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História Relativity - Larry - II - Back In Time


Escrita por: alouisiocobra

Notas do Autor


Hey, mais um capítulo!
Se preparem para conhecer o novo Harry.

Capítulo 2 - II - Back In Time


Fanfic / Fanfiction Relativity - Larry - II - Back In Time

Me tranco no quarto assim que entro. Não tenho cabeça para estudar na biblioteca ou conversar com Pam caso a gente se esbarre. 
Me jogo na cama e respiro fundo. Minha cabeça está uma bagunça. Nada faz sentido dentro dela. Um pensamento atravessa o outro e acabo não finalizando nenhum.
Se tudo que aconteceu naquela sala foi verdade, eu voltei no tempo. Eu realmente voltei no tempo.
Já ouvi falar sobre isso, já vi filmes sobre isso, já até li sobre isso, mas o que eu vivi é completamente diferente.
Acabei de voltar no tempo. Caramba.
Meu celular vibra e tenho que fazer uma força quase sobre-humana para me levantar. A tela pisca com o nome de Pam nela e tenho que parar alguns segundos para pensar se atendo ou não.
"Hey, Louis, sei que a sua aula acabou e que você está livre o resto do dia. Devíamos sair para comer alguma coisa."
"Não almocei."
"Vou entender isso como um 'sim'. Nos encontramos no estacionamento?"
"Claro, Pam."
Pam desliga antes que eu possa dar tchau ou mudar de ideia. Não estou com fome, mas Pam é uma amiga legal, e a única amiga que tenho aqui. Sei que ela merece mais atenção por insistir tanto em mim.
Me olho no espelho novamente e meus olhos estão esquisitos, não sei explicar, mas é um olhar diferente, eu diria que até misterioso. Bagunço o cabelo, mas ele continua horrível, então não insisto muito mais nele.
Pego a minha pasta e guardo a câmera nela. Quando abro a porta do meu quarto, vejo poucas pessoas.
Mal conheço alguns dos garotos que entram e saem de seus quartos, e eles com certeza não param para me notar. Sigo até a porta do dormitório, e quando saio recebo uma lufada de ar muito bem-vinda.
O sol resolveu dar as caras, esta reluzindo e brilhando no céu, e a paisagem de Windsor & Eton parece mais verde e mais bonita assim.
Reconheço rapidamente os cabelos de Alyssa, ainda mais brilhosos e claros agora. Ela esta sentada em um bando, de costas para mim, parece sempre sozinha e quieta, como eu. A bola de Zack, um babaca que é amigo de Taylor, bate em cheio na cabeça de Alyssa. Ele ri e pede desculpa, e ela levanta envergonhada e segue rumo.
Não acho isso certo, e gostaria de fazer algo para que ela não se sentisse assim, tão envergonhada e humilhada. O campus não está cheio, poucos não tem mais aula hoje, mas mesmo assim é ruim.
Lembro do que fiz na aula do Sr. Joseph e uma lâmpada se acende acima da minha cabeça. É uma ideia ruim. Devo ter enlouquecido de vez para pensar nisso.
Devo ter delirado naquela aula, ainda não sei se o que fiz foi verdade ou só coisa da minha imaginação, mas ainda assim quero tentar. Só mais uma vez. Só para ter certeza.
Tento convencer a mim mesmo disso, e a parte delirante do meu cérebro aceita de bom grado a ideia e está louca para pôr em prática.
Caminho até ficar alguns passos do banco onde Alyssa estava, estendo minha mão e forço os olhos. Penso que nada vai acontecer e que devo estar parecendo patético aqui, parado no meio do campus com a mão no ar e fazendo careta, mas então algo realmente acontece.
Tudo começa a tremer, como um terremoto, e tenho que forçar ainda mais olhos. Sinto a força que estou fazendo para isso acontecer e todo meu corpo dói. Minha cabeça estão prestes a explodir, mas eu permaneço parado, fazendo força, sentindo o peso da gravidade sobre mim. Então quando tudo parece quase insuportável, acaba.
Abaixo a mão e abro os olhos e Alyssa está no banco.
Mal posso acreditar. Na verdade não posso acreditar. 
Estou delirando. Não consigo acreditar.
