abriram a porta e praticamente nos jogaram lá dentro. Shawn foi primeiro, ele estava completamente em choque, só sabia sussurrar “estou fudido, estou fudido”. Voltei a perturbar os guardas.

-O que a gente fez de errado? Nós não invadimos a fábrica! Estávamos na colina e, pelo que eu saiba, ali é um local público. Vocês não podem nos prender!!

- A mocinha realmente não sabe? Nós vimos um casal fugindo quando entramos na fábrica e os moleques estavam pichando as paredes.

-Pra começar: um - comecei a contar nos dedos, mostrando - os pelo espelho do carro. O que foi uma tarefa meio difícil pois tínhamos sido algemados - Não são pichadores! São artistas, grafiteiros. - os policiais começaram a rir - Dois: nós não estamos lá! Vocês pegaram o casal errado. Isso é um absurdo! Solte nós dois agora!

Os policiais começaram a rir e passaram a me ignorar. Em pouco tempo estávamos na delegacia, eles nos colocaram em uma saleta com uma péssima iluminação, junto os outros que tinham ido na frente em outra viatura. Eu não conseguia ficar sentada e andava de um lado para o outro enquanto Shawn estava curvado sobre os braços, as mãos no rosto. Aos poucos os grafiteiros foram levados para depoimento e nos dois para um corredor do lado de fora.

-A senhorita poderia parar de andar de um lado para o outro? - um policial apareceu no início do corredor.

-Eu exijo ver o delegado! - apoiei a mão na cintura

-Ele tem mais o que fazer do que ouvindo uma pirralha chata. - o policial saiu me deixando mais puta ainda

-Olha aqui seu… - comecei a ir atrás dele, quando Shawn segurou meu braço me fazendo olhar pra ele.

-Chega Ellie! Senta aqui.

-Eu não consigo! Isso é um absurdo, Shawn. Nós não fizemos nada!

-Eu sei! Eles vão tomar nosso depoimento assim que nossos pais chegarem. - depois que ele comentou que a minha ficha caiu, ele estava desesperado porque os pais estavam vindo. Ele estava ferrado e eu mais ainda! Não duvido nada que a Karen o proíba de sair, falar ou até de respirar o mesmo ar que eu.

Me senti ao seu lado e esperei. Pouco depois uma policial apareceu e disse que o delegado iria nos receber. Fomos atrás dela até uma porta de madeira com uma placa escrito: Donald Lewis - Delegado titular

Eu reconheci na hora o nome e essa noite não poderia terminar pior. A policial abriu sua porta e fez sinal para sentarmos nas cadeiras a frente de Donald, que estava de cabeça baixa assinando alguns papéis. Assim que sentamos, a policial fechou a porta e o silêncio reinou na sala. Aquilo quase me matou! Eu queria terminar aquela noite logo, que venha o esporo.

-Eer, oi Donald. - comecei, quebrando o silêncio. Donald levantou a cabeça devagar, entrelaçando os dedos sobre o tampo da mesa. - Tudo bem com o você? Quanto tempo, né? - perguntei observando suas feições mudarem até que ele finalmente me reconheceu

-Eu estava muito bem, Ellie. Até me que me entregaram essa ficha porque, aparentemente, você foi pega pichando uma propriedade particular e ainda fugiu da polícia. - Donald estava usando sua voz mais calma e, por experiência própria, isso não era um bom sinal. Ele era daqueles que tem  voz forte, fala imponente fazendo que todo mundo prestasse atenção nele mas quando ele resolvia usar a sua versão calma e tranquila era sinal de que ele estava muito, mais muito puto ou decepcionado. - Eu não esperava te ver aqui, El! Sinceramente, estou desapontado. O que o Nathan diria pra você neste momento? - Donald Lewis era um grande amigo da família e nós não víamos a muito tempo. Eu me lembro dele saindo com Nathan, me ajudando a cuidar dele depois das festinhas… Donald fazia parte da minha família, era como um irmão.

-Quem é Nathan? - Shawn se manifestou ao meu lado. Donald me olhou confuso, balancei a cabeça pedindo para que ele não falasse mais nada.

