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História The Sound - Cosmica


Escrita por: Lyessin

Notas do Autor


Ahaaa, finalmente a continuação kkkkkkkk
tive problemas pra postar, taaambém.
Leiam as notas finais, sério.
Beixosss extelarexxxx

Capítulo 2 - Cosmica


Minhas pernas inquietas não me deixavam dormir.

Depois que nos despedimos, era difícil até mesmo cogitar a ideia de dormir. Ele estava tão perto e tão longe…

Tomei banho, demorei um tempo enquanto pensava e olhava a espuma, a fumaça, o sabonete e o shampoo. Pensei no quanto essa história tinha sido surpreendente, em quão pequenas eram as chances de termos esse tipo de sorte de novo… um raio não cai no mesmo lugar duas vezes. E segundo as leis do universo, temos que dar ouvidos às coisas que pensamos durante o banho.

Queria vê-lo. Queria vê-lo para ter certeza de que aquilo era real.

Troquei de roupa, virei e revirei as peças novas, como se tivesse alguma opção além da roupa que eu usava quando saí de casa e da única muda que comprei para passar a noite. Prendi o cabelo, soltei, prendi de novo para o outro lado e no fim desisti. Apaguei as luzes, me joguei na cama e ali estava o maior exemplo da confusão sentimental humana.

Abre e fecha, abaixa e levanta, um pouco mais pra esquerda, um pouco mais… agora para a direita. Continuei virando como um relógio, minhas pernas pareciam ponteiros acelerados, girando em 360 por toda a cama.

Cansei. Minhas pernas inquietas se jogaram para fora da cama e marcharam para fora do quarto 104. Um passo, outro passo, um passo, mais um passo. Eu precisava de dois passos até o quarto ao lado, até o quarto onde ele estava.

Respirei fundo e segui. 

Bati na porta, ainda meio indecisa. Acho que seria melhor ficar no meu quarto e ignorar esse pressentimento maluco de que a noite ainda poderia me render alguns bons momentos, apesar de toda a confusão. Não deveria terminar daquele jeito. Não quando eu tinha a oportunidade que achei que nunca teria.

Eu deveria estar lá, quieta em minha cama, dentro do outro quarto sem graça idêntico ao dele, mas minhas pernas inquietas não me deixavam dormir. Aquele quarto parecia mil vezes mais confortável que o meu, sendo que não era nada além de absurdamente igual. Só mudava o número pendurado na porta.

E a pessoa que ocupava a cama, é claro.

Quando pensei em desistir, era tarde demais. Lysandre abriu a porta e perguntou se estava tudo bem, enquanto tirava o cabelo úmido da frente do rosto.

— Sim, é só que… eu…

— Você?

Não é que eu não soubesse o que dizer ou não conseguisse falar, eu só não queria ter que dizer. Por mais que em teoria eu adorasse conversar com ele, sentia que também poderia ficar horas em silêncio observando uns detalhes bobos que ao longo do tempo eu vinha percebendo. Detalhes bobos que me deixavam um pouco sem ar, um pouco sem rumo, um pouco com o coração acelerado, bombeando a presença dele e o quanto ele mexia comigo por cada cantinho do meu corpo. Era impossível não olhar, era impossível não querer me deixar levar, ao mesmo tempo que não queria parar de admirar. A pele parecia mais brilhante debaixo de toda aquela luz artificial, seus cabelos úmidos ficavam mais escuro e mais brilhantes, como delicados fios de prata que emolduravam seu rosto. E que rosto… era tão hipnotizante que era difícil descrever, a cada segundo que tentava, parecia estar perdendo algum detalhe. Era algo que merecia ser visto, não contado, significava tanto, havia tanto a ser dito, que talvez eu nunca tivesse palavras o suficiente para colocar no papel. 

Mas quando eu olhava para aqueles olhos, sentia vontade de revirar dicionários, glossários, livros de poesia, manuais de instrução, pinturas renascentistas e placas de trânsito, só para achar uma maneira de colocar para fora tudo o que estava dentro de mim. Os gentis e sinceros olhos bicolores me atraiam como imãs e me faziam querer despir minha alma um pouquinho mais, para que ele visse cada vez mais fundo dentro de mim. Eu, que odiava ser notada, queria mais do que tudo entregar todos os meus segredos para aqueles olhos cor de mel e grama, esmeralda e âmbar.

Eu o conhecia tanto, mas tanto, que chegava a doer. Desde que a pouco mais de uma hora fui capaz de finalmente unir a imagem do fantasma que assombrava meu coração com o garoto que habitava meus pensamentos, tudo e nada faziam sentido ao mesmo tempo. Quem ele era ou quem eu era, qual deles nós éramos, já não era importante. O que importava era a nossa presença ali. O fato de estarmos mais unidos do que nunca. De que adiantava eu sabotar o momento? Isso não o tornaria menos real.

Eu conhecia quase tudo o que se passava ali dentro, todas as letras que ele queria compor, todos os blocos de notas perdidos e encontrados, histórias de escola que eu nunca imaginei que fossem dele, seus desejos, vontades, seus medos, suas motivações, seus anseios profundos, suas frustrações e seus sonhos. Mas ainda faltava alguma coisa. Meus dedos agitados e minhas pernas inquietas diziam que ainda tinha mais a explorar, algo que eu precisava com urgência. Algo que eu não pude ter naqueles dois anos de segredo e anonimato. 

Contato. 

Eu queria tocá-lo.

Quando aquela gotinha escorreu por seu pescoço, depois pela clavícula e logo continuou por seu peito até sumir dentro da camisa, percebi que daria tudo para trocar de lugar com ela. Queria memorizá-lo com meus dedos, sentir todos aqueles detalhes com as minhas mãos, para guardar em minhas palmas cada curva, cada pequena mudança, cada relevo e memorizar cada pedaço. Queria tocar seus quadris, barriga, cintura, costas, peito, ombros pescoço, orelhas, nuca, cabelos, bochechas, olhos, boca, nariz e testa, para então voltar para seus cabelos, esfregar meus dedos em sua nuca, acariciar de suas omoplatas até seus ombros, passar por seus braços, cotovelos, pulsos, até a ponta de seus dedos. Eu queria abraçar, segurar, agarrar, tudo o que meus braços eram capazes de fazer. Não precisava me preocupar em ser correspondida, porque eu sabia que ele queria exatamente o mesmo que eu. Seus dedos segurando o batente com força, como se ele estivesse se impedindo de fazer alguma coisa, se segurando para não ceder aos impulsos que corriam como pulsos elétricos de seu coração até a ponta dos dedos.

— Por que você não entra?

Desculpe, estava ocupada demais desejando você.

— Ah, sim, já vou entrar…

Segui para dentro, ainda movida pelas minhas pernas desobedientes, que agiam por vontade própria sempre que ele estava por perto.

Lysandre deitou-se na cama, apoiando a cabeça com o braço, e apontou sutilmente para o outro lado da cama, me convidando a deitar.

Não hesitei.

— Não está conseguindo dormir?

— Eu nem tentei. — Revelei de uma vez só, olhando para seus olhos.

— Quer conversar?

— Sim.

— Sobre o quê? Está tudo bem? — Lysandre vasculhou meu corpo e minhas expressões com os olhos, procurando alguma coisa fora do normal.

— Não é nada, eu só não queria que o dia terminasse, mesmo depois que, hm… ah, você sabe. — Agarrei o travesseiro, sentindo finalmente a onda de coragem sumir aos poucos, dando lugar a uma ansiedade meio sem sentido.

— Compreendo.

Ficamos em silêncio pelo que pareceu ser exatamente um minuto. O que era muito estranho, já que eu não tinha noção alguma de tempo quando estava com ele.

— Sabe aqueles clichês em que o casal principal é obrigado a dividir um quarto só, com uma cama de casal, por que todos os quartos estão lotados? 

— Sim — respondeu com delicadeza, enquanto ainda me olhava atentamente.

— Esse hotel aqui tem quartos demais… — suspirei, finalmente assumindo que fui derrotada pelo bom planejamento que acontecia fora dos clichês.

