Quando o apocalipse começou a dar sinais de ser verdadeiro, eu já estava planejando fugir do orfanato com minha irmã de consideração. E quando a diretora do orfanato disse que não poderíamos mais sair, eu decidi por meu plano em ação e fugir. Tentei levar outras garotas comigo, mas todas negaram então saímos só eu e a Ruby.
O caminho foi um tanto complicado, não só porque a rodovia estava cheia de carros tumultuados, mas também porque eu tinha vomitado duas vezes durante o caminho e não estava mesmo me sentindo bem.
Enquanto andávamos em meio aos automóveis parados, demos de cara com uma mulher, o nome dela era Carol Peletier e assim que ela nos viu logo nos encheu de perguntas, afinal, éramos duas crianças sozinhas.
Expliquei a ela, a sua filha e ao seu marido preguiçoso que éramos órfãs e que tivemos que fugir.
Carol quis ficar com a gente de cara, mas Ed não. Por isso eu tive que usar todo o meu talento como atriz para convencê-lo de que nós seriamos úteis para ele.
Depois de um longo tempo parados ali, conhecemos algumas pessoas e resolvemos nos juntar a eles. E essa foi a melhor decisão que todos nós já havíamos tomado.
– Cassie, temos que ajudar a encontrar comida. – Ruby informou assim que eu me levantei.
– Tudo bem, fique junto da Sophia. – Pedi assim que sai da barraca.
Agradeço pela diretora nos forçar a ser escoteiras, por que se não fosse por isso, não teríamos duas barracas e bastante senso de sobrevivência.
– Ficar com a Sophia? Mas eu quero ir com você. – Ruby disse enquanto me seguia.
– A Ruby quer ir com você aonde, Cassie? – Dale perguntou levantando-se da cadeira de praia que estava em cima do trailer.
– Vou atrás de comida, essas pessoas não podem sobreviver de biscoitos recheados e frutinhas silvestres. Eles precisam de carne e eu vou buscar carne.– Falei enquanto entrava no Trailer.
Peguei o meu arco e a aljava com flechas, a arma que antes era do meu pai e a minha faca de cozinha que tinha deixado no trailer de Dale para Ed não roubar e sai.
– Não pode sair sozinha. – Dale disse assim que me viu.
– Mas eu não vou sair sozinha, vou sair com o Daryl. – Falei assim que avistei ele saindo da caminhonete com sua besta.
– Não vai não. – Daryl respondeu se virando para mim.
– Viu? Eu vou com ele. – Falei dando a Dale um sorriso. – Fique de olho na Ruby para mim. E Ruby, fique com essa faca para se proteger caso necessário.
Entreguei a faca média de cozinha bem amolada para ela e a abracei forte.
– Não morra e traga algo bem gostoso para comer. Não aguento mais comer frutas e biscoito. – Ruby disse carregando um sorriso brincalhão.
– Tudo bem, eu voltarei em segurança e com comida. Agora tenho que ir. Não se afaste do Dale. – Sai do abraço e olhei na direção de Daryl, que para a minha surpresa, parecia estar me esperando.
– Você vai ficar me olhando ou vai vir comigo? – Daryl perguntou de modo rude.
– Estou indo. – Dito isso eu me aproximei dele e sorri. – Vamos?
Ficamos um bom tempo andando em silêncio. Daryl e eu não somos muito próximos, mas eu gosto do jeito dele, e por isso eu quis vir. Por isso e porque eu precisava me sentir livre.
– Onde conseguiu o arco e as flechas? – Daryl perguntou depois de um bom tempo apenas olhando rastros pela mata.
– O meu pai fez para mim. Ele sabia o quanto eu queria aprender a atirar com um arco. E quando eu fiz dez anos, comecei a fazer minhas próprias flechas. Também tenho uma arma. Era dele. – Levantei a camisa para que ele visse a arma que carregava para todo o lado.
