1. Spirit Fanfics >
  2. SKIN CURE - A Cura Fica Na Pele >
  3. 2. Damon

História SKIN CURE - A Cura Fica Na Pele - 2. Damon


Escrita por: Markz

Notas do Autor


Segundo capítulo...

Capítulo 2 - 2. Damon


Fanfic / Fanfiction SKIN CURE - A Cura Fica Na Pele - 2. Damon

    O ÚNICO BARULHO QUE OUÇO É O CHACOALHAR DAS folhas. O vento da tarde bate nelas e transmite aquela calmaria que só a solidão pode proporcionar. Muitas vezes prefiro estar aqui do que com outras pessoas. Sei que a principal regra da colônia é viver sob o mantra que diz que precisamos uns dos outros e que, enquanto estivermos juntos, nada de ruim pode nos acontecer. Aceitei viver sob essa filosofia, mas a ideia de viver me escondendo não me agrada muito. E estar com os outros significa manter a cabeça apenas nisso. Em estratégias de proteção, estabelecimento de rondas, patrulhas noturnas, treinamentos de defesa. Entre tantos afazeres que sustentam a colônia, escolhi o mais solitário possível. Caçar. Providenciar algo que ajude na alimentação do povo não é uma tarefa fácil de realizar, mas o tempo que passo sozinho e isolado de toda a agitação diária compensa apenas por me manter fora da colônia por algumas horas.
    A colônia é o refúgio de pessoas como eu. Morenas e negras. Nos escondemos dos terroristas que querem nos matar e do governo que quer nos usar como solução para os problemas deles. Acreditamos que a colônia seja tudo o que restou dos negros no mundo. Muitos de nós morreram por causa da busca desenfreada pela cura do VC e esse número aumenta cada vez mais. É uma situação preocupante.

    Carrego uma besta comigo e observo cada canto da floresta com extrema atenção em cada movimento. Meus passos são silenciosos e ritmados sobre o chão de terra. As árvores estão com um tom de âmbar, é outono e não vai demorar até as folhas caírem. O vento frio corre por todas as direções, o que me fez fechar minha jaqueta há uma hora.

    Vejo algo se mexer no alto de uma árvore. Uma ave empoleirada em um galho repousa com tranquilidade como se eu nem estivesse ali. Miro a besta na direção dela e disparo, ela despenca lá do alto com uma flecha cravada em seu olho. Tem muita carne, mas não o suficiente para me fazer encerrar a caçada e voltar à colônia e parte de mim fica feliz com isso. Guardo a ave na bolsa e continuo caminhando floresta adentro. Escorrego por um declínio revestido de musgo e chego à parte mais baixa da floresta, a área mais próxima do lago. Ando mais um pouco e, avisto três patos. Uns cinco tiros depois e tenho dois deles guardados junto à ave. Ainda é um pouco cedo para voltar então decido procurar por mais algum animal que possa levar para a colônia. Caminho por cerca de dez minutos e estou quase desistindo quando vejo um arbusto balançar. Não posso me aproximar ou, seja lá o que estiver sacudindo, vai fugir. Então me agacho e tateio a terra até encontrar uma pedra. Minha mão esbarra em uma e rala um pouco da pele do meu dedo. Mas não é nada muito sério, então pego a pedra e arremesso contra o arbusto, uma coisa salta lá de dentro. É um coelho selvagem, garras enormes e pontiagudas na extremidade dos dedos e um olhar feroz. As garras fazem parte de um processo evolutivo. Elas facilitam a escavação em busca de raízes que servem de alimento. Seleção natural. Ele é destemido pois começa a saltar na minha direção e me custa três disparos até que uma das flechas o atinja e ele caia imóvel no chão. Pego a agressiva criatura e enfio na bolsa antes de trilhar o caminho de volta à colônia.

    O céu já está tingido de laranja e anunciando a chegada da noite. As copas das árvores ficam douradas atingidas pela luz. Passo por uma nogueira e há um esquilo passeando em um de seus galhos robustos, estão tão entusiasmado com as nozes que nem nota minha presença até o momento em que uma de minhas flechas atravessa seu corpinho gordo. Recolho o esquilo e coloco na bolsa. Escalo a árvore, meus pés deslizam às vezes e alguns galhos fracos se quebram sob o meu peso, mas consigo alcançar algumas nozes e encho um saco delas. Volto ao chão e caminho até a colônia.

