História Snow - Capítulo 2

Naruto abriu os olhos, encarando a copa da árvore totalmente congelada. Alguns poucos flocos de neve caiam lentamente do céu nublado. Já tinha amanhecido e um pequeno monte de neve se formava sobre ele. 

O loiro teve um pouco de medo de se mover, sabendo que seu corpo inteiro doía. Mas com certa dificuldade se sentou, retirando a neve acumulada de cima dele, encostando no tronco da árvore  respirou fundo. Se não fosse pelo espírito da raposa que vivia dentro dele, certamente teria morrido congelado em suas roupas ensopadas. Mas um cheiro diferente chamou a atenção dele. 

Respirou fundo mais uma vez e um aroma delicado invadiu suas narinas. Ele puxou o tecido para o seu rosto e inspirou mais uma vez. O cheiro delicado de orvalho e algo a mais que ele não conseguiu distinguir, o deixaram em transe por alguns segundos e ele fechou os olhos. 

Quando finalmente abriu os olhos e reconheceu a manta branca, jogou o tecido o mais longe possível e liberando uma cauda, estraçalhou o pano. Seu rosto estava completamente vermelho e o loiro sentia o coração bater rápido demais. 

-Aquela...caçadorazinha... - apertou um punhado de neve no chão - Com quem pensa que estava lidando? Não vai passar da próxima vez. 

Colocou a mão sobre o ferimento, já quase totalmente curado e se levantou aos poucos, adentrando ainda mais a floresta. Olhou para a pequena cabana e suspirou cansado. Abriu a porta e se jogou na cama, mesmo sujo, não se importava. Queria apenas dormir um pouco. 

O restaurante era aconchegante, quente e servia uma comida boa. Não se importava com o silêncio do local ou com os outros encarando enquanto ele comia sua sopa. Desde que não interrompesse seu almoço, estava tudo bem.  

Naruto se recostou no banco e pediu uma caneca de chá quente, esquentando suas mãos na caneca e bebendo o líquido com calma. Aos poucos as conversas ao seu redor retornaram, o deixando um pouco mais a vontade e relaxado. 

-Soube que Saiken foi morto – um dos homens em uma mesa falou- Eles vão matar todos. São pessoas cruéis. 

-E ele não tinha atacado ninguém, só estava descansando. Sabem como ele era... Quando o líder atacou, tinha algumas crianças por perto e Utakata-san protegeu elas. Infelizmente não se salvou. 

-Se todos se juntassem, com certeza seríamos forte o bastante para vencê-los. 

-Você está louco? Os caçadores são muito fortes! Até ele foi ferido ontem – o homem falou a última parte mais baixa e todos voltaram a olhar para o loiro. 

Naruto se irritou e bateu a caneca com força na mesa. 

-Se vocês parassem de perturbar os humanos, talvez eles os deixassem em paz, já pensaram nisso? Qual a graça de pregar peças nos outros? São crianças por acaso? - ele se levantou deixando o dinheiro sobre a mesa – Sinto nojo de pessoas como vocês. Se acham melhores que aqueles merdas de caçadores, mas são tão merda quanto eles. 

O loiro ia saindo quando um dos homens gritou 

-E você Kyuubi? 

Naruto parou por um instante e deu de ombros. Geralmente não se envolvia nos assuntos dos outros e não seria diferente agora. 

-Como esperado – o homem riu – Um covarde como sempre. Você só lida com os seus interesses não é mesmo? 

-E porque me envolveria? - Naruto parou na porta, segurando firme no batente –E nunca me chame de covarde!  

O loiro se virou com os olhos vermelhos, quase em chamas laranjas e rapidamente o restaurante inteiro ficou em silêncio rapidamente. Naruto se virou e saiu dali rapidamente. O homem assustado se jogou na cadeira aliviado. 

-Você ficou maluco? - outro brigou com ele –Se a kyuubi ficar irritada será nosso fim! 

-Bando de idiotas – ele limpo o suor do rosto -Não passa de um moleque! 

-Um moleque muito forte! A mãe dele destruiu uma cidade inteira só porque tiraram sarro do cabelo dela. Vocês se lembram que se não fosse o pai, esse moleque já teria destruído esse vilarejo a muito tempo. 

-Hunf – cruzou os braços - E tanto pra nada! Nem mesmo demônios como nós abandonariam a própria família do jeito que ele fez. Entregou os próprios pais nas mãos dos caçadores... 

Naruto fechou as mãos tão fortes a ponto de ferí-las. Ninguém sabia que os pais tinham se sacrificado para salvar ele. Para todos, Naruto abandonou os dois para morrerem. Se tivesse o controle sobre o espírito da Kyuubi na época, teria acabado com cada um daqueles caçadores. Mas o que poderia ter feito com apenas cinco anos? 

Quando ficava com raiva de alguma coisa ele sempre perdia o controle. Só quem conseguia controlar era seu pai, com toda a paciência que tinha. Era a pessoa mais gentil que tinha conhecido a vida inteira. Um simples humano que de alguma forma conquistou um demônio. Não teve oportunidade ou idade para fazer as perguntas que agora tinha vontade, mas se lembra que mesmo sempre fugindo, tinha uma família feliz. 