Voltei por vontade própria. Acabei de voltar no tempo por vontade própria.
Tenho vontade de correr daqui até Doncaster e me esconder debaixo das minhas cobertas. Ou de chorar até desidratar. Ou até de gritar até estourar as cordas vocais. Mas não faço nada disso.
Tenho que avisar Alyssa. É o que minha consciência diz, e é o que vou fazer.
Já fui humilhado duas vezes hoje público e consegui reverter, agora tenho que proteger Alyssa de se sentir da mesma forma.
Vejo quando Zack puxa o braço para trás e então o impulsiona para frente, a bola de futebol americano voa quase em câmera lenta na nossa direção.
- Alyssa, vai para o lado! - Solto um grito, acompanhando Alyssa e a bola que se aproxima.
Alyssa desliza para o lado, sem sequer me olhar, e a bola passa reto por ela. 
Ela não foi humilhada, mas também não parece agradecida ou… Feliz?
- Valeu, Louis. - Ela da um sorriso e continua olhando para frente.
Pensei que me sentiria melhor. Acabei de ajudar Alyssa, mas não sinto nada. Continuo o mesmo.
Zack corre para pegar a bola e só então eu me dou conta de que o mundo continua girando.
Pam. Tenho que encontrar Pam no estacionamento.
Antes, preciso ir no banheiro para lavar o rosto e respirar. Preciso ficar um pouco sozinho antes de ser interrogado pela Pam.
Entro na faculdade e encontro o diretor, um cara nada amigável e cheio de regras. Sigo o caminho até o banheiro, empurrando a porta do banheiro masculino. Paro na frente de um dos espelhos e vejo meu reflexo. Estou a mesma coisa. Mesmos olhos indecifráveis e cabelo bagunçado.
Suspiro frustrado. Não sei o que estava esperando de mim mesmo, mas com certeza não era isso.
Abro a torneira e faço uma concha juntando as duas mãos para lavar o rosto. Quando abro os olhos novamente, eles parecem mais claros, em um tom azul esverdeado mais destacado.
Dou alguns passos para o lado e olho através de uma pequena janela no alto do banheiro. Vejo uma borboleta azul mexendo as asas e não penso duas vezes antes de sacar a câmera e tirar uma foto dela.
A foto sai instantaneamente e a sacudo no ar. 
Um solavanco me faz pular para o lado, me escondo atrás da parede, por mais ridículo que pareça.
- Você não me pagou! - Um homem grita, e ouço o modo evervante como ele fala.
- Você é um babaca! Já disse que não tenho dinheiro! 
- Não pense em me provocar. Você sabe que eu sou mais forte que você!
Ouço outro barulho alto, e praticamente me encolho contra a parede, mal consigo respirar. Não acredito que estou aqui no banheiro presenciando uma briga.
Um dos homens geme de dor, e acredito que seja o de voz rouca e lenta.
- Você me deve dois mil euros e vai me pagar agora ou eu te mato aqui mesmo! - Sinto pelo seu tom o nervosismo, parece prestes a cometer uma loucura. Uma loucura como matar alguém no banheiro da faculdade por dois mil euros.
Estou com a garganta apertada. Não sei o que fazer. Não sei o que devo fazer. Alguém que está a poucos passos de mim está prestes a morrer e outro está com uma arma ou uma faca. E eu simplesmente não sei o que fazer.
- Você me deve dois mil euros e vai me pagar agora ou eu te mato aqui mesmo! - O homem de voz rouca e lenta parece mais calmo, e quase me sinto aliviado por ele ainda estar vivo.
- Eu quero o dinheiro hoje! Você é surdo ou o que, porra?
- Não tenho o dinheiro!
Um silêncio de segundos me deixa mais apreensivo que a gritaria, e ouço alguns passos constantes.
- Isso é culpa sua! Isso tudo é culpa sua!
Tenho que me segurar na parede e posicionar a cabeça milimetricamente para conseguir ver o que vai acontecer. A curiosidade é maior que o medo de ser descoberto.
Reconheço Will Fritzman, o garoto mais rico da faculdade, talvez até mais rico que Viki e Taylor juntos.
Ele usa suéter todos os dias, tem o cabelo loiro perfeitamente penteado e é incrivelmente esnobe e arrogante.