-Bom, vamos ver o caso de vocês. - Donald voltou a olhar os papéis enquanto eu o analisava. Seus cabelos ruivos estavam bem menores, quase raspados atualmente, diferentemente da última vez em que o vi com seus cachos ruivos caindo sobre os olhos. Ele perdeu a carinha de bebê que eu me lembrava mas a covinha na bochecha continuava lá. Donald sempre foi uma das pessoas mais engraçadas que frequentavam a minha casa mas agora, olhando pra ele atrás dessa mesa, com seu traje social e expressão séria, eu me pergunto se aquele garoto divertido ainda existe ou se ele também foi embora junto com o Nat? - O que vocês foram fazer lá?

-Fomos gravar um vídeo para o meu canal do YouTube, foi naquela colina perto da antiga fábrica. - Shawn respondeu enquanto eu concordava com a cabeça.

-Foi isso mesmo, Ellie?

-Foi Donald.- respondi

-Sr. Lewis. - Shawn sussurou pra mim. Se ele soubesse de toda a história…

-Eu não acredito, Ellie! Conversei sobre sua reputação e você já é conhecida por aqui. - Donald respondeu, fazendo Shawn me olhar assustado.

-Você quer a verdade, Donald? - perguntei vendo-o assentir com a Cabeça. Fiquei de pé - É o seguinte, nós fomos lá pra transar feito dos coelhos e…

-Oi pai, oi mãe – Shawn me interrompeu. Quando olhei para a porta, Karen e Manuel estavam parados me encarrando, me virei para o Shawn e seu rosto completamente vermelho confirmou o que eu esperava. Virei novamente para os pais dele

-Olá senhor e senhora Mendes.- me joguei de volta na cadeira e encarei Donald, que segurava um riso. - Pode continuar, Donald.

Eu queria sumir! Escondi o rosto no meio dos cabelos e me afundei na cadeira.

-Boa noite, eu sou delegado Lewis. - Donald levantou e estendeu a mão para o casal, trocando um cumprimento rápido. - Eu os chamei aqui pois é de praxe, já que ambos são menores de idade. Mas, segundo as informações que coletamos e os depoimentos dos outros presos..

-Tem outros? Era uma orgia? SHAWN! - Karen deu um tapa na cabeça do filho

-Na verdade não, senhora. Os dois foram confundidos com um casal que estava junto com mais alguns jovens pichando uma propriedade particular mas os outros envolvidos confirmaram que eles não são os fugitivos em questão. Eles conhecem a Ellie - nesse momento todo mundo olhou para mim - Quero dizer, a senhorita Thompson mas afirmam que ela não estava com eles. Já o seu filho é um completo desconhecido para eles.

-Ainda bem. Nós já podemos ir para a casa? - Karen perguntou

-Claro, só preciso que vocês assinem estes papéis. - Donald fez sinal para que eles se aproximassem da mesa. O casal assinou e estavam quase na porta quando Shawn parou e me olhou.

-E a Ellie?

-Preciso conversar com a El… Digo, senhorita Thompson. Posso garantir que ela chegará em casa em segurança. - Donald afirmou. Olhei para Shawn que me observava preocupado.

-Pode ir, Shawn. Depois conversamos.

Shawn acenou com a cabeça e fechou a porta, me deixando sozinha com Donald.

-Eu nunca imaginei que te veria em uma delegacia, Ellie.

-Digo o mesmo, Donald. Pra quem queria ser arquiteto, você mudou de área totalmente.

-Eu sei. A vida deu cada volta. Como você está?

-Estou bem. Na correria do último ano… Você sabe como é.

-Bons tempos!

-Não tão bons assim. - sussurei

-Eu não tenho noticias suas desde que entrei para faculdade.

-Minha família se mudou de Alberta pouco antes do início das aulas. Precisávamos mudar de área.

-Imagino que sim! Até eu precisei.

-Por isso foi estudar em Londres?

-Sim, precisava sair de lá. Conhecer gente nova, tirar aquele dia da minha cabeça.

-E conseguiu? - perguntei vendo-o abaixar a cabeça

-Não. Quase todos os dias eu me lembro dele, seja por coisas boas ou não.

-Eu também!

Ficamos em silêncio por um tempo. Donald levantou da cadeira, me assustando.

-Vamos Ellie, vamos beber e falar do Nathan.

-Você sabe que eu ainda sou menor de idade, né?

-Merda, esqueci.

-Vamos, você compra as bebidas e vamos lá pra casa. Meus pais vão gostar de ver você. - abrimos a porta e saímos rindo.

-Sua prima continua doidinha? - Donald me perguntou

-Josy? Doidinha é bondade sua. Espera um pouco, eu preciso do meu equipamento que vocês pegaram.

