História Paradise - Capítulo 4

Estava frio quando Namjoon abriu os olhos. Ele não reconheceu onde estava ou o que estava acontecendo, mas seu corpo todo tremia e não queria admitir nem para si mesmo, mas estava com medo. Não tinha certeza do que tinha o levado até ali, mas conseguia se recordar de escamas roxas. O que aquilo significava afinal? Como uma pessoa poderia ter escamas pelo corpo? E por que tinha sido desmaiado? Talvez o barqueiro tivesse razão no final das contas, talvez fossem selvagens locais que ninguém fazia ideia da existência.

Kim puxou o ar com força e se moveu, conseguindo ficar em sentado. Logo notou que tudo à sua volta parecia escuro e ainda precisaria de alguns minutos para a sua visão se acostumar com a falta de iluminação.

Ele ficou parado no lugar, com medo de se mover e uma das criaturas aparecerem na sua frente, porém ele escutou uma tosse e o som foi dolorosamente reconhecido pelo o seu corpo. Antes de realmente processar tudo, já estava de pé, tentando encontrar a origem do som, até que seu pé chutou de leve algo e um gemido foi escutado.

— Jungkook! Oh, divindade, Jungkook!

Os olhos de Namjoon já estavam se acostumando e a figura encolhida no chão fez o seu coração falhar uma batida. Antes de pensar em mais alguma coisa, jogou-se ao lado do amigo, puxando-o para um abraço apertado.

Não demorou muito para ele escutar o choro do rapaz contra o seu ouvido e quase chorou junto, porém tentou ser forte pelos os dois. O mais novo estava ali, bem, então tudo parecia um pouco melhor de alguma maneira, pelo o menos o tinha ao seu lado.

— Hyung, hyung… Eu tive tanto medo…

— Shiiiu, estamos juntos agora. Vai dar tudo certo, Kookie.

— Hyung, eles são peixes igual a história, hyung. São… sereias.

Namjoon afastou o mais novo para lhe fitar a face. Ele então levou as mãos ao rosto do rapaz e analisou seus olhos com cuidado, mesmo que não enxergasse muita coisa.

— Você bateu a cabeça, Kookie?

— Quê?! Não! Hyung, são sereias, eu não estou louco. Eu vi.

O rapaz poderia ter visto muitas coisas, mas Namjoon estava cansado demais para discutir. Seu cérebro não aceitava aquela ideia, lendas não era verdadeiras, talvez em parte, mas não totalmente. O livro dizia sobre peixes carnívoros, provavelmente alguma espécie primitiva, mas sereias já eram demais. Não. Ele não acreditava.

— Hyung, acredita em mim!

— Tudo bem… Hm… precisamos achar um jeito de sair daqui e fugir dessa ilha.

E então, eles escutaram um gemido baixo e entraram em alerta.

— Obrigado… pela preocupação. Bom saber que… iriam me procurar.

A voz de Yoongi foi um alívio para os dois, que se levantaram e identificaram a sombra perto da parede de pedra. Jungkook também o abraçou com força e Min acabou dando um sorriso, agradecido pela pouca iluminação não entregar o gesto para os outros dois.

— Você está bem? Como se sente? — Namjoon perguntou, tateando por algum ferimento no barqueiro. Ele também tentou enxergar os olhos do homem, mas o local escuro não ajudava em nada. — Alguma dor?

— Só dor de cabeça infernal — grunhiu Yoongi, puxando o ar com força. — O garoto tem razão. São sereias.

Namjoon soltou o ar pelo nariz, descrente. Aquilo não existia, os outros dois estavam delirando.

— Você não acredita? — Yoongi questionou cinicamente. — Eu vi aquelas porras… Eu estava pegando galhos e vi os corpos cheios de escamas. É a história que meu avô me contava quando pequeno e eu achei que era só um conto de terror. Mas… elas existem. As filhas da puta realmente existem e caralho, são lindas.

O biólogo revirou os olhos.

— Mantenha as calças no lugar.

Min estalou a língua.

— Elas vão nos matar, você não entende? — disparou o mais velho. — Elas comem carne humana, vão nos dilacerar. Temos que ser rápidos, encontrar uma maneira de fugir antes que viremos comida dos peixões.

O mais alto não acreditava. Eram só lendas, tudo aquilo era lenda. Provavelmente haviam vistos povos que usavam roupas parecidas com escamas, talvez era algum tipo de culto ou a forma como se vestiam, mas sereias eram impossíveis. Não estudara anos para algo assim existir ele não saber.

— Hyung, é igual o livro… Elas vão nos comer.

— Talvez ele goste disso — disparou Namjoon, apontando para Yoongi com a cabeça.

Min bufou.