Mesmo sendo tão arrogante e metido quanto Viki, não consigo acreditar que ele seria capaz de matar alguém. Ele é rico, não precisa matar alguém por dois mil euros. Precisa?
Respondendo a minha pergunta silenciosa, ele puxa uma arma preta e reluzente de dentro da calça. De repente congelo e entro em pânico.
Nunca vi uma arma antes. Não ao vivo. E nunca vi alguém sendo morto antes, bem na minha frente.
É uma questão de segundos entre o semblante de terror do homem no chão, que tem a testa ferida e sangrando, e o gatilho da arma sendo apertado.
A bala o acerta em cheio. Bem no peito.
Não sei o que estou fazendo quando saio do meu esconderijo atrás da parede, com a mão estendida, como se fosse outra arma. Vejo o rosto do homem contorcido em dor, prestes a morrer, e fecho os olhos.
Tudo estremece e gira. Sinto a já familiar pressão sob mim e a dor que parece prestes a explodir meu cérebro. Quase caio de joelhos, mas consigo ser forte o suficiente.
Isso não depende só de mim, depende da vida de outra pessoa. 
Tudo para e fica silencioso. 
Abro os olhos e estou sozinho no banheiro, feito um louco com a mão estendida no ar e os joelhos flexionados.
Tenho que apoiar minhas mãos nos joelhos e respirar fundo muitas vezes. Me sinto cansado de uma forma esquisita.
Me sinto realmente fatigado, como se tivesse feito muitos exercícios fisícos. Minha cabeça está zumbindo, mas nada insuportável.
O mesmo solavanco se repete e eu me escondo novamente atrás da parede. Tento controlar minhas respiração irregular quando ouço os passos.
- Você não me pagou! - Will grita, irado, e agora que sei do que ele é capaz, parece mais assustador.
- Você é um babaca!
- Não pense em me provocar. Você sabe que eu sou mais forte que você! - O barulho se repete, e agora sei que Will bateu no homem e ele está sentado no chão, ferido.
- Você me deve dois mil euros e vai me pagar agora ou eu te mato aqui mesmo!
- Eu quero o dinheiro hoje! Você é surdo ou o que, porra?
- Não tenho o dinheiro!
Meu coração se aperta. Sei o que vem em seguida. Não voltei no tempo somente para reviver tudo de novo. Não conseguiria ouvir outro tiro. Ou o sangue. 
Não sei o que fazer, mas sei que tenho que fazer algo. Não é só a minha vida, é a vida de outra pessoa. 
Tenho uma carta na manga. Sei que posso reverter o final dessa história. E decidi que ninguém vai morrer hoje, se eu puder impedir.
Respiro fundo, sentindo a adrenalina fluir dentro de mim. Tenho que fazer isso. Vou fazer isso.
Vejo quando Will faz menção de puxar a arma, e uma força desconhecida cresce dentro de mim.
- Não! - Grito a tempo de Will me notar. Ele interrompe seu movimento, com a mão na arma, tremendo de nervosismo.
- Quem é você? - Ele está nervoso, qualquer um pode ver isso.
- Larga essa arma agora! - Grito de novo. Não estou pensando. Não estou sendo muito coerente.
E tudo acontece muito rápido. O homem até então caído no chão da um soco no meio das pernas de Will, e ele cai. A arma cai aos seus pés, e antes que Will possa raciocinar, o homem de voz rouca a pega e aponta para ele.
Estou eletrizado. Me sinto ligado na luz. Sei que é a adrenalina. Não sei o que vai acontecer agora, mas espero ter feito a coisa certa.
- Some desse banheiro agora ou eu te entrego para o diretor! - O homem parece mais ameaçador agora, segurando uma arma firmemente, nem treme. Noto que é mais alto que eu e Will e fico impressionado.
Will da uma risadinha de escárnio, não fala nada, mas parece pensar muita coisa. E isso é igualmente assustador.
- Eu tô falando sério, porra! - O homem aponta a arma novamente, como para dar ênfase, e Will da outra risadinha, se levantando desajeitadamente do chão e passando a mão pelo cabelo.
- Você está ferrado, Harry. - Will praticamente murmura, irritadiço, mas não faz menção nenhuma.
Will sai do banheiro e bate a porta com força. E mal posso acreditar.