— Não é mais divertido enfrentar o conflito que vem da vontade de ir por conta própria? — Lysandre sorriu, como se me confiasse um segredo. Mas o que ele…

— Espera! Então você também estava pensando em, você sabe, ir até meu quarto?

— Sim, mas você foi mais rápida.

Fiquei sem resposta ao ver o sorriso que tomava seu rosto aos poucos e acabamos caindo mais uma vez naquele silêncio nada constrangedor. — Já se sentiu em conflito consigo mesma?

— Sim.

Não era indicado que conversássemos diretamente sobre o acontecido, mas nada impedia outros assuntos filosóficos e desabafos, certo?

— Como se você tivesse partes que não se aceitassem, divididas entre o que você deve fazer e o que você quer fazer, como se o que o que você deseja é bem diferente do que você escolhe e, bem, você sabe que não se pode ter ambos? Acho que me enrolei um pouco, desculpe.

— Uhum.

Era interessante que trocássemos os papéis. Lysandre não era muito de usar palavras, como se sempre se ativesse ao necessário. E eu, bem, jogava tudo como uma avalanche sem me preocupar se fazia sentido ou não, enquanto Lysandre só assentia ou me encorajava a continuar com um olhar atencioso. 

Ele sabia que tinha toda a minha atenção, então continuou, sem deixar de lado a calma de sempre.

— É difícil lidar com todas essas decisões e esses extremos, não acha? É como se você estivesse em um cabo de guerra contra si mesmo e você fosse a própria corda. — Lysandre suspirou e deu um sorriso triste que chacoalhou meu coração. Não resisti e segurei sua mão, eu sabia o quão difícil havia sido sequer começar o assunto, então acariciar seus dedos era o mínimo que eu podia fazer.

— Uma vez eu li em algum lugar uma frase até que… interessante. Você precisa se perder pra se encontrar. Então não precisa ter medo de encarar a incerteza, ela vai… hm… te tornar mais forte? 

Lysandre riu da minha tentativa quase falha de confortá-lo. — Onde você leu isso?

— Acho que foi na camisa de um guia turístico bêbado, quando viajei com a minha mãe. Foi bem marcante, porque ele claramente estava bastante perdido, no fim, tivemos que guiar o guia até o hotel. Sente o quanto essa lição é inspiradora?

Quando Lysandre cobriu os olhos e se entregou a mais uma gargalhada, meu coração finalmente relaxou. Vê-lo triste me fazia querer abraçá-lo até a dor passar, ele merecia toda a felicidade do mundo.

— Vem cá. — Lysandre puxou meu braço com delicadeza, me trazendo pra perto. — Dança comigo.

— Dançar? Mas são duas da manhã, Lys!

— Sem desculpas. Você me deve uma dança há mais de um ano. Não acha que finalmente está na hora de pagar o que me deve?

Lysandre levantou-se em um pulo e logo passou os braços pela minha cintura, me içando para fora da cama. Passei os braços por seu pescoço e relaxei o corpo, deixando Lysandre me apertar contra seu corpo com a desculpa de "ficar mais fácil me tirar da cama", sei.

— Assim como combinamos, você escolhe a música, Isolda.

— Pode ser qualquer uma?

— Pode.

— Certo.

Aproveitei que Lysandre ainda não tinha me soltado e deitei minha cabeça em seu peito. — Eu quero essa música aqui. 

— Acho que não é uma boa ideia. — Lysandre soprou em meu ouvido, enquanto acariciava minha nuca com a mão livre. — Ela é… um tanto irregular, entende? Nesse exato momento está tão acelerada que acho que não conseguiríamos seguir o ritmo. 

Assenti e envolvi sua cintura com os braços, afundando mais em seu peito. — Eu não ligo, você dita o nosso ritmo. Não vou mover um músculo por conta própria, se vira.

Lysandre beijou meu pescoço e descansou a cabeça ali mesmo antes de começar uma série de movimentos cadenciados da esquerda para a direita, como se me ninasse em seus braços. Nossos corpos iam e vinham juntos, no mesmo ritmo, e mais nada importava. Enquanto estivéssemos ali, em nosso próprio universo, naquela cúpula cheia de sentimentos, nada no planeta podia nos abalar. Nossos toques se completavam, sua respiração tranquila em meu pescoço me dava arrepios gostosos na espinha e meus dedos acariciavam toda a pele que podia tocar. Aquele era o nosso momento, o nosso próprio ritmo. Éramos um só, protegidos por aquele encanto de ternura.

— Isolda… 

— Hm? — murmurei e levantei a cabeça, ainda um pouco atordoada pela dança.

— O quão brava você ficaria se eu te beijasse?

— Por que não descobre na prática?

— Pode parar de me responder com outra pergunta?

— Fala menos e beija mais. 

Não sei dizer muito bem o que senti quando finalmente nos beijamos, depois de todas as tentativas frustradas. Parte de mim queria explodir, mas a outra parte sabia que se eu explodisse, não teria mais beijo. Então continuei ali, tentando manter a parte que restava da minha sanidade enquanto a pessoa que eu gostava (e não sabia que gostava até descobrir a verdade) me beija apaixonadamente. 

Nossos braços eram uma bagunça de movimentos desesperados, nossos pés seguiam sem rumo por todo o quarto enquanto nossas pernas se embolavam em busca de mais proximidade. Tropeçamos em todos os móveis, nos beijamos nos criados mudos, no sofá, no chão, na pia do banheiro, na cama, encostados na porta, no colo dele, no meu colo, deitados, sentados, de pé, perto da janela para aliviar o calor… 

— Cansado? — murmurei, quando finalmente paramos de nos agarrar e deitamos na cama de barriga pra cima, lado a lado, ofegando como se tivéssemos acabado de correr uma maratona.

— Não. Como poderia me cansar de beijar você?

— Tem certeza? Eu estou morta de cansaço. — Me aninhei em seu peito, sentindo que poderia dormir a qualquer momento, depois que minha respiração se estabilizasse. 

— Eu te beijaria o resto da noite, sem descanso e não reclamaria nem por um segundo. Mas… já são… quase quatro da manhã e precisamos voltar hoje.

Lysandre me puxou para mais perto e suspirou. Acho, só acho, que ele ainda não queria voltar. Suspirei junto, porque eu também não queria.

— Vamos dormir, certo? As preocupações podem ficar depois. Somos só eu, você e o agora. — Lys murmurou enquanto afagava meus cabelos. 

Eu, ele e o agora. Sim. Eu, ele e o agora. Nós e o agora.

Adormeci enquanto pensava em karaokês, revelações problemáticas, beijos, passos de dança e a via láctea. Pensando no quão errada estava ao pensar que eu não deveria estar ali. Talvez eu realmente não devesse, mas o que importa se era o que eu queria? 

Minhas pernas inquietas, contentes por estarem entrelaçadas com aquele outro par de pernas, finalmente me deixaram dormir. 

 

Dormimos até bem tarde, enrolamos um pouco mais e só voltamos para casa à tarde. Depois que minha mãe me ligou para dizer que ela e minha irmã passariam duas semanas fora de casa para ajudar minha tia com o filho recém-nascido, dei de ombros e me permiti aproveitar um pouco mais do passeio.

Quando chegamos, o sol já estava perto de se pôr, mas ainda não queríamos nos despedir. Acabamos andando sem rumo pelo parque, o que nos deu inspiração e a magnífica ideia de usar uma das chaves que ele tinha de um dos estúdios da gravadora para que gravássemos a nossa música.

Entramos sem que ninguém percebesse e passamos quase toda a madrugada lá. Cantamos, rimos, gravamos, falamos besteira e nos beijamos até que alguém notasse a movimentação estranha e fosse investigar. Lysandre não queria ser confundido com um fantasma pela terceira vez, então fugimos sem fazer barulho e rimos de lá até o caminho para minha casa.

Tudo estava indo muito, mas muito bem. Mas não é isso que as pessoas chamam de calmaria antes da tempestade?

A tempestade veio uma semana depois, com aquela notícia.

Quando a conta de Cosmica começou a me bombardear de notificações, fui correndo saber o que estava acontecendo. E estava lá. O que eu mais temia: a verdade.

