1. Spirit Fanfics >
  2. Para Sempre Seu >
  3. Capítulo 21

História Para Sempre Seu - Capítulo 21


Escrita por: NaNaNat

Capítulo 21 - Capítulo 21


Eu costumava ter medo quando chegava tarde em casa. Nunca precisei olhar o relógio para saber que estava encrencado. Durante toda a minha infância, nunca fui de respeitas as condições que meus pais me impunham. Eles, é claro, sempre me repreenderam por causa disso. Minha mãe mais do que o meu pai. Ela sempre se preocupava demais e acho que esse era o motivo de nós brigamos em certas ocasiões. Esse era o motivo dela ter dado sua vida pela minha. Como consequência, meu pai passou milagrosamente, a notar minha existência. No época, a atenção dele em mim parecia algo bom. Mas não era assim hoje em dia. Não era daquele jeito que eu via as coisas. Desde então eu e meu pai vivíamos imersos numa estranha relação entre pai e filho. Mesmo que nos esforçássemos para fazermos aquilo tudo dar certo, era impossível. A morte da mamãe nos pegou completamente desprevenidos. Em um dia ela estava lá conosco e no outro ela havia deixado de existir. Perdê-la foi a coisa mais difícil pela qual tivemos que passar e ainda me pergunto qual de nós sofreu mais com sua ausência. Acho que não existe uma resposta certa para aquela pergunta. Éramos uma família mas agora não sei o que somos. Parecemos estranhos vivendo juntos por obrigação ou algo do gênero. Sei que falo somente por mim quando digo que ela ainda me faz falta. Não que Yuzu e Karin também não sintam, mas elas ainda são muito novas e não entendem nada do mundo. Nem mesmo eu entendo. A única coisa que sei é que meu pai tenta se esforçar, mas acaba deixando tudo mais difícil. Pelo menos para mim. Afinal de contas, eu também sou filho dele. Sei que ele perdeu a mulher que ele mais amava no mundo. Mas isso não lhe dá o direito de diminuir minha existência e aumentar minha culpa. Ou será que estou enganado?.
​Já passam das onze horas quando eu paro em frente ao portão de casa. Nunca hesitei em adentrar pela porta feita de madeira, que me era tão familiar. Mas agora, de alguma maneira, entrar naquela casa me dava uma sensação estranha. Não por eu ter medo de meu pai. Muito pelo contrário, ele não me assusta e o fato dele ser ''mole'' aumenta minha confiança. Porém não é isso o que me faz congelar os passos a poucos centímetros do meu lar. Não é o fato de eu não encontrar minha mãe assim que passar pela cozinha. Não...não é isso. O que me retém a ideia de viver mais um dia da minha rotina. Aquela rotina a qual eu era tão ligado mas que agora, não parecia sensata. Nunca achei que diria isso, mas tenho medo de voltar para minha vida. Para a única vida que conheço. Não quero viver tudo outra vez, nem fazer a mesma coisa de novo e de novo. Posso não estar sobre quatro paredes, mas me sinto aprisionado. Destinado a seguir em diante naquela cinzenta estrada, chamada vida. Quero me sentir livre e no fundo sei o motivo. Seu nome é Grimmjow. Foi quando conheci aquele homem que me permiti ser alguém diferente. Alguém que não fosse meu antigo eu, ainda que ele habitasse em algum lugar profundo da minha alma. Foi por ele que eu mudei e é por isso e tantas outras coisas, que eu o amo tanto.. Franzo o cenho ao me dar conta de que ainda estou parado no meio da rua, olhando para minha casa. Alguma parte dentro de mim palpita. Talvez seja meu estômago ou quem sabe meu coração. Ou talvez seja apenas o medo. Numa frágil tentativa de me desvencilhar dele, respiro fundo. É claro que não funciona. Aquela mesma sensação estranha me percorre outra vez e por algum motivo, olho por sobre meu ombro. A noite é tão estranhamente quieta e parece mais escura do que de costume. Meus braços se arrepiam como um reflexo de alguma coisa. Quanto mais fico ali fora, pior a sensação fica. Apesar de meus pés resmungarem, me movo em direção á minha casa. Enquanto vou subindo os degraus até a porta da frente, meus olhos não ousam se mover. Foco na maçaneta e o quão desconfortavelmente perto ela vai ficando. A cada passo ela avança centímetros. Os segundos parecem uma vida e sinto como se a cada movimento, meu corpo ficasse a deriva. Meus pés estão mais desajeitados do que normalmente são e tenho que me segurar na parede enquanto paro em frente a porta. Não imito aqueles filmes baratos de terror em que a pessoa aproxima a mão da maçaneta de forma lenta. Repito o mesmo movimento que fiz durante toda a minha infância. Abro a porta rapidamente, de modo confiante. Mas a confiança resolve me passar a perna assim que entro em casa.

