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História Terra de Sebastião - Capítulo Único


Escrita por: GerasBar

Notas do Autor


Certa vez eu inscrevi esse texto em um torneio de literatura, não ficou nem entre os 30 melhores kkk

Capítulo 1 - Capítulo Único


Fanfic / Fanfiction Terra de Sebastião - Capítulo Único

Na virada do século XIX, sob o céu aberto e o sol ardente do sertão nordestino, encontramos nossa história entrelaçada na vida de Sebastião. Negro, filho de escravos alforriados, Sebastião era peão na Fazenda Grão do Sol, um lugar onde a terra seca parecia se estender até o infinito. 

 A rotina começava com o canto do galo, ainda sob o céu estrelado. Sebastião levantava, já ciente da longa jornada que o aguardava. O café da manhã era sempre o mesmo: farinha, feijão e um pouco de carne seca. Depois, a lida no campo: arar a terra, plantar, colher, tudo sob o sol inclemente que parecia desafiar a vontade mais forte de existir.

Sebastião manuseava o arado como quem dança uma valsa triste e cansada. O suor escorria pelo seu rosto, descendo pela pele escura até cair na terra, como se pagasse um tributo à natureza, um pedido silencioso por um dia menos árduo. Ao entardecer, Sebastião retornava à sua pequena casa de taipa. Exausto, ele se entregava ao sono, sonhando com um amanhã que parecia nunca chegar: um dia em que o trabalho seria recompensado, um dia em que haveria tempo para viver além da labuta constante. Ah, a esperança! Esse veneno doce que nos embriaga e nos faz acreditar que o amanhã será diferente. Sebastião, como todos nós, bebia desse veneno, se agarrando a ele como um salva-vidas em meio a um mar de incertezas, mas os dias se sucediam em um ciclo monótono e interminável.

O sol nascia e se punha, a terra era arada, a colheita feita, e nada mudava. Não havia trem de progresso chegando, não havia um conselheiro com promessas de uma vida melhor. Apenas o sol, a terra, e a luta constante de Sebastião. A vida é isso, percebeu ele. Um constante arar do campo, um constante nascer e pôr do sol. Sem propósito maior, sem grande plano divino. Somos apenas grãos de areia ao vento, marcando o tempo com nossa existência efêmera. No entanto, mesmo na futilidade de sua existência, Sebastião encontrava uma certa paz. No fim do dia, quando o sol se punha e o céu era pintado com cores vibrantes, ele se sentava à porta de sua casa e olhava para o campo infinito. E ali, naquele instante, na beleza cruel do sertão, ele encontrava algo que parecia valer a pena: a simplicidade de existir, de ser parte de algo maior, mesmo que esse algo maior fosse apenas um campo de terra sob o céu infinito.

A Fazenda Grão do Sol se estendia por quilômetros de terra, coberta por plantações de algodão e mandioca, espalhadas como um tapete verde e amarelo que se mesclava com o marrom da terra e o azul do céu. O casarão da fazenda, uma imponente estrutura de madeira e tijolos, era cercado por palmeiras, e dava uma visão panorâmica de todo o terreno. Lá, o patrão, um senhor de idade avançada, de pele branca, olhos pequenos e mãos grossas pelo trabalho no campo, morava com sua família. O senhor Antônio era conhecido pela sua postura rígida e olhar severo.

Ele era um homem que tinha nascido e se criado naquela mesma fazenda, tendo herdado as terras e as responsabilidades de seu pai. Acreditava que o trabalho duro era o único caminho para a dignidade e para a vida. Embora fosse um homem de poucas palavras, quando falava, todos na fazenda paravam para ouvir. A Fazenda Grão do Sol era uma entidade em si, uma vastidão de terra que se espalhava por vários quilômetros, estendendo-se até onde os olhos podiam ver. Ela era uma paisagem viva, mudando com as estações, mas sempre mantendo sua essência. A maior parte da fazenda era dedicada ao cultivo do algodão, estes campos se estendiam até o horizonte, marcados por fileiras retas e precisas de plantas que, quando estavam em plena floração, pareciam cobertas por uma neve branca e macia. Além do algodão, a fazenda também produzia mandioca. Os campos de mandioca eram mais irregulares, com plantas altas e folhas grandes que criavam sombras sob o sol escaldante. A raiz da mandioca era um alimento essencial na fazenda, usada para fazer farinha e outros produtos pra cozinha.

A fazenda também abrigava um grande pomar de mangueiras, que forneciam uma sombra bem-vinda durante os meses quentes. Elas eram altas e majestosas, com troncos largos e uma copa densa que filtrava a luz do sol, criando um tapete de sombras e luz no chão. Além dos campos de cultivo, a fazenda possuía várias estruturas, incluindo o grande casarão, um barracão, um estábulo e várias casas menores para os trabalhadores. O casarão, com seus alicerces de pedra e paredes de madeira, era o coração da fazenda, de onde o seu Antônio gerenciava tudo.