Eu não me importei com os comentários que as pessoas fizeram, nem por um segundo, eu estava mais preocupada em surtar porque meu maior segredo já era. As únicas pessoas que sabiam sobre isso eram minha mãe, Lilo e Lysandre, era óbvio que nenhum deles tinha vazado essa informação. Quem era a tal fonte misteriosa e como tinha conseguido aquelas gravações?

Chutei algumas coisas, gritei um pouco, chorei bastante e quase não dormi. Em doze horas eu: entrei em pânico, percebi que minha vida tinha dado um giro de 540º, não podia mais sair de casa porque vários malucos estavam quase acampados na frente da minha casa, perdi meu emprego (porque segundo a minha chefe ela não queria toda essa bagunça dentro do café dela, afetaria as boas energias), perdi qualquer chance de ter meu emprego de volta (porque eu mandei a minha chefe enfiar as boas energias em um lugar não muito legal) e briguei feio com o Lysandre.

É, nós brigamos. Assim que ele soube da notícia, me ligou para saber se eu estava bem. E o que eu fiz?

Explodi. Toda a frustração dentro de mim transbordou através de resmungos, palavrões e muita, mas muita revolta.

— Vai ficar tudo bem, Isolda, confie em mim. Logo todos vão esquecer de tudo isso e você vai ficar bem.

— Eu não quero ficar bem, Lysandre, eu quero que as coisas voltem ao normal. Será que você não percebeu que pra “ficar bem”, tem uma série de coisas que você tem que sofrer antes? Eu nunca pedi por isso, tá bem? Nunca. Não existe a opção “apagar o que aconteceu e fazer as coisas voltarem ao que eram antes”. Já parou para pensar que ficar bem é muito, mas muito relativo? E se ficar bem não for o que eu precise? Ou melhor, o que eu queira?

— Às vezes o que queremos não é o que precisamos, Isolda. — Sua voz tranquila e quase sem emoção parecia zombar de mim, como se todo aquele problema não fosse nada demais. Aquilo estava me fazendo ficar cada vez mais irritada. 

— É claro que não, olha só o que está acontecendo com a minha vida agora, porra! Eu perdi minha privacidade e o direito de ser quem eu quisesse sem nenhuma restrição, sem ter medo de fazer o que eu queria, Lysandre. Você não entende como é. Afinal, as atenções estão todas em mim, é claro que você não foi afetado por isso! Não é maravilhoso? — debochei, rindo para ver se a vontade de chorar passava.

— Porra, como eu não entenderia? — Lysandre explodiu, o que me surpreendeu, mas ele recuperou a calma logo em seguida. — É claro que eles sempre vão encontrar alguma coisa para comentar, mas não há mais o que fazer. Você vai ter que aprender a lidar com isso. Percebeu quantas vezes você disse “eu” e “meu”? E quantas vezes eu disse “você”? Você parou para se perguntar ou parou para pensar como eu me sentia sobre a situação? Dói. Dói te ver assim tão triste e não poder fazer nada.

— E por que doeria, Lysandre? 

— Porque eu me importo, Isolda. Não quero que você sofra e...

E eu não queria mais ouvir aquele tipo de besteira. Estava farta de uma vida inteira ter que ouvir que eu ficaria bem e que as coisas passariam, certas coisas nunca vão desaparecer.

— Chega. Acha que jogar clichês genéricos na minha cara vai fazer com que eu me sinta melhor? É isso?

— E não foi o que você fez naquela noite em que descobrimos a verdade? Repetiu frases feitas em que nem você acreditava, para melhorar a situação?

Quando eu achava que não tinha mais paciência a perder, algo dentro de mim ainda parecia querer transbordar.

— Eu só estava tentando ajudar!

— E eu estou tentando fazer o quê, Isolda? Me diz. O que eu estou tentando fazer? Você mal me deixa falar, só se ocupa em repetir seus monólogos egoístas e sem sentido! Você diz que eu não entendo, mas em algum momento me deixou falar? Naquela noite eu queria conversar, esclarecer tudo, te contar tudo. Mas você fugiu, dizendo que não precisávamos falar sobre nada. Passamos dois anos brincando de gato e rato por motivos que nem você sabe explicar, ou você sabe explicar? Aposto que não, porque nenhum de nós sabe o que está acontecendo porque você se recusa a tentar. 

“Você diz que eu não entendo, ótimo. Mas é isso que você pensa que eu sou? Ou melhor, o que você pensa que eu sou? Se você acha que eu não entendo, faço questão de que você escute a minha parte da história, então. Sua música era a minha válvula de escape, sempre que te ouvia cantar me sentia livre de todas as amarras e tudo o que eu era obrigado a ser e a fazer. Eu sempre invejei sua liberdade, você cantava o que queria e como queria. Eles querem que eu cante o que vende, coisas que contrariam as minhas vontades e não tem nem um pouco a ver comigo, Isolda. O Lysandre que eles querem não tem nada a ver com o Lysandre que existe aqui dentro, que quer cantar o que realmente importa, o que eu realmente sinto. Mas parte de mim quer continuar, não importa o que eu tenha que fazer. Afinal, era o meu sonho desde o começo, uma oportunidade única que eu nunca quis desperdiçar por uma vontade que me fizeram acreditar ser egoísta. Os dois são parte de mim, mas não consegui chegar a um meio termo e isso estava acabando comigo. Por que você acha que eu dei uma pausa? Jogada de marketing, como todos disseram? Eu só precisava fugir. Sim, eu fugi, eu precisava de um tempo, eu sou humano. Eu não queria mais ficar no meio desse conflito, eu queria respirar. Eu precisava respirar.

Conversar com você era a minha única certeza de ter momentos bons, Isolda. Era óbvio que eu queria saber quem era você desde o começo, desde o início dos meus sentimentos. Mas eu tinha medo de te assustar, eu estava no começo dessa história de “fazer sucesso” e nunca tinha pensado que isso iria acontecer, só… aconteceu e eu aceitei. Eu não queria que você acabasse no meio dessa bagunça, tinha medo de estragar tudo entre a gente se você soubesse quem eu sou, não por eu ser famoso ou qualquer besteira do tipo, mas por eu estar preso dentro desse conflito e que isso estragasse toda a paz que eu tinha quando estávamos juntos. Porque com você eu podia ser só eu, simplesmente eu, sem pensar na fama e no que eu era obrigado a fazer, eu só pensava no que eu queria fazer. Sim, eu quis separar essas duas metades da minha vida para me proteger. Mas, acima de tudo, eu queria ser sincero com você e te contar toda a verdade. Mas você nunca deixou, Isolda.

Você gostava daquele segredo e era algo que eu tinha que respeitar, porque eu concordei com aquilo. Mas qual é o sentido de seguir com uma relação de brincadeira? Algo que não foi feito para ser real. Era passo para frente e dois pulos para trás. Havia um precipício entre a gente, por mais que mentíssemos para nós mesmos dizendo que nossos corações estavam próximos. Eu gosto tanto de você que não me importei de continuar com aquilo, porque eu preferia ter você ao meu lado, não importa como. E isso é gostar alguém. 

Desde que nos encontramos pela primeira vez, você fica dividida entre querer me afastar e querer que eu me aproxime. Você afasta as pessoas por medo de que elas te abandonem e que você fique sozinha no fim, não é? Mas se não deixar que ninguém se aproxime, vai terminar sozinha do mesmo jeito, que diferença faz?

Quando descobrimos a verdade, eu não estava chateado com a situação. Nem um pouco. Muito pelo contrário. Não foi perfeito, mas isso é mesmo importante? Eu estava lá, onde eu queria, eu estava com você. Não estava chateado, estava com medo de que você me deixasse depois de saber a verdade. De que você me rejeitasse por eu ser quem eu sou ou que não quisesse saber mais de mim agora que a brincadeira acabou e que vamos ser obrigados a tomar uma decisão de verdade. Porque você estava com mais medo do que eu. Mas do que você realmente tem medo, Isolda? 

E esse é o momento. Você tem que tomar uma decisão. E você tem razão… não adianta tentar te ajudar, porque você não quer ser ajudada. E é um direito seu. Mas eu tentei. E não quero continuar insistindo em algo que só vai me magoar.