— Quer saber? Se você quer ficar aqui e virar comida de lenda, problema é seu. Eu vou arranjar um jeito de sair dessa gruta.

Yoongi tateou a parede e ficou de pé, Jungkook fez o mesmo e Namjoon acabou repetindo o processo.

— Deve ter uma saída por aqui — murmurou Min, começando a andar mais adentro do local.

Mas, Namjoon ficou no mesmo lugar. Ele não sabia se era uma boa ideia ir mais a fundo na gruta, poderia não ter espaço, poderiam se perder ou poderiam encontrar algo pior que o escuro.

— Hyung… vamos com ele.

— Não sei se é uma boa ideia — disse Namjoon, segurando a mão do rapaz. — Pode ser pior.

— Mas vamos deixar ele sozinho? Hyung…

Kim mordeu o lábio inferior, até que o eco da voz de Yoongi chegou para eles.

— Tem água aqui! Água doce.

Era o que Namjoon precisava escutar. Eles então seguiram na direção que Yoongi tinha ido, também tateando a parede, com medo de se perderem de alguma maneira. Contudo, Min não estava longe e a água chamou mais atenção de qualquer coisa, pois ela parecia brilhar.

— Por que… brilha? — Jeon perguntou, surpreso.

— Sei lá, garoto — Yoongi disparou, sentando na beirada da piscina natural. — O importante é que é água doce e precisamos nos hidratar.

Namjoon observou rapidamente o lado, ficando ao lado de Yoongi por um momento.

— Pode ser bioluminescência — disse Namjoon. — São fitoplânctons. Eles geram luz para sobreviver.

— Gente, só toma essa água — Min falou sem muita paciência.

Eles então tomaram de uma vez, logo se sentindo melhores. Namjoon observou como o seu corpo estava tão cansado e se sentia seco, por mais que não fizesse sentido. Seu corpo estava dolorido e agora tomando água, as coisas pareciam melhores outra vez, sentia-se vivo de alguma maneira.

— Essa é a melhor água do mundo — Jungkook murmurou, molhando o rosto. Ele sentiu mãos nas suas costas e mesmo sem olhar, sabia que era Namjoon preocupado com ele cair na piscina natural.

Yoongi observou a cena e por algum motivo, sorriu. O garoto era muito fofo e queria que estivessem em outro lugar naquele momento. Não queria se desesperar, mas não estava conseguindo pensar em nenhuma saída para aquela situação; viraria comida de sereia.

Alguns minutos depois, os três estavam sentados ainda no mesmo lugar, sabendo como era sempre bom ficar perto da água em casos como aqueles, contudo estavam presos na gruta e sabiam muito bem que não tinham parado por ali com suas próprias pernas, tinham sido jogados por ali.

— E se deixaram aqui para morrermos de fome? — Jungkook perguntou, deixando seu corpo se escorar no de Namjoon.

— Parece ruim para quem quer comer nossa carne — Yoongi disse, sério. — Nosso corpo vai comer primeiro os músculos, né? Então, não vai ter carne para eles saborearem.

— Ninguém vai nos comer, okay? Esse negócio de sereias não existe, vocês viram outra coisa e estão confundindo.

Yoongi revirou os olhos.

— Mesmo que não exista, nos prenderam aqui, cara! Tem gente aí fora e não parecerem nada felizes de termos vindo parar na ilha deles.

Namjoon se calou, pois Yoongi tinha um ponto. Tinham pessoas por ali não muito felizes com aquela situação.

— Hyung… não me sinto bem.

A voz de Jungkook fez Namjoon ficar em alerta, fitando o rapaz com cuidado enquanto analisava o seu rosto.

— O que foi, Kookie? O que você sente?

— N-não sei, hyung. Acho que estou com sede, muita… sede.

Kim sentiu o coração se apertar e com cuidado deixou Jungkook próximo a piscina. Yoongi se moveu agilmente e mesmo não tendo nenhum compartimento para levar água ao rapaz, usou as mãos, deixando com cuidado cair sobre a boca de Jeon, que pareceu desesperado por aquilo.

— O que ele tem? — Min perguntou.

— Não sei… — disse o mais alto. — Ele pode ter ficado muito tempo no sol, pode estar com uma insolação.

— Ou aquelas sereias malditas fizeram algo com ele!

O biólogo quis discutir, reclamar daquele absurdo, afinal não existiam sereias coisa alguma, porém era melhor somente cuidar de Jungkook para o rapaz ficar bem.

Então, acabaram não partindo em busca de nada, pelo menos pelos próximos minutos, até que Jungkook pareceu bem outra vez, sua mão já segurando com força a de Namjoon.

— Estou melhor, hyungs — disse o rapaz. — D-desculpa…

— Não precisa se desculpar — afirmou o mais alto. — Você não tem culpa de nada, Kookie.

