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História Song One - Capítulo 8


Escrita por: byJaymayindie

Notas do Autor


Olá!!
Nesse capítulo, especialmente, vamos conhecer um pouco mais sobre a família e o passado de Lucy. Espero que gostem.
Boa leitura a todos.

Capítulo 8 - Capítulo 8


Sentia-me muito satisfeita com a forma como a noite tinha se desenrolado. Não fora nada do que imaginava, e até poderia ter começado meio confusa, mas o desfecho era o que mais importava. Tinha aquela sensação boa de quando fazemos uma amizade nova e queremos conversar com a pessoa o tempo inteiro, descobrir quais são nossos pontos em comum e quais são nossas divergências. A verdade é que no início tudo parece mágico porque é novo.

Eu não sabia se havia regras para o pós-encontro entre amigos, assim como havia regras para os primeiros encontros clássicos. Então julguei que não haveria problemas em mandar uma mensagem para Chris no dia seguinte. Afinal, amigos trocavam mensagens, me convenci. Procurei seu número entre os contatos – o número com o qual ele me ligara da primeira vez e mandei:

“Sobre a noite de ontem: podíamos ter sido assaltados, mas foi legal”.

Ele respondeu um minuto depois:

“Foi perigosamente divertido”.

Gostei da forma como ele usou o advérbio. A mensagem podia muito bem ter um sentido ambíguo e eu não sabia se Chris estava ciente disso, o que a tornava melhor. Sorri e o celular vibrou novamente indicando outra mensagem dele:

“Posso ligar para você? Prefiro ouvir sua voz.”.

Respondi:

“Claro.”.

Então ele me ligou. Atendi no primeiro toque.

- Então você gosta de ouvir o som de minha voz. – falei.

- Principalmente acompanhada pelo Alfred.

- Quem é Alfred?

- O violão. Você o carrega para cima e para baixo, então decidi que ele precisava de um nome.

 - Muito justo. Alfred? Gostei.

- Como está sendo seu dia? – ele continuou.

- Comparado a ontem, entediante. E o seu?

- Nada entediante.

Claro que não estaria. Nada que o envolvia parecia ser entediante.

- O que está fazendo? – perguntei ao ouvir vozes e risadas infantis. Um tipo de som que os meninos costumavam fazer quando estavam imitando o barulho de motores de carro e colisões automobilísticas, ao mesmo tempo em que ouvia algum tema da Disney que estava tocando ao fundo, do outro lado da linha.

- Estou com meus sobrinhos na casa da minha mãe, e estamos fazendo a maior bagunça aqui. – ele riu.

Certo. Ele também levava jeito com crianças. Fiquei pensando se haveria algo em que não fosse bom. Quase conseguia imaginá-lo sentado no tapete brincando com as crianças e assistindo desenho animado na TV da sala.

- Quais os nomes deles? – perguntei.

- Ethan, Miles e Stella... E o Miles quer te dar um oi. – disse Chris.

Então ouvi uma voz de criança gritando “Oi!” bem próximo ao telefone e Chris explicando brevemente a Miles que eu era uma amiga de Nova Iorque. Pareciam estar se divertindo. Sorri.  Aquilo fez me lembrar de tio Barry, irmão de meu pai. Alto e robusto como um pinheiro centenário, ele não era nem de longe tão ameaçador quanto sua barba ruiva e sua aparência de lenhador o faziam parecer. Fora ele quem me ensinara a tocar violão quando eu era criança.

- Você tem sobrinhos? – Chris voltou a falar comigo, e eu ainda podia ouvir as crianças brincando.

- Tenho um, Thomas. Ele está em Portland.

- E você visita sua família com frequência?

- Menos do que eu gostaria, mas minha mãe vem me ver essa semana. – contei animadamente. – Bem, na verdade ela vem para o aniversário de tia Helen. – eu já havia falado sobre tia Helen com Chris. Ele pareceu gostar dela, principalmente quando mencionei sua insistência para que eu arrumasse um namorado.

- Isso é ótimo. – ele parecia estar sorrindo também. – E falando nessa semana, você tem compromisso para quinta-feira à noite?

- Não que eu me lembre. Por quê?

- Vou jantar na casa da minha irmã, Carly. Ela mora em Nova Iorque também, e pensei em convidar você. – ele fez uma pequena pausa e eu mordi o lábio inferior. – Mas se não puder tudo bem. Talvez queira aproveitar um tempo com sua mãe.

- Ela vai embora na quinta-feira pela manhã. – falei.

- Bem. Então se você quiser ir, eu posso buscá-la em casa. É só me passar seu endereço.

Pensei por um instante. Não sabia se estávamos indo rápido demais com aquilo ou não. Além do mais, ninguém ia a minha casa além de tia Helen, Annie e meus pais em suas visitas esporádicas.

