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História Redemptation - A Aliança


Escrita por: Grainer

Notas do Autor


Olá, queridos leitores e queridas leitoras! Mais um capítulo atualizado! Eu retornarei com as atualizações mais assíduas de minhas fanfics, ok? Estas últimas duas semanas têm sido complicadas para mim. Mas pela metade da próxima semana, ficarei mais livre e tranquila. Espero que gostem deste capítulo e já aviso de antemão que o tamanho dos capítulos irá aumentar, certo? kkkkkkkkkkkk
Beijos a todos e a todas e boa leitura!

Capítulo 10 - A Aliança


Capítulo X: A ALIANÇA

Ele estava parado diante do vidro que separava o corredor da sala da UTI neonatal. Naquele momento, somente dois bebês estavam ali, em observação. Os outros, mas afastados, dispunham de aparelhos para fazer funcionar os pequenos e delicados órgãos vitais, mostrando a gravidade das situações.

Ele sorriu, um sorriso doce e sereno no rosto de espanhol, com sua cor moura, os cabelos rebeldes e negros e os olhos de belo árabe. As mãos nos bolsos, sentiu-se, de certa forma, um pouco responsável pelo bem estar daquelas duas crianças.

— Olha só, espanhol... - falava consigo - Você perdeu uma filha, mas ganhou dois filhos "adotivos".

— Senhor Sánchez? - chamou Giovanni, que havia virado, naquele momento, o corredor e havia visto o homem espanhol ainda ao longe. - O que faz aqui, na área de pediatria?

O médico estirou a mão amistosamente e o espanhol aceitou o cumprimento.

— Minha esposa dormiu e eu resolvi dar uma passada para saber como estavam os bebês. Haviam dito que tudo tinha corrido bem. Então, eu quis espiar como eram as crianças que tive o prazer de ajudar antes de ontem!

— Tudo correu muito bem! - voltou Giovanni, também observando os bebês através do vidro - Foi realmente providencial que o senhor a tenha encontrado por acaso. Sabe-se lá o que poderia ter acontecido se aquela moça não houvesse sido socorrida ás pressas!

Shura abriu um singelo sorriso em seu semblante sempre sério, vendo que um dos bebês mexia-se naquele momento. O outro, dormia profundamente. Não pôde deixar de sentir um estranho sentimento invadir o peito. Quando soube que uma das crianças era uma menina, seu coração havia acelerado. O destino lhe tirara uma menina, mas havia posto outra em seu caminho, e dessa vez, ele pôde ser mais feliz no desenlace.

— São tão pequenos... – o espanhol comentou.

— È vero! - disse Giovanni, sem importância - E sua esposa, como ela está? Já aceita melhor a ideia de uma adoção ou ainda teima em querer gerar um filho? Lembra-se de nossa conversa, senhor Sánchez? Sua esposa pode engravidar, ela não é estéril. Mas ela jamais chegará a termo. Ela nunca vai parir um filho, Shura.

— Eu conversei com ela sobre isso depois que nós dois falamos sobre o assunto. Até disse a ela que era uma opinião sua, enquanto médico, para ver se isso mudava a cabeça de minha esposa. Mas, da primeira vez, ela reagiu com fúria, atirando-me na cara de que eu não acreditava que ela pudesse me dar um filho. Da segunda vez, ela já estava mais tranquila, até acredito que ficou pensativa sobre a questão.

— Se vocês querem tanto um filho, eu receio ser o certo a fazer. Só é necessário saber levar a situação e convencê-la que é pela própria saúde dela. – tornou o médico.

— Assim farei. – tornou Shura – Mas eu não quero apressar as coisas. Não quero tirar dela a esperança de ter um filho nosso!

Shura olhou, seriamente, para o médico, ainda que seu rosto estivesse bastante calmo. Giovanni apenas sorriu.

— Tem razão, senhor Sánchez. Eu lhe desejo boa sorte! Depois, eu passarei por lá, para conversar um pouco com ela!

— Faça isso, ela se sentirá muito bem! - Shura hesitou por um momento; mas encarando o médico, indagou - Eu poderia visitar a mãe dos bebês? Eu tenho algo dela para entregar e gostaria que fosse em pessoa!

— Claro! Não é horário de visitas, mas diga a Chloe que o deixe passar. Fale que eu mandei!

— Gracias!

Shura outra vez apertou a mão do médico, em despedida, e caminhou em direção ao final do corredor. Tomou o elevador e desceu até a parte da enfermaria. Giovanni ficou ali, pensativo, olhando os bebês através do vidro. Estava sério, taciturno, e de repente seus olhos brilharam, uma ideia havia cruzado sua mente. Caminhou até a porta da sala de neonatologia e bateu. A enfermeira responsável veio atendê-lo com um sorriso.

— O que deseja, senhor d'Angeri? O senhor quer ver os bebês?

— Eu gostaria de saber como eles estão! Você já tem o resultado dos exames?

A mulher ofereceu-lhe uma máscara que ele prontamente colocou, segurando-a com uma das mãos. Entrou na sala e fechou a porta. A enfermeira foi até uma gaveta, onde ficava o prontuário dos pacientes. Retirando de lá uma pasta, entregou-a ao obstetra.

— Ambos são saudáveis e bem conformados, mas a menina nasceu com baixo peso! - dizia ela, enquanto ele folheava os documentos - Talvez precise ficar aqui mais tempo do que imaginávamos!

— Estou vendo... - comentou ele - Um quilo e cem gramos, realmente baixo para um bebê que nasceu de quase 8 meses. Mas, pelo que vejo, ela não tem nenhuma outra complicação!

Fechando o prontuário e entregando de novo à moça.

— Não, nenhuma. Os outros exames chegarão apenas na próxima semana. Eu estava esperando ter todos para entregá-los ao senhor.

— Não é preciso. Já sei o que queria saber. Entregue-os aos pediatras que estiveram comigo na sala de parto, eles são os responsáveis pela saúde dos bebês por enquanto.

— Sim, senhor!

Ele encaminhou-se para os bebês e os observou por um momento. Seus olhos azuis pararam na fisionomia da menina. Era pequena, magrinha, ainda muito vermelha. Assemelhava-se a um bebê prematuro. Assim seria a filha dos Sánchez se houvesse sobrevivido. Sorriu para si mesmo, metade do rosto escondido pela máscara hospitalar. Depois, foi até a porta, acenou de cabeça para a enfermeira e saiu para o longo corredor. Do lado de fora, retirou a máscara e desapareceu em uma esquina.

o.O.o.O.o

Shura bateu na porta antes de abri-la. Quando assomou o rosto por uma fresta, Esmeralda o reconheceu prontamente. Aquele homem havia sido um anjo da guarda, como ela o havia chamado. A garota abriu-lhe um imenso sorriso, iluminado, como se ele fosse realmente um ser celestial.

— Eu posso entrar? – ele indagou, ainda da porta.

— Nem precisa perguntar, senhor Sánchez! - disse ela.

Estava sozinha e tinha uma bandeja de comida em seu colo, que rapidamente foi posta na mesinha ao lado.

- Entre, por favor, desculpe se estou mal penteada, ainda não fiz a toalete da manhã. A enfermeira ainda não me permite ficar perambulando por aí sozinha.

— Não se preocupe, eu sei muito bem como é! - o espanhol entrou e fechou a porta, aproximando-se do leito - Não ache que, só porque passou por um parto há dois dias, pode fazer tudo. Você precisa relaxar e fazer repouso, é muito importante!

— O senhor fala como se soubesse. Você tem filhos? - perguntou ela, sorrindo delicadamente.

