História Sentimentos Apagados - Aproximações

As nuvens avermelhadas do céu anunciavam o fim do dia, a sexta feira foi agitada e mesmo assim passou voando. Ally entrou no quarto e atirou-se na cama fechando os olhos e respirando fundo, quando sentiu seu celular vibrar no bolso da blusa, pegou-o e olhou, era o nome de Kate no visor. Ela leu o que dizia a mensagem. "Você vem no aeroporto despedir-se de mim e do meu irmão, certo Ally? Não te perdoarei se deixar de vir!". Ally abriu a opção de responder a mensagem, mas hesitou por alguns minutos, pensando se deveria ou não. Lá estaria Dake, que apesar das desculpas sinceras que tocaram seu coração, ele ainda a havia machucado muito. Talvez não devesse, mas resolveu levar adiante a chance que o dera e além de tudo, Kate era uma ótima amiga, não queria decepciona-la. "Certo, me diga onde e quando." A mensagem não demorou a receber uma resposta com o endereço do aeroporto e a hora do embarque e, com mais uma mensagem, Ally confirmou presença.

Com um sorriso nos lábios, Ally fechou os olhos e jogou o celular na cama, seu peito parecia leve como se um grande ramo de espinhos tivessem se dissolvido, tudo estava resolvido entre ela e Dake, nunca mais precisaria se preocupar,  pois de agora em diante seriam apenas amigos, amigos de verdade. Virando-se na cama, ela puxou o edredom para cima de si e tapou o rosto para abafar uma gargalhada, mesmo sabendo que estava sozinha em casa. Quando ouviu o celular vibrar abafado pelas cobertas. "Você está melhor? Não pude ir à aula, meu irmão precisou de ajuda na loja, foi bastante movimentado e ele ainda recebeu uma grande encomenda de tecidos." Ao ver que era uma mensagem de Lysandre, Ally deu um pulo da cama, respondendo-o depressa.

"Oi Lys! Estou bem sim, meu dia foi ótimo! E o seu?" A resposta foi imediata. "A mesma coisa de sempre, haha. Mas o que fez do seu dia tão bom assim?" Os dois continuaram conversando sobre assuntos aleatórios enquanto Ally tentava disfarçar o real motivo de sua felicidade, as mensagens iam e vinham e ela finalmente mandou uma mensagem que dizia seus planos para o dia seguinte. "Amanhã vou ao aeroporto despedir-me de um amigo, não sei se fico feliz ou triste com isso, estou insegura.", disse ela. "Quer que eu vá junto? É melhor ter alguém pra te dar um apoio nessas horas.", Lysandre respondeu. Ally respirou fundo, Lysandre era tão gentil que a deixava desconcertada em certos momentos, mordeu o lábio e respondeu. "Não teria problemas pra você?". "Não, tudo bem... Eu iria acabar dormir até tarde mesmo.” Ally riu e pensou que se não fosse pelo convite de Kate, ela também iria ficar até tarda na cama. Então respondeu a mensagem com o endereço e a hora. "Posso te buscar em casa?", perguntou ele. Ally respondeu que sim. Ela voltou a deitar-se na cama, fechando os olhos e relembrando como foi seu dia, acabou pensando em Ambre. “O que ela estava fazendo naquele banheiro?”, questionou-se.

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Ainda era muito cedo quando Ally acordou, o céu apenas começara a clarear-se. Mas ela estava sem sono algum, dormira bastante e isso a deixara cheia de vitalidade. Pegou o celular no meio das cobertas e olhou a hora, eram 06h49min da manhã. Levantou-se devagar, pois tinha bastante tempo e foi até o guarda roupas para escolher algumas. Pegou a toalha e tomou um banho quente bem demorado, escovou os dentes, penteou e prendeu os cabelos com um rabo de cavalo, como sempre usava, e vestiu-se. Desceu e tomou café da manhã sem pressa. Ally notou que sua tia não havia voltado do almoço com o ex e nem sequer do trabalho, logo maliciou a situação, mas espantou os esses pensamentos e preocupou-se com Agatha. Sua preocupação esvaiu-se ao receber uma mensagem da tia, avisando que voltaria antes do meio-dia.