O barracão, um edifício alto e amplo, usado para armazenar os produtos da fazenda, enquanto o estábulo abrigava os animais, principalmente cavalos e mulas, que eram usados para o trabalho no campo. As casas dos trabalhadores eram mais simples, construídas de barro e palha, com poucos móveis e sem muitos confortos. No entanto, apesar da simplicidade, elas eram acolhedoras e tinham uma sensação de comunidade. Na hierarquia da fazenda, Sebastião estava na base, trabalhando como peão sob o sol escaldante, sem nenhuma perspectiva de ascensão.

Os dias na Fazenda Grão do Sol eram longos e quentes. O sol brilhava intensamente desde o amanhecer até o pôr do sol, e o trabalho nunca cessava, e assim, a fazenda seguia o seu curso, um microcosmo do mundo maior que era o sertão, um retrato da vida que, em sua simplicidade e dureza, revelava a crueza da existência. A vida no sertão, assim como a vida em si, era um ciclo constante de nascimentos e mortes, de plantios e colheitas, de esperanças e desilusões. Nada mais que isso. E em meio a essa existência desprovida de grandes eventos, Sebastião continuava, dia após dia, a arar a terra, a lutar contra o sol e a suportar as ordens do senhor Antônio, buscando algum significado em uma vida que, por natureza, parecia desprovida dele.

Enquanto o sol ardia e as lâminas de Sebastião rasgavam a terra, uma alteração sutil no ambiente começou a tomar forma. Uma leve brisa tocou seu rosto suado, mais fria que o habitual, trazendo consigo o sussurro de uma promessa. O ar estava grávido de algo intangível, e uma quietude estranha envolveu o lugar, acalmando até mesmo o zumbido constante dos insetos. Sebastião levantou o olhar para o céu, que até então estava ofuscado pelo brilho inclemente do sol. As nuvens, antes esparsas e brancas, começaram a se fundir em uma massa sólida, assumindo um tom cinzento pesado, como se estivessem absorvendo a angústia da terra ressecada abaixo. A energia na fazenda mudou. A terra, que antes parecia inerte sob o sol escaldante, estava agora viva com expectativa. As plantas retesadas pareciam se esticar em direção ao céu, suas folhas tremendo em antecipação. Os animais, antes inquietos sob o calor, agora estavam silenciosos, como se compartilhassem de uma sabedoria inata, aguardando o alívio que vinha com a mudança das marés do tempo. E então, a promessa do céu se cumpriu.

Primeiro, timidamente, poucas gotas se lançaram no solo sedento, levantando uma fina nuvem de poeira com o impacto, despertando o perfume adormecido da terra que inundou o ar, um cheiro de renovação e esperança. E em seguida, a sinfonia completa. A chuva veio em cascata, um dilúvio de libertação que se despejava do céu. Sebastião permaneceu imóvel no meio do campo, enquanto a chuva fria caía sobre sua pele queimada pelo sol. Ele ergueu o rosto, permitindo que a água escorresse, limpando o suor de seu rosto, aliviando a queimadura do sol em suas costas, encharcando suas roupas até que se colassem em sua pele.

A chuva se fundia com a terra, criando rios vermelhos que circulavam ao redor de seus pés, desenhando padrões sinuosos em direção ao solo sedento. Era como se o céu e a terra estivessem finalmente se unindo, numa dança harmoniosa de elementos, e Sebastião era a testemunha privilegiada daquele momento. E em meio a tudo isso, uma sensação de alívio tomou conta de Sebastião. A chuva lavava não só seu corpo, mas também sua alma, libertando-o do peso do sol, da aridez da terra, da dureza da vida. Era como se cada gota que caía levasse consigo um pouco da dor, um pouco do cansaço, um pouco da monotonia dos dias na fazenda. Sebastião estendeu as mãos, deixando a chuva limpar as marcas da labuta diária.

Ele fechou os olhos, permitindo-se ser banhado por aquela dádiva dos céus. E naquele momento, em meio ao som do céu chorando alegremente, ele se sentiu conectado com o mundo de uma maneira que nunca tinha sentido antes. Era uma sensação de ser parte de algo maior, de ser parte de um ciclo que era tão antigo quanto o tempo e tão vasto quanto o universo. E assim, a chuva lavou a Fazenda Grão do Sol, infundindo vida e esperança naquele pedaço de terra esquecido, dando um respiro à natureza exausta e uma nova visão a Sebastião. E quando a chuva cessou e o ar se encheu de um frescor raro, ele soube que, por mais cruel que fosse o sol, sempre haveria a possibilidade de chuva, sempre haveria uma chance de renovação e esperança.



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