— Não! - respondeu ele, algo melancólico, não queria falar de coisas tão tristes - Mas sei como é o processo! Acabei de ver os seus bebês, eles estão bem!

— Obrigada. Mal posso esperar para vê-los também! Infelizmente, eles terão que ficar em observação por um tempo. Enquanto isso, eu ficarei sozinha!

— Vai passar rápido, você vai ver. A propósito...

Shura fez menção de retirar algo de dentro do bolso, mas a porta abriu-se naquele momento. Esmeralda e o moreno espanhol olharam ao mesmo tempo o recém chegado e o sorriso da moça desfez-se diante do rosto impassível e severo do pai.

Shura desistiu de sua ação e levantou-se. Havia se sentado ao pé da cama da paciente. Pela expressão do imenso homem e por sua idade, Shura julgara que fora um senhor pelo grisalho do cabelo, prontamente ele soube que se tratava do pai da recente mãe em questão.

— Olá, papai! - saudou a menina, com um fio de voz, confirmando as suspeitas de Shura; o espanhol notou um certo nervosismo nela. - Chegou cedo...

— Bom dia! - cumprimentou o homem, olhando a filha e fazendo-lhe um aceno de cabeça. - O senhor, quem é? - franzindo o cenho e encarando Shura.

— Sou um amigo de sua filha. Ajudei-a a vir para o hospital... – Shura respondeu um pouco entrecortado, uma vez que não esperava a rispidez da pergunta - Meu nome é Shura Sánchez. - e estirou a mão.

Guilty olhou do rosto moreno para a mão estendida e não correspondeu a saudação. Após um segundo, o espanhol deixou que sua mão caísse, percebendo de imediato o quão autoritário parecia aquele sujeito.

— Como você está? - perguntou o pai, seriamente, dirigindo-se à filha; soltou a mochila que trazia nos ombros.

— Eu estou bem. Um pouco enjoada, mas bem, papai! Estou com anemia, por isso eu tomo sangue. Mas, amanhã, já não precisarei mais e ficarei só com a medicação.

— Que bom... – tornou o pai, entediado - E os bebês? - indagou com desconfiança.

— Nasceram com baixo peso e terão de ficar na incubadora por alguns dias! – respondeu ela.

— Hum... - Guilty fez um som gutural - E você? Vai ficar aí parado com cara de paspalho? Não vê que isso aqui é uma reunião familiar? – retrucou ele voltando-se para Shura, que havia permanecido parado observando a cena.

Shura encolheu os ombros, surpreendido. Esmeralda abriu desmesuradamente os olhos.

— Papai! - repreendeu ela - Ele me ajudou. Não sei o que teria sido de mim se não fosse o senhor Shura!

— Bom, obrigado pelo que fez, mas agora já pode se retirar! - fazendo um gesto impaciente com a mão.

— Mas, papai...

— Não se preocupe! - Shura ergueu uma mão, impedindo que ela se levantasse - Eu volto outra hora. É melhor mesmo que fiquem sozinhos, acho que precisarão conversar!

— Exatamente e você está sobrando, portanto cai fora! - rosnou Guilty, colocando as mãos nos bolsos e fazendo cara de mal humor.

— Eu só queria entregar isso. – disse Shura, retirando a bolsa - É sua e deixou cair dentro do meu carro quando eu a trazia para o hospital! – ele estendeu o objeto para Esmeralda, mas Guilty, com um gesto brusco, arrancou a carteira das mãos do espanhol.

— O que é isso? - perguntou desconfiado, abrindo a bolsa e olhando o conteúdo. - Dinheiro? De quem é este dinheiro?

— Ele é meu, papai. Foi o que pude juntar em Atenas, depois que soube que estava grávida.

— Quanto tem aqui? – tornou o pai.

— Acho que uns dois mil euros, não é muito. Eu estava guardando para comprar algumas coisas... - falou ela com um fio de voz.

— Comprar algumas coisas! - desdenhou Guilty, metendo o dinheiro no bolso e jogando a carteira de volta em cima de Shura - Esse dinheiro é parte do prejuízo que eu tive durante todos estes meses! Vai nos alimentar por uma semana.

Shura relanceou os olhos para homem, indignado e surpreso. Depois, suspirando, sorriu para Esmeralda, que lhe retribuiu o sorriso algo tímida. Por fim, ele saiu do quarto, fechando a porta.

— Não precisava tê-lo tratado tão mal! - disse Esmeralda para o pai, realmente furiosa pelo que houve - Esse homem me salvou a vida, a mim e aos meus filhos!

— Está tendo um caso com ele? Até dinheiro ele te deu. – comentou Guilty, irônico.

— Papai, eu... Esse dinheiro é meu!

— Você é mesmo uma tola! - disse Guilty, dirigindo-se para a porta.

— Aonde vai? - perguntou ela com o semblante preocupado.

— Vou falar com o seu médico e perguntar quanto terei de pagar por toda essa palhaçada! - e dizendo isso, abriu a porta, saiu e voltou a fechá-la atrás de si.

Saiu para os largos corredores do hospital, Shura já não estava por ali. Guilty caminhou e chegou até uma recepção onde uma moça estava sentada, diante de um computador.

— Em que posso ajudá-lo, senhor? - perguntou ela, quando ele se aproximou.

— Quero saber quem foi o médico que atendeu a minha filha, uma garota loira, de dezenove anos, grávida de gêmeos. Ela teve os bebês há dois dias, exatamente na noite de natal!

— Eu sei quem é, a lourinha que chegou junto com o senhor Sánchez. - sorriu a atendente - Quem fez o parto da sua filha foi Giovanni d'Angeri, eu o chamarei para ver se ainda está no hospital, pois creio que ele já está em horário de ir embora. Deseja falar com ele ainda hoje?

— Se for possível!

A moça pegou o telefone e apertou um botão, esperando a resposta. Quando foi atendida, falou sobre a visita e obteve a permissão para deixá-lo passar. Desligou o aparelho e voltou a fitar Guilty com um sorriso.

— Ele irá recebê-lo. O consultório fica no quarto andar, na sala quatro. Pode tomar o elevador e ir, ele está esperando pelo senhor.

— Obrigado! - respondeu Guilty, seco; mas antes de se retirar, indagou - Quem é esse senhor Sánchez que ajudou minha filha?

— É o marido de uma paciente daqui. A mulher dele passou por uma cesariana e está internada!

— Obrigado! – disse, e dando as costas para a atendente, saiu.

Caminhou por um longo corredor, com várias portas numeradas de um lado e de outro. Tomou o elevador, apertou o número “4” e subiu. Saltou no andar correspondente e caminhou até o consultório indicado. Sem bater na porta, abriu-a, relanceando os olhos pelo interior.

Giovanni, naquele momento, sem seu costumeiro traje de médico, levando calças escuras e uma camisa branca formal com as mangas dobradas até os cotovelos, servia-se de um cappuccino na máquina de café. Quando escutou a porta ser aberta, virou o olhar, sem parar o que fazia, para o recém chegado. Abriu um sorriso falso em seu rosto másculo de italiano.

— É o senhor Hernandez? – perguntou com forte sotaque, sentando-se comodamente em sua poltrona, por trás da mesa. - Entre, per piacere, e sente-se. Aceita alguma coisa? Um café, suco, água... - tomando um gole do seu próprio café fumegante e convidativo.

— Não! - respondeu rispidamente o convidado, fechando a porta e dirigindo-se à cadeira que lhe era oferecida, diante da enorme mesa. – Eu apenas queria saber quanto é a conta!

— A conta de quê? - Giovanni franziu o cenho.