Estaria tudo silencioso não fosse o barulho de carros e pássaros. Ally olhou o relógio e ainda faltava algum tempo até a hora que marcara com Lysandre, foi até a janela e olhou para a rua, a loja de Leigh já estava aberta. A manhã estava um pouco fria, Ally juntou as mãos e esfregou-as rápido para aquecê-las. Sentiu-se um pouco ansiosa ao lembrar-se de Kate e Dake e da partida dos dois. Balançou a cabeça tentando afastar algumas lembranças e sentou no sofá, pegou o controle remoto e ligou a TV, pulando alguns canais e parando num canal de animes, quando notou do que se tratava a programação, um sorriso estendeu-se em seu rosto de orelha a orelha. “Gantz! Nada melhor que um pouco de drama e ação logo cedo.”, pensou ela, vibrando por dentro.

Algum tempo depois Ally olhou o relógio na parede, estava na hora. Ela desligou a TV e voltou ao quarto para pegar um casaco de tricô que costumava usar com aquele vestido amarelo e desceu até a porta, trancou-a com a chave que sua tia havia lhe dado e esperou do lado de fora, encostada no portão, assim poderia ver quando Lysandre saísse de dentro da loja do irmão, o que não demorou muito. Ally notou algo de diferente nele, eram as roupas, roupas um tanto diferentes das que ele costumava usar na escola. Lysandre usava uma camisa verde musgo, uma calça jeans simples e um allstar preto. Estava simples e de fato, bonito. As roupas ficaram tão bem nele que Ally sentiu uma vontade imensa de voltar para casa e vestir uma roupa melhor.

- Ally, bom dia! – Lysandre disse quando chegou, coçando o olho com as costas da mão, parecia estar sentindo bastante sono. – Cheguei atrasad... Lysandre interrompeu a própria frase e analisou Ally.

- O que foi? – Ally ergueu uma sobrancelha, chegando à conclusão de que sua roupa estava realmente ruim.

- Ah... Nada. Eu gostei do vestido. – Lysandre coçou a cabeça e desviou o olhar.

Ally ruborizou e virou-se para esconder, com a desculpa de que chamaria um táxi, mas Lysandre interrompeu segurando-a pelo braço e mostrando o celular.

- Vamos chamar um pelo telefone, acho que é melhor do que ficar abanando o braço para todo táxi que passar. – Ele riu.

- Ah, porque não pensei nisso antes? – Ally deu um tapinha na própria testa. Quando o carro chegou, cada um entrou por uma porta do banco traseiro e sentaram-se perto das janelas. Ally deu o endereço ao taxista e seguiram ao destino. O aeroporto era longe e o silêncio dentro do carro era constrangedor, ninguém falava, ninguém se movia, era só o ronco do motor e o barulho do vento, entrando pelas frestas das janelas semiabertas. Ally então resolveu quebrar o silêncio. – Obrigada por vir comigo... – Ela se aproximou um pouco, juntou as mãos sobre os joelhos e olhou para Lysandre, que observava o movimento da rua pela janela do carro com o queixo apoiado na mão.

- Bem, achei que você gostaria de ter uma companhia. – Lysandre virou-se para Ally sorrindo e seus rostos sem querer ficaram muito próximos, logo sua expressão ficou séria.

- É... – Ally falou, distanciando-se rápido. – Parece que você leu meus pensamentos. Ambos coraram e riram achando graça da situação embaraçosa, o taxista enfim ligou o rádio do carro e o resto da corrida foi tomada pelo som de uma música brega. Ally e Lysandre não se contiveram e começaram a cantar baixinho, acompanhando o ritmo, então olharam um para o outro e riram como duas crianças.

Quando enfim chegaram, Ally tirou dinheiro da bolsa para pagar a corrida, mas Lysandre a impediu e sugeriu que ambos dividissem os gastos. Por fim ficou decidido que Lysandre pagaria a vinda e Ally pagaria a volta. O taxi foi embora e os dois atravessaram o estacionamento até a entrada do Aeroporto, a recepção e o saguão eram gigantescos, Ally teve um pouco de vertigem ao olhar pra cima. Percorreram todo o caminho até o salão de embarque, onde estava escrito num display no alto o número do voo, Ally parou e Lysandre parou logo atrás e procuraram por Dake ou Kate no meio das pessoas. Encontraram-nos próximos a uma parede enorme de vidro grosso e transparente que dava vista para a pista de pouso onde aviões subiam, desciam, manobravam e descarregavam.

- Ally! – Kate foi a primeira a vê-los e levantou depressa de sua cadeira para vir abraçar a amiga.