Salvei a vida desse homem. Realmente salvei a vida de alguém. 
Estou catatônico, pisco, mas não enxergo nada. Estou tremendo. Não acredito que fiz isso. Não acredito que realmente fiz isso.
- Você está sangrando. - O homem avisa, e tenho que piscar mais algumas vezes para conseguir raciocinar direito.
Passo a mão no nariz, e realmente estou sangrando. Meu nariz nunca sangrou antes. 
Em parte, sei porque, meu cérebro está zumbindo desde que voltei no tempo pela primeira vez, há minutos atrás.
- Estou bem. - Asseguro, e finalmente olho para o homem a minha frente.
Seu traços são fortes e masculinos, tem uma mandíbula bem desenhada e cabelos curtos bem arrumados de uma forma bagunçada. É muito bonito.
Não consigo ignorar o pequeno corte entre o couro cabeludo e a testa que está sagrando. Ele não parece se importar, mas parece doer.
- Você também está sangrando.
- Ah. Isso? - Ele aponta para o corte na sua testa. - Não está doendo. Aquele merda bateu a minha cabeça na pia.
Ficaria horrorizado se não tivesse visto ele sendo morto há minutos atrás pelo mesmo cara.
- Conheço você. - O homem me olha minuciosamente, da cabeça aos pés. Está pensativo, me olhando bem nos olhos, e vejo como ele se abaixa para ficar com o rosto na altura do meu. 
Ele sorri e de repente fica sério, como se lembrasse de algo.
- Louis? - Algo na forma como ele fala meu nome me deixa inquieto. É uma sensação estranha. Quase um déjà-vu.
- Harry? - Estou com as sobrancelhas erguidas, mal posso acreditar.
Mas ultimamente eu não tenho conseguido acreditar em muitas coisas.
Harry. Esse Harry na minha frente, bem mais alto do que eu, e com o rosto sério e másculo é o meu Harry. Meu melhor amigo.
Nos conhecemos quando me mudei para cá pela primeira vez, junto com minha mãe e minhas irmãs para a casa dos meus avós. Fomos melhores amigos pelo curto tempo em que fiquei aqui. E me lembro de ser mais alto do que ele. Bem mais alto do que ele na época.
Nunca o teria reconhecido na rua ou nos corredores movimentados da faculdade. Harry mudou da água para o vinho, não parece mais aquele garoto de cabelos enrolados e olhos verdes vividos, tímido e quieto. Agora ele tem olhos sérios e opacos, mais escuros do que me lembro, cabelos curtos e lisos, e parece ter trocado o silêncio e a timidez por palavrões e uma atitude ameaçadora.
Claro que ele me reconheceu. Não mudei muito mais desde que me mudei de volta para Doncaster. Mudei o corte de cabelo, criei um pouco mais de corpo e cresci alguns centímetros. Mas ainda sou o mesmo garoto quieto e silencioso.
Harry também mudou fisicamente. Antes era magro e esguio, ainda é magro, mas tem mais massa muscular, ombros largos e braços mais fortes. 
- Você sumiu. - Ele sopra as palavras, quase sem notar. Demoro para entender suas palavras, e quando entendo, fico sem ar.
Lembro de quando fui embora e não me despedi, apenas fui. Não dei satisfações, e sei que fui errado, mas eu não sabia como lidar com uma despedida. Sabia que se o fizesse, ficaria com raiva da minha mãe por estarmos indo embora, e sabia que, no fundo, ela não tinha culpa.
Lembro também das ligações que não fiz e das mensagens que não enviei. Simplesmente fingi que não o conhecia, ignorei todas nossas lembranças, todos nossos segredos compartilhados. Pensando bem hoje, aqui, agora, não entendo bem porque fiz aquilo.
Na época Harry precisava de mim e eu não estava lá para ajudar. Fui horrível, desprezível. 
- Desculpa. - É tudo que consigo falar, não sei se consigo formular uma frase direito, falando tudo que penso sobre minha atitude egoísta. Mas Harry parece entender, e por mais que pareça sério demais e assustador demais, não fala nada.