-Opa! Só um minuto. - Donald me deixou no meio da delegacia enquanto ia falar com o pessoal responsável. Pouco depois ele voltou com minha mochila. - Seus pais não vão se assustar?

-Eu vou avisar durante o caminho, eles vão adorar te ver.

Saímos da delegacia e Donald me levou até o seu carro, abrindo a porta para mim.

-Que tipo de delegado eu sou? Estou levando uma suspeita para casa e ainda vou comprar bebida para ela, que é menor de idade! - Donald saiu com o carro, me fazendo rir.

Shawn

Eu sabia que o pior ainda estava por vir! Meus pais saíram muito quietos da delegacia e o silêncio continuou durante todo o trajeto até em casa.

Assim que fechei a porta minha mãe começou :

-DELEGACIA SHAWN? VOCÊ ULTRAPASSOU TODOS OS LIMITES!

-Mãe, foi um mal entendido! Nós não estávamos fazendo nada de errado.

-Eu nunca imaginei que eu fosse buscar um filho meu na delegacia!!! Você está de castigo, Shawn! De castigo!

-Mãe! - reclamei

-VOCÊ ESTÁ PROIBIDO DE SAIR! É DE CASA PRA ESCOLA, DA ESCOLA PRA CASA!

-Mãe, eu não tenho mais cinco anos pra ficar de castigo! Porra!

-OLHA COMO VOCÊ FALA COMIGO!

-Shawn, respeite sua mãe! - meu pai se pronunciou

-EU NÃO QUERO VOCÊ ANDANDO COM AQUELA MENINA!

-A Ellie não fez nada de errado, mãe! Foi tão vítima quanto eu.

-O delegado era íntimo dela, você percebeu? Quantas vezes ela já passou por lá?

-Eu não sei, mãe!!! - joguei os braços pra cima, não aguentando mais esse assunto. Peguei minhas coisas e fui para o meu quarto, batendo a porta atrás de mim.

Tinha acabado de sair do banho, quando meu pai bate na porta.

-Preciso falar com você.

-Se for pra passar sermão não precisa. Mamãe já falou o suficiente.

-Só vamos conversar. O que tá acontecendo com você, meu filho? - meu pai sentou na cama.

-Não está acontecendo nada, pai.

-Você mudou muito! Suas notas caíram, você tem brigado com a sua irmã e com a gente, briga com uma menina, vai parar na delegacia…. O que está acontecendo?

-Eu não sei, pai.

- É melhor você andar na linha ou vai ter que parar com a música. Lembre-se da sua promessa.

-Eu sei. Eu sei. Vou me dedicar mais, prometo.

-Espero que sim! - meu pai saiu, fechando a porta. Me joguei na cama e fechei os olhos, repassando os acontecimentos de hoje.

Shawn

Donald estacionou o carro na entrada da minha casa, saímos e antes que eu pudesse pegar as chaves, minha mãe abriu a porta e correu para os braços de Donald.

-Meu filho, quanto tempo!

-Quanto tempo, senhora Thompson!

-Senhora? Olha só, pra quem me chamava de tia é uma mudança e tanto. - minha mãe comentou, nos fazendo rir. Entramos em casa e encontramos meu pai sentado no sofá com uma taça de vinho na mão.

-Donald, meu filho, seja bem vindo de volta! - eles trocaram um abraço. Os dois sentaram no sofá, seguidos pela minha mãe enquanto eu me sinto jogava no chão e enchia a mão com os amendoins sobre a mesa.

-Como vocês se encontraram? - meu pai perguntou.

-Eu prendi a Ellie. - Donald comentou, me fazendo engasgar com a casca do amendoim.

-O QUE? - meu pais responderam em coro.

E lá vamos nós!! Explique toda a história, levando um esporro logo assim que terminei.

-Na próxima, você pode deixá-la por lá mesmo. Quem sabe assim ela toma juízo - meu pai comentou, fazendo Donald rir.

-Pode deixar. Ela vai dormir lá na próxima.

-Credo! Vocês querem me ferrar mesmo assim, hein.

-Apronta mais uma pra você ver. - minha mãe apontou a faca de queijos pra mim. Começamos a rir.

Meus pais voltaram sua atenção para Donald, perguntando sobre sua vida e relembrando momentos. Tê-lo aqui me trouxe lembranças tão felizes mas meu coração estava apertado e eu só conseguia imaginar como seria se estivéssemos todos aqui.

Nat, eu sinto a sua falta.