- Eu disse que viria. – Ally retribuiu o abraço apertado. – Se não se importam, - Ally soltou-se do abraço de Kate e puxou Lysandre pelo cotovelo. – Eu trouxe um amigo. – Ambos riram e cumprimentaram-se, mantendo uma conversa agradável por meia hora, antes de uma voz sintética anunciar o número do voo de Kate e Dake e o embarque.

- Eu virei te visitar. – Kate tentava se mostrar alegre, mas sua voz já estava embargada pelo choro. – E você, venha me visitar também! Isso não é um pedido, é uma ordem, entendeu? Quero você na minha festa de aniversário. – Daqui a alguns meses, Kate faria dezenove anos, embora sua aparência fosse de uma jovem de dezesseis anos.

 - Eu vou sim, prometo. – As duas sorriram antes de Ally se virar para Dake com um suspiro pesaroso. Dake deu alguns passos em direção à Ally, então Kate e Lysandre afastaram-se e sentaram-se nos bancos, a fim de dar liberdade para que ambos se despedissem.

- Acho que ele gosta de você. – Dake sussurrou no ouvido de Ally, apontando discretamente para Lysandre, que tinha o olhar fixado nos dois, este, logo tratou de desviar o olhar.

- Não seja bobo! - Ela deu-lhe um tapinha no ombro e ambos riram.

- Enfim... Nós temos que ir, não é Kate? – Dake chamou a irmã e ambos pegaram suas poucas bagagens. – Vou sentir saudades. – Ele puxou Ally, apoiou seu braço no ombro dela, deu-lhe um beijo na testa e olhou para Lysandre, que imediatamente desviou o olhar. – Ih, ele gosta de você sim. – Sussurrou Dake para Ally.

- A-até logo! Eu também sentirei saudades de vocês dois. – Disse Ally, empurrando-o disfarçadamente e ignorando o que ele tinha dito. Lysandre levantou-se e ficou ao lado de Ally, então Dake aproximou-se dele, aproveitando que Ally estava conversando com Kate e sorriu.

- Cuide bem da Ally, vou contar com você. – Dake piscou e deu um tapinha no ombro de Lysandre, que ficou um sério.

- S-sim. - Respondeu ele, um pouco corado. Kate e o irmão estavam direção à saída quando ela virou-se e acenou para Lysandre e Ally, que acenaram de volta.

Depois de saírem do aeroporto, Ally sugeriu que ela e Lysandre fossem à sorveteria que ficava perto de sua casa. Lys gostou da ideia e então novamente precisaram de um táxi. Ao chegarem à rua onde moravam, Ally pagou o taxista, então desceu do carro, juntamente com Lysandre. A sorveteria não estava muito cheia devido ao clima um pouco frio. Lysandre e Ally entraram, escolheram um lugar para se sentar e fizeram seus pedidos.

- Então... – Lysandre puxou assunto. – Como está se sentindo sobre isso? – Perguntou ele.

- Isso o que? – Ally colocou a colher com sorvete na boca, o saboreou com um leve sorriso e olhou para Lysandre.

- Sobre o... – Ele coçou a cabeça, tentando se lembrar do nome de Dake. – Ah, sobre ele ter ido embora...

- Dakota? – Perguntou a garota. Lysandre afirmou com a cabeça. – Eu estou feliz. Acho que já estava na hora de cada um seguir em frente, sabe? – Ela riu e Lysandre sorriu com o canto da boca, demonstrando que a compreendia e concordava. – Ele fará falta, confesso. – Continuou. – Dake é um cara legal, apesar de tudo.

- É, ele parece ser sim. – Disse Lysandre um pouco sério.

- Mas e você Lys? Tem uma namorada? – Perguntou Ally enquanto enchia novamente a colher com sorvete.

- N-não... – Ele corou. – Para falar a verdade, eu nunca cheguei a ficar com alguém. – Lysandre confessou.

- Sério? – Ally ficou surpresa. – Mas nunca gostou de alguém? – Perguntou ela.

- Bem... Eu já pensei que estava apaixonado por uma pessoa, mas no fim eu percebi que sentia apenas afeto por ela. – Ele sorriu um tanto constrangido por estar contando algo pessoal para uma garota.

- Entendo... – Disse Ally. – E o que aconteceu depois disso?

- Hum... Depois ela se apaixonou pelo meu irmão e até hoje estão juntos. – Ele riu. – Acho que você já deve saber de quem estou falando. – Sorriu e escondeu o rosto com a mão.

