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História Possuídos - Prólogo


Escrita por: naigp

Capítulo 1 - Prólogo


Nosso planeta não é mais o mesmo. Os humanos não são mais os governantes da Terra. Não são mais os governantes de seus próprios corpos. Há alguns anos nosso planeta fora invadido por seres desconhecidos, e não invadiram somente a Terra, os corpos humanos eram as casas dos invasores. No ano de 2024, finalmente os humanos descobriram o que estava acontecendo, mas já era tarde demais. Pai entregando filho, irmão entregando irmão. Em 2025 quase toda a humanidade havia sido possuída por eles. Não havia como distinguir um amigo de um inimigo. Mesmo que os humanos tentassem lutar, era uma batalha perdida. Os humanos que sobreviveram viviam escondidos, assustados, com medo…

 Sophie tentava dormir, há horas buscava descansar um pouco, mas era quase impossível fechar os olhos e relaxar naquelas condições. Estava sentada no chão de uma casa em ruínas e não havia nada naquele lugar além de poeira e muita umidade. Ela, seu pai e seu irmão mais novo acabaram achando a casa em uma área suburbana deserta enquanto procuravam por comida e decidiram se instalar ali por algumas horas. Quando Sophie finalmente decidiu tirar um cochilo depois de horas vagando atrás de comida e abrigo, seu irmão tivera a mesma ideia e preferiu fazer as pernas dela de travesseiro. Os dois estavam no chão do que um dia fora uma cozinha, imaginou Sophie. Ela encontrava-se sentada e encostada em uma parede fria enquanto seu irmão dormia em seu colo. A posição do seu corpo não era o que mais a incomodava, mas sim o som da barriga de seu irmão roncando e o nó em seu próprio estômago vazio. Sophie percebeu que seu pai também não conseguia dormir.

— Tente dormir um pouco, pai — disse Sophie.

— Você também, docinho.

— Não consigo, a barriga do Cris não para de fazer barulho — disse Sophie, triste. — Ele deve estar com muita fome.

— Todos nós estamos, querida.

Sophie queria ajudá-los, ela sabia que conseguiria pegar comida para eles sem ser vista, era bastante rápida, mas seu pai não a deixava fazer nada. Seu único dever era cuidar de seu irmão. Sophie adorava Cris e não se importava em cuidar dele, mas seu pai passava muito tempo fora e quase não arranjava comida. Ele tinha cinquenta e seis anos, mas o modo como eles estavam vivendo nos últimos meses fazia com que ele parecesse mais velho. Ele aparentava cansaço.

— Pai, por favor, me deixe sair para procurar comida.

— Não, Sophie! — disse ele ríspido. — Já tivemos essa conversa várias vezes.

— E vamos continuar tendo até você me deixar sair! — Insistiu Sophie.

Seu pai pressionou a têmpora com uma das mãos, parecia muito cansado e discutir com sua filha não estava em seus planos para a noite.

— Sophie, escute. Aquelas criaturas lá fora pegaram sua mãe, você mesma presenciou a cena.

Ao se lembrar, Sophie levou a mão esquerda até o pescoço para tocar o colar que seu pai lhe dera no dia em que a mãe se fora, o colar pertencera a ela. Era apenas uma corrente dourada com um pequeno pingente em formato de cruz, sua mãe sempre dizia que se sentia protegida quando o usava. Sophie nunca se esqueceria daquele dia. Estavam sozinhas em casa. Dois homens que ela jamais vira invadiram e levaram sua mãe. Por sorte, ela conseguiu se esconder. Enquanto os homens saíam, ela conseguiu ver algo se materializar nas costas deles e percebeu que eram pares de asas escuras e assustadoras. Toda vez que fechava os olhos ela conseguia ouvir os gritos de sua mãe pedindo por ajuda. Perder a pessoa que ela mais amava foi algo horrível, talvez a pior coisa que aconteceu na sua vida. Não queria que o mesmo acontecesse com ela mesma ou com seu pai, mas não aguentaria mais uma noite acordada preocupando-se por seu irmão estar com fome.