Noto que ele ainda segura a arma, e não falo nada também. Não o conheço mais. Conhecia meu melhor amigo, o Harry criança que sentava comigo nos trilhos do trem e atirava pedras no rio. Não conheço esse homem imponente aqui, bem na minha frente. E isso é mais estranho do que posso admitir.
Harry se move lentamente, passando a mão no cabelo, olhando para os lados. Ele esconde a arma dentro da caixa de descarga de um dos vasos sanitários. Não falo nada sobre não achar seguro.
- Temos que contar para o diretor. - Aviso, Harry se vira lentamente para mim, e fico com um pouco de medo do seu olhar ameaçador. Ele arqueia a sobrancelha e fala: - É mesmo? - Em tom sarcástico.
- Ele vai saber o que fazer com Will. Ele não pode continuar andando por aí depois de ter matado você. - Estou desesperado, despejando as palavras sem pensar, e só depois que falo, noto. 
- Eu pareço morto para você? - Ele arqueia a sobrancelha novamente e aponta para o seu peito. Lembro que, há minutos atrás, havia uma bala ali. - Não vamos contar nada. Will é podre de rico, os pais dele doam uma caralhada de dinheiro para cá todo ano. O diretor provavelmente limparia a bunda do Will com a língua se os pais dele pedissem. 
Harry mudou. Mudou muito. O Harry de anos atrás não falava palavrão, sequer falava "merda", e quando falava ficava vermelho e pedia desculpa.
Fico em silêncio depois disso.
- Não vamos falar nada. Vou resolver essa merda sozinho. 
Não duvido que Harry possa resolver isso sozinho, mas tenho medo. Sei do que Will é capaz, ele matou Harry sem pensar duas vezes, na droga do banheiro da faculdade.
Meu celular vibro, mas não preciso pegar para saber que é Pam, e que estou.
- Vamos, você me deve umas respostas. - Harry da uma risadinha. Não entendo seu humor
Ele estava assustado, sério, irritado, sarcástico e agora está sorrindo.
Combinei com Pam, mas não vejo Harry há anos, e ele realmente merece algumas respostas.
Sigo Harry em silêncio para fora do banheiro e para fora da faculdade. 
Ainda está sol e um pouco mais abafado do que antes, mas há algo poético no sol de hoje, depois de tantas coisas.
Seguimos até o estacionamento, onde vejo o carro velho de Pam. Praticamente não tem mais tinto, e parece estar caindo aos pedaços, mas ela ainda consegue acelerar há quase 100/h nele.
Pam está recostada no capo do carro, e ela sorri para mim, balançando a chave. 
Seus cabelos castanhos compridos brilham no sol e seus olhos cinzas se destacam de longe. Ela veste um cardigã de bolinhas azuis e um jeans simples com sapatilhas.
- Demorou, Louis. - Ela sorri, mesmo tentando parecer séria. Sorrio de volta.
- Vamos. - Harry maneia com a cabeça, ignorando a presença de Pam. 
Franzo o cenho para Harry, realmente não entendo qual o problema dele. Ele deve ser bipolar ou alguma coisa do tipo.
- Pam, vai ficar para outro dia. Reencontrei um amigo de infância e eu devo um tempo para ele.
- Ah. - A decepção está estampada no seu rosto. Ela fica desconcertada por alguns segundos, se remexendo. - Bom, então vou para o laboratório estudar. - Ela força um sorriso e dá de ombros. - Nos vemos depois. 
Não gosto de fazer esse tipo de coisa, normalmente sou a segunda opção dos outros, mas nunca fiz isso com ninguém, e agora me sinto mal. Pam é uma garota maravilhoso, atenciosa, brincalhona e divertida, mas não sei o que fazer a respeito dela, as vezes sinto que ela tenta atravessar a nossa linha de amizade. 
Harry entra na sua picape, também está um pouco acabada, mas já estou acostumado com carros velhos. Abro a porta e subo, sentando-me ao lado de Harry.
Harry da partida e logo estamos fora do estacionamento da faculdade. Ele move os longos dedos pelo painel e logo liga o rádio. Ele faz um barulho estranho, mas sintoniza. Uma música estranha toca, não é o tipo de música que costumo ouvir, mas combina com o estilo do novo Harry. 
- Você voltou para Doncaster? - Ele pergunta, mordendo o lábio inferior e passando uma mão pelo cabelo.