Nós achávamos que conhecíamos um ao outro melhor do que qualquer pessoa no mundo, mas a verdade é que sabíamos só o que era conveniente. Conhecer alguém não é ver só as partes bonitas, Isolda. E depois de tudo isso, sinto que não te conheço mais. E acho que nem você conseguiu tal proeza.”

Quando ele desligou na minha cara, percebi que estava sozinha, exposta e desamparada. Minha mãe e Lilo se ofereceram para voltar para casa depois da confusão, mas a minha tia precisava mais delas do que eu e eu não queria que elas acabassem caindo de cara no meio da bagunça que eu fiz. Eu tinha que resolver aquilo sozinha. Na verdade, eu tinha muito o que resolver sozinha.

Não era errado depender das pessoas, mas eu não queria machucar mais ninguém.

O que Lysandre disse me despedaçou um pouco… 

Ok, me despedaçou muito. Foi como um tapa na cara. Ele disse que eu era egoísta e sem sentido, e isso não é verdade. Sendo sincera, é verdade mesmo, confesso. O problema é até que ponto ser egoísta era ruim. Por um lado, era um ato de autopreservação, porque eu passei a vida toda tendo poucos ou quase nenhum amigo, então não sabia muito bem lidar com as pessoas e se eu só tinha a mim mesma, de quem eu iria cuidar? De mim! Bem, eu morria de medo de ser deixada para trás. Então se eu não tenho ninguém, quem iria me abandonar? Mas Lysandre estava certo, eu tinha medo de ficar sozinha e iria acabar sozinha de todo jeito. A verdade me deixava irritada pra caramba. 

Do que eu tenho medo? De me machucar. Pode parecer óbvio e idiota, mas a dor dói. E não é legal sentir nenhum tipo de dor. Eu tinha toda aquela resistência em relação ao Lysandre por causa do meu pai e eu já me toquei de que tinha uma resistência a uma porrada de coisa pelo fato de ele ter me abandonado. Eu não conseguia ouvir as músicas dele, ouvir falar dele ou falar com ele (e isso só melhorou quando eu fui obrigada a ficar com ele por três meses durante uma turnê). 

Eu estava brava porque Cosmica foi tirada de mim e eu não estava pronta para perdê-la. Ela era a minha parte legal, a parte que gostava de aparecer e de ser notada, que podia ter muitos amigos e que não tinha um compromisso real com a sociedade porque era só uma invenção da minha cabeça. E se as pessoas não gostassem da Isolda? E se a Isolda cometesse algum erro? Se a Cosmica assumisse a responsabilidade, eu não teria que lidar com nada disso. E esse era o meu ponto quando a criei. Eu achava que Fantasma, que agora sei que é o Lysandre, também não quisesse um compromisso de verdade com a sociedade e usasse aquilo como uma válvula de escape. Só daria errado se as coisas fossem longe demais, mas essa parte de história já está bem clara. Foi longe demais, mais longe do que qualquer um de nós poderia prever.

Que merda.

Parei para analisar meus pensamentos e nada ali dentro fazia sentido, foi assim que eu desisti de pensar e corri para a única coisa com que eu ainda podia contar: a música. 

Peguei o violão e continuei a tocar aquela melodia sem letra, sem pensar muito no que eu estava fazendo, e cantei sobre amor, dor e decepção. Eu não queria tocar o coração de ninguém, só dar um rumo a tudo aquilo que acontecia dentro do meu. Que se foda o dilema de ser Isolda ou de ser Cosmica. Que se foda meu pai e a banda dele. Que se foda a minha raiva. Que se fodam as revistas de fofocas e que se foda seja lá quem revelou a minha identidade. Que se foda a necessidade de ser alguém e a necessidade de ser obrigado a fazer o que as pessoas acham certo. Que se foda o sistema solar todinho. E isso inclui o Lysandre. Gosto muito dele, mas no momento só precisava cantar e surtar mais um pouco.

Movida por uma vontade vinda do além, peguei meus equipamentos e gravei o primeiro vídeo da história da Cosmica. Ou melhor, da história da minha vida. Editei o que achei conveniente, mas não fiz lá um trabalho muito sofisticado. Postei “Tristão e Isolda” com um texto explicando o que eu entendia sobre a minha própria situação, pela primeira vez sem ligar para o que as pessoas iriam dizer. Expliquei mal e porcamente o motivo de ter criado a Cosmica (e durante a explicação acabei me tocando de que eu não sabia qual era o ponto de ter criado-a e acabado no meio dessa bagunça colossal). Quanto mais eu pensava, menos sentido fazia e mais raiva me dava. O pânico foi substituído pela mais pura e mais sincera raiva. Raiva de quem me colocou nessa situação, raiva de quem falou sobre, raiva da minha raiva e raiva da minha babaquice. Eu passei anos sendo meio babaca comigo mesma sem motivo nenhum e só percebi agora que alguém esfregou na minha cara tudo o que eu fiz durante esses anos. 

O tempo ia passando e o sono não vinha, então fiquei me revirando raivosamente na cama, jogando meu travesseiro de um lado para o outro enquanto minha cabeça repassava um zilhão de besteiras. Levantei da cama e fiquei olhando pela janela, admirando o nada, querendo que a minha cabeça também fosse um antro tranquilo de porcaria nenhuma. 

Eu precisava sair.

Peguei a primeira roupa que eu vi, me enfiei para fora da janela e deslizei pela árvore, já que a porta de frente estava tomada por algumas pessoas desesperadas por notícias ou qualquer informação que fosse no mínimo útil para ser distorcida. Tsc, mídia.

Pulei o muro do meu quintal e segui andando sem rumo pela cidade, enquanto repensava todas as minhas escolhas de vida. E agora que expliquei toda a minha situação e como tudo começou, eu tentava, pela milésima vez, explicar para mim mesma o que estava acontecendo e onde eu tinha errado.

Estava cansada, tudo doía e tudo que eu queria é um lugar para me sentar e ficar sozinha, olhando para o nada por um bom tempo. Aquele parquinho parecia um ótimo lugar para isso. Tirando o fato de que eu não ficaria sozinha, porque uma pessoa ocupava um dos bancos, parecendo quase tão perdida quanto eu. Não era uma pessoa desconhecida, eu reconheceria aquele moletom a quilômetros de distância!

Por mais que Lysandre e Castiel estivessem na lista de prodígios da escola, quem realmente brilhou nisso tudo foi a melhor amiga deles, June. June era o tipo de pessoa que eu gostava de observar de longe, sem dúvida nenhuma ela era a rainha daquele lugar. Era o tipo de pessoa que você ou amava ou odiava, não havia meio termo. Não importava para onde você olhasse, ela estava lá, cheia de energia e conversando com todo mundo sobre todo tipo de coisa. Não era difícil notá-la, porque bem… ela usava roupas de cores aleatórias e sempre chamativas, que combinavam e representavam o seu humor no dia a dia. A minha favorita, de longe, era seu moletom “Sincerity is Scary”, que ela usava nos dias de preguiça ou de mal humor. 

— June? — chamei baixinho, enquanto me aproximava.

— Isolda? — June levantou os olhos do celular ao me ouvir chamar, como se estivesse vendo um fantasma. — O que você está fazendo aqui?

Eu queria perguntar por que ela sabia meu nome, mas seria ridículo… todo mundo sabia meu nome, agora.

— Nada — respondi. — Só fugi da prisão domiciliar. E você?

— Senta aqui. — June apontou para o banco ao seu lado e sem pensar muito, eu obedeci. — Eu estou fugindo de um dos ensaios do Castiel. Eles são muito cansativos, porque eles adoram ensaiar à noite e eu sempre vou assim que saio da faculdade. Já não tenho energia para existir, imagina se vou ter paciência para aguentar um ensaio de duas horas enquanto não faço nada? Por isso que eu sempre acabo fugindo. Mas me diga… você está, hm, bem?

— Não. — Fui sincera logo de uma vez, para evitar mais formalidades. — Por isso resolvi sair para dar uma volta, para fugir um pouco de mim mesma e dos pensamentos que estavam me fazendo mal. Espera… o Castiel sabe que você está aqui? 

— Acho que ele deve imaginar, já que eu não estou lá. Por quê? — ri de sua risada, totalmente travessa, e apontei para a tela de seu celular.