— Do hospital! Parto, UTI, enfim, todos os prejuízos que a idiota da minha filha me deu. Não tenho dinheiro, não sou um homem de muitas posses, mas nessas situações temos que arranjar de algum lugar!

Giovanni ergueu uma sobrancelha, a coisa estava saindo melhor do que havia planejado. Pousando sua xícara na mesa, encostou-se no espaldar da cadeira, os dedos no queixo coberto pela barba bem aparada, um semblante pensativo, analítico e calculista. Seus olhos perscrutaram toda a figura de Guilty.

— O senhor não precisa se preocupar, não há qualquer conta! Era meu plantão o dia em que seus netos nasceram. Eu fiz o meu trabalho e sua filha foi posta na ala da enfermaria. A UTI neonatal, confesso que é particular, mas não precisa se preocupar, isso pode ficar por minha conta.

— Por sua conta? – Guilty estreitou os olhos em cima do médico - Pelo menos isso. - grunhiu Guilty - Criança já começa a dar trabalho para nascer. Por quanto tempo esses bebês ainda terão que ficar aqui?

— Ainda não sabemos ao certo. Sua filha está com anemia, mas ficará bem. As crianças nasceram perfeitas, com certeza poderão sair junto com a mãe, apesar da menina ainda ser uma dúvida, talvez precise de mais tempo internada... – comentava o médico, com uma voz calma e dando goles no café.

— Ainda terei de gastar com remédio... – Guilty balançou a cabeça negativamente.

— O senhor não parece muito satisfeito com o nascimento dos seus netos... - disse o médico. - Eu posso notar que não se dá muito bem com a sua jovem filha...

— É uma estúpida. A única coisa que conseguiu, em sua maldita vida, foi emprenhar de um cara que eu nem sei de que buraco saiu! E ainda por cima de gêmeos! - o homem gesticulava com ferocidade, extravasando a sua ira - Eu queria mais era que essas crianças morressem, seriam menos um problema na minha vida...

— Sei... - refletia o obstetra, alisando o queixo - Mas não devia falar assim, senhor. Seus netos não têm culpa...

— Você pode estar achando que eu sou um monstro, não é mesmo? Mas eu não sou o que você pensa. Olhe para mim! - e abriu os braços - Sou um velho, aposentado, doente, com uma filha desmiolada que joga uma oportunidade pela janela, que ficará em minha casa vivendo do meu dinheiro e para completar, ainda terei de aguentar dois bebês e um deles menina, para terminar de acabar comigo quando crescer.

Giovanni levantou-se por um instante, deu alguns passos pela sala, pensativo. Depois, pegando a carteira de cigarro, puxando um fumo com os dentes, travando do isqueiro, acendeu o cigarro e deu uma relaxada tragada, deixando que a fumaça saísse lenta. Guilty franziu o cenho ao ver um médico fumando displicentemente dentro de sua sala particular, em um hospital. Mas o médico não parecia preocupado com o semblante surpreso do convidado.

— Como o senhor viu a sua filha, senhor Hernandez? - perguntou Giovanni de repente, após alguns minutos de silêncio, com um tom sarcástico e um olhar cruel.

— Viva, infelizmente! - suspirou Guilty, sem perceber o semblante interessado do médico.

— Pois, o senhor sabia que eu já ajudei a muitos pais que sofriam da mesma infelicidade? - disparou o médico.

Guilty franziu o cenho, olhando-o com desconfiança.

— Do que você está falando? Seja claro, eu não gosto de meias palavras. – retrucou Guilty.

— Eu notei que o senhor é um homem direto e por isso eu também serei. - Giovani sentou-se direito em sua poltrona, encarando seu visitante dentro dos seus profundos olhos castanhos - Eu tenho uma proposta que o senhor não poderá recusar. Se o senhor aceitá-la, ficará livre de sua filha e de seus netos para sempre e de uma só vez. E ainda poderá ganhar uma generosa mesada. Então, o que me diz?

— Explique-se, doutor, e eu direi se a aceito ou não! - respondeu Guilty, acomodando-se melhor em sua cadeira, interessado no que o médico tinha para lhe contar.

o.O.o Aeroporto Internacional de Londres o.O.o

Era a quinta vez que ele olhava o relógio. Depois de horas de atraso, esperando que o avião que o levaria à América passasse por uma última revisão devido a um problema na fuselagem, finalmente a companhia resolveu trocar todos os voos e eles embarcariam sem demora no próximo avião com destino a Massachusetts, onde teria uma importante reunião de negócios antes e depois do ano novo, festa essa que passaria em casa de um dos sócios do seu pai, o irmão do reitor da Universidade de Havard.

Ao seu lado, entusiasmada mas já algo entediada pela espera, Emma ocupava-se de ajeitar os cabelos, as roupas, olhava-se no pequeno espelho que levara consigo e vez ou outra corria ao banheiro para retocar a maquiagem. As malas já haviam sido despachadas e os dois já haviam feito corretamente o novo check in. Mas a cada vez que a garota retirava o batom e passava, o jovem loiro, quase rosnando pela sua maré de má sorte, tinha vontade de deixá-la ali, plantada, e desaparecer da cidade, do país, quem sabe até do planeta.

— Quando embarcaremos, meu amor? Estou com sono, cansada, com sede, preciso de um Martini imediatamente e também do delicioso caviar que eles servem na primeira classe. - disse ela, fechando os olhos de satisfação - Há horas que esperamos esse avião idiota. É um crime que pessoas como nós devam ficar aqui, paradas, como as outras pessoas comuns.

— Emma, cala a boca e fica quieta um instante que seja! - pediu Radamanthys, entredentes, com vontade de esmurrá-la. A espera o estava estressando. - E já chega de retocar este batom idiota, eu já não suporto mais! – completou ríspido, tomando, com violência, o doméstico da mão dela.

— Devolve-me o batom, ele é meu! - pediu ela, como uma criança pedindo chocolate, com as mãos na cintura - Vamos, não seja mal, devolve, sabe que não consigo ficar sem minha maquiagem!

— Será que só pensa nisso? - ele atirou o artefato em cima dela, agressivo - Sua cabeça é tão medíocre que deve ser dividida em quatro áreas: salão de beleza, shopping, fofoca e moda. Não sei onde eu estava com a cabeça quando decidi pedi-la em noivado!

— Eu não só penso nisso. - disse ela, insinuando-se - Também penso em você! - e o abraçou.

Ela levava calça jeans, botas até os joelhos e um sobretudo negro bastante caro. Ele, sem as roupas formais, levava um casaco grosso, de marca, também negro. Quando ela enlaçou seu pescoço, Radamanthys sentiu-se ferver. Segurando-a, tirou aqueles braços de seu pescoço e a afastou, como se tivesse asco.

— O que houve? - ela estranhou, fazendo o sorriso desaparecer - Não quer que o abrace?

— Um abraço é o que menos preciso neste momento, Emma, ainda mais seu! O que quero é embarcar, sentar, beber e dormir! - disse ele, sem olhá-la.

— Pensei que você gostasse quando eu fazia isso... - o tom dela era entristecido, mas ele não se deu conta. - Você nunca me tratou assim antes.

— Pois, está na hora de tratá-la como merece, e não, eu nunca gostei quando você resolve se comportar como uma menina mimada. Não gosto da tua futilidade, da tua mediocridade, da tua burrice, isso me dá náuseas.

Sem que ele esperasse, Emma esbofeteou-o no rosto, fortemente, fazendo outros passageiros próximos voltarem-se para observar a cena.

— Você não tem o direito de falar assim comigo! - ela lhe apontou um dedo de forma ameaçadora.