Embora a luz da cozinha lance uma cortina de claridade em direção ao corredor, demoro a distinguir a silhueta de meu pai, parado a alguns metros de mim. Retiro o que eu disse sobre os filmes baratos de terror. Tomo um susto repentino com sua presença inesperada e demoro um pouco mais do que queria para me recompor. Engulo em seco, temendo até mesmo o som que minha garganta produz.
- Onde é que você estava ? – Sua voz é estrondosa. Ele está bravo, mas eu não precisava ouvir sua voz para saber disso. Posso ver isso só de olhar para o rosto cansado de meu pai. Apesar de não admitir, eu conhecia o conhecia tão bem quanto ele me conhecia. Me deparei com aquele rosto diversas vezes na minha infância, que esquecê-lo se tornou uma tarefa difícil para mim.
- Eu estava na casa da Inoue – respondi com a voz relaxada, apesar de não estar me sentindo como aparentava.
- Mentira – Sua resposta me pega de surpresa. Sinto minha respiração acelerar – Liguei para a casa dela e a mãe dela me disse que você não tinha passado lá.
Não sei o que deveria estar sentindo naquele momento. Não sei se devo estar surpreso por ele ter ligado ou irritado pelo simples fato dele querer saber onde eu estava. Como ele descobriu o número da casa da Inoue ?
- Você ligou para a casa dela ? – perguntou, recobrando a normalidade da voz.
- Sim...a Karin me passou o número – meu pai murmurou, enquanto me fitava com o olhar carrancudo.
Seguro meu surto psicótico antes mesmo que ele venha. Apesar de estar arrancando os cabelos por dentro, continuo agindo de modo casual.
- E então ?
- O quê ?
- Onde você estava ? – Ele retoma, gesticulando os braços – Você sabe que horas são ?
Tenho vontade de rir com as palavras dele. ‘’Você sabe que horas são ?’’ Quanto anos ele acha que eu tenho ?
- Sim..meu celular tem relógio – murmuro sem muito interesse, controlando os sentimentos que ousam expelir de dentro de mim.
- Olha só como você fala.. – Meu pai me alerta, talvez pela primeira vez em sua vida. Na verdade, ver sua tentativa de querer me controlar não me soa engraçada. Ela só me deixa com mais raiva do que já estou.
- O que você vai fazer ? – ergo o tom pela primeira vez, sem nem me preocupar em esconder a ironia na voz – vai me bater ?
Acho que meu pai não esperava essa minha resposta, pois me olha embasbacado. Sei que ele não vai me bater, pois não é algo dele. Ele nunca usou a violência para educar a mim ou minhas irmãs. Ele sempre procurou a razão para solucionar tudo. Embora uma criança normal agradeceria por não levar uma boa surra, eu via aquilo como sua fraqueza. A noite em que minha mãe foi assassinada me vêm a mente e junto dela, tudo o que senti e tudo que eu ainda sinto. Raiva, medo, dor.
- Ichigo...eu só quero saber onde você estava. – O tom de voz de meu pai parece diminuir e isso me enfurece. Sei que é estranho, mas quero que ele brigue comigo. Quero que ele seja, de alguma modo, duro. Quero que ele seja forte e que não fraqueje toda vez que está lutando. As memórias de oito anos atrás me invadem outra vez. Meu pai não estava em casa quando tudo aconteceu. Ele não conseguiu salvar minha mãe. Desde então, no fundo eu sempre odiei ele. Talvez na mesma quantidade em que eu também o amo. É por isso que vê-lo desistir me deixa tão enfurecido.
- Por quê você se importa, pai ? – Disparo, enquanto meu corpo transborda de sentimentos aos quais eu sempre neguei.
- Do que você está falando ? – Ele dá um passo para frente e eu me movo, passando por ele e caminhando em direção as escadas – Ichigo, vamos conversar.