- Mando por mensagem para você. – falei por fim.

- Está certo. – ele fez outra pausa e reconheci a música de “A Pequena Sereia” tocando ao fundo. – Eu preciso desligar agora. Vamos ao parque. – explicou.

- Tudo bem. Bom passeio para vocês.

- Obrigado. Até quinta-feira.

- Até. – respondi e desliguei.

Eu sabia que a amizade entre homens e mulheres era vista com olhar de desconfiança pelas pessoas, pois sempre haveria um conflito de interesses. E em algum momento esse conflito poderia gerar o sofrimento de alguma das partes que não estivesse interessada somente em amizade. Eu achava tudo aquilo uma grande bobagem, além de ser machista. Meu histórico de amizades masculinas mostrava que era perfeitamente possível duas pessoas solteiras serem amigas e somente amigas. Então tentei não me preocupar com o jantar na casa da irmã de Chris e pensar que tudo ocorreria tão bem quanto da primeira vez. 

***

Como eu havia contado a Chris, minha mãe estava indo para Nova Iorque, então na terça-feira saí mais cedo do trabalho na loja e fui buscá-la no aeroporto. Foi fácil encontrá-la em meio à multidão no saguão de desembarque. Ela se destacava como um dedão machucado, carregando a bagagem – uma mala amarela – um tanto quanto exagerada para uma estadia de apenas três dias, mas aquela era ela, o exagero personificado em seus modestos 1,65m.

Minha mãe, Katherine Lambert, ou simplesmente Kate, era escritora. Ela meio que ficou famosa com um romance, Nothing But Time, há uns quinze anos, por todo o Condado de Multnomah. No entanto, passara os últimos mesmos quinze anos tentando escrever um novo romance, que nunca conseguia terminar.

Com um pai músico e uma mãe escritora foi natural que eu crescesse achando que a arte fazia parte da vida de todo mundo. Na escola, eu fazia atividades extracurriculares relacionadas à música, poesia e teatro. Mais tarde, quando fui para a faculdade, consegui uma bolsa integral para a Juilliard – uma das mais conceituadas escolas de música e artes cênicas do país -, mas acabei ficando pouco mais de um ano lá. Em minha opinião, as pessoas eram insuportavelmente esnobes e a música para eles era limitada a técnica, técnica, técnica, ensaios e muito suor. E não era nada disso que eu queria.

Foi logo depois de largar a faculdade que acabei deixando a casa de tia Helen. Não era justo que ela ou meus pais continuassem me bancando quando eu já estava seguindo meu próprio caminho. Eu queria poder fazer minhas escolhas sem me preocupar se agradaria ou não as outras pessoas.  E minha mãe entendia muito bem meus motivos.

Ela era de Louisiana, mas mudou-se para Paris em 1978, sozinha, aos vinte e dois anos. Hoje isso não seria novidade para ninguém, mas minha mãe era ativista e feminista, o que naquela época poderia arruinar o futuro de uma moça de boa família. Esse “escândalo” só foi superado pelo casamento de meus pais. Meu avô e minha avó maternos eram de uma família tradicionalmente sulina e aristocrática. Logo, eles foram contra, quando sua filha mais velha resolveu se casar com um professor de música, viúvo, que tinha um filho pequeno, que no caso, era meu pai. Mesmo assim, ela mudou-se para o Oregon e realizou seus sonhos de ser escritora e viver um grande amor.

Eu pensava que era por isso que mamãe apoiava minha própria aventura em busca de meu sonho. De certa forma ela revivia sua história em mim. Mesmo quando as coisas ficaram difíceis era ela quem me lembrava do porquê de eu continuar tentando. Por isso eu estava tão feliz com sua visita. Era uma oportunidade de eu poder contá-la o que estava acontecendo, de fato, e pedir seu conselho.

Mas, fora isso, não éramos muito parecidas. Eu não herdara seus grandes olhos azuis bem delineados, nem seu corpo esguio de quadril estreito. Talvez nossa única semelhança física fosse o cabelo castanho, liso e com franja – o dela mais curto do que o meu. Quanto ao temperamento, acho que todas as mulheres de nossa família se pareciam um pouco. Éramos capazes de explodir feito uma tempestade de verão, a qualquer momento, e nos acalmarmos com a mesma rapidez. Não era uma característica que me agradava ou me orgulhava, mas era quem nós éramos.

- Como você emagreceu! – foram as primeiras palavras dela ao me abraçar. – Tem se alimentado direito? E você cortou o cabelo? Preferia mais comprido.

- Estou bem mãe. – assegurei. – Só com saudades. – saudades de seus comentários rápidos e pretensiosos.

- Eu também. – ela me abraçou mais uma vez, brevemente, mas com intensidade.

- Como estão todos? E o papai?