Emma sentiu as lágrimas queimarem seus olhos, seus belos olhos azuis de inglesa. Mas as lágrimas teimavam em não sair. Radamanthys estava eufórico, furioso, irritado, e despejara nela toda a sua raiva, arrogância e desprezo. E quando notou os olhos femininos cheios de água, sua fúria cresceu ainda mais e já não pôde se controlar.

— Eu falo com você como eu quero! Você é só uma cachorrinha de luxo que eu adquiri e da qual posso me livrar na hora em que eu quiser. E se por acaso não gosta de ouvir as verdades, pode ir embora daqui. Eu embarco sozinho e não preciso mais ver a sua cara!

Dizendo isso, encarou-a, ríspido. As lágrimas desciam pelo rosto branco da jovem. Radamanthys enterneceu-se. Havia-a culpado pelo atraso, pelos seus problemas pessoais, pela sua fraqueza, pela sua vida frustrada ao longo daqueles anos. Há três anos não estava bem, há três anos não dormia de noite, há três anos... Emma o encarou, resoluta, ferida, magoada e com um impulso, saiu correndo da sala de embarque e desapareceu nos corredores do aeroporto.

— Mas que merda! - rosnou ele - Emma, espera!

Resolveu ir atrás dela, já estava quase na hora do embarque e se perdesse o voo, aí sim, ele ficaria furiosamente irritado de verdade. Conhecendo-a bem, sabia que a encontraria no banheiro feminino. Olhando ao redor, certificando-se que não havia empecilho, aproximou-se da porta e a entreabriu.

— Emma, vamos conversar. - chamou ele, com a voz mais tranquila, tentando não chamar a atenção de ninguém. - Eu sei que você está aí dentro, paremos com infantilidades. Saia desse banheiro e vamos falar como adultos.

— Vai embora! - respondeu ela pela primeira vez, a voz embargada, estava chorando. - Eu não quero mais ver você, Radamanthys McKenitt!

— Não, você não quer isso, eu sei. Vamos, eu peço desculpas, mas não me faça perder este voo. Já estamos em cima da hora! - olhando o relógio com impaciência – Você vai querer perder as compras em Nova York? - sem receber resposta, suspirou - Bem, você é quem sabe. Eu estou indo, adeus!

E bateu a porta com força, para que ela escutasse. Deu as costas, olhou o relógio e contou os segundos. Mal havia dado três passos, a porta do banheiro voltou a abrir-se, havia sido mais rápido do que ele imaginara. Ele sorriu, cínico, tornando-se sério antes de se virar para ela. Emma estava com os olhos vermelhos. Saiu do banheiro, fechou a porta e caminhou até ele.

— Você me ofendeu! – ela disse – E eu não gostei disso, não mesmo!

— Desculpe... - pediu ele com profundo arrependimento; beijou-a nos lábios e disse - Agora, nós podemos ir?

— E minha maquiagem? Você me fez borrar todo o delineador, eu não posso sair assim!

Radamanthys, revirando os olhos ao teto, respirou fundo, fechando os orbes e concordando de cabeça em que ela fosse ajeitar-se. A moça sorriu, deu-lhe um rápido beijo nos lábios e voltou a entrar no banheiro.

— Seja rápida! - gritou-lhe o noivo, antes que ela fechasse a porta.

Por fim, embarcaram. Acomodaram-se em suas poltronas e recostaram-se. A decolagem foi tranquila e logo os passageiros estavam colocando tapa olhos para dormir, uma vez que estavam levantando voo ás onze da manhã, depois de quase oito horas de espera. Emma pôs sua máscara e recostou-se mais comodamente, deitando sua cadeira. Radamanthys suspirou, aliviado. Ao menos não teria de escutá-la pelas próximas quatro horas, pelo menos.

— Seu whisky, sir! - disse a aeromoça.

Radamanthys pegou o copo e sorveu um gole do líquido escocês, puro, sem gelo, como gostava. Acomodou-se na poltrona e tirando um livro, abriu, a fim de se distrair um pouco. Mas não contava com o que encontrou entre as páginas. Aquele livro, de fato, não o abria havia já três anos. Fora ela quem lhe dera, alguns dias antes do aniversário dele, alguns dias antes que ela mesma lhe desse também aquela notícia fatídica.

Havia uma foto, que ele lembrava bem, havia sido tirada naquele mesmo dia. Havia sido um dia perfeito. Estava frio, eles estavam bem agasalhados. A foto tinha sido batida muito próxima, de modo que somente era visível do tórax para cima, mas estava realmente perfeita. Ambos sorriam, ele a abraçava por trás e ela repousava a cabeça em seu peito. Era um casal feliz e apaixonado. Eles tinham tudo para terem vivido a mais linda história de amor.

Radamanthys fechou o livro e deu atenção à fotografia. Quando ele soubera que teria de ir aos EUA, havia sentido o sangue gelar. Não sabia se estava preparado para se encontrar com ela, caso se topassem por alguma das esquinas da cidade. Mas, ao mesmo tempo, desejava esse encontro. Tinha medo, mas o queria. E recostando-se no seu assento, acariciou o rosto pálido da jovem, que parecia tão doce naquele dia inesquecível.

o.O.o Grécia o.O.o

Shura entrou no quarto correspondente à sua esposa com uma pequena bandeja do refeitório principal do hospital. Havia uma taça de chocolate quente e algumas torradas. Melina sorriu ao vê-lo entrar e sentou-se melhor na sua cama hospitalar. Os lindos e longos cabelos negros, lisos e sedosos, estavam espalhados, bem penteados e ela já possuía um semblante sereno e calmo, ainda que entristecido, mas já com ares de superação.

— Como você dormiu? - perguntou o marido, entrando e fechando a porta - É a primeira vez, desde que nos casamos, que a vejo dormir por tantas horas seguidas.

— Segunda! - corrigiu ela, aceitando a bandeja que ele lhe oferecia - Na nossa lua de mel, nós dormimos por dezessete horas, lembra-se?

— Estávamos bêbados, Melina, isso não conta. Falo de quando estamos nosso estado dito normal... - ele respondeu com cinismo. – Eu ainda não acredito que bebi daquela maneira naquela noite... – ele sentiu-se avermelhar pela lembrança.

— Eu me recordo bem, a festa tinha sido tão linda, todos os nossos amigos, familiares. Você tomou sangria como se fosse água! - ela sorveu um gole do chocolate. - Sinto falta dessa época. Eu ueria poder casar de novo, Shura.

— Você fala como se fôssemos dois velhos e isso tivesse acontecido há trinta anos. Faz somente três anos que nos casamos. - ele puxou uma cadeira e sentou-se ao lado da cama - E eu não estava tão bêbado assim...

— Não? - ela ergueu uma sobrancelha - Shura, você me perguntou se eu era solteira!

Ele arqueou uma sobrancelha, enquanto ela sorria do embaraço dele. Era assim que ele gostava de vê-la: alegre, sorridente, sentindo e distribuindo felicidade. Essa era a sua mulher, sua andaluza! Houve um silêncio enquanto a bela sevilhana comia seu café da manhã, que poderia ser o almoço, visto já estar próximo ao meio dia. Shura suspirou de repente, relembrando o horrível homem no quarto de sua nova amiga.

— O que foi? - perguntou Melina, olhando-o - Parece preocupado. Alguma coisa com o trabalho?

— Não, não é nada. - olharam-se; Melina o conhecia bastante bem para saber que algo não estava direito - Bom, aconteceu alguma coisa. Lembra da garota que eu te falei, a qual ajudei no dia de natal?

