História Renegade Of Heaven - A falta que você faz

Houka cambaleava para os lados ainda confusa. Sentia como se a sua mente estivesse sendo controlada por uma força maior. Todos os sentimentos de pureza que a garota tinha, inexistiam naquela forma. Ela era um mero instrumento da morte.

Flexionou os joelhos e deu um impulso, atravessando a floresta rapidamente. Deixava um rastro de ar por onde passava, destruindo as árvores e tudo ao seu redor. Os olhos dela estavam fixos no alvo, avistando-o com a visão aguçada.

As três bruxas pararam de andar ao sentir uma inquietude dos pássaros. Eles voavam desesperadamente para longe dali. Chinatsu ajeitou o cabelo verde e tentou ver o que se aproximava. Porém, foi rápido demais. Houka já estava atrás delas olhando-as com um semblante neutro.

- Mas o que é isso? – Fuyuki recuava assustada.

- Um demônio da floresta? – A bruxa de cabelo verde opina.

- É a Houka. – Emi diz calma mas no fundo estava apavorada, podia sentir o imenso poder que emanava da rosada.

As três bruxas recuaram rapidamente, suas capas se transformaram em enormes asas semelhas às asas dos corvos. Elas voavam o mais alto que podiam, assustadas com a situação. Houka fez aparecer um enorme par de asas prata de demônio e, com um impulso, apareceu entre as oponentes.

Deu um chute no estômago de Chinatsu, um soco no queixo de Fuyuki e girou o pé no ar, acertando a cabeça de Emi. Elas caíram no chão mas logo moveram-se na velocidade do som, indo para longe do campo de vista do demônio. Porém, foi tudo em vão. Houka já estava atrás delas no mesmo instante, deixando-as mais surpresas ainda.

- Eliminar. – A garota dizia com a expressão sem vida. Erguia o dedo indicador em direção às bruxas e lançou uma enorme explosão, lançando-as longe.

- Tsc. – Fuyuki esticou o braço e murmurou um feitiço.

Um enorme monstro de pedra apareceu diante delas, ele tinha mais de quarenta metros e sua estrutura era firme e resistente. O monstro avançou contra Houka, movendo seu punho para dar um soco no demônio. Ela apenas imitou o seu movimento. O punho dele era imensamente maior que o corpo da garota, ainda assim a mesma não recuou. O soco de ambos se chocaram e, instantaneamente, o monstro de pedra sentiu o seu corpo se partir em pedaços virando poeira logo em seguida.

Chinatsu, já irritada, criou uma proteção de plantas ao redor do corpo e voou contra Houka. As duas começaram uma intensa sessão de socos, que foi encerrada com um golpe certeiro da garota na face da bruxa. A moça de cabelo verde caiu no chão fazendo uma leve cratera.

- Esse é o verdadeiro poder de um demônio...? – Questiona surpresa.

Houka continuou calada, esticando a mão em direção às três. Elas ficaram presas em meio a uma intensa descarga elétrica. O choque foi tão potente que destruiu tudo ao redor, até as rochas mais resistentes que existiam ali. As bruxas caíram de joelhos, Chinatsu e Fuyuki tinham um leve curto circuito por causa da intensa carga elétrica que percorria seus corpos.

Emi precisava lidar com o oponente, já que recebeu menos danos que as outras. Uma esfera de energia negra formou-se na mão na bruxa, ela a lançou contra a garota. Ela esfera explodiu, sugando tudo ao seu redor logo em seguida. O seu efeito era semelhante a um buraco negro. Era possível ouvir um pequeno grito do demônio diante daquele ataque.

A bruxa não pensou duas vezes e criou imensas estacas de sombras, jogando-as contra Houka no mesmo instante. Tocas as estacas a atingiram, perfurando cada parte de sua pele. O corpo da garota caiu lentamente até um chão, criando uma imensa cratera quando colidiu nele. A poeira subiu e nada podia ser visto ali. Emi respirava com dificuldade pois esse ataque exigia muito do seu poder.

- Consegui. – Sussurra abrindo um leve sorriso.

- Ela é dura na queda. – Comenta Fuyuki.

- Literalmente. – Completa Chinatsu.