    São quase cinco horas quando chego à vila. Os chalés que compõesm a colônia são feitos com madeira e folhas, são pequenos visto que são usados para dormir. Todos passam o dia executando suas funções. Acima de nossas cabeças, está o que todos chamam de cobertor, trata-se de uma lona com terra, folhas e arbustos sustentada por altas estacas de madeira, fincadas ao redor da colônia, como um grande telhado sobre todos os chalés e dependências do refúgio, serve para nos esconder das buscas aéreas realizadas mensalmente.

    Da última vez em que a colônia foi encontrada, foi por causa de uma busca aérea. Alguém em um aeromotor nos localizou em uma clareira e bombardeou a colônia nos forçando a fugir ou morrer.

    Aqueles que conseguiram escapar, reconstruíram tudo em outro lugar e o conselho da colônia ordenou que a lona fosse estendida sobre nós. Agora quando sobrevoam a colônia, tudo o que veem são folhas, terra e ramos, como uma clareira vazia. É uma ideia de camuflagem eficiente. Tem nos evitado problemas há um bom tempo. Às vezes, alguns de nós são mandados em vérias direções para deixar pistas falsas em outros lugares e desviar a atenção dos captores e dos terroristas. No momento, eles acham que estamos escondidos a oeste.

    Caminho entre os chalés até alcançar a cozinha comunitária. Quando cruzo a soleira da porta. Nancy se aproxima para me receber. O cabelo grisalho preso em um rabo de cavalo e um avental branco, é a imagem que tenho gravada na mente pois é assim que ela fica quase que o tempo todo.

    — O que trouxe hoje, Damon? — pergunta ela, animada. Entrego a bolsa e o saco de nozes. Ao olhar o interior da bolsa, Nancy abre um sorriso e seus olhos escuros chegam a brilhar. — Isso dará uma bela sopa, garoto.

    Sorrio.

    — Tenho uma coisa para você também. — diz ela indo até a bancada e pegando uma tigela coberta. — Fiz para você.

    Nancy me entrega a tigela e eu olho o que há dentro, algumas torradas e um pouco de geleia de morango.

    — Nancy, não precisava fazer isso. — digo. — Você já tem que cozinhar para a colônia inteira e ainda se dá mais trabalho?

    — Isso é forma de agradecer? — pergunta ela, cruzando os braços e me olhando sério.

    — Desculpe. Obrigado. — falo.

    — Assim está melhor. — Nancy volta a esboçar sua expressão sorridente. — Shauna colheu os morangos e me pediu para fazer a geleia pra você. Foi tudo ideia dela.

    — Ah, agradeça a ela em meu nome, então. — digo. — Bem, vou para o meu chalé, preciso descansar um pouco. Nos vemos no jantar.

    — Até lá. — diz Nancy voltando às panelas.

    Saio da cozinha e ando pela colônia até meu chalé. Ao entrar, me sento na cama e abro a tigela. Pego uma torrada e passo na geleia. O sabor é ótimo, agridoce, os morangos estavam frescos. Em poucos minutos, não resta mais nada na tigela.

    Shauna deve ter passado passado um bom tempo de colheita selecionando morangos para essa geleia. Shauna é filha de Nancy, temos a mesma idade, a função dela é colher as frutas, legumes e verduras da horta junto com várias outras garotas. Para elas, é a melhor hora do dia. Quatro horas de colheita e elas acham tempo suficiente pra falar da colônia inteira. Graças a essas conversas, correram boatos de que Shauna é interessada em mim. Várias pessoas vieram me contar isso. A empolgação em seus olhos era evidente. Espalhar boatos é o esporte favorito das pessoas aqui. Quando me contavam sobre Shauna, eu fazia vista grossa. Ignoro na esperança de que isso desapareça com o tempo. Shauna é bonita e gentil, mas não pretendo me encrencar por isso. Há uma regra na colônia, regra essa que diz que seus habitantes devem evitar relacionamentos íntimos demais. Isso leva a filhos e, logo, nossa população cresceria além do que a colônia pode suportar. Além do mais, nas atuais circunstâncias, ter filhos não é algo a se cogitar. Vivemos fugindo, nos escondendo, temendo por nossas vidas cada vez que saímos a céu aberto. Não estamos vivendo uma época fácil e é injusto colocar mais pessoas no mundo para sofrerem como nós. Além disso, existem punições para quem quebra essa regra.