- Hum… Sim. - Remexo as mãos no colo, de repente me sinto inquieto aqui, ao lado de Harry.
- Porque?
- Viemos morar por um tempo, estávamos sem casa, você sabe. Moramos com meus avós e quando consigo uma casa, voltamos.
- Você sabia onde eu morava. Porque não me procurou? - Ele arqueia a sobrancelha, visivelmente curioso. Encolho os ombros.
Não sei o que responder. Realmente não sei o que se passava pela minha cabeça na época. Harry era tudo que eu tinha for a minha família, o único com quem eu poda me abrir e contar como me sentia sem me sentir culpado.
- Não sei. - Admito. - Pensei que seria mais fácil simplesmente ir. Tinha medo de me despedir e você implorar para que eu ficasse, sei que eu brigaria com a minha mãe e descontaria nela. E não acho que ela mereça algo assim vindo de nenhum dos filhos dela. - Essa é uma boa desculpa. Penso comigo mesmo. Fui sincero sobre a minha mãe.
- Você sempre poderia ter ligado. Ou mandando, eventualmente, uma mensagem. - Harry não precisa olhar para mim para que eu saiba como ele está.
Me sinto culpado, com o peito e o coração pesados. Fiquei tão preocupado em não magoar a minha mãe e em apoiar ela, que esqueci do meu melhor amigo.
- Não tenho uma desculpa boa o suficiente para isso. Sei que fui muito errado, deveria ter procurado você e mantido contato. Não sei porque não o fiz. - Me defendo.
- Como está a tia Jay? - Harry muda de assunto, e eu me sinto aliviado. Posso respirar de novo.
- Bem. Ainda trabalha na casa de ricos, mas está juntando dinheiro para montar uma pousada. - Sorrio ao lembrar dos planos dela.
- Isso é bom. - Ele sorri. - E as garotas? Elas eram crianças quando vocês foram embora. 
- Fizzy e Lottie estão bem, são adolescentes bem… Adolescentes. - Rio. - As gêmeas também estão bem.
- Devem estar lindas. - Ele comenta. Mas não falo nada.
O assunto morre, mas nenhum de nós puxa assunto. A música parece o necessário para não nos sentirmos desconfortáveis com o silêncio.
Chegamos a lanchonete da mãe do Harry. Não sei se a tia Anne ainda trabalha aqui, uma parte de mim espera que ela tenha conseguido um trabalho melhor, mas a parte mais egoísta espera que ela ainda esteja ela, tão sorridente e divertida quanto antes do… Incidente.
Descemos do carro assim que Harry estaciona. A rua parece a mesma, com as mesmas lojinhas e as mesmas pinturas. Gosto disso. Gosto daqui.
Senti saudades dessa cidade pequena, onde todos se conhecem, onde uns se importam com os outros. Em Doncaster não funciona desse jeito, e uma parte bem pequena de mim deseja que nós nunca tivéssemos saído daqui. Que eu nunca tivesse me distanciado de Harry quando ele mais precisava de mim. 
Harry caminha na frente e abre a porta de vidro que faz um barulho, avisando sua entrada, seguro a porta e entro em seguida.
O cheiro de carne, gordura, fumaça e batata-frita está em toda lanchonete, e por mais que pareça nojento, é bom e nostálgico.
Sentamos na mesa da frente, de forma que podemos ver a rua pela janela. Nossa mesa favorita. Sempre vinhamos aqui depois da escola e, às vezes, até no café da manhã.
Não consigo ignorar o jeito como Harry se senta, escorregando até ficar sentado na ponta da cadeira, um pé no corredor estreito de mesas e as mãos brincando com um isqueiro prateado, abrindo e fechando. Só agora, quando parece que não tenho nada melhor para pensar ou reparar, noto que Harry está usando uma camisa um pouco larga e preta com "Ramones" na frente. Lembro de ser sua banda favorita, e sorrio com isso. Algumas coisas nunca mudam.
Seus braços estão expostos, se me inclinar para a direita, consigo ver até metade da pele do seu tronco exposta.
Agora ele usa jeans preto colado, de modo que consigo ver as curvas de suas pernas. E nos seus pés, invés dos confortáveis all stars, ele usa botas marrons desgastadas.