— Ele te ligou umas cinco vezes.

— Puta merda!

June olhou incrédula para o celular, parecendo se questionar como não tinha percebido que Castiel havia ligado tantas vezes. Antes que ela pudesse arrumar uma maneira de avisar que estava viva e bem, percebi que uma figura toda vestida de preto vinha apressada em direção à praça.

— Você quer me matar do coração, Juniper? Como você some enquanto eu estou distraído? Você é pior que uma criança de cinco anos, puta merda. Como veio parar aqui? — Castiel, suavemente irado, pergunta à namorada.

— Eu usei minhas duas pernas, foi assim. 

Castiel respirou fundo, provavelmente contendo uma resposta à altura, e sentou-se no colo de June.

— Sai de cima de mim! Você faz ideia do quanto você pesa, criatura? — June empurrou-o sem força, enquanto fingia estar sufocando.

— Aguente seu castigo calada e de brinde mantenha sua honra. E, ei, você acha que ser gostoso assim é fácil? Tenho que manter as minhas idas regulares ao Mc Donalds. — Ele abraçou-a pelo pescoço, quase deitado em cima da pobre coitada, que disfarçava um sorriso e abraçava a cintura do suposto incômodo. Fofos. — E aí, Isolda?

Seria estranho dizer que eu só tinha percebido o quanto sentia falta de Castiel até ouvi-lo dizer meu nome? Ele era como um quase irmão mais velho, já que aposto que meu pai gosta muito mais dele do que de mim. Quando a Crowstorm estava começando, o pessoal da R66 viu um vídeo de uma das apresentações, se encantou com o talento deles e acabaram convidando os meninos para abrirem todos os shows de uma das turnês. No caso, a turnê que minha mãe me obrigou a acompanhar. Lilo era nova demais para ir, então fui obrigada a passar três meses convivendo com duas bandas de rock que com toda certeza cumpriam alguns dos estereótipos “sexo, drogas e rock n’ roll”. Eu aprendi bastante coisa naquele verão. A maior parte delas ou era inútil, ou aconteceu na base do trauma, ou todas as alternativas anteriores.

Castiel, que era um dos mais ajuizados, cuidou de mim durante aquele tempo. Ele não estava muito bem graças ao termino com June, então algumas vezes passávamos um tempo olhando para o nada e compartilhando nossas dores. Que inspirador.

— E aí, Castiel? Os ensaios continuam sendo um saco?

— Não sei, não fui eu que fugi no meio de um deles, talvez a June saiba te responder. 

Como eu senti falta do sarcasmo, do mal humor e das indiretas…

— Sim, os ensaios continuam um saco. — June respondeu, meio escondida pela cabeleira vermelha de Castiel. — Ai! Não me aperta!

— Chega. — Castiel levantou-se e estendeu a mão para June. — Hora de irmos.

— Até mais… nos vemos, hm, outro dia.

Foi o máximo que eu consegui dizer. Por mais que antes eu não quisesse companhia, confesso que me senti meio triste por ter que me despedir tão rápido. Passei a última semana sozinha, Lysandre estava ocupado resolvendo algumas coisas com a gravadora, minha mãe e minha irmã ainda estavam viajando e não tive que trabalhar, porque o movimento no café estava bem próximo de zero. Ou seja, uma semana solitária, depressiva e sem gorjetas para aumentar minhas economias para a faculdade. E para fechar com chave de ouro, bem, vocês já sabem.

— Como assim “até mais”? Você vem com a gente. Acha mesmo que eu vou te deixar voltar sozinha para casa a essa hora da manhã? — Castiel arqueou uma das sobrancelhas, algo que ele fazia sempre que ouvia alguma coisa muito idiota. É, acho que ultimamente essa é a palavra que me mais serve para me definir.

Por fim, não questionei. Segui June e Castiel até o carro e não demorou muito até que chegássemos a seu apartamento, que ficava a mais ou menos cinco minutos do estúdio onde ele ensaiava com a banda.

Depois de colocar as chaves no balcão e tirar os coturnos, Castiel ajeitou um punhado de travesseiros e cobertores fofos no sofá, quase fazendo um ninho, me deu boa noite e foi para seu quarto sem muita cerimônia. 

Eu estava em um lugar muito mais confortável que a minha própria cama, mas ainda assim não conseguia dormir. Fiquei olhando para o teto por um bom tempo, até que a sede me fizesse sair do meio daqueles cobertores quentinhos.

Olhei para o copo, olhei para água, olhei para o copo já com a água… tudo parecia uma massa disforme de confusão, que rodava pela minha cabeça como uma nuvem de chuva extremamente carregada, deixando tudo meio cinza e meio sem graça. Sempre que eu tentava pensar em algo que exigisse mais da minha capacidade mental, tudo ficava em branco. Minha cabeça cabeça era um grande quadro de nada sobre tela.

— Não consegue dormir? — Castiel interrompeu meu momento (bizarro) admirando o copo d’água. 

— Não. E você?

— Também não. — Castiel encostou-se ao batente da porta, cruzando os braços sobre o peito desnudo. — Fiquei observando a June dormindo e acabei me perdendo em pensamentos, daqueles que não deixam a gente dormir, entende? 

É, eu entendo. Daqueles que não deixam a gente dormir.

— Não sou a pessoa mais indicada para dar conselhos, mas… não acha que você precisa falar com alguém? 

— Como sabe que eu ainda não falei com ninguém? — respondi, finalmente tomando a água que coloquei no copo.

— Porque você nunca fala, simples.

É, ele estava certo. Eu nunca falava.

Suspirei. — Acho que não tenho o que dizer. O resto já dá pra adivinhar. E Lysandre é seu melhor amigo, então aposto que você já deve saber de tudo.

Castiel assentiu e ficou em silêncio por alguns segundos, antes de continuar:

— Uma vez a June ficou três dias sem falar comigo.

Olhei para Castiel, que ostentava mais um de seus sorrisos de canto, com curiosidade, incentivando-o a continuar.

— Uma fã jogou um sutiã no palco durante um show e eu pendurei no microfone, como uma forma de agradecimento. A primeira coisa que eu faço quando saio do palco é ir abraçar a June, porque ela fica irritada por causa do meu suor, mas me abraça mesmo assim. Naquele dia ela não me abraçou, só saiu andando e ficou no camarim até que arrumássemos as coisas e estivéssemos prontos para ir embora. Eu tentei me explicar, pedir desculpas, fiz tudo o que eu podia… mas sabe o que ela disse? June disse que estava tudo bem e que ela entendia a situação, mas não sabia lidar com a maneira como estava se sentindo e que não queria conversar comigo até entender, porque não queria discutir por uma coisa tão desnecessária. Afinal, a garota era uma fã e fãs fazem isso o tempo todo. 

“Eu preferia que ela me xingasse, gritasse, jogasse coisas em mim… porque aquele tempo foi torturante. Eu não sabia lidar com aquela reação e aquilo estava me matando, principalmente por ter sido uma reação diferente do que eu esperava. Às vezes não sabemos lidar com surpresas boas ou situações diferentes das que estamos acostumados… pra resumir, é uma merda. No fim, quando conversamos, ela me disse que não sabia lidar com a minha fama. Ela reclamou das multidões, dos fãs malucos, de ter que ficar se escondendo, fugindo, das revistas de fofoca... 

No fim, cheguei à conclusão de que por mais que ela gostasse de mim, não achava que valia à pena continuar comigo por causa da porra da minha fama.

Por mais que as melhores músicas da minha carreira tenham saído enquanto eu estava na fossa por ela, eu não sei o que seria de mim se ela me deixasse de novo, então eu quase entrei em desespero. Fui direto ao ponto e perguntei se ela queria terminar comigo. E me surpreendi com a resposta, mais uma vez. Ela riu da minha cara. E disse que me amava, pela primeira vez.