– Por que seu pai te deu essas coisas? Você não tem só oito anos?
– Doze anos. Quem tem oito é a Ruby. – Corrigi seriamente. – Bom, meu pai era do exército e quando ele morreu enviaram a arma para minha mãe mas ela me deu porque quando eu tinha quatro anos, eu colei um adesivo de princesa na arma dele e ele disse que aquilo seria para ele lembrar de mim toda vez que tivesse que lutar.
Acabei sorrindo pela lembrança.
– E a sua mãe?
– Ela cometeu suicídio dois meses depois a morte do meu pai. Ela começou a usar drogas e ficou com muitas dívidas. Acho que ela também se achou incapaz de cuidar de mim e por isso desistiu. – Falei sentindo minha voz falhar algumas vezes. – E já que eu não tinha mais ninguém acabei indo para o orfanato.
– Eu sinto muito. – O Dixon disse após alguns segundos de silêncio.
– É, eu também.
– Como conheceu a Ruby? Vocês parecem próximas. – Daryl disse, parecendo não querer deixar o clima ruim daquele jeito.
– Eu fui para o orfanato quando tinha onze anos, levei minhas armas escondida dentro de uma mala enorme e fiquei um bom tempo isolada. Ruby foi a única corajosa o suficiente para insistir em ser minha amiga, e no final ela se tornou como uma irmã para mim. Apesar de que as vezes eu ajo como mãe dela. – Expliquei soltando um sorriso. – E o Merle? Como é a sua relação com ele?
– Merle é complicado e costuma fazer cagada o tempo todo, mas é meu irmão.
– Quando ele não está sendo um babaca racista e machista até que ele é suportável. Ele defendeu a Ruby do Ed uma vez.
– Eu lembro disso. Foi no mesmo dia em que você disse ao Ed que se ele encostasse um dedo na Ruby de novo, você arrancarias os olhos dele e faria um colar para você.
– Eu estava exagerando, no máximo eu daria uma flechada na bunda dele.
– E eu no olho. Não suporto aquele cara.
– Bem vindo a A.P.O.E, associação de pessoas que odeiam o Ed. – Falei vendo-o dar um mínimo sorriso.
– Vamos ver se você sabe usar mesmo esse arco.
•~•*•~•
– Eu acertei o veado sim, você que errou. – Resmunguei o óbvio para Daryl.
– Eu não errei nada, você que errou e aposto que ainda perdeu uma das flechas atirando tão longe do veado assim.
– Eu vou te provar que eu acertei.
Caminhamos em silêncio até onde o veado estava e fomos recebidos de braços abertos e armas engatilhadas.
– Ah, Daryl. – Shane disse um tanto aliviado e olhou para mim. – Cassie, o que está fazendo na mata com o Daryl? E que arco é esse?
– Nós estávamos caçando. E esse é o meu arco.
– Mas que coisa, esse veado era nosso. Olha só, tá todo comido por essa coisa imunda, doente, desgraçado, idiota. – Daryl disse enquanto chutava o zumbi.
– Olha só, eu disse que tinha acertado o Bambi. Essa é a minha flecha ali no canto. – Apontei com o dedo para o veado.
– Calma, filho. Isso não vai ajudar. – Dale disse numa tentativa falha de acalmá-lo.
– O que que você sabe disso, coroa? Por que não pega seu chapéu idiota e volta para casa na praia? – Daryl disse irritado. – Andamos quilômetros atrás desse cervo. Íamos leva-lo para o acampamento. Fazer uma carne para nós. E se a gente cortasse essa parte que foi comida?
– Homem esquilo, eu não arriscaria. – Comentei vendo-o me lançar um olhar irritado pelo apelido.
– É uma pena. Mas eu consegui uns esquilos, uma dúzia. Vai ter que dar.
– Nós conseguimos os esquilos. – Corrigi. – As vezes, você não sabe nada sobre trabalho em dupla, Daryl.