Para completar seu visual… Diferente? Ele tem tatuagens, muitas delas. Vejo dois pássaros no seu peito, uma cruz no lado da mão e muitas nos braços, mal posso contá-las, não sei onde começa uma e onde termina outra.
- Está estudando na W&E College? - Harry pergunta, sua voz é mais rouca e lenta do que antigamente, mas não posso reclamar.
- Sim. Fotografia. E você? - Lembro remotamente de Harry falando sobre fazer faculdade quando ainda éramos crianças.
- Segundo ano de letras. Mas fui expulso da W&E. - Não fico surpreso com a notícia, mas fico surpreso com a calma que ele usa para contar.
- Porque?
- Festas, bebidas, brigas, encrencas… A lista só aumenta. - Ele sorri e, mesmo que seja errado, eu o acompanho.
Apesar do seu visual pesado e da sua pose assustadora, Harry tem o mesmo sorriso de sempre. Um sorriso claro e gostoso, que te faz querer sorrir também.
Só então percebo, depois de todos os anos que passaram, e depois de ter o ignorado por tanto tempo, que sinto saudade dele.
- Literatura? - Estou curioso. Não sei nada sobre o novo Harry, e de repente quero saber mais e mais.
- Gosto de escrever umas coisas, mas não sei ainda. Por enquanto só leio. - Ele da de ombros, como se não se importasse, e lembro quando ele fazia isso há anos atrás, quando estava chateado ou bravo, mas só dava de ombros como se não fosse nada demais.
- O que você gosta de ler? - Não consigo visualizar esse Harry sentado lendo. O antigo Harry lia O Pequeno Príncipe quase todo dia.
- Hã… - Ele pigarreia. - Nada demais. - De novo ele mudou de humor, agora está se retraindo, se fechando. - Fotografia?
Não comento a mudança de assunto, não quero ser chato com Harry, eu que devo respostas para ele, não o contrário.
- Sim. - Sorrio ao lembrar de como amo fotografia e a minha polaroide.
- Lembro de como você amava tirar fotos. - Ele sorri.
Não está olhando para mim, está com o olhar fixo no isqueiro, mas amo seu sorriso. Um tom de nostalgia toma conta de mim. 
Lembro muito bem da primeira câmera que ganhei, era do meu avô, muito antiga, mas foi quando me apaixonei por fotografia. Também lembro da câmera que ganhei de aniversário, minha primeira câmera nova.
- Foi você que me deu a minha primeira câmera nova.
- Foi. - Novamente seu humor mudou. Harry está sério e focado no seu isqueiro de novo. - Eu via como você era bom, e olha onde você está hoje.
Gosto de pensar que Harry foi uma das pessoas mais importantes que influenciou minha decisão de ser fotógrafo. Desde pequeno ele me incentivava, e eu amava isso nele.
- Nós tirávamos muitas fotos.
- Você tirava muitas fotos.
Tenho que concordar. Tenho um álbum de fotos só de nós dois, no curto período em que fiquei aqui. Silenciosamente me pergunto se Harry ainda tem algumas das fotos que dei para ele.
- Eu tenho uma parede de fotos suas. - Harry admite, de cabeça baixa, mas ainda assim consigo ver suas bochechas vermelhas.
- Eu também. - Na minha antiga casa, há duas horas daqui, eu realmente tenho uma parede de fotos de Harry.
- Podemos passar lá em casa depois daqui. - Harry arqueia a sobrancelha, e tenho que me segurar para não concordar imediatamente.
Por mais que isso seja estranho, nós dois aqui, tentando manter um dialogo, mesmo depois que eu o vi ser morto, tenho vontade de ficar mais perto de Harry. De ser mais próximo dele, como quando éramos crianças. 
Antes que eu possa responder, tia Anne aparece, sorridente e segurando um bule de café.
- Harry, tudo bem? - Ela pergunta, prendendo uma mecha de cabelo atrás da orelha.
Hoje consigo notar melhor a semelhança dos dois. Os olhos verdes, os cabelos e os sorrisos são iguais. Me sinto aquecido por dentro por, depois de tanto tempo, rever pessoas que faziam parte da minha vida.
