Pela manhã, ao me virar na cama encontrei o corpo esguio de Park jogado sobre meu travesseiro de penas, não me lembrava exatamente como realmente tínhamos chegado a cama, me lembrava de termos estado no sofá por longas horas, ainda assim agora deitados no mesmo local, partilhando o calor dos cobertores de algodão e ouvindo o ressonar baixo um do outro, sentia que praticamente tínhamos flutuado em direção àquele ninho de amor. Por mais que tenhamos dividido a mesma cama por anos, a atmosfera era completamente diferente, não tínhamos o mesmo cheiro — tínhamos tomado banho antes de dormir, esse não é o ponto—, o ar não tinha o mesmo peso e sequer meus pensamentos seguiam a mesma linha de raciocínio, o que quero dizer é que uma vez que se dá um passo, seja ele grande ou pequeno, em direção a alguém, tudo ao redor de ambos muda drasticamente.
O corpo adormecido ao meu lado tinha aos meus olhos uma imagem ainda mais bonita do que realmente se parecia, apesar de eu sempre tê-lo amado exatamente como se parece, atualmente sentia que meus olhos brilhavam numa intensidade diferenciada, tinham adquirido nova cor e ele, novo significado. O momento em que se cruza as barreiras do medo e deixa alguém entrar, é quando verdadeiramente o crescimento começa entre ambos.
O medo que antes eu tinha de dizer qualquer coisa que fosse ao meu hyung e o mesmo interpretar de forma tão errônea a ponto de me julgar mal e assim, se afastar, por saber de sentimentos que na verdade eu tenho nutrido há anos, se extirpou, sentia-me leve como se pudesse dizer qualquer coisa que viesse a minha cabeça, um tipo de leveza não passageira e confortável, dentro do meu peito a certeza de que ele me pertencia só crescia e eu sabia que, independentemente de qualquer coisa, sua presença, saber que ele estava ao meu lado — agora mais do que nunca—, aliviaria meus medos de fazer a coisa errada.
Não queria acordá-lo tampouco, tudo o que eu queria fazer era admirá-lo por mais um tempo, não que eu tivesse medo de que as coisas não fossem reais, na altura em que estávamos, já não tinha mais medo de nada, eu estava completamente imerso no que nós tínhamos e isso me consumia de forma a — pelo menos agora— não temer a irrealidade de todos os toques que desde o primeiro momento, tivemos. Não queria acordá-lo na verdade porque admirar seu rosto é bastante confortável, pensar que nutri por ele um carinho desde a infância, que cresci idealizando nada mais do que nós dois juntos e não é para parecer um romântico à moda antiga ou um Romeu fora de época, mas nunca quis outro, que não ele, nada que se encaixasse em mim tal qual ele sempre se encaixou e se encaixa.
Parte de mim sente-se acomodada, quente, pertencente a algum lugar como há muito não tenho me sentido, estar ao seu lado era a certeza de missão cumprida, não que estarmos juntos tivesse alguma coisa a ver com uma competição ou quem sabe um jogo, no entanto, sentia que toda aquela corrida para conquistar seu coração, finalmente foi possível.
Enquanto o vento matutino balançava de leve as cortinas brancas da janela, me lembrava de todas as vezes em que segurei sua mão, de todas as vezes que o elogiei e quis mostrar que apesar de não entender de astronomia, se pudesse descobrir um novo astro, era o nome dele que eu daria, de todas as vezes que — não sutilmente— quis que ele soubesse que eu o amava, mas não fazia ideia de como lidar com isso, não sabia que palavras usar. Como eu poderia querer me expressar se sempre tive medo da resposta? Sua presença porém, extirpou de mim esse medo e o peito que antes queimava em fogo e o desespero das mãos trêmulas ao olhar seus olhos, não passava do nervosismo característico de quem ama sem limites.
Pensando em tudo pelo que passamos, compreendia por que não queria acordá-lo, desejava alguns minutos a mais para admirá-lo daquele jeito, não como o Park Jimin melhor amigo, e sim como amante, como aquele que tem uma parte enorme de mim em seu peito e que pela primeira vez pude saber que nele, habita outra enorme parte de mim também. Estava admirando seu rosto, mesmo que não tocasse, para deixar meu coração em paz, para que minha mente descansasse em vez de continuar trabalhando naquela jornada desesperada para ser notado, porque finalmente eu o tinha, do jeito que sempre sonhei.