— Isso, escute o seu namorado — Yoongi disse, com um fraco sorriso.

O rapaz piscou confuso.

— O hyung não é o meu namorado — disse Jeon, de imediato. — Ou… é? Hyung, nós estamos namorando?

A inocência de Jungkook sempre fazia Namjoon querer gritar. Como o garoto não podia saber o que significava namorar ou não? Se agora ele falasse que namoravam, o rapaz aceitaria? Era isso? Sinceramente, ficava assustado com o que poderiam fazer com Jeon se não estivesse por perto.

— Não, Kookie. Somos amigos.

Yoongi estalou a língua, olhando de um para o outro, sem acreditar naquilo.

— Você me enganou! — disparou Min para Namjoon.

— Não enganei. Eu nunca disse que éramos namorados, você supôs sozinho — esclareceu o biólogo. — Eu não podia deixar você colocar essas mãos nojentas nele!

Min grunhiu, ficando de pé de uma vez.

— Eu não ia colocar mãos nele! Eu não sou um babaca! Só odeio que mintam para mim!

— Hyungs… por favor… Não briguem. Posso namorar os dois.

Namjoon virou o corpo com tanta velocidade na direção de Jungkook que o rapaz se encolheu, principalmente ao ver Yoongi fazer o mesmo.

— O que você disse? — Min perguntou.

— S-se… vocês estão b-brigando porque querem me namorar, e-eu posso namorar os d-dois.

Namjoon tampou o rosto com as mãos e Yoongi acabou rindo. Aquele garoto não era real.

— Não mude — pediu Kim, segurando a mão do mais novo e o ajudando a ficar de pé. — Por favor, tome cuidado, mas não mude.

— Ele tem razão, garoto — Min disse, aproximando-se até ter a mão no ombro do rapaz. — Eu nunca vi ninguém como você, tão… puro. Acho que até ganhei um pouco de fé na humanidade agora.

Os três sorriam e Jungkook se sentiu bem. Seus amigos eram bons e se sentia protegido e cuidado perto deles, agora somente queria poder sair logo daquela ilha para voltarem em segurança para Jeju.

Porém, o pedido de Jeon não foi escutado, pois quase instantaneamente, escutaram um barulho vindo da água, barulho de algo grande nadando na direção deles. Os três tentaram fazer algo ou procurar alguma para se defender, mas não tinha nada naquele lugar. Assim, instintivamente, Namjoon colocou Jungkook atrás de si e esperou pelo pior.

E, o pior veio em forma de um homem. Porém, a mente de Namjoon não processou corretamente o que viu, pois seus olhos captaram grandes caudas repartidas em duas na sua base e em seguida quando o ser pulou para a superfície, a cauda desapareceu, dando lugar às pernas, cobertas por escamas verdes escuras que cobriam todo o corpo do homem, desde os pés até a altura do pescoço, incluindo parte dos braços. O biólogo tentou pensar racionalmente, mas acabou enjoado por um momento. Tudo o que acreditava ser real, tinha se desfeito na sua frente, naqueles poucos segundos de percepção.

— Você está morto!

Por um momento, Namjoon pensou que era com ele, mas pela forma como Yoongi se encolheu, o barqueiro também imaginou que as palavras eram para si, contudo, estavam enganados. Pois o homem apontava para além deles, apontava para Jungkook que estava atrás dos mais velhos.

A sereia — Namjoon nem sabia como ainda não tinha surtado naquele momento — aproximou-se velozmente, mas Kim se manteve no lugar e em um ato de loucura, tentou empurrar o ser para longe, contudo ele sentiu unhas no seu rosto e força descomunal jogando-se contra as pedras. Sua cabeça bateu na rocha sem que conseguisse se defender, porém não desmaiou, afinal conseguiu escutar o grito de Jungkook e o de Yoongi.

A visão do biólogo estava duplicada, mas ele viu o ser de escamas verdes puxar Jungkook pelo braço e após piscar algumas vezes, percebeu que Yoongi também estava no chão, provavelmente machucado.

— Você vai pagar por tudo o que fez! Traidor! Eu vou te matar, acabar com a sua raça imunda!

Jungkook tentava lutar, mas ele nem sabia como exatamente. As unhas do homem estavam fincadas nos seus braços e tudo doía, sua cabeça não estava totalmente boa e seu corpo fraco. O rapaz não sabia o que fazer naquele momento.

— Como você traz humanos para cá? Como você nos traiu dessa maneira?

Jungkook sentiu o seu corpo ir ao chão e antes de se virar, a sua face sendo arrastada no solo de pedra. Ele tentou correr de alguma maneira, mas as unhas da sereia foram até o seu pescoço, ficando com força no local e arrastando até rasgar a sua blusa e ferir suas costas.