A poeira abaixou e Houka estava de pé, caminhando calmamente até elas. As bruxas ficaram boquiabertas e recuaram assustadas. A garota estava sem nenhum ferimento e continuava com a mesma expressão impassível de antes. Sua cauda pontuda balançava para os lados e as asas estavam recolhidas. Em questão de milésimos de segundos, ela estava entre as bruxas como se locomovesse na velocidade da luz. A cauda enroscou no pescoço de Chinatsu e começou a apertá-lo com força. Segurou com a mão esquerda o rosto de Fuyuki apertando-o até que seu crânio fosse completamente esmagado. O corpo da bruxa estava um pouco suspenso por causa da força de Houka enquanto os pés da morta balançavam para os lados. Parecia um relógio antigo em funcionamento, as pernas movendo-se como pêndulos.

- Ops. – Houka diz ironicamente. A ponta afiada da sua cauda entrou pelo queixo de Chinatsu, atravessando-o de baixo para cima. Ela gritava de dor e seus gritos eram como música para os ouvidos do demônio. Logo, o corpo dela ficou em chamas azuis. As chamas eternas do inferno que queimavam até a alma. Em poucos segundos, a bruxa de cabelos verdes estava morta tendo seu corpo lançado em um canto qualquer. – Só falta... – Os olhos de Houka foram imediatamente nas orbes negras de Emi. – Você.

Emi criou uma barreira espessa de energia, protegendo-se do demônio. A garota deu um leve peteleco na barreira e ela ficou em pedaços. A bruxa correu o mais rápido possível, ativando os seus poderes para locomover acima da velocidade humana. Houka abria suas asas e dava um impulso, voando até a mulher e a derrubando com um soco em suas costas. Emi rolava pelo chão tossindo um pouco, a rosada pousou em cima dela olhando-a nos olhos.

- Fim da linha.

- Garota... – Emi começa a falar com sangue escorrendo pela sua boca. – É isso que deseja? É isso que a sua irmã desejaria? Não suje as mãos de sangue como eu. Não consigo suportar essa dor mas preciso carregar esse fardo.

- ...

- Eu me tornei uma bruxa para proteger aqueles que amava, porém, perdi tudo. Acabou de condenar sua alma por algo que não vale a pena. Acredite no que eu di-...

A cabeça de Emi foi completamente esmagada com um soco de Houka deu. Ela olhava para baixo com a respiração pesada, desejando reviver a bruxa e mata-la inúmeras vezes. Uma lágrima escorria pelo seu rosto, questionando-se sobre o que a sua irmã acharia ao ver aquilo.

Deixou o corpo lá e voou de volta para o local onde estava anteriormente. Pegou o corpo da irmã, dirigindo-se a sua casa em um voo calmo. Pousou na frente da casa vendo Maeka na porta. A mulher recuou assustada e tentava conjurar um feitiço até que ouviu a voz fraca da filha.

- Mãe...

O corpo de Houka voltava ao normal lentamente, uma névoa escura a cobria durante a transformação. Seu cabelo voltou ao tamanho e cor original. A roupa estava intacta, fora alguns rasgos da luta anterior. Os olhos azuis com o mesmo brilho de antes. A garota chorava deitando o corpo da rosada no chão.

- Mamãe... Ela... – Soluçava enquanto as lágrimas escorriam pelo seu rosto.

- N-Não... – Maeka negava com a cabeça, correndo até o corpo da filha e o abraçando. – Acorda, filha! Por favor, acorda!

Ela abraçava o corpo de Kaori, balançando-se para os lados chorando baixinho. Houka observava a cena, ajoelhando-se bruscamente na grama com os olhos fixos no céu. As nuvens escuras reuniam-se na área de Kyoto e logo começou a chover. A chuva caía sobre o corpo delas, como se o céu chorasse também pela morte da garota.

Houka fechava os olhos chorando sem parar. Queria sumir, ir para bem longe dali. Na verdade, queria estar no lugar da irmã. Por que ela se sacrificou? Foi embora e deixou uma imensa ferida no coração dela e de Maeka. A morte é um sofrimento passageiro para a vítima, ela tem que ser temida para os vivos que ficam e lidam com a ausência da pessoa amada.

(...)