— A menina que deu à luz aos gêmeos, sim, eu lembro. O que tem ela? - Melina franziu o cenho, prestando atenção.

— Fui ao seu quarto saber como estava e devolver a bolsa que ela havia esquecido no carro. Mas eu terminei conhecendo o pai dela! - Shura sorriu cínico - Poderia dizer que mais parecia um carrasco! Tratou-a muito mal e ainda teve a coragem de lhe tirar o pouco dinheiro que ela havia juntado, dizendo que era pelas despesas que ele tivera até aqui!

— Não posso acreditar! - Melina tornou-se séria - Que pai faz uma coisa assim com uma filha que acabou de passar por um parto?

— Um pai realmente não faria, mas esse sujeito... - ele fitou o nada - Ela teve um casal de gêmeos e um dos bebês é uma menina, eu soube hoje...

Melina sorriu, mas Shura pôde notar a expressão de melancolia no rosto da esposa. Não que Melina não estivesse feliz pela garota em questão, mas ainda lhe doía ver que todas as mulheres ao seu redor podiam gerar seus filhos saudavelmente e a ela isso lhe era negado. Era injusto. De repente, ela virou-se para o marido e disparou.

— Eu aceito sua proposta!

— Que proposta? - Shura encarou-a, pego de surpresa.

— Quero que adotemos uma criança, mas eu quero que seja uma menina.

— Melina, você sabe que não substituirá a filha que perdemos! - ele a olhou com bastante cuidado.

— Eu sei, mas quero poder fazer tudo que sonhei um dia... Vesti-la de cor de rosa, encher de lacinho, comprar um monte de bonecas, vê-la fazer balé e quero poder chamá-la pelo nome que havíamos escolhido: Isabela.

O marido sorriu, e levantando-se, beijou-a nos cabelos.

— Primeiro, nos preocupemos que você saia daqui. Logo, nós pensaremos sobre isso. Na Espanha, há muitas meninas esperando por um lar, não será difícil encontrarmos uma. Teremos tempo de nos organizarmos antes de voltarmos para Madrid.

— Voltaremos para a Madrid? - indagou a mulher, completamente surpresa com a notícia – Você não tinha dito nada.

— Era o que você mais queria, voltar ao nosso país. Pois bem, se temos que adotar uma filha, quero que ela seja espanhola, criada dentro da nossa cultura e falando a nossa língua, não uma língua estrangeira. – completou Shura.

— No. - Melina foi taxativa, sobressaltando-se - Não quero que ninguém saiba que perdi outro filho. Não quero mais ouvir os comentários nem ver as caras de compaixão, Shura. Quero sair da Grécia com minha filha nos braços, não quero que ninguém saiba que ela é adotada. Por favor, mi amor.

— Mas, Melina...

— Não discuta comigo. - pediu ela - É a última coisa que peço. Adotemos uma menina aqui e voltemos para Madrid de cabeça erguida, por favor.

— Se você quer assim, assim será!

Melina sorriu, e estendendo a mão para o marido, chamou-o. Ele aceitou, segurou a mão feminina, foi até ela e tudo terminou com um longo beijo.

o.O.o Estados Unidos o.O.o

As duas garotas corriam apressadamente pelos jardins cobertos de neve da universidade de Havard. Pandora levava um cappuccino em uma mão e sua bolsa pendurada ao ombro. Os livros de genética estavam bem presos em seu outro braço. Estava de calças jeans, botas e um sobretudo, e o cachecol grosso em volta do pescoço.

A outra moça, com os cabelos soltos ao vento frio, estava igualmente vestida, mas sem cachecol, e olhava o relógio repetidamente, amaldiçoando-se por mais um atraso na aula daquele professor idiota! Segurava um café puro e uma bolsinha com um sanduiche. Não havia comido nada e estavam absurdamente atrasadas para o exame final.

Chegaram diante da sala de aula de numeração 305 e abriram a porta. Pandora, ainda arfando, foi a primeira a dar as caras, recebendo os olhares de todos os seus colegas que, de imediato, levantaram as cabeças do difícil teste para prestar atenção às duas recém chegadas. Ela sorriu sem jeito.

— Desculpe, professor Camus Dousseau, nós ainda poderíamos entrar? - perguntou Pandora, quando o professor, com um semblante seco, sério e frio, a olhou por cima de seus óculos de leitura - Estávamos na biblioteca e perdemos a hora!

— Não me interessa as suas desculpas, senhorita Heinstein, somente o fato de que esse exame é o último que farão antes do recesso e não haverá outra oportunidade de recuperá-lo. – disse Camus, com a entonação severa, porém calma.

Shina estava visível atrás da amiga e o professor apertou a visão na direção dela.

— Vejo que não está sozinha. - volveu o professor - É a quinta vez, só nesta semana, que a senhorita Marchiggiani chega quarenta minutos atrasada!

— Ora, professor, não sabia que meus atrasos eram assim, tão importantes, a ponto do senhor contar os minutos! – falou Shina, cínica, enquanto as duas amigas entravam na sala. - Isso me lisonjeia!

— Não se dê aires de notabilidade, “signorina”... - Camus retrucou sarcástico, falando no idioma dela com seu forte sotaque francês - É normal que um professor sempre lembre dos seus desafetos.

— Principalmente se o desafeto for gostoso como ela. - comentou um rapaz da turma, para riso geral.

Camus ficou visivelmente vermelho enquanto Shina sorria com orgulho.

— Entrem as duas, tomem seus lugares e fiquem quietas. - retificou Camus, sem perder sua calma calculada que estressava Shina, e ele sabia.

As duas garotas entraram, fecharam a porta, passaram pela mesa a fim de pegar as folhas que ele estendia e ir para seus devidos assentos. Pandora agarrou o exame e foi sentar-se rapidamente, mas quando Shina tentou fazer o mesmo, segurando o exame, o professor não o soltou, fazendo com que a italiana o olhasse, confusa.

— Não entendo por que corre tanto para fazer esta prova se sabe que não aprovará a matéria. - disse Camus, olhando-a entre o sério e o sarcástico.

— O senhor, por acaso, além de engomadinho é vidente? - cínica - Sou a melhor aluna em sua matéria, e se não me aprova, será por pura má vontade e isso não é justo!

— Não esqueça das nossas posições, mademoiselle: eu sou o professor e você a estudante; eu mando, você obedece. Essa é a minha matéria e minha classe, eu decido o que é justo aqui, não você. Agora vá se sentar.

— Mas isso é muito... - ela ia explodir. Mas Camus levantou um dedo, impedindo-a.

— E calada!

A garota agarrou a prova como se apertasse o pescoço do professor e caminhou até o seu lugar como se fosse para a cadeira elétrica. Pandora, de cabeça baixa, levantou os olhos para a amiga que sentara ao seu lado. Tinha um sorrisinho irônico no rosto.

— É impressão minha ou você está flertando com o professor Camus? – indagou Pandora em um murmúrio.

— O que? - Shina gritara algo alto demais, fazendo alguns colegas, e também o professor, encará-las. - Desculpem! - disse sem jeito, encolhendo-se. - Você ficou louca? - disse para Pandora com um fio de voz - Como posso flertar com ele se eu o odeio?

— Por um momento, não foi isso o que senti! – completou Pandora.

— Cala a boca! – rebateu Shina, enraivecida.

— Senhorita Marchiggiani... - chamou o professor, com cara de poucos amigos - Se falar mais uma palavra, em vez do C-, que tão merecidamente levará, ou colocarei um E, ou seja, a senhorita me estará devendo pontos para um próximo exame, o que não permitirá passar para o próximo semestre.