A cabeça do zumbi logo começou a reclamar da vida tediosa que ela estava levando e Daryl a calou com uma flechada.
– Tem que ser no cérebro, não sabem disso? – Dito isso ele pegou a flecha e foi embora.
– Quem é o cara novo?
– Eu sou Rick, Rick Grimes. Qual seu nome?
– Cassie Hart. Grimes como aquele garoto bonitinho filho da Lori? – Perguntei vendo Glenn soltar uma risadinha debochada.
– É, ele é meu filho. – Rick comentou dando um sorriso, parecendo achar fofo minha quedinha pelo Grimes. – Vocês são amigos?
– Não, já que eu costumo estar sempre ajudando no acampamento, e por isso não tenho tempo para brincar com as outras crianças.
– Feliz em conhecer o futuro sogro, Cassie? – Glenn perguntou.
– Feliz em te ver de novo, seu japonês. – Me aproximei de Glenn e o abracei.
– É coreano.
– Tanto faz.
– Não deveria ir para a floresta com o Daryl. Na verdade, nem deveria sair do acampamento. – Shane repreendeu, falando mais bosta que o normal.
Nada contra o Shane, mas eu odeio que tentem controlar minha vida.
– Eu disse isso a ela, mas ela não quis ouvir. – Dale se meteu.
– Daryl faz o máximo para ajudar o acampamento. Ele é meio agressivo e caladão, mas é um cara legal. Deveriam agradecê-lo por ele se esforçar tanto, e não julgá-lo. – Repreendi sustentando um olhar decepcionado.
– A gente sabe, mas de qualquer forma não é seguro sair do acampamento. Você só tem doze anos, não pode ficar se arriscando assim. – Dale disse.
– Minha idade não importa, não quando fui eu que ajudei a trazer comida para vocês. Eu sou independente e sairei do acampamento quando me der vontade, ouviram? – Perguntei já cansada de toda aquela opressão.
– Mas Cassie, pense na Ruby, ela não aguentaria te perder. – Dale insistiu na ideia de me manter no acampamento.
– Não use ela como uma desculpa, quando até ela concorda que eu saia e seja útil. E falando na Ruby, onde ela está?
– Está com a Sophia, o Carl e um cara novo. – Shane respondeu.
– Com um cara novo? Entendi, vou ir conhecer ele.
– Vai ir ver o cara novo ou o Carl? – Glenn perguntou sustentando um sorriso zombeteiro.
– Cala a boca, japonês. – Dito isso eu apenas dei as costas e sai andando em direção ao local em que Ruby estava.
– Cassie, você voltou! – Ruby murmurou sorridente.
– Cadê o Merle? – Perguntei assim que vi o Dixon mais novo chamando pelo irmão.
– Você não soube, não é? O tal do Merle não voltou. – O cara novo respondeu.
– Quem é você?
– Dake Ategray. E você? – O adolescente perguntou.
– Cassie Hart. Tenho que resolver uma coisa. Cuida das crianças para mim?
– Nós temos a mesma idade, Cass. – Sophia disse parecendo não gostar de ser chamada de criança.
– Eu sei, mas eu sou a criança que vai se meter na treta, e vocês as crianças que vão ficar longe. Porque pelo o que parece, isso não vai acabar bem.
– E por que você pode entrar na briga e a gente não? – Carl perguntou se pondo de pé na minha frente.
Que menino lindo em pleno apocalipse.
– Por que se eu não me meter o Daryl arranca a cabeça do seu pai. Tirando o Merle, a pessoa com que o Daryl mais trocou palavras fui eu. Então, sou a única criança entre nós que pode tentar resolver. Agora, por favor, Carl, ajude o Dake a cuidar da Ruby e da Sophia. Elas são meio lerdas.
– Ei!
Carl e eu apenas ignoramos a exclamação revoltada de Ruby e Sophia, e continuamos focando no mais importante: a cabeça do Rick que poderia rolar pelo chão a qualquer momento.