- Ah sim, a Rosalya, não? – Perguntou ela. – Tem motivos para alguém se apaixonar por ela. Até eu poderia me apaixonar por ela, mesmo sendo uma garota. – Brincou. – Ela é linda e gentil! – Ally sorriu.

- Você também é. – Lysandre pensou alto.

- Ah... Obrigada! – Ela riu um pouco ruborizada.

- Enfim, mudando de assunto... Eu ainda estou curioso com o que você estava desenhando aquele dia, durante o intervalo. – Lysandre apoiou os cotovelos na mesa e o queixo nas mãos.

- Já que você me contou algo pessoal sobre você, eu vou te falar, mas prometa não rir! – Ally lançou um olhar intimidador e Lysandre concordou com a cabeça. – Eu... Gosto de animes. – Confessou ela, desviando o olhar, um pouco envergonhada. – Eu estava desenhando um personagem de um mangá que eu gosto. – Finalizou.

- E por que eu riria disso? Não é uma coisa ruim, eu também assisto animes de vez em quando. – Disse Lysandre sorrindo.

- Você não está entendendo... Eu adoro esse tipo de coisa! – Ela destacou a voz na palavra "adoro". – E geralmente os otakus, pessoas que gostam de animes, são vistos como pervertidos ou idiotas. Não quero que me chamem de pervertida. – Ela riu.

- Entendo. – Lysandre riu. – E quais são os gêneros que você mais gosta?

- Acho que você não devia ter perguntado... Quando eu começo a falar sobre isso com alguém, eu não paro nem para respirar! – Ally abaixou a cabeça e riu de si mesma.

- Tudo bem, eu quero ouvir. – Lysandre apoiou o queixo em uma das mãos e isso deixou Ally um pouco constrangida, porém feliz por finalmente alguém se interessar no que ela estava dizendo.

- Bom, eu me interesso mais por ação, drama, comédia e romance. Mas principalmente aqueles que tratam de assuntos complexos e psicológicos. Isso me deixa completamente "presa" no enredo. É incrível! – Disse Ally, muito entusiasmada.

- Uau! – Lysandre sorriu. – Achei que você diria que gosta mais de romance...

- Por quê? – Ally deu risada. – Tenho cara não é? Sou muito dramática.

- Sim, você é. – Lysandre riu.

- Seu bobo... – Ela corou e continuou comendo o seu sorvete. – Eu só falei sobre mim até agora. Estou esperando você dizer algo de você, senhor Lysandre.

- Bem... O que eu poderia dizer? – Ele coçou a cabeça em dúvida.

- Os seus gostos musicais talvez? – Ally sugeriu.

- Hum... Eu gosto muito de música clássica, mas isso não me impede de ouvir outros gêneros como rock, indie e folk... – Respondeu ele. – Eu não tenho uma preferência musical, só ouço o que me agrada mesmo.

- Isso é ótimo! – Ally sorriu. – Eu também sou assim. Eu gosto de experimentar outros tipos de música e não ficar sempre na mesma coisa.

- Pois é! – Lysandre concordou. Ally ia dizer algo, mas duas silhuetas familiares entraram na sorveteria e passaram atrás de Lysandre, que instintivamente olhou para trás para saber o que havia distraído Ally. Logo percebeu que as duas pessoas se tratavam de Nathaniel e Amy, que se sentaram a duas mesas de distância sem perceber a presença de Ally e Lysandre.

- Olha que fofo, estão em um encontro! – Os olhos de Ally brilharam enquanto admiravam o jovem casal à sua frente. Lysandre riu do olhar bobo que Ally lançava sobre os dois. – Lysandre, que horas são? – Perguntou Ally, apontando para o relógio no pulso do rapaz.

- Quase meio-dia. – Respondeu ele.

- Caramba! – Ally levantou-se rapidamente, ajeitando a barra do vestido. – Eu tenho que ir para casa, minha tia já deve estar para chegar. – Então tirou um pouco de dinheiro de sua bolsa e colocou sobre a mesa. – Isso deve pagar a minha parte. Desculpe-me por sair tão apressada. – Disse ela um tanto envergonhada.

- Tudo bem. – Lysandre sorriu. – Nos vemos segunda-feira!

- Até segunda! – Ally sorriu e afastou-se, indo em direção à porta. Amy notou que a amiga estava lá e acenou para ela, Ally sorriu e fez o mesmo.