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História Para todas as mulheres que amei - Eu acredito na liberdade da estrada aberta


Escrita por: fantasyisland

Notas do Autor


Boa leitura!

Capítulo 1 - Eu acredito na liberdade da estrada aberta


Fanfic / Fanfiction Para todas as mulheres que amei - Eu acredito na liberdade da estrada aberta


"Eu sabia
Que era preciso conseguir tudo
O que sempre quis e depois perder
Para saber o que é a verdadeira liberdade"


 

Desde nova eu sabia que não era parecida com as garotas a minha volta.

Minha mãe dizia que eu nasci com alma de camaleão, sem me importar com o que era certo ou errado, sem ter personalidade fixa, só uma grande constante aberta em meu peito, que clamava por uma liberdade que eu ainda não sabia o que era.

Liberdade esta que me fez sair de casa ainda bem nova, sem uma mapa traçado em mente, sem um destino fixo, sem olhar para trás.

Foi na estrada aberta que eu alcancei a liberdade que eu sempre sonhei, que eu nunca soube nomear ou descrever, que me parecia errado, sujo e pecaminoso.

A liberdade que eu encontrei no corpo de todas as mulheres que me marcaram. Que deixaram um pouco de si comigo, que eu guardo até hoje como se fossem cicatrizes em minha pele, na verdade, cravadas mais no fundo, na minha alma.

Três delas eu ainda consigo me lembrar nitidamente, com uma vivacidade que as vezes me assusta. Uma lembrança inebriante de tempos melhores, os tempos em que eu me deixei ser guiada apenas pela minha intuição e as estrelas brilhantes no céu.

A primeira que eu posso lhes contar foi a primeira em muitos aspectos.

Victoria era uma prostituta. A mais famosa e cobiçada daquela pequena espelunca que me abriguei na primeira semana em que fugi de casa.

Não pensem que minha casa era um lar problemático, confuso ou cruel, ao contrário, eu tinha uma mãe bondosa, irmãos trabalhadores e uma pai presente, que sentava na ponta da mesa todas as noites e puxava uma oração antes do jantar.

Acho que foi por isso que eu sempre me senti tentada a tudo que parecesse errado, aquela casa perfeita, com azulejos perfeitos e pessoas perfeitas. Não era o meu lugar, eu ansiava por todas as imperfeições deste mundo, por mais dolorosas que fossem.

Eu ansiava pela dor também.

E Victoria me fez sentir, fisicamente, todas possíveis.

A primeira vez que ela me olhou seus olhos já chamuscavam em um sentimento que eu não soube descrever na época, que fez todo o meu corpo se arrepiar, do dedinho do pé até os fios de cabelos. Ela era uma cafetina e imaginou que eu queria seguir essa vida também, mas eu só era ingênua demais para me atentar onde tinha me metido.

— Você me parece nova demais, aonde estão seus pais, garota?

Ela ainda me encarava, com aqueles olhos analiticos e um sorriso de canto que viraria sua marca registrada. As conversas de Victoria sempre pareciam ter segundas intenções, mesmo quando não tinham.

— Eu tenho dezoito anos. — Falei, me sentindo insultada por ela achar que parecia uma criança. Eu descobriria, anos mais tarde, que idade não era um definidor de maturidade, e Victoria tinha toda a razão em me chamar de garota. — E quero um quarto.

Ela me sondou por longos minutos, até eu estender as moedas que havia tirado do meu porquinho antes de sair de casa, tão confiante que chegava a ser trágico.

Victoria sorriu e me estendeu a chave, que logo peguei como se fosse um verdadeiro tesouro.

A primeira noite passou tranquila, eu não tinha levado muitas roupas, nem as valiosas jóias que era obrigada a usar em alguma festividade familiar. Era apenas Amber Liu, quatro peças de roupa, cinco calcinhas e um pequeno pingente que minha avó me deu antes de morrer, aquilo era o suficiente para mim.

Mas na segunda noite gritos me acordaram no meio da madrugada. O que não era muito difícil, as paredes eram finas, os quartos colados e tão pequenos como um banheiro.

Esperei cessar, porém quando minha paciência se esgotou, abri a porta num rompante, no mesmo momento que Victoria chutava um homem de um dos quartos. Ele parecia como todos os homens que frequentavam aquele bordel, desleixado e escroto.

— Se me forçar a chupar esse pau nojento mais uma vez um chute vai ser o menor dos seus problemas.

Ele a xingou de mais alguns milhares de palavrões, que não pareciam ser uma ofensa a Song, até juntar suas poucas peças e descer pelas escadas pequenas. Victoria parecia perdida em devaneios até perceber que eu estava do outro lado do corredor, com meus olhos arregalados.