O loiro caminhou de volta para a floresta com os pensamentos longe, na sua infância. Por isso escolheu morar na floresta, afastado da cidade e também do vilarejo dos espíritos. Não se encaixava em lugar algum. Queria apenas encontrar o responsável pela morte dos seus pais. Tinha encontrado algumas pistas, mas os caçadores o tinham atrapalhado da última vez. Não era do tipo que lutava sem motivo, odiava machucar alguém e sempre fazia o possível para evitar uma briga, mesmo tendo um temperamento explosivo. 

A estrada era escura, mas ele não tinha problema algum em enxergar. Poderia seguir aquele ritmo a noite inteira e não ficaria cansado. Mas por sorte o seu alvo estava bem perto. Não tinha como esquecer aquele cheiro, e uma coisa que Naruto era bom era se lembrar perfeitamente dos cheiros. O que o fez franzir a testa por um momento. 

Era comum encontrar grupos de caçadores acampados no meio da noite. Naruto em forma de raposa observou silenciosamente por detrás das árvores. Ali tinha cerca de quinze caçadores, eram muitos. Nenhum deles sentiu a presença do espírito, aliás, apenas uma pessoa. Os olhos perolados o encararam tão fixamente que ele se remexeu incomodado. Se ela desse o sinal, ele teria de lutar com certeza. 

Abaixou o focinho expondo as presas, prestes a rosnar mas a garota o surpreendeu. Balançou a cabeça devagar e olhou ao redor, fingindo não ter visto nada. O cheiro estranho chegou até ele, fazendo o seu coração acelerar novamente. Algo estava errado, ela fazia ele se lembrar de algo, tão familiar, mas desconhecido. 

Saiu dos seus devaneios quando um homem alto gargalhou. Eles estavam bebendo, provavelmente comemorando alguma caçada bem sucedida. Os cabelos negros compridos, o jeito arrogante de falar e o cheiro inconfundível. Algo que ele associava à morte. Abaixou as orelhas e mostrou as presas. O rosnado saiu sem que ele pensasse ou pudesse controlar. 

Em poucos segundos todos os caçadores estavam a postos, com armas na mão, prontos para o combate. Ele saiu de trás da árvore com as garras expostas, pronto para o combate. As caudas balançavam agitadas no ar e o corpo da raposa começava a ser coberto com uma espécie de manto vermelho-alaranjado. 

-É a Kyuubi! - um dos homens gritaram 

Alguns pareceram um pouco relutantes, mas foram incentivados por outros que começavam a cercar a raposa. Apontaram as armas consagradas, feitas especialmente para aprisionar espíritos. O loiro deu um passo para trás, não estava preparado para enfrentar os caçadores ali, e ainda tinha uma sensação estranha. Algo que o estava deixando inquieto. 

-Não vai fugir raposinha – o homem moreno sorriu - Não vou deixar. 

-Madara-san, não acha que é um pouco precipitado atacar o espírito da Kyuubi aqui? 

O moreno olhou para Hinata com um ar de quase desprezo. 

-Não me insulte menina! Quem acha que eu sou? 

A morena olhou na direção da raposa que parecia apenas aumentar de tamanho. Não gostava da vida que levava e de forma alguma concordava com nenhuma das partes. Nem os caçadores estavam certos como afirmavam e nem os espíritos estavam certos em perturbar os humanos. 

Os espíritos eram odiados porque gostavam de pregar peças nos humanos. Estragavam plantações, roubavam animais, faziam as pessoas se perderem na floresta, assustavam as crianças, e tinham aqueles que eram fortes o suficiente para cometer assassinatos. Mas a morena sabia que não se aplicava a todos, e  também tinham humanos que faziam a mesma coisa e não eram punidos. 

Olhou para a criança aprisionada. Tinha a forma de um gato grande, estava machucada mas nada a impediria de correr, as cordas especiais apertavam as mãos/patas dela. Os caçadores gostavam de fazer uma grande festa quando abatiam algum espírito e com essa criança com certeza não seria diferente. Segurou o punhal com força e baixou a cabeça para o capitão do grupo. 

-Desculpe senhor... 

Enquanto o som das lanças e espadas enchiam o lugar, Hinata se afastou um pouco. Não era do tipo que lutava, não que não soubesse. Poderia matar alguém rapidamente. Mas sua especialidade ali era outra. Ela podia sentir a presença de um não-humano a uma certa distância. Era muito útil em uma caçada e sempre se mantinha atenta para avisar o grupo de um possível ataque. 

Quando o grito de fúria ecoou pela clareira, Hinata ofegou. Nunca tinha sentido um poder tão grande como o da raposa. E tinha certeza que ela estava apenas se defendendo. Cinco dos caçadores já estavam no chão, feridos e se o demônio liberasse todo aquele poder contido seria capaz de eliminar todos ali rapidamente. Não entendia porque não o fazia. Deu alguns passos para trás, chegando perto da menina presa. 

-Eu vou te soltar. Você consegue correr? 

Mesmo sem entender o motivo da caçadora querer solta-la, a garota confirmou com a cabeça. Hinata foi rápida em sacar o punhal e cortar as cordas. E tudo foi bem rápido. 

A garota pulou sobre ela, arranhando o rosto da morena, e correu para o grupo de caçadores derrubando três deles antes de correr para a floresta. Naruto aproveitou o susto dos homens e derrubou com suas caudas os outros que ainda estavam de pé. Antes de sumir pela floresta olhou mais uma vez para a morena, que limpava o fio de sangue que descia pelo rosto. Correu o mais rápido que conseguiu.