    Repouso a cabeça no travesseiro e sinto o corpo relaxar. Não se pode dizer a mesma coisa durante a noite. Tenho pesadelos constantes e repetitivos. A colônia em chamas, pessoas caídas, e, por fim, sou pego e morro. Desperto em agonia com o som do disparo da arma. Louis, o líder da colônia disse que sofro de síndrome de estresse pós-traumático. Quando eu era criança e atacaram a  antiga localização da colônia, eu me escondi no depósito atrás da cozinha e vi um terrorista enfiar uma bala na cabeça do antecessor de Nancy. O que explica a minha resistência em fazer uso de arma de fogo. Quando sou designado para rondas noturnas, uso a besta.

    Em meio a meus pensamentos, o sono chega e eu adormeço.


---


    Desperto atrasado para o jantar então me apresso em ir ao refeitório.

    Nancy me serve sopa e um pão macio. Ela consegue fazer o melhor possível com os recursos que temos. Pego um copo de suco de amoras e me sento à mesa mais afastada do refeitório, a que fica localizada ao fundo encostada à parede. Ninguém costuma sentar aqui, então tenho privacidade sempre.

    Tomo a primeira colherada da sopa e noto alguém me observando a algumas mesas de distância. Continuo tomando a sopa, rasgo um pedaço do pão e levo à boca. Viro a colher na direção de meu observador e vejo seu reflexo no metal polido. Exatamente quem eu imaginava que seria. Shauna está sentada a uma mesa de distância de mim e me dá mais atenção do que ao prato de sopa disposto à frente dela. Prossigo com minha refeição, tomo o suco de amoras e como mais outro pedaço de pão. Quando termino minha sopa, Shauna já não está mais no refeitório.

    Levo os pratos até Jim, meu colega de chalé. A função dele é lavar os pratos. Nunca compreendi como ele pode estar sempre bem-humorado quando tem pilhas diárias de pratos para esfregar. Quase não o vejo durante o dia.

    — Damon, estava mesmo precisando falar com você. — diz ele, sorridente, assim que me aproximo. O suor escorre da testa dele pela lateral de seu rosto. Os dentes dele são brancos e entram em contraste com sua pele, mais escura do que a minha.

    — Algum problema, Jim? — pergunto.

    — Não, não. É claro que não. Eu só queria perguntar se pode me fazer um grande favor.

    — Claro. O que é?

    — Gostaria de saber se pode assumir meu posto na ronda noturna hoje. Assumo o seu na próxima vez. Estou muito cansado. Faria isso por mim? — pergunta ele.

    — Tudo bem. Eu não vou conseguir dormir mesmo... — digo.

    — Obrigado, muito obrigado.

    — Mas sabe, Jim, sua função é sobrecarregada o bastante para lhe dar o direito de contestar a obrigação da ronda. — sugiro.

    — Não. Não posso fazer isso. Se fizer isso, terei de obedecer ao toque de recolher todos os dias. Nunca poderei sair à noite. — diz Jim empilhando alguns pratos.

    — E isso é problema porquê? — pergunto.

    — Porque não suporto ficar dentro do chalé a noite toda. Não todos os dias.

    — Você e sua mania de liberdade. — digo.

    — Falou o homem que se mete na floresta todas as tardes. — rebate ele, sorrindo. Retribuo o sorriso.

    Do lado de fora do refeitório, Shauna está sentada nos degraus da entrada. Seus olhos castanhos brilham à luz das tochas. Seus cabelos estão soltos em cachos que deslizam por seus ombros morenos. Chama a atenção de muitos homens, já percebi isso várias vezes.

    — Boa noite, Damon. — diz ela quando passo.

    — Boa noite, Shauna. — respondo.

    — Como tem passado? — pergunta ela.

    — Bem. A propósito, obrigado pela geleia. Estava ótima.

    — Fico feliz que tenha gostado.

    Ergo os cantos da boca em um sorriso contido. Ela sorri de volta sem conter.

    — Você está escalado para a ronda hoje?

    — Sim, estou. Troquei de posto com Jim hoje.

    — Entendo, Bem, talvez nos vejamos hoje. É minha noite também. — diz Shauna se levantando.

    — Ah, sei. É, talvez... — digo. — Então, até mais.

    — Até mais. — responde ela enquanto me distancio cada vez mais do refeitório em direção ao meu chalé.


Notas Finais


Continua...


Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...