— Ainda dá tempo de voltar para a casa dos seus pais, garota. — Ela me sorriu triste.

E pela primeira vez eu vi Victoria, reparei em suas olheiras, no rímel forte demais, nas roupas curtas e no orgulho ferido, e me apaixonei, por mais clichê e doentio que isso possa soar.

Passei o resto da noite sem conseguir dormir, pensando em todos os detalhes que consegui guardar dela naquele pouco tempo.

Na terceira noite ela me fez companhia.

Na quarta noite eu esperei o soar baixinho de sua voz no corredor e quando não ouvi, pude vê-la do lado de fora do motel, na beira da estrada. Pode parecer bizarro mas o som dos caminhões me acalmavam, o cheiro de borracha queimada já tinha se tornado comum, Victória também gostava, era nosso hábito estranho.

— Você me lembra um cachorrinho abandonado. — Ela me disse, me estendendo um cigarro ruim que exalava um cheiro incômodo, eu me acostumaria e cederia a ele mais tarde, sendo um dos vícios que Victoria implantou em mim que eu nunca consegui largar. — É só oferecer um pouco de carinho e atenção e ele nunca te abandona.

Eu ri, me engasgando com a tentativa falha de tragar aquela fumaça pegajosa. O céu escuro era iluminado por diversos pontinhos luminosos, o frio da estrada me sendo bem vindo.

Em casa eu nunca conseguia ver as estrelas, mas ali elas eram tão brilhantes que eu passei alguns minutos as encarando, quando voltei meus olhos a Victória ela me encarava também, o rosto impassível no meio da fumaça, os cabelos uma bagunça negra que a fazia parecer uma pintura viva.

E numa coragem repentina, talvez pela sensação de perigo que apossava meu corpo, juntei meus lábios desajeitados nos rachados de Victoria.

Minha falta de experiência me fez rir, mas logo eu queria mais daquele beijo, queria sentir todos os gostos de Victoria. Era encantador, a busca por me encontrar pelos toques de outra pessoa, era libertador, era novo, era inigualável.

Mas a Song era o sinônimo de efêmero, e tirando a mente ferrada nós éramos de certa forma bastante parecidas, nunca estávamos saciadas, sempre sentíamos prazer na dor.

Eu nunca me perguntava até onde iríamos quando sentia o metal das algemas abraçarem meu pulso, quando a venda era apertada com força, fazendo a escuridão ser meu único ponto de apoio.

— Conte novamente.

Ela mandava, mas eu sempre errava a contagem de propósito, só para que as chibatadas começassem novamente. Naquela altura do campeonato Victoria sabia da minha ânsia por aventuras desenfreadas, da minha falta de limites, mesmo que isso acabasse fugindo do controle.

Mas minha boca ainda tinha o gosto dela quando as coisas começaram a ficar insuportáveis.

Victoria era o tipo de pessoa que nasceu para morrer jovem, aquelas que você sabia que nunca tomaria um jeito, e ela levava esse papel a sério. Sua vida era aquele pequeno bordel em beira de estrada, foder caminhoneiros por trocados e receber uma ou outra garota para se divertir quando o fardo ficava pesado demais.

Minha temporada com ela durou um verão, e quando eu juntei minhas poucas coisas na bolsa de couro velha, o tempo parecia sépia, diferente do calor que me cobria quando cheguei.

Mas amores de estrada são assim, vocês já deveriam se acostumar com isso.

E se Victória foi uma tempestade eu queria lhes contar sobre a calmaria.

Eu já era um pouco mais velha, com algumas tatuagens pelos braços quando a encontrei. Foi simples, mas não tomem isso como sendo menos marcante, pelo contrário, Sunyoung foi a mulher em que eu passei mais tempo ao seu lado.

Me encontrava em outra fase da minha vida. Pela primeira vez em alguns anos resolvi que sairia das estradas, que me aquietaria, arrumaria um emprego, entraria em contato com a minha família depois de anos perdida.

Quando eles descobriram do que eu vivia, de pequenos serviços que me dessem o suficiente para comer, que eu subia na carroceria de qualquer caroneiro na beira da estrada, me chamaram para voltar para a casa. Mas eles não entendiam que eu nunca poderia chamar aquele lugar de casa, que eu buscava um lar nas pessoas em que me envolvia durante as minhas viagens sem fim.

Então, resolvi recomeçar sozinha, em um pequeno kitnet e num emprego de meio período de garçonete. Nos primeiros dias eu gostei da paz e da calmaria, de ter um lugar para guardar minhas roupas e um chuveiro quente para tomar banho, mas depois tudo começou a ser um fardo. Eu sabia que estava saindo do controle, fumava mais cigarros do que conseguia comprar e por conta própria resolvi procurar ajuda, em um grupo de apoio.