— Pai, não tem um dia que eu não pense na mamãe, eu juro, mas eu sou mais rápida que você, eu sei que conseguiria arranjar comida com mais facilidade para você e Cris. Deixe-me ajudar.

— Sophie, já chega, ajeite seu irmão no chão e tente dormir. Não quero mais falar nisso. — Ele ficou alguns segundos em silêncio, então soltou um suspiro. — Filha, escute, eu te amo muito, não suportaria perdê-la também.

Sophie ficou em silêncio por longos minutos, retirou Cris de cima de sua perna e esperou seu pai adormecer. Decidiu sair por conta própria. Ela provaria que estava certa, conseguiria comida para todos eles sem ser pega. Já havia esperado tempo demais para tomar essa decisão. Ela aguardou até ouvir o primeiro ronco de seu pai e se levantou com muito cuidado para não perder o equilíbrio e esbarrar em seu irmão. Quando começou a caminhar nas pontas dos pés para não fazer barulho, ouviu Cris acordar.

— O que está fazendo, Sophie? — perguntou Cris, sonolento.

Sophie xingou baixinho. Cris tinha que acordar logo agora?

— Nada. Tente dormir mais um pouco, você deve estar cansado.

— Você ia sair, não ia? — disse Cris, agora um pouco mais alerta. — O papai não vai gostar nada disso.

Sophie caminhou até seu irmão, ajoelhou-se para ficar na mesma altura que ele e lhe fez um afago na cabeça.

— Sim, eu sei Cris, mas o papai está muito cansado para conseguir comida para todos nós — explicou Sophie. — Talvez eu consiga algo.

Cris olhou para a irmã e colocou suas mãozinhas em cima da mão de Sophie.

— Eu consigo ficar mais tempo sem comer — disse Cris, com os olhos começando a ficar marejados.

Sophie sentiu uma raiva intensa que nunca sentira antes. Sim, ela odiava as criaturas que invadiram a Terra, destruíram seu mundo e possuíram algumas pessoas que ela amava, mas nunca os odiou tanto quanto naquele instante. Quando eles levaram sua mãe, Sophie não sentiu raiva nem ódio, ela ficou triste, ficou despedaçada. Eles levaram a pessoa que mais amava e ela só sentiu dor, não havia espaço para outro sentimento. Mas ali de frente para seu irmão com os olhos cheios de lágrimas, ela sentiu toda a raiva e todo o ódio que ela sequer sabia que podia sentir.

— Eu vou voltar, Cris — falou Sophie. — Vou voltar com comida. Confie em mim.

Ele abaixou a cabeça e ficou olhando para o chão, mas concordou com sua irmã. Sophie olhou para o lado para se certificar que seu pai continuava dormindo. Ele dormia tranquilamente. Estava muito cansado para acordar.

— Eu amo você. É a melhor irmã do mundo.

— Eu amo você também, peste.

Sophie bagunçou os cabelos de Cris, levantou-se e foi em direção à porta. Saiu da casa, acendeu uma pequena lanterna que sempre carregava no bolso e começou a caminhar na direção de algumas luzes de residências bem distantes. Sophie percebeu que os locais habitados ficavam a quilômetros dali. Ela se deu conta que nem sabia onde estava, não sabia sequer o nome da cidade, mas sabia que teria uma bela caminhada pela frente.

Após uma hora caminhando, Sophie já se arrependia da ideia de sair sozinha para procurar suprimentos e todo tipo de pensamento horrendo surgia em sua mente. Pensou em seu pai, ele iria ficar uma fera quando acordasse, pensou em sua mãe, o que ela acharia da decisão que acabara de tomar? E pensou no som da barriga de Cris e decidiu que estava fazendo a coisa certa. Sophie tremia, nunca saía sozinha e sentia medo do que poderia acontecer se fosse pega, mas precisava ajudar sua família. O estômago de Sophie roncou em seguida. Precisava ajudar a si mesma também, lembrou. Sentia-se faminta.