— Para! Por favor, deixe-o em paz! — Namjoon gritou, levantando-se e indo até a sereia para tentar de alguma maneira salvar Jungkook. — Ele não fez nada, é inocente. Por favor. Não faz isso com ele! Por favor!

Sem resposta, Namjoon jogou seu corpo contra o da sereia, que gritou de ódio, sem realmente sair do local. O mais alto então sentiu uma dor dilacerante do seu ombro até o seu peitoral e somente conseguiu gritar, sem forças para empurrar o ser de cima dele. Seu cérebro lhe mandava se defender, mas não tinha forças para lutar contra algo que nem sabia existir.

A sereia de cabelo verde — Namjoon estava quase desmaiando, mas conseguiu perceber pela primeira o tom dos fios capilares do outro — nada ouviu ou sentiu, mal percebendo a tentativa frustrada de Jungkook para defender Kim, e levou as mãos os pescoço do biólogo, deixando as unhas aparentes.

Namjoon então percebeu que iria morrer ali, que teria a sua garganta dilacerada por um ser que jurava ser mitológico.

Porém, quando tudo pareceu perdido, uma nova voz surgiu da água e em seguida outro ser surgiu na gruta.

— CHANGKYUN! LARGA ELE AGORA!

Como por um milagre, Namjoon sentiu a afiada unha sair do seu pescoço e o peso por cima dele desaparecer, mas seu corpo estava todo machucado e mal conseguia abrir o olho direito, recordando-se do momento quando aquela sereia havia ferido o seu rosto em um movimento só.

— VOCÊ ESTÁ MALUCO?! QUEM DEU TE DEU AUTORIZAÇÃO DE FAZER ISSO?!

Kim tentou se mexer e virou o corpo de qualquer maneira, com dificuldade enxergando que a sereia que tinha chegado tinha escamas arroxeadas. Havia sido de relance, contudo já tinha visto aquele ser antes.

— Ele é um traidor, Seokjin! Não merece viver!

— Mas as ordens devem partir diretamente do Tritão! O que você fez vai totalmente contra as leis!

— Esse desgraçado imundo merece! — disparou o de escamas verdes. — Podemos matá-los aqui mesmo!

— Por f-favor, não! P-por favor — Jungkook choramingou e mesmo machucado tentou se levantar, não conseguindo de imediato. — Nós viemos em p-paz. Por favor.

— Pegamos uma tempestade! Nosso barco afundou. Nós não estamos tentando machucar vocês! — A voz de Yoongi soou alta e clara. Ele tentava passar confiança. — Nem sabíamos que tinham pessoas por aqui. Por favor, sejam clementes. Não temos nem condições de machucar ninguém.

A sereia de escamas roxas fitou os humanos e depois olhou para Jungkook, que tinha se arrastado até Namjoon, segurando o amigo contra o seu corpo, tentando de alguma maneira cuidar dele e fazer com que todos os seus ferimentos desaparecessem, por mais louco que fosse o pensamento.

— Changkyun, vá até a base e reporte o que fez. Se você não falar, eu mesmo falarei e será pior — disse a sereia. — E chame mais sereias, precisamos deslocar os prisioneiros.

A sereia com escamas verdes pareceu acatar a ordem, mas não antes de fitar os humanos com ódio para segundos depois desaparecer na água, somente o som do nado chegando aos que ficaram para trás.

A outra sereia suspirou alto, aproximando-se de Jungkook e Namjoon, contudo o mais novo se encolheu, tentando proteger Kim do ódio daqueles seres.

— Não irei machucar vocês — disse o que possuía escamas arroxeadas.

— Sinto muito, mas não acreditamos muito nisso — Yoongi disparou, chamando atenção para si. — Aquele psicopata iria nos matar!

A sereia fitou Yoongi antes de seguir para o pequeno lago e assim com a outra, sumir nas águas azuis brilhantes.

Min então se moveu até os outros dois, assustado com a extensão dos ferimentos. Aqueles monstros haviam feito aquilo com eles e não tinha muita coisa que pudesse os ajudarem naquele momento.

— Eu nem vou perguntar como vocês estão — Yoongi afirmou.

Namjoon deixou o ar sair do seu nariz, mas antes de falar qualquer coisa, escutou o choro de Jungkook e ao olhá-lo sentiu que todas as suas dores não eram comparáveis com a que abateu seu coração com a cena.

— Kookie…

— E-eu estou com m-medo, hyungs. E-eu não quero morrer a-aqui…

O mais novo sentiu a mão de Namjoon na sua e os braços de Yoongi em volta de si, então chorou ainda mais, pedindo que logo acordassem daquele horrível pesadelo.