Sunyoung foi a primeira coisa que me chamou atenção naquele poço de perdedores, em que eu me encontrava também. Ela parecia sempre com um bom humor que te contagiava, com seus vestidos floridos e seu batom rosa, os pacientes viviam atrás dela, encantados, a dando flores, estas que Sunyoung sempre colocava no canto da orelha.

— Agora fale um pouco sobre você, Amber.

Ela me perguntava, como uma boa psicóloga, durante todos os encontros em grupo. Mas eu nunca abri a boca para falar mais que o meu nome, eu estava naquela fase de negação, em que eu achava que não tinha nenhum problema, mas eu sentia, todas as noites, a liberdade me chamando, por mais louco que isso pareça.

E em um surto que até hoje me deixou marcas, eu acabei ligando para a ajuda mais próxima em que eu confiava, e Sunyoung veio a minha casa de madrugada, me encontrando no meio da poça de sangue que eu própria causei, chorando compulsivamente por algo que eu não sabia o que era. Porque por mais que eu me sentisse livre nunca era o suficiente, eu nunca estava completamente cheia, viver tanto tempo parada só me fez ficar mais ansiosa e sozinha comigo mesma.

— Eu olho para o céu, a noite, e penso que o mundo é grande demais para eu ficar aqui, parada. — Murmurei, observando-a trocar os curativos do meu pulso, ela vinha sempre à noite, depois do expediente, eu me achava sortuda por isso.

— Por mais que você ande, as estrelas vão ser sempre as mesmas, não tem porque ter pressa. — Ela disse, sorrindo logo depois, e eu quis morar naquele sorriso. Sunyoung era como a Lua, brilhante, única, você podia ficar horas olhando suas fases e nunca se cansaria.

— Luna. — Murmurei, e aquele apelido nunca se encaixou tão bem em alguém como esse.

Luna era o tipo de mulher que todo mundo deveria ser apaixonar um dia. É quase impossível que isso não aconteça, ela era tão boa e prestativa que chegava a parecer mentira. Seu sorriso iluminava uma cidade inteira e a perspectiva de que eu poderia melhorar ao lado dela me animou.

Mas até anjos bons pecam, e o pecado de Luna foi se apaixonar por mim.

Eu sempre esperava sua última reunião para irmos embora juntas, ela me dava carona e isso me poupava uns bons vinte minutos andando. Mas naquela noite em especial eu notei sua inquietação, as mãos suadas e a fala embolada, eu não conseguia entender sua antecipação até seus lábios tocarem os meus, me fazendo lembrar da primeira vez que beijei lábios femininos, como eu também parecia sem jeito e prática.

— Me desculpe! M-meu Deus, o que eu fiz… Amber… — Ela me olhava assustada, como se tivesse feito algo muito errado, mas eu conseguia entender, ela nunca poderia imaginar que um dia se envolveria com um de seus pacientes.

E eu a beijei de novo, e de novo, até que ela retribuísse os beijos. Até eu ter que parar para dizer o quanto suas bochechas ficavam adoráveis quando estavam coradas.

Luna foi a calmaria entre todas as tempestades em que eu vivi, de todas as pessoas ferradas que eu tinha me envolvido até então. Com ela eu aprendi que o sexo não precisava ser violento e bruto, que eu também sentia prazer com seus dedos dedilhando minhas costas num carinho gentil, que beijos lentos e molhados também eram tão excitantes quanto.

Mas minha mente é uma eterna confusão e Luna sabia, mesmo que ela nunca tenha tocado nos meus problemas. Para ela era mais fácil não me imaginar como uma paciente, fazia o peso ético nas suas costas doer menos.

E assim como eu amava meus pais e irmãos e os deixei, eu também deixei Luna. Tenho que admitir que deixa-lá foi a experiência mais dolorosa que eu passei, não era a dor que eu estava acostumada e gostava, era a dor que me fez chorar por longas noites, no sereno dos bares e hotéis baratos, indo o mais longe que eu conseguia daquele cidade.

Mas hoje eu não me arrependo, eu não era merecedora do amor de Luna.

E quando eu achei que nunca mais me entregaria a ninguém da mesma forma que me entreguei a Luna e Victoria, Krystal apareceu.

Com vinte e oito anos eu já me considerava velha, já tinha passado dez anos vagando como uma cigana por todo canto daquele país, conheci pessoas muitos boas mas também sofri nas mãos das ruins. Tinha mais marcas de expressão do que o considerado normal para pessoas da minha idade, a vida que eu havia escolhido tinha seus lados ruins.