Tia Anne ainda tem cabelos castanhos-escuros presos em um rabo-de-cavalo, com apenas duas mechas soltas ao redor do rosto. Veste o mesmo avental verde com listras brancas e seus tênis de corrida confortáveis. Parece que nada mudou. Mas quando olho para Harry, sentado da mesma forma, ignorando sua mãe, noto que, na verdade, tudo mudou.
- Louis?! - Sorrio timidamente, mas Anne não se importa. 
Ela larga o bule sob a mesa e me puxa para um abraço apertado.
- Você cresceu! - Ela sorri e, instantaneamente, eu também sorriso. - Está de visita?
- Estou na Windsor & Eton.
- Oh! Isso é ótimo! 
Harry pigarreia, e nós dois olhamos para ele, mas ele não fala nada. Não entendo esse Harry. Antigamente conversávamos sobre qualquer coisa por horas, agora mal conseguimos nos olhar sem um dos dois ficar envergonhado.
- Harry também estudava lá, mas se meteu em outra encrenca. - Ela olha de canto de olho para o filho, e vejo como, na verdade, ela está triste por Harry.
- Enfim. - Ela abana as mãos no ar e pega o bule de café. - O que vocês vão pedir?
Olho para Harry, porque realmente não sei o que pedir, sequer me lembro do menu da lanchonete. Ele pigarreia e olha para a mesa.
- Uma torrada com ovos para mim e um café da manhã completo para o Louis.
Anne olha de mim para Harry, tentando, em vão, esconder um sorriso.
- Café? 
- Sim. - A voz de Harry sai mais rouca ainda, e acabo suspirando por isso.
Harry lembrou do que eu comia há anos, nem eu lembrava mais, mas ele lembra. De repente me sinto mal por Harry de novo, ele está diferente, mas, ao mesmo tempo, parece o mesmo.
Anne se retira e vai para trás do balcão, onde um policial e dois bêbados estão sentados conversando.
- Desculpa. - Murmuro. Não tenho coragem para olhar para o seu rosto, por isso olho para as minhas próprias mãos, suadas e inquietas no meu colo.
- Você já pediu desculpas. - Sinto seu olhar sobre mim, mas isso não me deixa mais calmo. 
- Eu sei. Mas queria que você soubesse que eu realmente me arrependo.
- Tudo bem. Já passou. - Ele balança a mão no ar, visivelmente impaciente e desconfortável.
Tia Anne ressurge, segurando uma bandeja com nossos pedidos. O cheiro dos ovos, linguiça e bacons faz meu estômago roncar.
Logo a mesa fica cheia com nossos pratos e xícaras de café. Quando sentimos que Anne ainda está aqui, olhamos para ela.
Anne está sorrindo, radiante, com os olhos verdes marejados. Como estamos na janela, o sol bate em cheio nela, a deixando ainda mais bonita.
- Vocês dois ainda são os mesmos.
Não sei se é o peso das suas palavras, mas de repente o ambiente fica pesado e sufocante. De repente tudo parece demais. A volta no tempo, Will matando o Harry, nossa conversa estranha, tia Anne, a cidade, o sol… E Harry. Principalmente Harry. Harry e sua indiferença a tudo, Harry agindo como se não tivesse quase sido morto no banheiro da faculdade, Harry expulso da faculdade, Harry e suas mudanças de humor, Harry e sua memória perfeita, Harry e seu estilo sombrio, Harry e sua voz rouca… É demais. Sinto que estou sufocando aqui, mas não sei porque essa segunda-feira está sendo tão diferente de todas as outras da minha vida.
- Pode apostar que não somos. - Harry murmura, mas é o suficiente para acabar com o momento estranho e emocionante.
Anne assente e sai, passando a mão no rosto. 
Não sei porque, mas sinto que tenho que agradecer Harry por ter acabado com aquele momento estranho. Não sei se aguentaria muito mais daquilo. Não estou pronto para lidar com emoções antigas.
- Obrigado.
Harry levanta o olhar para mim, enquanto morde sua torrada, e maneia a cabeça, dando de ombros.
- De nada.
Consigo respirar fundo e encarar meu prato de comida. Me sinto surpreendentemente bem e calmo, como se nada tivesse mudado entre nós dois, e consigo comer tudo enquanto ouço a respiração calma de Harry.


Notas Finais


Posto assim que der ;)


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