Um ano havia se passado desde a morte de Kaori. Houka ficava trancada em seu quarto e não saía de lá. Sua mãe estava preocupada pois não via a filha há meses, sabia que ela sofria muito. Foi difícil aceitar o pacto que a rosada fez mas Maeka entendeu o motivo. Nunca odiaria a sua filha, ela era tudo que tinha. Outras bruxas, amigas da mulher, vieram saber do estado da garota. A resposta era sempre a mesma: Está de luto. Porém, por que um luto tão demorado?

Houka estava sentada no canto de seu quarto, mal comia e mesmo assim seu corpo não sofreu nenhuma alteração. Maldito seja o pacto. Seu longo cabelo rosado todo bagunçado e os olhos com uma expressão vazia. Ouviu as batidas na porta, sua mãe murmurava palavras de preocupação que buscou fervorosamente ignorar. O prato de comida foi deixado ali na frente. Mesmo contra a sua vontade, a garota se levantou e caminhou até a porta. A barriga roncava e sentia o corpo fraco.

A fraqueza foi tão forte que recuou um pouco, batendo as costas no guarda roupa. Uma enorme caixa que estava no topo do guarda roupa caiu sobre a cabeça da rosada. Ela resmungou baixo irritada e percebeu que eram objetos da falecida irmã. Acendeu a luz, pois vivia no escuro desde então, e ajoelhou-se no chão. Pegou algumas fotos da Kaori sorrindo, analisando-as com um sorriso bobo. Em uma das fotos, o longo cabelo da rosada e seus belos olhos eram bem valorizados pelo brilho do sol. Uma foto com a garota usando roupas fofas e um sorriso meigo nos lábios.

Falta que você faz -  Fernando e Tiago Fonseca

Houka passava as fotos com um sorriso bobo, elas traziam uma nostalgia boa. Havia uma foto da rosada com a irmã, as duas usavam roupas belas e sorriam muito. Ela lembrou daquele dia ainda sorrindo.

Flash Back On

- Prenda o cabelo, Houka! – Kaori exclama segurando a risada.

- Não! – A rosada faz bico. – Eu gosto de deixa-lo solto.

- Eu poderia facilmente confundir as duas se isso acontecesse. – Maeka diz rindo baixo.

- Ora... -  Houka resmunga baixinho mas logo estava rindo.

A mulher pediu para que as duas garotas fizessem uma pose, elas se entreolharam e já sabia como ficar. Ambas ficaram um ao lado da outra, Kaori piscava os olhos mostrando a língua, apoiando uma mão nas costas. Houka colocava a mão sobre a coxa e jogava o cabelo com a outra.

Depois da foto, as duas se abraçaram forte. A rosada apertou o corpo da sua irmã, feliz por ter alguém tão incrível na sua família. Considerava-se uma pessoa de sorte pois sempre teria o apoio de Kaori. Sempre...

Flash Back Off

Uma lágrima tocou a foto, Houka a abraçou com um pouco de força junto ao seu peito. Sussurrou o quanto sentia falta da azulada e logo olhou para uma folha de papel sobre o álbum de fotos. Havia algo escrito ali e resolveu ler pois sabia que Kaori nunca reclamaria.

“Querido deus da floresta, estou preocupada com a minha irmãzinha. Ela vive treinando mas sinto que a sua vida não deve ser voltada somente para isso. Quero que ela conheça o mundo, há várias cidades legais na região. Aliás, há um vasto mundo a esperando. Desejo que ela esteja pronta o mais rápido possível, assim sairemos em uma longa jornada. Sei que parece egoísmo desejar a minha irmã sempre comigo mas ela é importante para mim. A minha melhor amiga. Quero compartilhar vários momentos ao seu lado. Por favor, permita-me ter esse desejo egoísta concedido.”

“Esses dias, ela pareceu desanimada com algo. Eu a observei de longe e vi que encarava demais a cidade. Ela mal conhece o Japão, isso é tão injusto. Gosto de viver na floresta, não me interprete mal. Porém, quero conhecer o mundo com a minha irmãzinha. Prometo sempre protege-la. Por ela, daria a minha vida. Isso que fazem em uma família, certo?”

Após ler a carga, abraçava a folha de papel soluçando baixinho. Sua irmã fazia muita falta, sempre foi o seu apoio e porto seguro nos momentos difíceis. Aprendeu muita coisa com ela e, principalmente, aprendeu o valor da família. Porém, descobriu através da carta que Kaori preocupava-se com o futuro da menor. Ela desejava que a rosada explorasse o mundo, viajasse por vários países e conhecesse novas pessoas. Então, respirou fundo limpando as lágrimas.