Shina bufou, ficou vermelha, quase o fulminou com o olhar e terminou por partir sua caneta ao meio, de tanta raiva. Pandora sorriu, já imaginando onde terminaria aquela disputa.

o.O.o.O.o

- ...E por isso passaremos todos aqui. - concluía Milo, andando ao lado de um taciturno amigo.

O grego de cabelos e olhos azuis franziu o cenho, não recebendo qualquer resposta de seu interlocutor. Caminhavam lado a lado até o prédio onde estavam as baterias de classes D e E, onde teriam um seminário sobre a mecânica dos átomos. Ambos seguravam livros e suas devidas mochilas penduradas ao ombro.

— Ikki, você me escutou? - perguntou Milo, olhando-o com atenção. Mas este não respondeu, parecia perdido no mundo da lua. - Ikki, roubaram nossas bicicletas! - arriscou.

— Certo... - resmungou o outro, alheio a tudo.

— Tudo bem, você não escutou. Amamiya, terra chamando!

— Falou comigo? - subitamente Ikki sobressaltou-se e olhou para o amigo, como se tivesse voltado de um sonho. - Desculpe, estou em outra dimensão... - apertou o canto interno dos olhos com os dedos. - Não estou bem.

— Notei. Há dez minutos eu falava sobre os planos de passarmos o ano novo todos juntos, com as garotas, e você aí, pensando na morte da bezerra! Está cansado?

— Não, não é cansaço, é preocupação. Ainda não consegui falar com minha noiva, acredita?  Há dias que não tenho notícias dela, o celular só dá fora de área agora, não sei o que está passando.

— Será que ela não mudou o celular? - perguntou Milo, dando de ombros.

— Ela teria me avisado.

— Não tem outro telefone com o qual possa se comunicar com ela? - perguntou Milo, com tom óbvio.

— Tem Eiri, a companheira de apartamento dela. Sabe que você me deu uma ideia?  Não tinha pensado nela, vivem juntas em Atenas. Vou ligar para Eiri imediatamente.

Disse, fazendo menção de se afastar. Haviam entrado no prédio.

— Você quer que eu o espere?

— Não, Milo, vá na frente, eu já te alcanço. - disse Ikki e entrou por um corredor mais tranquilo. - Acho que tenho o celular de Eiri no meu. Eu tenho certeza que Esmeralda o pôs para o caso de alguma emergência.

Retirou o celular e buscou, na agenda, o referido nome. Achou-o, abrindo um sorriso de satisfação. Como não havia pensado antes? Discou o número e esperou. Do outro lado da linha, uma voz o atendeu.

— Sim? – Eiri tentou falar, escovando os dentes. De repente, ela parou o que estava fazendo, surpresa ao escutar o nome. - Ikki Amamiya? É você mesmo? Espera um minuto, vou lavar a boca!

Cuspiu a pasta, lavou a boca, guardou a escova e voltou ao celular.

— Desculpe, você me pegou no meio da escovação... - sorriu ela.

— Eu quem peço desculpas pelo incômodo, Eiri, mas precisava falar com você.

— Comigo? - ela estranhou - Tem certeza? Não está se confundindo de loira?  - ela brincou.

— Não, e é sobre a outra loira a razão pela qual liguei para você. Por acaso, ela não está por aí, queria falar com ela.

— Esmeralda?  - Eiri gaguejou - Não, Ikki, ela viajou mais cedo para casa. Você sabe, aqui já estamos de férias e ela foi semana passada.

— Que estranho! E você não sabe dizer se ela está com algum problema, se talvez ela tenha mudado o número do celular, ou algo assim...

— Não, Ikki, não sei dizer. Faz alguns dias que não falo com ela, mas acho que se ela tivesse mudado, ela teria nos avisado, com certeza.

— É o que eu também acho, mas há três dias que não consigo localizá-la. Nada! Só dá fora de área. Por isso, pensei que, bem, talvez...

— Talvez ela tenha perdido, ou talvez tenha sido roubada... enfim, uma porção de possibilidades. - Eiri sorriu, nervosa - Eu vou tentar me comunicar com ela, qualquer coisa eu mando uma mensagem para você, avisando. Esse número que você me ligou é o seu?

— Sim. Por favor, Eiri, não deixe de avisar, seja sim ou não. - pediu Ikki, preocupado - Você teria o telefone fixo dela? - perguntou de repente.

— Tenho sim, você o quer?

— Por favor.

Eiri abriu um caderninho em cima da mesa e ditou o telefone a Ikki, que anotava mentalmente para depois passá-lo ao seu celular.

— Bom, desculpa por qualquer coisa, Eiri, eu vou indo agora. Obrigado.

— De nada, tchau... - Eiri apagou o celular.

Realmente, fazia três dias que havia falado com Esmeralda, fora no dia de natal, quando ela chamara para lhe desejar felizes festas. Eiri ficou curiosa, mas deu de ombros. Se tivesse passando alguma coisa, Esmeralda teria lhe avisado de alguma forma. Começou a tirar a roupa e entrou no banho.

Ikki guardou o aparelho no bolso da calça e suspirando, encaminhou-se à sala onde deveria assistir a palestra, pois era importante e não poderia perdê-la. Abriu a porta e buscou Milo com o olhar. Este lhe fez um aceno e Ikki caminhou até ali, onde o companheiro lhe havia reservado um assento. Estava lotado.

— Conseguiu alguma coisa? - perguntou Milo, falando baixo.

— Nada. Ela já foi para casa, já estão de férias, mas consegui o telefone fixo. Quando sairmos daqui, eu vou chamá-la.

Ambos silenciaram e tentaram prestar atenção no que estava sendo dito. Ao final do seminário, após uma longa e enfadonha hora e meia sentados, os dois amigos se levantaram e buscaram passagem entre a montanha de gente que também se encaminhava para a porta de saída. Alguns estudantes preferiam fazer autografar seus livros com o professor convidado, um dos grandes especialistas no assunto exposto.

Ikki e Milo saíram finalmente para os corredores da universidade. Ganhando o ar puro do exterior, onde um vento frio soprava, encontraram Aiolia, que saía do prédio vizinho onde tinha prestado exame de cálculo experimental. O jovem loiro aproximou-se dos companheiros e se cumprimentaram jovialmente. Foi Ikki que, retirando o celular do bolso, afastou-se, gritando ao longe para os amigos.

— Encontro com vocês no refeitório, não demoro. Preciso fazer isso, é urgente.

— Do que ele está falando? O que precisa fazer de tão urgente? - indagou Aiolia, quando ele e Milo começaram a caminhar na direção do prédio onde estava o restaurante mais próximo - Amamiya anda com muitos segredos, muitos presságios, parece até a minha mãe. – retrucou Aiolia.

— Ainda não conseguiu falar com a noiva e isso o tem deixado uma pilha, está simplesmente omisso a tudo. Não presta mais atenção ás aulas, não come, enfim... Ou essa tal Esmeralda dá sinal de vida, ou ele é capaz de tomar um avião e voltar para Atenas. - suspirou Milo - É por isso que eu não me amarro. Mulher é um bicho muito complicado.

— Sabe o que eu acho? - Aiolia olhava adiante, perdido em conjecturas - Não comenta com ele, mas isso está me parecendo traição.

— Traição? Acha que ela pode estar com outro? De verdade pensa isso, Aiolia? - Milo sorriu cínico.

— Por que não? Ela está sozinha, pode ser que tivesse algum pretendente que resolveu aproveitar a oportunidade que Ikki lhe deu, saindo do país. Pelo menos, é possível, não é? Mas não quero comentar nada, não quero ser o portador de más notícias. Mas se a Marin me aprontasse uma dessas, o que eu iria pensar? O que você iria pensar?