- Por quê de repente, você lembra que tem outro filho ? - cuspo as palavras enquanto sinto meus olhos arderem. Não quero chorar pois isso vai me desmanchar por dentro. Não posso ser fraco. Não como meu pai foi. - Não estou entendendo – ele diz, dando outro passo e parando logo em seguida. Ele me observa como se estivesse me analisando. Como se eu fosse um enigma que ele tivesse que desvendar. Ás vezes, era exatamente desse jeito que eu me sentia. Incompreendido pelo meu próprio pai. – Por quê você está dizendo essas coisas ?
- Por quê é assim que eu me sinto... – fraquejo a voz por um momento, lutando para segurar as lágrimas.
Meu pai dá um suspiro cansado e me lança um olhar gentil. Um olhar que eu não via há vários anos. Esse olhar me lembra da minha infância. Do período mais feliz da minha vida, quando eu sentia que tinha tudo, mesmo que na realidade não tivéssemos nada. Nunca precisei de muito, apenas queria que ficássemos todos juntos. Sempre achei que teria todos ao meu lado e nunca considerei a morte de alguém próximo a mim. Mas minha mãe morreu e embora eu achasse que ficaríamos todos unidos mesmo que ela não estivesse conosco, ela levou uma parte de nós com ela. A lembrança de seu abraço, confortável e apertado ao mesmo tempo me foge a cabeça. Aos poucos ela vai deixando de existir e as vezes, pego a mim mesmo perguntando quem ela era. Em certas vezes, tenho medo de não saber a resposta.
- Se abra comigo, filho – o tom duro agora dá lugar a sua voz calma e habitual.
- Você finge que eu não existo e agora que que eu me abra ? – olho para ele de forma incrédula.
- Sim...eu quero – ele responde de forma direta. – Eu me importo com você filho.
Desde pequeno, nunca tive muita paciência para seguras as palavras. Algumas coisas nunca mudam.
- Não se importa nada...Desde que a mamãe morreu, você vêm me tratando como se eu fosse um completo estranho – As palavras tomam controle de mim e mesmo assim, não quero parar. – Você só deu atenção a Yuzu e a Karin por que elas eram pequenas, mas ao longo dos anos você foi me deixando de lado, como se eu também não precisasse de consolo.
A cada palavra que solto, meu coração parece se despedaçar. Tão sobrecarregado de mágoa e culpa. A dor de perder minha mãe e de não ter sido capaz de fazer nada. A impotência que eu senti quando só pude vê-la morrer bem na minha frente.
- Eu sei que você está sofrendo com a morte da mamãe – as lágrimas preenchem meus olhos e aos poucos, elas vão caindo – Mas eu não morri também, eu estou vivo.
Minha garganta se contrai e sinto que vou me afogar em minhas próprias lágrimas. Meu peito dói a cada respiração. Sinto que vou perder o controle.
- Eu sei – meu pai diz. É tudo o que ele consegue dizer para mim. Ele não avança, não acrescenta nada. Só fica parado fitando meu rosto.
- Você podia ter salvado ela, sabia ? – sussurro, enquanto as lágrimas continuam a contornar meu rosto. – Você podia ter chegado a tempo e ela poderia estar viva nesse momento. Poderia estar aqui com a gente.
O olhar de meu pai se dirige ao chão e percebo em seu rosto envelhecido, que ele relembra da própria dor em seu coração. Por dentro, não consigo deixar de sentir culpa. Mas as palavras que atravessam meus lábios são verdadeiras e não há nada que mude o fato dele, assim como eu, carregar sua cota de culpa.
- Você não conseguiu salvá-la – Não reconheço minha própria voz. Ela é tão cheia de algo obscuro que temo continuar falando e me tornar algo nojento. Algo desumano O rosto diabólico de Ulquiorra surge em meus pensamentos. Será que eu sou como ele ? – Não conseguiu..
Meu pai continua a me ouvir, sem ao menos olhar na minha direção. Sua expressão é a de um homem amargurado. Observo seu rosto e percebo como ele está diferente da época que minha mãe estava viva. Seus cabelos agora estava grisalhos. Os olhos envoltos por olheiras e a barba por fazer. As vezes é difícil reconhece-lo. É difícil imaginar que o homem jovem e feliz havia desaparecido, deixando todo o resto para trás.