Ela disse: “não, seu idiota, eu amo você. Mas precisava dizer que não sei lidar com a situação, porque tenho certeza que vamos conseguir resolver isso juntos, não é? Você vale o risco. Não importa o quão famoso seja, o quanto as pessoas tentem distorcer sua imagem, quantos sutiãs joguem ou quanto tempo passe, você ainda vai ser o meu Castiel. Algumas mudanças na nossa vida exigem que mudemos junto, porque temos que nos adaptar ao que a vida esfrega na nossa cara. Mas eu tenho a certeza de que você sempre vai ser o meu melhor amigo, o ruivo falso mais mal-humorado da história, que consegue me deixar de pernas bambas com um único sorriso. Eu me apaixonei por tudo o que você é, Castiel. Não existe essa de amar menos a sua versão famosa porque algumas coisas não me agradam. Eu sou imprevisível e aleatória, sei que isso te confunde quase sempre, mas… você me ama menos por causa disso? Na maioria das vezes a resposta é não, mas você entendeu o que eu quis dizer.”

 Não pude deixar de rir da cara de bobo apaixonado (e indignado) do Castiel. Era difícil ver expressões além de mal humor e humor ruim alí, então aproveitei a situação para gravar na memória a cara que ele fazia graças à sua paixão por June.

— Então, Isolda, apesar de eu ser ótimo com as palavras, sou uma merda dando conselhos, mas… coisas ruins são uma merda. E merdas acontecem com todo mundo. Você acha mesmo que vale à pena viver no limbo? Fugir das coisas ruins também significa perder as boas. Algumas coisas, como disse a minha garota, valem o risco. E falando nela, tenho que ir, antes que ela acorde e me sufoque com os travesseiros. Mas antes, preciso que você veja uma coisa. — Castiel pegou o celular no bolso da calça, procurou alguma coisa por alguns poucos segundos e logo guardou-o novo. — Pronto. As paredes são à prova de som, certo? E se precisar dar um passeio no parque, basta apertar os dois botões no interfone. Boa noite, Is. — Castiel piscou e foi para seu quarto, deixando uma Isolda confusa e sem palavras plantada na cozinha.

O que ele queria dizer com a última parte da conversa?

Voltei para o sofá e peguei meu celular para olhar as horas. Eram quase quatro da manhã. Quem passeia no parque a uma hora dessas?

Castiel enviou um arquivo de áudio.

Era uma música. Do Lysandre. Uma música que foi como mais um soco no meu indefeso estômago. Era uma música para mim. Ou melhor, uma música sobre mim. A voz de Lysandre estava cheia de emoção, quase como se ele recitasse cada verso. A música dizia tanto sobre mim que toda aquele medo, a raiva e a confusão guardadas se transformaram em lágrimas, um rio delas.

“Significa mais para você do que para eles

Então não justifica

Viver em silêncio, em segredo”

Lysandre sabia o que eu tive que disfarçar todo esse tempo, mas que não estava pronta para assumir toda aquela carga, então não podia mais abrir um sorriso e fingir que estava bem. Ele fez questão de dizer que eu só estava começando, que tinha um monte de coisas para ganhar e mais um monte para perder. Essa parte, ganhar e perder, dar e receber… eram o meu maior ponto fraco. Eu não queria perder nada, então me privava de ganhar. Como eu pude me sabotar por tanto tempo, pensando que era o melhor para mim? Exato, eu pensava que era o melhor para mim. Mesclei egoísmo e autopreservação, como se fossem uma coisa só e desaprendi a lidar com a dor, o que só me machucou ainda mais. 

Chorei e ri quando, no fim da música, ele fez questão de repetir que à partir do momento em que eu revelasse ao mundo quem eu realmente era, não conseguiria mais olhar para trás, mas por outro lado, tudo aquilo que todos achavam que era perfeito, tudo o que achavam que sabiam sobre mim, daria lugar a uma beleza que ninguém poderia imaginar.

Quando a música terminou, eu estava chorando pelo que parecia ser a décima vez no dia. 

Meus pais se amavam mais do que tudo no mundo, mas se amor não foi o suficiente para fazê-lo ficar, então o que seria? Eu, que mal conseguia decidir qual das minhas partes era meu verdadeiro eu, era o suficiente para fazer alguém ficar? Essa era a questão. Eu estava com medo de perder alguém que eu sequer deixei que fosse meu. 

Era ridículo e lamentável.

Mas era humano. Ter medo não é uma falha, no fim das contas. As pessoas passam a vida toda indecisas sobre o que querem fazer e o que querem ser, passam anos de um lado para o outro buscando o que parece ser a decisão certa. Mas a “decisão certa” era muito, mas muito relativa. Eu precisava mesmo decidir se eu era a Isolda ou a Cosmica? Eu nunca vou deixar de ser a Isolda, ao mesmo tempo que a Cosmica faz parte de mim. Estar inteiro não é ser uma coisa só, é aceitar a existência de tudo aquilo que faz você ser quem você é. Eu não precisava tomar essa decisão agora, porque ninguém além de mim tem a ver com o que eu sou.

Só precisava de um tempo para digerir a minha nova realidade, mas quem não precisa de um tempo diante de alguma mudança? Mesmo que a Cosmica deixasse de existir para eles, ela ainda seria parte de mim e todas as músicas que eu cantei, tudo o que eu aprendi nesse tempo, são provas de que nada foi em vão. 

Mas algumas coisas não podiam esperar, não mais. 

Eu estava apaixonada pelo Lysandre e essa era uma das poucas certezas que eu tinha no meio de toda essa tempestade (as outras certezas eram coisas como “estou afundando”, “estou triste”, “alguém me tira daqui”, “quero esganar quem vazou a informação”, “Castiel sabe dar conselhos, uau”). Ele era o meu arco-íris no meio de toda aquela chuva sem fim. Por mais que pareça uma melosidade sem tamanho, era o que meu coração vinha tentando me dizer com toda aquela inquietação. Ele era uma estrela, em todos os sentidos. Posso vê-lo brilhar até de olhos fechados, seus sorrisos estão tão vivos na minha memória que é como se eu pudesse estender a mão e tocar seu rosto. Como eu queria tocá-lo agora...

Respirei bem fundo e peguei meu celular, mandando embora todo o medo e a vontade de desistir. 

Lysandre não demorou muito a atender, mas eu não sabia o que dizer. Porém, quando ouvi sua respiração e o suave som do vento ao fundo, soube que não precisava dizer nada: ficar em silêncio ouvindo a respiração um do outro era o suficiente.

Espera, “o suave som do vento ao fundo”?

“se precisar dar um passeio no parque, basta apertar os dois botões no interfone.”

Não sei se mencionei, mas eu amo o Castiel! Peguei minhas coisas, deixei um bilhete agradecendo e apertei os dois botões do interfone, conseguindo meu passe livre para fora do apartamento. 

Castiel não morava longe do parque e eu não sei dizer se isso é algo bom ou ruim. Caminhei o mais devagar que minhas pernas deixavam, aproveitando a escuridão e o frio da madrugada, por mais que o sol já desse pequenos indícios de querer aparecer no céu. O nervosismo foi crescendo a cada passo, enchendo meu estômago de elefantes alados e minha cabeça de paranóias sem sentido. As chances de Lysandre ter desistido de mim eram grandes, levando em conta o que ele falou quando brigamos. Por outro lado, ele disse que existia beleza em mim, pelo menos em algum lugar (que bom que não entramos no mérito de discutir o quão fundo, ou eu ficaria um bocado mais depressiva). Eu era o suficiente para fazê-lo ficar? De verdade?

Entre suspiros, paranóias e passos, cheguei ao parque. Fiquei encarando os portões metálicos ornamentados até demais enquanto tomava a coragem para dar o primeiro passo. A parte boa era que de madrugada ninguém ficaria se questionando o que eu estava fazendo olhando para o portão sem saber o que fazer, porque se me perguntassem, eu não saberia responder. Eu queria entrar, mas minhas pernas não se mexiam. Onde estava toda aquela inquietação? Traidoras.

Continuei em frente, tentando empurrar toda aquela ansiedade para um lugar onde não pudesse senti-la e segui andando pelo parque, sem ter a mínima ideia de onde Lysandre estava. Bem de vez em quando algumas pessoas passaram por mim correndo, fugindo da insônia ou só das calorias, mas nenhum sinal dele. Acho que não é tão difícil encontrar alguém tão peculiar em um parque, às quase seis da manhã.