É basicamente como estar casado e acordar no dia seguinte questionando-se: “é verdade, então?”, nunca acreditamos que merecemos o amor, até que ele se instala repentinamente sem pedir permissão ou perguntar se há lugar para ficar. O amor se espalha como uma célula que desordenadamente se multiplica, é uma desordem benigna, é o tudo, mesmo sobre aqueles que temiam o nada, o fim. Nunca vou cansar de comparar Jimin como o marco da minha existência como pessoa, como conhecedor da felicidade, veículo do meu amadurecimento e grande amor da minha vida, eu quis me tornar um homem melhor por ele, desejei amar a mim mesmo, por saber que só poderia amar alguém quando fosse capaz de me amar também, estar ao seu lado era compreender que por vezes, a felicidade se materializa em alguém, se impregna nas palavras dela e te rouba uma anterior lacuna, tudo são cerejas no topo do bolo.
Quis deixa-lo dormindo pois só assim poderia seguir com meus pensamentos, posso repassar o nosso roteiro na mente e encerrar qualquer ocasional medo ou insuficiência que queira atrapalhar a mim e a ele de pertencer um ao outro. Sei que não sou o melhor, mas saber que posso tê-lo e compreender que alguém como ele escolheu a mim para amar, me faz pensar que talvez eu seja melhor do que esperava.
A paz em que ele descansa e a calmaria que seu rosto me transmite me lembra uma utopia. É isso, a palavra que eu estava procurando. Desde o começo, estar ao lado de Jimin é a constante sensação de estar com os pés fora do chão, o jeito que seu corpo me aquele, que ele me abraça, seu sorriso agradável e a risada audível e melodiosa, me tele transportavam para um universo particular, e eu o amo por isso, por isso e por sua capacidade de roubar de mim a necessidade de viver uma realidade exterior ao sonho que vivemos juntos.
Eu amo Park Jimin porque todas as curvas do nosso caminho nos trouxeram para este momento, tudo o que passamos e a quantidade de coisas variadas que eu senti, entre perde-lo, tê-lo, beijá-lo, deseja-lo como um pecador deseja o perdão e a variação até descobrir que sim, ele é tudo o que eu sempre quis, me fazem sorrir porque nos trouxeram até esse momento. Acredito que em algum lugar há o desenho de nosso encontro e as lacunas formam um enorme e divertido mapa do tesouro, que nos leva até aqui, exatamente onde estamos.
Eu não mudaria nada do caminho que fiz até poder finalmente tê-lo em meus braços, não mudaria nossos desencontros, discussões, nem mesmo a diferença de idade e o meu medo bobo de não ser o homem perfeito, não mudo nada porque se algo se modificasse, eu talvez tivesse tentado antes, e antes eu era muito jovem para saber amá-lo. Estar apaixonado por alguém é perigoso, a paixão é um caminho traiçoeiro, as coisas são melhores do que realmente são quando estamos apaixonados, porém, quando amamos alguém ao ponto de tê-la em nossos pensamentos constantemente e desejá-la em nosso braços é tudo o que fazemos dia e noite, precisamos compreender as contingências, que cada pessoa é um universo e às vezes as estrelas colidem nesse universo, que ocasionalmente projéteis vão dispersar, que às vezes alguns meteoros não vão cair quando esperávamos. Precisamos compreender que há dias bons e dias ruins e que ninguém é responsável por ninguém, seja pelo coração, pelos problemas ou pelo corpo de forma geral, não somos responsáveis por aquilo que cativamos, somos responsáveis pela maturidade dos nossos sentimentos e mediante a maturidade, poderemos doá-lo a alguém no momento em que pudermos fazê-la desejar ficar.
O amor não é um contrato, não é prisão, não machuca, não se felicita com a dor do outro, não sente ciúmes e não toma posse de nada, é compreensivo, e talvez eu não estivesse pronto para dar esse amor livre ao Jimin, quando era apenas uma semente, que não tinha desabrochado em flor. Por isso não me arrependo das escolhas, pois fui trazido para ele quando ambos estávamos prontos para o amor, a contingência de reforço foi a própria congruência de tempo.
Segui observando seu rosto, como se no silêncio daquela manhã pudesse agradecer por ter feito valer todas as vezes em que eu não desisti e pensei “Como poderia?!”, afinal, quando amamos, como podemos?