- Estão bem. Seu pai está bem, continua tomando os remédios. Claire ficou com ele. – Claire era minha irmã mais velha.

Enquanto saíamos do aeroporto, de braços dados, a procura de um táxi, minha mãe me atualizou sobre tudo em Portland – tudo que envolvesse nossa família e amigos próximos. Ela estava mais agitada do que o normal, não sabia se pelas quatro horas de viagem, pelo barulho do aeroporto, ou pelo clima de Nova Iorque.

Mas quando chegamos ao apartamento os assuntos cotidianos foram deixados de lado e passamos para as partes difíceis. Talvez o ambiente tenha ajudado. Meu apartamento minúsculo e apertado parecia muito com nossa casa em Portland no quesito acúmulo de discos, livros e instrumentos musicais – principalmente com o estúdio de papai.

Minha mãe sentou-se na cama com ar de pesado cansaço. Pude perceber que as olheiras dela não eram resultado apenas da viagem. Desde que meu pai ficara doente ela fazia de tudo para se manter forte, até assumindo responsabilidades que não deveriam ser suas. Aquela era uma das raras vezes em que tinham se afastado nos últimos dois anos.

Sentei-me ao seu lado na cama e segurei sua mão.

- Seu pai fez uma tomografia há duas semanas. – ela começou e pelo seu tom de voz eu sabia que não era uma boa notícia. – O câncer se espalhou para o fígado dele também.

Suas palavras ecoaram em minha cabeça por um tempo. Ambas sabíamos o que significava. Meu pai se aposentara aos cinqüenta e oito anos devido a uma artrite nos cotovelos, o que o impossibilitava de dar o seu melhor na orquestra e nas aulas da Universidade. Isso o abalou muito na época, embora não demonstrasse. Mas foi somente há dois anos que a verdadeira tempestade se instalou sobre nossa família: depois de quarenta e dois anos como fumante ativo, ele foi diagnosticado com câncer de pulmão. Eu teria pegado um avião e voltado para casa no momento em que soube, mas ele me impediu.

Foi naquele dia em que estabelecemos um acordo: eu continuaria correndo atrás de meu sonho, enquanto ele lutaria contra o câncer. Foi a forma encontrada por ele para lidar com a situação, imaginei, mas agora parecia que eu estava em uma encruzilhada. Se eu desistisse de tudo e fosse para casa, significaria que eu estava desistindo de acreditar que meu pai venceria essa luta, mas, ao mesmo tempo, se eu fosse para casa, poderia ficar ao lado dele. O sentimento de impotência naquele momento era a pior parte.

Uma lágrima se formou no canto de meu olho. Minha mãe enxugou-a com o polegar enquanto escorria.

- Eu não queria trazer-lhe más notícias. Desculpe, mas você precisava saber.

- Tudo bem. Obrigada por me contar.

- Seu pai não queria que soubesse. Ele não queria que se preocupasse.

- É claro que não. Ele sempre tenta me proteger.

- Você é a princesinha dele, afinal. – minha mãe me puxou para que deitasse a cabeça em seu colo e ficou alisando meu cabelo.

- Começamos um tratamento paliativo, mas seu pai não quer fazer quimioterapia de novo. Ele é muito cabeça-dura, mesmo nesse momento. – ela falou com ar de mãe.

- Você vai convencê-lo. - tranquilizei-a. – E se precisar, posso ajudá-la quando for para casa também.

- Então você vai mesmo ir? – ela perguntou e me virei na cama para olhar em seus olhos azuis com matizes castanhas. - Não me entenda mal, estou feliz por tê-la conosco outra vez, mas, Lucy, você está mesmo desistindo?

- Acho que há alguma honra em assumir a derrota. – falei e lembrei-me de Chris usando piadas para fugir dos assuntos difíceis. No fundo eu o entendia.

- Você e seu pai são muito parecidos, sabia?

- E isso é ruim?

- Só quando estão errados. – mamãe sorriu um sorriso triste.

- O que acha que eu devo fazer, então?

- Não posso lhe dizer o que fazer. Mas você for para casa, nesse momento, vai parecer que está fugindo do problema.

- Há problemas maiores em casa.

- E vamos lidar com eles de qualquer forma. – ela me assegurou. – A escolha é sua, mas lembre-se que nenhuma escolha agrada totalmente a ambos os lados.

- Eu sei disso. – suspirei.

- É você quem dá o rumo a sua vida, não se esqueça disso. A apoiaremos seja qual for sua decisão.

- Obrigada.

- Amo você. – ela deu-me um beijo da testa.

- Também amo você, mãe.


Notas Finais


Obrigada por lerem. Espero que tenham gostado. E como sempre, por favor, se quiserem deixar um comentário, me fariam muito feliz.
Abraço.


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