No canto mais poético do lugar, sob as árvores mais bonitas, ele parecia uma pintura. Daquelas que só se vê em sonho, por mais que eu não saiba muito bem descrever o porquê de ser uma visão tão surreal. Os cabelos prateados estavam impecáveis apesar do vento cortante, seu rosto, não mais iluminado por alguma luz artificial qualquer, era adornado pela primeira luz da manhã. Os dedos longos repousavam na lateral de seu pescoço e o sobretudo elegante, como sempre, estava lá. Sorri ao ver que uma das mangas não estava abotoada, revelando um pouco de seu pulso. Parece que nem tudo estava no lugar, mas…  ele ainda era a aparição fantasmagórica mais doce, a mais bela visão.

Sentei-me ao lado dele e fechei os olhos, aproveitando o vento, que parecia acalmar os pensamentos que giravam por toda a minha mente e soprar para longe todos os meus medos.

— Vem sempre aqui, em horas estranhas da manhã? — Perguntei sem me preocupar em abrir os olhos.

— Me limito a vir quando não consigo tirar meus pensamentos de perto das estrelas, quando não consigo não pensar em garotas cósmicas… — Lysandre respondeu em um sopro, também sem se preocupar em me olhar.

— E o que te veio à cabeça por pensar em algo tão longe daqui?

— Que eu tenho que me desculpar. Pensando tão longe, fui longe demais. Pensando tão longe acabei afastando-a cada vez mais. Achei que o quanto mais longe pensasse, mais perto estaria. 

— Eu pensei muito perto. Perto demais, na verdade. Como se fosse assombrada por um fantasma, que me seguia para todos os lados. — A risada fraca de Lysandre me incentivou a continuar. — Eu só conseguia pensar em um fantasma de cabelos prateados e que se veste muito bem.

— E o que te veio à cabeça por pensar em algo tão perto daqui?

— Que eu preciso dizer que está tudo bem. — Quando abri os olhos e me deparei com seu olhar atento, meu nervosismo deu uma trégua e se transformou em coragem. — Por mais que tenha machucado um pouco, eu precisava ouvir parte daquelas coisas. Eu estava tão focada no dilema Isolda e Cosmica que não prestei atenção em mais nada. Esqueci dos seus sentimentos e dos meus também, que nem estavam tão confusos quanto eu achava que estavam. É verdade, eu sou meio egoísta e meio sem sentido, mas também estou triste e perdida com toda essa situação. Mas aprendi que algumas mudanças na nossa vida exigem que mudemos junto, porque temos que nos adaptar ao que a vida esfrega na nossa cara. Então eu só preciso de um tempo antes de saber o que fazer. Ah!, eu também aprendi que algumas pessoas valem o risco. E como isso não podia esperar, aqui estou eu, pronta para tentar consertar as coisas. — murmurei, agora olhando para meus pés.

— Você leu isso em qual camiseta? — Lysandre zombou, daquele jeito discreto e divertido que só ele tinha. Ao ver o sorriso verdadeiro que afetava até seus olhos, algo dentro de mim se desfez e derreteu, espalhando calor para cada pedacinho do meu corpo. Acho que é o que as pessoas chamam de alívio.

— Na verdade, estava escrito em um sutiã. 

Dessa vez ele não questionou, muito menos riu. Lysandre correu as mãos entre os cabelos e os bagunçou, parecendo meio perdido. Antes que ele pudesse fazer mais estrago, aninhei suas mãos entre as minhas e chamei sua atenção ao apertar seus dedos.

— Eu já disse, está tudo bem.

Lysandre inverteu a posição e entrelaçou os dedos nos meus.

— Eu não deveria ter dito aquelas coisas, Isolda. Mas tudo parecia estar desmoronando mais uma vez e eu não sabia o que fazer, mas nunca, nunca quis te machucar. Eu poderia ter dito qualquer coisa dentre as milhares de coisas que eu queria te dizer, mas quando tive oportunidade, escolhi logo as piores coisas, as piores palavras, do pior jeito. Eu poderia ter dito o quanto amo o seu cabelo, o quanto adoro o jeito como você pisca quando está concentrada, ou o quanto consegue manter a calma e me fazer sorrir, mesmo quando estamos perdidos no meio do nada depois de sermos perseguidos por, como você disse, uma multidão de zumbis controlados por controle remoto e sede de autógrafos. Quando nos vimos pela primeira vez, na cozinha do café, e você prendeu meu cabelo… a vez em que fingimos ser um casal para que não me reconhecessem… todos os momentos ruins se tornaram incríveis graças à sua presença. Você sempre me salvava e cuidava de mim, já mencionei o quanto é fofa a sua mania de tentar parecer indiferente e logo depois desistir de tentar? É impossível entender você, não posso negar. Mas quem disse que a gente gosta só do que entende? — Lysandre encostou a testa na minha, relaxando aos poucos ao me ver sorrir um pouco mais a cada palavra que saia de sua boca.

— Você poderia ter dito qualquer coisa, sim. Mas você pode dizer qualquer coisa, nesse exato momento. Também pode dizer daqui a dois minutos, daqui a três horas, daqui a sete anos… eu sempre vou te ouvir, Lysandre. Não quero mais cometer o erro de deixar seus sentimentos de lado, nem fingir que os meus não existem. Por mais que você não fale tanto quanto eu, até posso abrir uma exceção… — ele mordeu o lábio, tentando não rir da minha maneira de tentar animá-lo. — E, ei, viu só? Eu te conheço. Quase que por inteiro! Não conheço só as partes bonitas. Eu sei dos seus blocos de notas, mocinho. Sei das suas aventuras no porão, da corrida de orientação, dos shows, da vez em que perdeu a memória, do seu amor por coelhos, sei sobre a sua família e sobre suas vontades, seus medos, suas músicas favoritas, seu momento favorito para compor, com quem você gosta de compor, sei da sua tatuagem e que a June invadiu o vestiário para vê-la. E, ah, sei que o Castiel quase morreu de ciúmes e nenhum dos dois percebeu até ele estourar e gritar que vocês dois são o maior exemplo vivo da lerdeza. Também sei que você é uma pessoa maravilhosa e que roubou meu coração duas vezes, sei que você é uma superestrela e que todos te adoram, até porque é impossível não adorar. 

Quando Lysandre acariciou meu rosto, me joguei em seus braços. Já não aguentava estar ao lado dele e não poder afundar em seu pescoço, sentir seu perfume e esquecer do resto do mundo.

— Você disse que não me conhecia, então vou ser obrigada a me apresentar de novo. — Cutuquei sua cintura, para mostrar o quanto aquilo tinha me irritado. Lysandre acariciou minhas costas como um pedido mudo de desculpas. — Muito prazer, meu nome é Isolda Rivière, também conhecida Cosmica, uma webcelebridade não mais tão misteriosa assim. Também sua nova fã número dois e acho que, hm, estou mortalmente apaixonada por você.

Lysandre riu e me apertou mais forte contra seu peito. — Muito prazer, senhorita. Meu nome é Lysandre Benoit, uma "super estrela" sem rumo. Eu sempre fui seu fã número um e com certeza estou mortalmente apaixonado por você. 

Passei os braços ao redor de seu pescoço, pronta para beijá-lo até minha boca ficar dormente, mas ele parecia ter outros planos. Lysandre agarrou minha cintura e me puxou para seu colo, escondendo a cabeça em meu pescoço.

— Que história é essa de fã número dois? — questionou, enquanto beijava meu pescoço e acariciava minhas costas por debaixo da blusa.

— Isolda está fora de área ou desligada, tente novamente mais tarde.

Se ele perguntasse meu nome enquanto me beijava daquele jeito, talvez eu criasse uma terceira identidade com a primeira coisa que me viesse à cabeça ou só respondesse um “sei lá”, afinal, preferia ocupar minha boca de outra maneira.

— Ainda quero saber. — Ele parou com os beijos e em meus olhos, procurando uma resposta.