- Ela chamou por você – Digo, me lembrando das últimas palavras que saíram da sua boca antes de seus olhos se fecharem ‘’Isshin...onde está..’’. As lágrimas parecem ganhar mais força e minha visão se torna embaçada. – Ela chamou seu nome..mas você não estava lá. Você nunca estava lá...
Na época meu pai trabalhava em uma empresa de materiais plásticos em uma cidade não muito longe da nossa. Ele sempre chegava em casa cansado e logo adormecia. Seus turno ás vezes era prolongado e também era preciso viajar. Houve dias em que ele chegou a ficar vários dias longe de casa. E foi assim durante anos. Minha mãe dizia que não se importava pois sabia que o emprego era necessário. Mas no fundo eu sabia que ela sentia a falta dele. Eu também sentia. Depois que ela morreu, ele acabou perdendo o emprego. Foi preciso a ajuda de alguns parentes para que ele comprasse a pequena loja onde trabalha atualmente. Desde então, ele se tornou ocupado outra vez. Ocupado para tudo, principalmente para mim.
- A culpa é sua – digo, com o coração cheio de mágoa.
- Você tem razão – sua voz é fraca mas ela abala meu corpo inteiro – a culpa foi minha.
Não era aquela a resposta que eu esperava. Não era isso que eu imaginava que meu pai fosse dizer. Pensei que ele continuaria a negar que me tratava como um estranho ou que a morte da minha mãe não fora culpa dele. Mas não. Choro agora mais de raiva do que de qualquer coisa. Por que ele tem que ser desse jeito. ? Por que ele não continua casca- dura ? Por que ele concordou comigo ?
- Eu sinto tanto, meu filho – ele se aproxima de mim. A tristeza refletindo em seus olhos – eu sinto muito mesmo..
Não era aquilo que eu queria ouvir. As lágrimas continuam a escorrer sobre meu rosto e eu olho para meu pai. Não quero aceitar suas palavras. Esse não é o meu pai. Ele nunca admitiria sua culpa em algo, por menor que fosse.
- Venha cá.. – Ele diz, esticando uma das mãos na minha direção. Dou um passo para trás, mas meu pai se aproxima de mim. Ele estica os braços ao lado do corpo e sei que ele vai me abraçar. Não quero que ele me abrace. Tento me desviar de suas mãos mas ele me puxa para seus braços.
- Não..- Digo com a voz trêmula, socando seu peito na tentativa de afastá-lo. Mas isso só faz com que ele se aproxime ainda mais. Começo a me movimentar, tentando me soltar dele. Mas não consigo. Meu pai é forte como um urso, de modo que qualquer movimento que eu faça seja totalmente inútil. Eu o empurro mas ele não se move um centímetro. Ele me aperta e me envolve em seus braços. Meu coração muda com o contato. O contato que fiquei tanto tempo esperando, que tanto senti falta. Desisto de minhas resistências e deixo de lutar. As lágrimas ainda deslizam, só que agora elas não são de raiva. São de libertação. Me agarro aos ombros de meu pai, encostando a cabeça sobre seu peito enquanto deixo a tristeza me possuir por inteiro. Soluço feito uma criança mas não me importo. Meu pai está ali para me segurar e isso faz com que eu chore ainda mais. Percebo que eu não o odeio, mas sim que eu o amo. Amo profundamente. Ter a sensação de se sentir em casa outra vez é melhor do que tudo. Sei que estou seguro ali com ele, com minha família. Finalmente estou em casa. Meu pai continua a me segurar por um longo tempo. Ele não diz nada, mas sei que o seu coração está junto a mim. Não sei quanto tempo se passou, mas foram as melhores horas que passei com meu pai desde então. Conversámos até as três horas da manhã. Falamos sobre tudo. Sobre como nos sentíamos, sobre os anos anteriores, sobre a mamãe. É difícil descrever quando você tira todo aquele peso dos ombros, que você achava que ninguém mais poderia aguentar senão você. É estranho como o simples ato de conversar pode melhoras as coisas de uma hora para outra. As palavras são a melhor terapia. Nunca achei que fosse me sentir tão aliviado depois de ter uma longa e honesta conversa com meu pai. Tudo bem, talvez não tão honesta pois contei tudo menos sobre o Grimmjow. Sei que meu pai provavelmente não seria a favor, mas talvez pudesse aceitar minha escolha sexual.
- Você pode falar comigo sempre que quiser, ok ? – ele me pergunta quando estamos prestes a ir dormir em plena madrugada. – Sobre qualquer coisa.
- Eu sei – digo, tentando não pensar em Grimmjow. Isso vai ter que esperar.
Sigo em direção ao meu quarto em passos suaves, para não acordar minhas irmãs. A semana foi exaustiva e só de imaginar que o fim de semana já quase no fim, reviro os olhos de modo exaustivo. Se bem que ter uma semana cheia de afazeres e compromissos, é uma boa maneira de colocar de lado os acontecimentos marcantes dessa semana. Meu celular vibra em algum lugar da minha calça jeans mais estou cansado demais para continuar em pé. Me jogo sobre a cama e adormeço pensando no rosto de Grimmjow.
 



Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...