– Está bem, eu ajudo. Mas toma cuidado pra não machucar ali no meio. – Carl disse e meu coração quase parou de bater.
Nosso casamento vai ser em julho. Meu vestido vai ser ombro a ombro e com renda.
Depois de alguns segundos me esforçando para afastar os pensamentos sobre meu futuro casamento com o Carl, eu apenas fui em direção a treta -que felizmente já tinha acabado- e me meti.
– Vocês vão buscar o Merle?
– Vamos, mas nem pense nisso. – T-Dog respondeu.
– Não precisam insistir, eu vou com vocês. – Falei sorrindo, mesmo sabendo que eles me queriam no acampamento.
– Você não vai.
– Fala sério, Daryl! Você era o único que não me impedia de ser livre.
– Mas a gente não vai pra mata em volta do acampamento, a gente vai pra uma cidade cheia de zumbis. É diferente.
– E? Eu ainda quero ajudar vocês a encontrarem o Merle.
– Por que? – Daryl perguntou irritado como nunca. – Por que sempre tenta correr atrás de mim? Por que quer se arriscar tendo uma irmã mais nova pra cuidar, em? Por quê?
– Porque você me lembra o meu pai. – Revelei vendo sua expressão de raiva sumir. – E porque o Merle também nunca tentou me prender aqui. Ele assim como você sabe do que eu sou capaz. E vocês dois são importantes para mim.
Daryl não disse nada, apenas ficou ali me encarando pensativo.
– Se te levarmos e algo acontecer, a gente nunca vai se perdoar. – Glenn disse se aproximando de mim e pondo a mão no meu ombro.
– Se acontecer algo com vocês, eu que não vou me perdoar. Mas tudo bem, eu entendo, vocês não querem um peso nas costas. Tomem cuidado lá. – Me afastei, fazendo com que a mão de Glenn saísse do meu ombro. – Vou ficar com as outras crianças e tentar ser normal, não se preocupem.
– Cassie, não fica assim, por favor. – Glenn tentou se aproximar mas eu me afastei.
– Se possível, tragam uma jaqueta de couro pra mim. Se trouxerem e voltarem vivos, eu perdoo vocês. – Resmunguei soltando um sorriso mínimo. – Agora vazem, bestas quadradas.
– Aproveita que vai ficar com as crianças e agarra o Carl. – Glenn disse me fazendo rir.
– As vezes você fala como se eu não fosse criança também.
– É que as vezes você não parece uma. – Glenn respondeu para minha felicidade.
– Já chega de melação. – Daryl cortou nosso momento com um mínimo sorriso no rosto. – Eu vou trazer a sua jaqueta de couro se você prometer que não vai agarrar o Carl. Você é muita areia pro caminhãozinho dele.
– Qual é, Daryl! Está me forçando a tomar uma decisão difícil. Mas ok, eu escolho a jaqueta de couro. Vou ficar incrível nela. – Sorri abertamente e vi o grupo ao redor sorrir também.
– Agarra o Carl sim. – Glenn sussurrou na minha direção e eu apenas assenti disfarçadamente.
– Tudo bem, eu já estou indo.
Não esperei uma resposta, apenas abracei cada um dos membros do grupo que iria para Atlanta e sai correndo em direção a Sophia, Carl, Ruby e Dake.
– Posso brincar com vocês? – Perguntei sentindo minhas bochechas aquecerem.
– Você quer brincar com a gente? – Carl perguntou confuso e com razão, já que eu nunca parei para brincar com eles. – Legal! Do que vamos brincar?
– Pega-Pega? – Ruby propôs.
– Tudo bem, eu não sou muito fã de correr mas eu topo.
E foi assim que passamos o dia, correndo e brincando, sem nem imaginar o que acontecia depois.
Esse foi o nosso maior erro. Não pensar no depois foi o nosso maior erro.
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