— Minha irmã mais nova, Lilo. Ei, não faça essa cara, eu já te falei dela. Ela é a presidente do seu fã clube. Ela conseguiu esse cargo com muito suor, sangue e lágrimas, literalmente. Lembra da Nina? Então… ela e a Lilo vivem em uma relação de puro amor e ódio, as duas quase saíram no soco para ver quem seria a nova presidente. Enfim, ontem à tarde ela passou exatos sete minutos gritando coisas sem sentido pelo telefone, quando soube sobre nós.

— Você não contou antes? 

— Para dar fim ao resto da paz que eu ainda tinha? Nem pensar. Era um segredo que eu preferi guardar, pelo bem da minha sanidade. Enfim, continuando, foram três minutos e meio de drama por eu não ter contado antes e no restante, ela esfregou na minha cara o fato de estar certa esse tempo todo.

— Estar certa sobre o quê?

— Sobre nós dois. Ela vivia dizendo que eu iria gostar de você se desse uma chance. E foi o que aconteceu, não foi? Não da maneira que eu esperava, mas tudo bem.

— O Castiel disse exatamente a mesma coisa.

Como assim? Afastei um pouco meu corpo e me ajeitei em seu colo, fazendo a minha melhor pose de “explique, mas explique com detalhes”.

— Quando eu contei o que aconteceu na cozinha do café, depois de rir por uns quinze minutos, ele disse que eu gostaria de você caso te conhecesse melhor. — Lysandre, que agora podia ver meu rosto, sorria ao ver minha cara de indignação.

— Ele não me ofendeu nenhuma vez? Só riu e disse que você iria gostar de mim? Eu hein. Estou começando a estranhar. Acredita que ele me deu conselhos essa madrugada? Foi ele que me contou que você estaria aqui! Será que o Castiel está bem da cabeça?

— Espera… ele te contou que eu estaria aqui? Devia ter imaginado… — Lysandre balançou a cabeça e murmurou a última parte, como se estivesse só pensando alto.

— Como assim? — Questionei, ajeitando o cabelo que tinha caído em seus olhos após ter balançado a cabeça.

— É complicado… — Os lóbulos das orelhas de Lysandre se tingiram de vermelho e eu não consegui evitar acariciar sua nuca e seu pescoço. — Somos melhores amigos, então eu conto tudo para ele. Quando eu contei sobre os meus sentimentos por você, ele disse que… hm… você seria uma ótima mãe para os sobrinhos dele.

Engasguei com o ar, apesar de saber que o Castiel tinha dito aquilo só para fazer o Lysandre ficar com vergonha. Funcionou tão bem que o constrangimento passou dele para mim e agora estávamos os dois, com o rosto mais quente que o sol, quase começando uma plantação de tomates no parque. 

Sem condições. Sem comentários. 

— Lembra de quando o Leigh me pediu para que eu te levasse para casa? Ele só estava tentando arrumar um jeito de me fazer passar mais tempo com você. E, bem, parece que deu certo… 

— Mas até o Leigh? Parece que o mundo todo estava conspirando para que ficássemos juntos. O destino até que consegue ser um pouco menos sacana às vezes. Acho que estou até um pouco grata a quem vazou aquelas informações. — brinquei, mas Lysandre perdeu qualquer sinal de diversão quando mencionei os acontecimentos de ontem.

— Confirmaram que foi alguém da gravadora que vazou as informações. Ainda não descobriram quem, mas sabem que foi alguém de lá. — Lysandre suspirou e bagunçou seu cabelo pela milésima vez no dia.

— E o que eles planejam fazer quanto a isso? — indaguei, mesmo sem estar curiosa de verdade.

— Nada. Por isso pedi demissão.

Por alguns segundos tive a certeza de que estava ouvindo errado, mas nada que parecia soar como aquela frase tinha a ver com o assunto.

— Como assim, Lysandre?

— Eu me demiti, Isolda. E está tudo bem, não precisa se preocupar.

Tarde demais. 

— Como assim você se demitiu? — Agarrei seus ombros, ainda me questionando sobre veracidade da informação. 

— Alguém da gravadora vazou a informação e criou toda essa bagunça, então acabei tendo uma discussão não muito amigável com meu antigo empresário e pedi demissão. Acho que logo logo vão estar fofocando sobre isso, também. — explicou, mantendo a tranquilidade. Ao ver minha expressão de desespero, Lysandre riu e afagou meus cabelos. — Recebi três propostas em menos de duas horas, vai ficar tudo bem. É uma chance de finalmente tomar as rédeas da situação, não acha? 

— É… — me limitei a resmungar, ainda me recuperando do susto.

— Mas como nem tudo é perfeito, estou com medo de meus fãs não gostarem do novo Lysandre…

— Novo? Não tem nada de novo, Lys. É só você. E o que mais importa se você estiver feliz? Quem realmente gostava de você vai te apoiar — dei o meu melhor sorriso encorajador, segurando seu rosto entre as mãos para fazê-lo olhar para mim.

— Você vai me apoiar? — Lysandre cobriu minhas mãos com as dele.

— Talvez, depende de como você vai se comportar.

— Acho que estou disposto a fazer tudo que você me pedir. 

— Ah, é mesmo?

— Sim. — Lysandre respondeu, sem qualquer sinal de dúvida.

— Hm, então, e se eu te pedisse para me beijar agora? O que você faria?

— Com toda certeza eu diria que você está lendo a minha mente.

Com certeza eu ainda me irritaria com alguns fãs exagerados e com toda essa história de fama. Mas quem se importa com a fama? Com fãs? Com identidades secretas, fantasmas e karaokês? Eu tinha tudo o que eu queria e precisava, e não vou deixar que nada atrapalhe a minha, ou melhor, a nossa felicidade.

Somos só eu, ele e o agora.

Eu, ele e o agora. Para sempre. 

 

— Lys? — chamei com gentileza, depois de interromper um de seus beijos maravilhosos.

— Sim? — murmurou, roçando a boca na minha, pronto para voltar ao que estavamos fazendo.

— Agora que percebi um detalhe meio importante… 

Lysandre franziu as sobrancelhas ao perceber minha hesitação.

— Lembra do dia em que nos encontramos pela primeira vez? — continuei. — Acabei de perceber que eu, hm… falei mal de você para você mesmo! Que mancada. Quer dizer, não tinha como eu saber, mas… 

Lysandre gargalhou, o que só me deixou com mais vergonha. Quando sua expressão ficou séria de repente, tudo dentro de mim pareceu congelar. Socorro.

— Isolda.

— Hm? — resmunguei, torcendo para que, sei lá, um pterodáctilo passasse voando e me levasse para longe.

— Fala menos e beija mais.


Notas Finais


Vocês estão prontos para o textão?? Eu não. Só agora percebi que não tenho muita coisa a dizer.
Antes de tudo: a música que o Lys fez pra Isolda existe!!!! Eu estava ouvindo enquanto escrevia e pensei "caramba, era disso que eu tava falando!". Se chama Under Wraps.
https://www.youtube.com/watch?v=U4czyfhMei0
(Inclusive, escutem as outras músicas da banda, eles são incríveis!)
Vou expor minhas paranoias: eu pensei em tanta, mas tanta coisa pra esse plot que, sim, eu acabei me perdendo várias e várias vezes. Então tem umas coisas que estão me deixando com a impressão de que tá meio "sem pé nem cabeça". Espero que seja só impressão xD
Mesmo que não seja, aqui vai: decidi transformar essa one (sim, é uma one, que virou uma duo por motivos de tamanho) em uma longfic, eeeeeeeeeh
Aí sim eu vou poder desenvolver melhor os personagens e as situações, porque eu ainda estou achando que coloquei coisa demais em palavras de menos (ou eu só estou sendo insegura, como sou toda vez)
Porém foi maravilhoso escrever (apesar da dificuldade de postar, senhorrrrrrrrrrr), eu adorei escrever alguma coisa com outro paquera. Eu só escrevo com o Castiel, por mais que o maior amor da minha vida seja o Lys (também não entendi, mas vida que segue).
Espero que tenham gostado (sendo muito sincera eu nem sei mais o que estou fazendo e estou confusa, mas espero mesmo que tenham gostado xD) e muito obrigada por terem lido até aqui, sou eternamente grata hehe~
Nos vemos em uma próxima oportunidade?
Só para não perder o costume, o link do grupo:
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Entrem, somos uns amores <♥


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