As pernas de Sophie começaram a ficar cansadas e uma forte cãibra em sua panturrilha a fez parar por alguns minutos para descansar. Abaixou-se para massagear a área dolorida e percebeu que havia um panfleto velho sob seu pé, onde se lia “Conheça os melhores pontos turísticos de Los Angeles”. Sophie se sentiu melhor ao saber onde estava, mas continuou receosa por não conhecer nada ali. Nunca havia visitado Los Angeles quando as coisas eram normais porque sua mãe não gostava daquela cidade. Percebeu que só conheceu novos lugares após a morte de sua mãe porque sempre viviam se escondendo. Segundo seu pai, não era seguro permanecer no mesmo lugar por muito tempo e mesmo assim, nunca conseguiram sair da Califórnia. Antes disso, nunca havia saído de Sacramento, a cidade onde nascera e crescera.

No início da invasão as criaturas possuíam os humanos, mas continuavam a viver como seu hospedeiro. Trabalhavam, estudavam, dirigiam, comiam e até mesmo falavam como a pessoa. Tudo para que os demais humanos não desconfiassem de algo. Na verdade, havia até relatos de pessoas dizendo que seus pais se tornaram mais gentis de uma hora para outra, ou que seu irmão tinha parado de se meter em encrencas. Pensando nisso, Sophie se lembrou que nessa mesma época, os noticiários pararam de divulgar tragédias e a taxa de crime havia diminuído. Tudo no mundo parecia bem até 2024, o ano em que sua mãe foi levada. Nesse mesmo ano o noticiário informou que a invasão ocorria desde 2020 e que a raça humana estava condenada. Dizia que os Estados Unidos foram os primeiros, mas que logo o planeta todo seria tomado. Quando parou para pensar nisso, Sophie percebeu que aquela notícia deveria ter sido divulgada no início da invasão, era estranho que informassem aquilo tudo somente quatro anos depois. Sophie tentou se recordar do restante da notícia e lembrou de outro trecho que não havia entendido. Dizia que se caso quisessem se entregar, “eles” seriam misericordiosos. Nunca foi divulgado quem “eles” eram e, também, não deixaram explícito quem deveria se entregar. Podia parecer bobagem, mas Sophie não estava certa se naquele trecho específico, "eles" referia-se aos humanos. Sophie olhou ao redor. Um ano se passara desde a notícia divulgada e a morte de sua mãe. Tudo parecia meio abandonado, os meios de comunicação não funcionavam mais, as empresas paradas, não havia mais alunos nas escolas e era raro ver algum veículo andando nas ruas.

Sophie sentiu todo seu corpo tremer, de repente começou a fazer muito frio e a luz da sua lanterna se apagou, ela não conseguia enxergar nada, mas uma forte luz apareceu e quase a cegou. Sophie conseguiu ver com muita dificuldade uma forma através daquela luz que ofuscava seus olhos, uma forma humana, porém tinha algo nas costas, algo grande. Eram asas. E estava chegando perto dela. O coração de Sophie parou de bater por um momento, ela percebeu que havia sido descoberta. Estava acontecendo.

Ela tinha conhecimento do que aquele ser com asas iria fazer com ela, não sabia o que eles eram de verdade, mas sabia o que aquele grupo de seres desconhecidos fizeram com o restante da humanidade. Ela sentiu medo e entendeu que não podia voltar para o abrigo, tinha de fugir para longe. Precisava tentar proteger seu irmão e seu pai, os únicos humanos que ela conhecia que haviam sobrevivido. Sophie correu o mais rápido que pôde, porém o ser a alcançaria facilmente, flutuando rápido e graciosamente atrás dela. Com o pouco tempo que lhe restava, Sophie retirou seu colar do pescoço e o deixou cair na estrada, esperando que seu pai e seu irmão o encontrassem. Era um aviso para eles.

Eles me acharam.

A luz a estava cegando, mas ela conseguiu ver o rosto da criatura. Era belo, tinha olhos azuis quase cinzas como o mar em um dia chuvoso, e foram esses olhos a última coisa que ela viu. Quando a criatura a tocou, Sophie não viu nada além de escuridão…


Notas Finais


Obrigado por ler até aqui. Espero que tenha gostado. Um grande beijo.


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