Saiu do quarto correndo e parou na frente da mãe que estava arrumando a cozinha.

- F-Filha!

- Mãe, eu me decidi. – Diz séria. – Quero conhecer o mundo, viver o que eu e a Kaori queríamos viver juntas. – Abriu um sorriso fraco, a primeira vez que mostrava um sorriso para a mãe depois da morte da sua irmã. – Chega de se lamentar. Eu quero e preciso seguir em frente! Por favor, permita que eu vá...

- Filha... – Maeka abraçou a garota afagando seu cabelo. – Claro, quero que siga em frente. Conheça o mundo mas nunca esqueça do seu lar, onde você realmente pertence.

- Uhum...

- Eu sentirei sua falta mas reconheço que é o melhor a ser feito.

- Mãe, eu prometo que irei encontrar uma forma de purificar minha alma. – Apertava a mulher em seus braços. – Eu prometo... Por você e pela Kaori...

E a rosada estava decidida sobre o que queria fazer. No outro dia, ela arrumou uma roupa básica rosa pois amava essa cor. Olhou o seu reflexo no espelho, passando um pouco de maquiagem para disfarçar as marcas das longas noites chorando. Prendeu o seu cabelo no lado esquerdo e direito, como sua irmã fazia. Essa era uma homenagem à pessoa que sempre estará em seu coração.

Despediu-se da mãe com um forte abraço, começando a caminhada logo em seguida apoiando a mochila no ombro. Antes de ir para a cidade, ela parou na lápide da sua irmã que ficava no  meio da floresta. Ajoelhou-se diante da lápide olhando o nome de azulada escrito nela. Colocou a mão sobre o local sentindo a brisa erguer as folhas ao redor. Lembrava dos tempos em que as duas brincavam de esconde-esconde naquela floresta.

- Nada separa os grandes amigos. – Murmura com um leve sorriso. – A gente ainda tem muita coisa para viver. Lá do outro lado, vamos nos ver...

Podia sentir a presença de Kaori naquele lugar, como ela a observasse sorrindo. Tinha medo da reprovação da irmã mas, no fundo, sabia que a azulada nunca a odiaria. Mesmo que suas escolhas a levassem para o caminho errado, família continua sendo família.

Levantou-se dando as costas à lápide, começou a andar com um semblante sereno. Não superou a morte da garota e sabia que, talvez, nunca superasse. Porém, não podia ficar trancada no quarto chorando. Havia um vasto mundo para aproveitar, uma vida a ser vivida. Ela esticou o braço para o lado com o punho fechado e pôde imaginar Kaori imitando o mesmo movimento ao seu lado. Ambos os punhos se tocando e a azulada encarando a menor segurando a risada. Houka deixou escapar uma lágrima pois a saudade bateu em seu peito.

- Eu sei que a nossa história não vai morrer. – Disse isso sumindo no meio da floresta, seu longo cabelo rosa preso como o cabelo de sua irmã.

(...)

Houka nunca imaginou que Tokyo fosse uma cidade tão complicada. Pelo menos, aprendeu a conviver em sociedade em menos de duas semanas. Ela resolveu ir para um lado afastado da cidade, um típico costume pois morou em um local assim. A garota estava sentada em um banco observando os pássaros ao seu redor até que uma pena preta flutuou na frente de seu rosto.

- Hum?

Piscou rapidamente os olhos confusa e sentiu uma leve energia naquela pena. Resolveu segui-la um pouco apreensiva, chegando na frente de um enorme colégio. Seus olhos brilharam maravilhada com o que estava vendo. Um colégio afastado da cidade? Muitos sinistro e incrível ao mesmo tempo. O local estava rodeado por uma densa floresta.

A rosada viu um cartaz no portão dizendo que aceitava novos alunos, sem precisar fazer qualquer tipo de teste. Abriu um largo sorriso, essa seria a oportunidade perfeita para seguir em frente e esquecer as mágoas do passado. Respirou fundo criando a coragem necessária e entrou naquele enorme colégio. A brisa brincou novamente com seu longo cabelo, tirando uma risada baixa por parte da garota. Esse seria um novo capítulo na história dela e  Houka esperava que fosse o mais belo capítulo já escrito.