Meu dinheiro tinha acabado e eu aceitei com gosto um emprego de barista em uma boate movimentada em Seoul. Era estranho para mim estar em uma cidade grande quando havia passado toda a minha vida no interior no país, mas eu precisava urgentemente de ares novos, algo que me estimulasse e me fizesse viver como antigamente.

Quando vi Krystal pela primeira vez eu não achei que ela fosse me causar isso.

— Me dê uma Mussolini, por favor. —  Eu voltei meus olhos mais atentamente para a garota a frente do balcão, para logo procurar por toda a boate um segurança por perto, porque para mim era óbvio que aquela garota não tinha idade o suficiente para estar ali, a essa hora acordada. Krystal me lembrava muito, e ela realmente era, aquelas colegiais ricas que eu via quando passava pelos colégios caros, sem ter preocupações a não ser como pintaria as unhas no final de semana.

— O máximo que eu posso te dar é um leite com toddy.

Sorri, irônica e ela me surpreendeu tirando sua identidade do bolso das saias de prega, sorrindo da mesma maneira debochada que eu.

— Um Mussolini, por favor.

Algumas pessoas poderiam ter se enraivecido, com a postura petulante e irônica da garota, mas ela só conseguiu me fazer ficar curiosa. Krystal Jung era uma mulher de facetas, com múltiplas camadas escondidas naqueles olhos de aparência casta, dava uma sensação sufocante, como se você nunca fosse parar de se afogar.

Eu logo descobri, naquela noite e nas próximas em que ela me visitaria, que Krystal poderia ser tudo, menos a garota inocente que imaginei no primeiro dia. Ela em muitos aspectos lembrava a mim a dez anos atrás, com sua ânsia pelo desconhecido, pela família perfeita que a fazia ter enjoos, mas diferente de mim Krystal gostava da vida que levava.

Ela gostava das coisas a sua maneira também, e eu me sentia tola, por me permitir ser tão submissa a Krystal, em todos os aspectos possíveis. Eu me perguntava, frequentemente, como uma garota tão nova podia ser capaz de me deixar de quatro tão rápido.

A menina que cantava no coral da igreja e a noite me fodia nos cantos daquela boate.

Krystal foi o que pedi quando cheguei a Seoul, alguém que me fizesse sentir viva novamente.

Mas o tempo traz ensinamentos e eu já sabia que eu deveria aproveitar aquilo ao máximo. Krystal era uma droga muito boa mas com o efeito rápido.

— Vamos fugir? — Ela murmurou em uma noite, estava bêbada como eu nunca a vi antes.  — Vamos para longe de Seul, longe dos meus pais e de Jongin…

Eu sorri, encostando nos muro dos fundos da boate para trazê-la aos meus braços.

— Você não nasceu para viver assim, princesa.

Realmente, Krystal não aguentaria viver nem uma semana longe de toda a riqueza que tinha desde sempre, era doloroso dizer aquilo.

— Mas eu não quero me casar. — Ela murmurou, chorosa, e ali eu entendi perfeitamente o motivo da sua ânsia por aproveitar tudo como se fosse a última coisa que faria. Por um segundo, sentindo-a se aconchegar junto a mim, eu pude imaginar uma vida ao lado de Krystal, por mais ilusório que fosse.

Logo depois ela se despediu, e eu me forcei a não pedi-la para ficar um pouco mais, quem sabe por mais uma noite. Era como se eu soubesse que não teríamos uma despedida digna.

A penúltima vez que a vi foi quando ela apareceu no bar no mesmo dia em que havia formado no ensino médio, com os olhos marejados e uma aliança no dedo.

A última vez foi em seu casamento. Eu me permiti comprar um belo vestido, que tenho comigo até hoje, como um lembrete dos tempos bons que Krystal me trouxe.

E mesmo agora, depois de tantos anos, eu ainda continuo vagando sem rumo. Com um coração cheio de possibilidades e uma bota gasta, guardando lembranças de todas as mulheres que me permiti amar durantes esses árduo anos.

Tome esse relato como uma carta aberta, como uma via, sempre guardando surpresas e novos haveres. Talvez, quando acabar, eu volte para contar sobre Sulli, como eu disse, amores de estrada são assim, vocês já deveriam saber.

 

"Quem é você?
Você está em contato com todas as suas fantasias mais sombrias?
Você criou uma vida para si mesmo onde você está livre para experimentá-las?"

Notas Finais


- eu quis colocar traços de personalidade boderline nessa amber, mas meu intuito nunca foi romantizar essa psicopatologia, deixando claro.
- me inspirei na musica da lana del rey, - ride, um musicão alias, vale a pena a ouvida.

Fanfic: @xoliswa
Beta: @Xiuglubglub
Capa: @onwjink


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