Não queria me levantar, apesar de querer contar as boas novas para o Taehyung, ainda não desejava me mover, sequer desestabilizar a calmaria que seu corpo exalava, não queria que o mundo soubesse, porque quem precisava saber, estava bem ali. Pensei que as coisas estavam começando entre nós exatamente como tinha começado dias atrás, se eu soubesse aonde uma saída para o shopping teria nos levado, provavelmente observaria seu belo rosto enquanto mastigava, por mais tempo, teria tirado uma foto.
Decidi que eu teria muito para viver ainda, provavelmente há muitas pessoas que vão querer saber sobre nós, algumas sobre como aconteceu, outras apenas vão rir de “Finalmente aconteceu?!”, mas naquele momento eu só queria aproveitar que pela primeira vez na minha vida com Jimin, estava sentindo algo plural e finalmente, recíproco.
Beijei sua têmpora com todo o cuidado do mundo e ele encolheu-se em meu peito quando deitei na cama, levei minha mão esquerda até suas costas e enquanto acariciava, em silêncio pensava que o mundo tinha acabado de mudar, apenas porque nós estávamos finalmente juntos, mas eu podia pensar nisso outra hora. A realidade não me interessa quando estou com ele.
— Corta! — Ouvi o diretor falar, depois de pelo menos cinco minutos em que passei deitado na cama, abraçado ao corpo de Jimin.
Todas as pessoas que trabalhavam na produção, fossem câmeras, figurinistas, maquiadores, todos eles começaram a aplaudir no quarto que servia de cenário para as gravações, eu que ainda tinha o rosto escondido nos cabelos do mais velho, sorri, vendo que ele estava movendo-se verdadeiramente agora.
— Depois de 6 meses, finalmente conseguimos terminar de gravar! Parabéns meninos, vocês foram ótimos! Rodada de cerveja para todos! — Aquilo fez com que Park levantasse a cabeça da cama rapidamente.
— Alguém disse cerveja?! — gritou para a multidão arrumando-se para sair e todos riram em retorno.
Enquanto ele vestia a roupa em minha frente e ocasionalmente jogava os cabelos para trás, eu não conseguia me levantar da cama ainda, estava confortável o suficiente para afundar ser recomendado, observei no entanto seu corpo sendo coberto pelos tecidos e um sorriso de canto não abandonava meu rosto.
— Que cara é essa, Kook? Você não vem para o happy hour de comemoração? — questionou, sentando-se na ponta da cama e calçando seus sapatos. Fiz que sim com a cabeça.
— Vou sim, mas pode ir na frente, eu já alcanço vocês. Só preciso terminar de editar uma coisa.
Não reparei a hora em que ele finalmente saiu, estava com o computador ligado em cima do colo — o mesmo usado para a cena do Facebook do Yoongi—, abri o editor de vídeos e continuei o que tenho feito nos últimos meses: GCF Park Jimin Edition. Um compilado com todos os vídeos que filmei dele nos últimos meses de gravação.
Jimin é meu melhor amigo, um dançarino contemporâneo incrível, há alguns meses enquanto eu estava no campus de artes, vi que tinham aberto vagas para audições acerca de atuar em um Dorama, de início ele negou, porém depois aceitou pois insisti muito, não estávamos muito confiantes e nos assustamos quando o resultado saiu e tínhamos passado, ainda assim, temos contracenado há 6 meses com outras pessoas de renome, como o modelo e cantor de R&B, Kim Taehyung, o produtor e idol, Min Yoongi e o rapper Jung Hoseok, foi uma oportunidade e tanto, a produção disse que provavelmente continuaremos na companhia para novos trabalhos, principalmente como casal, pois segundo eles “Vocês tem uma sintonia incrível”.
Desbloqueei o celular e vi a foto que tiramos juntos há pouco tempo quando saímos juntos, sorri para a fotografia. Mal eles sabiam que o que tínhamos era mais singular e não recíproco do que o nome do dorama.
“Kook, você vem? Estou te esperando na entrada do prédio.”
Mandou a mensagem para mim e eu sorri, respondendo na mesma hora.
“À caminho, mochi.”
Eu seguraria a mão dele a noite inteira, ele riria das minhas piadas, provavelmente dormiríamos e ocasionalmente nos beijaríamos, isso é porque estamos juntos, mas não juntos, afinal, ele é o único que não admite que estamos completamente apaixonados um pelo outro. Há muito tempo.
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