— Não sei... - respondeu Milo, ajeitando a mochila nas costas - Não conheço a garota para saber o que ela seria capaz de fazer; ele, sim. Mas, eu confesso, é uma possibilidade bastante plausível. Eu, por exemplo, quando quero cortar alguma mina, não atendo as suas chamadas.

— Pois é. Mas esperemos, certamente irá saltar alguma coisa desse mato.

E entraram pela porta principal do refeitório, buscando uma mesa entre todos os estudantes que se amontoavam para se alimentarem.

Ikki havia se afastado um pouco, para uma área mais calma, com menos ou quase nenhuma pessoa. Discou o número solicitado e esperou. Chamou uma, duas, três, diversas vezes, mas a ligação terminou caindo e ninguém o atendeu. Voltou a discar, esperou e nada. Uma terceira, uma quarta, uma quinta vez, e a mesma coisa voltava a suceder. Chamava, chamava e caía a ligação sem que ninguém tirasse o aparelho do gancho. Não era possível!

— Mas que droga, Esmeralda! - irritou-se, estava visivelmente preocupado e transtornado – Mas, o que diabos está acontecendo? Por que não atende o celular?

E furioso, chutou com raiva uma lata de lixo, fazendo-a voar longe. Algumas pessoas o olharam, mas por estar em um lugar afastado, para sua sorte não havia nenhum policial por ali. Passou as mãos nos cabelos, nervoso, discou mais uma vez, outra vez, uma terceira, e nada, nenhum sinal. Era como se ela houvesse, simplesmente, evaporado. Terminou desistindo. Tinha fome, frio, decidiu esperar e tentar mais tarde. Com certeza, em algum momento, ele receberia uma resposta.

Saiu caminhando rápido, quase correndo, na direção que haviam tomado seus amigos. Entrando no edifício, dirigiu-se à ala de alimentação e os buscou, acomodando-se por sua vez na mesa em que eles estavam, já degustando de um delicioso prato de sopa.

o.O.o Aeroporto Internacional de Boston, MA - USA o.O.o

19:30 Horário dos EUA

Após quase oito horas de viagem, em um voo direto, saído com um atraso de quase sete horas, finalmente ele havia chegado ao seu destino. Estava em solo americano, na capital do belo estado de Massachusetts, localizado na região da Nova Inglaterra, a primeira área a ser colonizada pelos britânicos.

De certo modo, ele poderia sentir-se em casa. Desceram do avião, cansados e sonolentos. Havia sido um voo longo e exaustivo e a única coisa que ele tinha em mente era tomar um bom banho, comer uma boa janta e dormir em uma boa cama. Nada mais.

Ao seu lado, ainda bocejando, Emma tentava se recompor. Suas roupas se haviam amassado um pouco pelo excesso de horas sentada. Odiava ter de voar, ainda que o fizesse na primeira classe. Simplesmente não suportava o cheiro do avião ou o fato de não ter muito o que fazer, apesar das dezenas de filmes que viu nas oito horas em que estava lá em cima. Pendurou-se no ombro do noivo enquanto esperavam as bagagens.

— Quase oito horas da noite... - comentou Radamanthys, olhando o relógio - Espero que eu não durma em cima dos papéis. Tenho uma reunião importante, amanhã ás sete horas, e não contava em chegar tão tarde da noite.

— Relaxa, meu amor, estamos na América. Aqui, tudo é permitido, tudo é diversão... - disse ela, no ouvido dele, com voz insinuante. - Sinto muito, mas esta noite trabalhar é o que o senhor menos irá fazer, my dear. No laptop, ao menos, não!

Ele suspirou, encarando-a com um profundo tédio. Depois voltou sua atenção para a esteira rolante que trazia as malas dos passageiros. Após assegurarem-se das suas, ambos se encaminharam para a parte de imigração a fim de apresentar os devidos documentos e vistos. Recebendo o carimbo de permissão, saíram para o aeroporto e a vida dentro dele, que borbulhava como um redemoinho de gente.

Haviam pegado um carrinho para pôr as malas e assim melhor transportá-las até um táxi. Emma parecia encantada, olhava tudo ao redor e sorria, como uma estudante na sua festa de quinze anos. Ele, sério, taciturno, um semblante algo feroz no rosto, só pensava em sair dali e fechar os olhos por toda noite.

— Emma, você seria capaz de caminhar um pouco mais depressa? - advertiu ele, quando ela diminuiu o passo para observar uma vitrine - Tenho muito trabalho a fazer antes de poder deitar minha cabeça em um travesseiro e pregar os olhos!

— Nossa, querido, você está tão mal humorado desde que soube que teria de vir aos EUA. Até parece que aqui existe algo que o deixa transtornado, cruzes. - rebateu ela, correndo para alcançá-lo - É a primeira vez que venho aqui, quero viver tudo, ver tudo...

— Poderá ver, viver e morrer, se quiser, mas deixe para fazer isso quando estiver sozinha, sem a minha presença. Sabe que eu odeio correr atrás de você dentro de um shopping.

— Será melhor mesmo, assim poderei provar todos os vestidos que eu encontrar... - disse ela, saltitante.

Saíram pelas portas principais e aproximaram-se de um táxi. Rapidamente o motorista os atendeu, pôs as bagagens no porta malas e ambos passageiros entraram no carro, no banco traseiro. O motorista entrou por sua vez e olhando-os pelo espelho retrovisor, perguntou:

— Aonde devo levá-los, senhor?

— Ao hotel Boston Harbor. - disse Radamanthys, abrindo seu laptop e ligando-o. - É longe daqui?

— Não, senhor, está próximo do aeroporto, no bairro de Quincy Markt. - respondeu o motorista, com um sotaque meio espanholizado, dando a partida e ganhando as largas avenidas.

— Quanto tempo mais ou menos até lá? - perguntou o inglês, olhando o relógio.

— Uns 15 minutos, dependendo do tráfego.

— Dou-lhe uma boa comissão se fizer o percurso em dez minutos, o que me diz? – tornou o inglês, muito sério.

— Conheço uns atalhos, poderemos driblar alguns semáforos e cortar algumas avenidas mais movimentadas, saindo pela... – disse o taxista, animado em receber um bom dinheiro.

— Ótimo! - o jovem não o deixou terminar, fechando seu computador portátil – Agora, cale-se e dirija.

— Yes, sir... - disse o motorista, sem jeito.

A viagem transcorreu tranquila. Quando estavam quase chegando, o motorista, que através do espelho buscava estudar seu passageiro arrogante, perguntou, como que para quebrar o silêncio e puxar um assunto qualquer.

— São turistas? Boston é uma bela cidade. Eu vivo aqui há dezoito anos, trabalhando como taxista. Posso lhes mostrar alguns pontos principais de atração...

— Não somos turistas! - disse o outro, secamente. Emma havia dormido em seu ombro.

— Devia ter percebido antes. - o homem gordo sorriu - O senhor tem cara de empresário. Está aqui a trabalho, não é?

— Está fazendo muita pergunta e está sendo indiscreto. E eu estou me irritando de verdade! - contestou Radamanthys, com um fio de voz ameaçador e uma tranquilidade na fala.

— I'm sorry, sir.

O trajeto prosseguiu em silêncio e, após alguns minutos, chegaram ao destino. Radamanthys e Emma desceram do carro, pegaram suas coisas, pagaram o preço devido e entraram no lobby do hotel. Era esplendoroso, um verdadeiro castelo moderno. Os olhos da garota abriam-se e fechavam-se de espanto e surpresa.

— Meu Deus, nunca imaginei que tantas maravilhas pudessem estar juntas em um só lugar! - exclamava, enquanto caminhava ao lado do noivo na direção do balcão.

— Pois não, senhor? - um empregado veio atendê-lo.

— Uma reserva em nome de McKenitt, feita no dia doze de dezembro do presente ano. - retirando um papel do bolso - Já está tudo pago e espero que as minhas exigências, pedidas de antemão, tenham sido devidamente obedecidas.

— Com toda certeza, senhor. - respondeu o outro, confirmando a reserva no computador e entregando-lhe o cartão - A suíte presidencial está detalhadamente arranjada para recebê-lo. Toalhas de cor negra e whisky escocês doze anos. Espero que disfrutem de suas estadias aqui em Boston. - sorriu amavelmente; mas Radamanthys ignorou-o completamente.

O jovem inglês agarrou o cartão com um semblante sério, deu as costas ao recepcionista e subiu, acompanhado da noiva. No elevador, Emma, encostada no espelho, perguntou:

— Que exigências foram estas que você fez e que espera que sejam vitalmente atendidas?

— Você as verá. Espero que tenha a delicadeza de não comentar isso com ninguém.

Ela ergueu uma sobrancelha e saíram do elevador no trigésimo andar. Somente um quarto estava naquele piso e este quarto pertencia a ele, a suíte presidencial, o que havia de mais sofisticado e luxuoso dentro de um hotel cinco estrelas. Radamanthys passou o cartão e abriu a porta, entrando no suntuoso ambiente.

Emma fez o mesmo, e mal havia cruzado a porta de entrada, parou, os olhos arregalados na direção do imenso gradeado de ferro que cercava toda varanda.

— O que é isso? – perguntou ela, apontando naquela direção.

— Essa é a minha exigência... - disse o jovem, irritado por ter de revelar à noiva seu maior segredo – Eu tenho medo de altura.

— Se tem medo de altura, por que escolheu a suíte presidencial?

— Porque é a melhor e já deixemos de conversa. Vai tomar banho para que desçamos para jantar. Eu estou morto de fome e ainda tenho de trabalhar esta noite. Portanto, não me irrite. Eu não quero mais escutar a sua voz esta noite. - tirando o casaco.

— Você é um chato, sabia? - exclamou ela.

— Acha-me chato? - ele ergueu uma sobrancelha, sarcástico, enquanto se livrava do casaco - Diga-me como se sente com o fato de eu não dar a mínima para isso?

Ela deu de ombros, jogando a bolsa na cama e dirigindo-se para espiar o banheiro. E ele ficou ali, observando a paisagem através das grades de proteção.

— Pandora, em algum lugar desta maldita cidade você está, neste momento, e eu vou te encontrar!

o.O.o Grécia o.O.o

Esmeralda saía do banheiro penteando seus longos cabelos loiros. Havia tomado um bom banho quente e já havia jantado. Voltou para o quarto e sentou-se na cama. Terminando a tarefa, apoiou o pente na mesinha ao lado e suspirou. Usava um vestido simples, com estampas florais, dando-lhe um ar de camponesa.

Seu pai, que há pouco havia chegado para dormir com ela a pedido da enfermeira, estava sentado em uma cadeira um pouco desconfortável, principalmente pelo seu tamanho. Lia o jornal distraidamente, sem dar a ela qualquer importância.

— O senhor trouxe meu celular, pai? Preciso avisar a Eiri sobre o nascimento dos meus filhos... - disse. Na verdade, ela queria avisar a Ikki o porquê ficara fora do ar por tantos dias.

— Eu joguei seu celular fora! - respondeu Guilty, desimportante. A loira surpreendeu-se.

— O senhor fez o que? - sem entender direito.

— Joguei o aparelho fora e também as cartas que você guardava dentro de sua gaveta de roupa íntima! Que coisa mais cafona e previsível, filha. - balançou a cabeça negativamente - Achou que eu não ia encontrar?

— Pai... Como o senhor pôde ter feito isso? Não tinha o direito, eram minhas coisas, não é certo...

— Você está dentro da minha casa, vive do meu dinheiro e vai fazer o que eu mando. A menos que queira buscar outro lugar para viver com suas duas criaturas... - gritou ele. - Não ficou nada para trás, Esmeralda. Agora, é olhar adiante.

— Mas, pai... – ela tentou argumentar.

— Já chega, Esmeralda. Não vai mais falar com ninguém, entendeu bem? Com ninguém! Eu te ponho na rua.

Ela engoliu em seco e voltou a se sentar. Não suportaria mais isso. Agarraria esse trabalho na Itália e faria o que fosse preciso para sair de casa o mais rápido que pudesse. Mas, naquele momento, precisava encontrar um modo de avisar a Ikki sobre por que não o responderia tão frequentemente. Após um longo silêncio, ela perguntou:

— O senhor falou com o médico? A enfermeira me disse que vocês passaram um longo tempo conversando, ele até o convidou para almoçar...

— Sim, falei com o médico e o que isso tem demais? - Guilty fechou o jornal e a olhou - Almoçamos juntos. Ele pagou, evidentemente... Um verdadeiro cavalheiro! Mas não interessa a você para nada o que falamos. - sorriu com crueldade.

Esmeralda sentiu-se enraivecer por aquele sorriso estranho, sarcástico, amedrontador. Seu pai estava muito diferente desde que havia tido essa suposta conversa com o seu médico obstetra.

— O senhor já viu os seus netos? – ela arriscou, em um fio de voz, após um minuto de silêncio.

— Não. - respondeu Guilty, secamente - Já terei de conviver com eles pelo resto da minha vida, não tenho o mínimo interesse em vê-los agora. Haverá muito tempo para fazer isso!

— Pai, eu prometo que irei por esse trabalho na Itália. Eu vou ganhar dinheiro para sustentar meus filhos. Apenas peço um pouco de paciência e...

— Não se preocupe, filha. - Guilty falou com deboche - Já falei que o seu médico me contou muito bem sobre a proposta que lhe fez. E eu dei meu consentimento. Eu ficarei com seus filhos por alguns dias, até você voltar... - e estreitou o olhar pesado no rosto dela, ao proferir a última palavra.

Teve vontade de completar "ou não", mas preferiu ficar calado. Não poderia dar nenhuma pista, fazê-la desconfiar da inocência da questão. Recostou-se mais na cadeira e suspirou.

— Eu realmente fico feliz em que o senhor tenha aceitado. E surpresa também... - completou ela, tentando sorrir - Eu prometo que farei o meu melhor na entrevista. Serei selecionada e voltarei com um emprego, e ganharei muito dinheiro...

— Não duvido. - falou ele com cinismo - Tenho certeza que você "agradará" aos chefes... - sublinhou o verbo - Você é inteligente... É "bonita"... - sublinhou o adjetivo - Puxou a sua mãe. Com certeza vai ganhar muito dinheiro...

— O senhor fala pouco dela! - rebateu Esmeralda - Apesar do que ela fez, eu sinto sua falta. Neste momento da minha vida, eu preciso muito dela ao meu lado, mas... Eu tenho de ser forte, sou mãe de família agora e devo ser forte por meus filhos.

— É... - Guilty balançava a cabeça afirmativamente, perdido em pensamentos - Terá de ser muito forte, filha...

Ela levantou-se e se dirigiu à porta. Guilty a viu abrir a mesma e fazer menção de sair.

— Aonde vai? – ele perguntou com autoridade.

— Vou ver meus bebês! - respondeu ela, com um sorriso, fechando a porta atrás de si.

o.O.o Continua o.O.o

 



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