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História Trust me - Poder


Escrita por: LauraEllyse

Notas do Autor


OI POVO <3 desculpa nao ter respondido a maioria dos comentarios no capitulo anterior, eu li todos e juro que vou responder <3 muito obrigada pelo carinho e pelo apoio <3

mas oh, quero deixar aqui um aviso de gatilho pra esse capitulo. A narração do stiles com a aura fica meio pesada em certas partes, então tentem se lembrar que vai dar tudo certo eventualmente, okay? okay <3

Capítulo 135 - Poder


Levou um tempo, mas Lydia conseguiu convencer Jordan a se levantar e sair daquela sala destruída. Ele havia pegado seu gato no colo, e ainda não o soltara, sentado à pequena mesa da cozinha. Nico não parecia se importar, completamente confortável em seus braços. Lydia varrera para longe os cacos de vidro e arrumara a toalha, colocando seu celular com a lanterna ligada no centro da mesa. Não sabia quanto tempo ainda ficariam ali, mas teriam que decidir o que fariam assim que a chuva passasse.

- O que você quis dizer? - Ela perguntou, quebrando o silêncio desconfortável que havia se instalado entre eles. - Do que você se lembrou?

- Eu… - Ele trouxe Nico para mais perto. - Na minha última semana no Afeganistão, eles me enviaram para desarmar uma bomba. Eu disse para o comandante que ele devia mandar outra pessoa, mas ele não me ouviu. O meu… um bom amigo tinha morrido alguns dias antes, e eu não estava conseguindo pensar. Eu cortei o fio errado.

Lydia segurou a respiração.

- E foi… - Jordan continuou. - Foi a pior dor que eu já senti na minha vida. Eu senti as chamas me consumirem. Eu senti um vazio. Eu vi coisas. E aí eu só… eu estava bem de novo. Mas não era eu. Quando eu levantei e saí dali, eu não estava… não era eu que…

- Você disse que alguma coisa nasceu.

- Eu senti aqui - Apontou para seu peito, apesar de Nico estar na frente. - Quando eu roubei os corpos, eu senti a mesma coisa. Ninguém sabia como eu tinha sobrevivido. Eles viram a explosão e me deram como morto. Eu não tinha nenhuma queimadura, não sabia explicar o porquê. Uma semana depois, eles me dispensaram.

- Então é por isso que você não se lembrava de nada, não até ler o livro. Você não é sobrenatural, mas… tem algo sobrenatural… em você?

Jordan assentiu, parecendo mais assustado a cada segundo:

- Você já viu alguma coisa assim antes?

- Eu… - Ela não continuou. Não faria bem a ninguém compartilhar em voz alta a lembrança dos olhos vazios de Stiles.

***

- Hey…  hey, Malia, sou eu. Kira, sou eu, Kira. Você sabe disso. Você tem o meu número no seu celular, é claro que você sabe. É claro que ela sabe Kira, que droga…

Apagou a gravação, imediatamente iniciando outra.

- Malia, é a Kira - Assim era melhor. Malia tinha seu número, sim, mas ainda era bom começar com uma introdução. Certo? Talvez. - Eu só… eu só queria dizer que… eu não quero ir, e que eu vou voltar. Eu sei que eu já disse isso, mas eu queria…

Suspirou, afastando o celular de seu ouvido por um momento. Respirou fundo, se ajeitou na cama, onde estava sentada, e trouxe o aparelho de volta para a lateral de seu rosto.

- Eu só queria dizer que… todo mundo nos chama de namoradas, e eu nunca te pedi oficialmente como eu queria, mas eu… não, Kira.

Cancelou a mensagem. Iniciou outra.

- Hey Malia, sou eu. Só queria reforçar que eu ficaria se pudesse, e que vou voltar. E eu queria que você soubesse que… que eu sempre… que você… - Limpou a garganta. - Eu sempre me senti uma idiota perto das pessoas, mas não com você. Quer dizer, às vezes eu me sinto um idiota com você, mas é porque eu sou uma idiota, e não porque você me faz me sentir uma idiota, entende? Porque com a maioria das pessoas eu sou idiota e me sinto idiota, mas elas dizem coisas que me fazem me sentir mais idiota por cima do que eu já me sinto, e com você eu só sinto sem nada por cima, e… e isso não fez nenhum sentido.

A energia havia voltado poucos minutos atrás, a chuva finalmente diminuindo. Kira clicou em “iniciar mensagem de voz”, ouvindo mais uma vez o beep antes de voltar a falar:

- Malia, oi. Eu não queria ir, e eu vou voltar. Eu me sinto muito bem quando estou com você. Eu me sinto… segura. E não só porque nossas vidas estão sempre em perigo e é sempre bom andarmos em grupo, mas eu me sinto… segura em existir perto de você. O que não é algo que acontece com a maioria das pessoas. Eu fico sempre pensando no que eu estou falando, e no que estou fazendo, e com você eu só existo, e por algum motivo você gosta disso, e eu…

Seus olhos marejaram. Ela cancelou a mensagem.

- Malia, eu gosto muito de você. Eu me sinto segura com você, e você sempre me faz rir, e… n-não que eu esteja rindo de você, eu… droga.

Beep.

- Eu estou com medo de ir. Eu não sei onde é, ou quem são os Skinwalkers. Não sei o que vão fazer, não sei quanto tempo vai levar, eu não sei… Eu estou com tanto medo de voltar e descobrir que alguma coisa aconteceu com você, ou com algum dos outros. Eu acho que nunca vou me perdoar.

Fez uma pausa. Malia sequer ouviria aquela mensagem? Ela estava com tanta raiva quando saíra há poucas horas atrás.

- Eu não sei se você me odeia no momento, e eu não sei se consegui explicar o quão… essa raposa, a que está em volta de mim, não é a minha. Nogitsunes não nascem, eles são raposas corrompidas. E é exatamente assim que eles se parecem. Isso nunca acontece com raposas com menos de cem anos. Seja lá o que os doutores fizeram, eu tenho que descobrir como impedir o quanto antes, ou eu vou ficar…

Engoliu em seco. Podia quase sentir a raposa ao seu redor. Era errado. Tudo estava errado.

- Eu vou voltar assim que puder, então por favor, fique segura. Eu preciso… eu preciso que você fique segura, okay? Parece que faz tanto tempo desde a última vez que eu te beijei, e você foi embora, então isso tem que acontecer quando eu voltar, okay? Eu te… - Soltou todo o ar que segurava, trêmula. - Eu acho que te amo.

Deixou o celular na cama. Encarou a tela, onde a gravação se estendia a cada instante. Os segundos se passaram, os números continuaram correndo. Repetiu as palavras em sua mente, de novo e de novo. Eu acho que te amo.

Cancelou a mensagem.

- Às vezes eu fico pensando que vou viver por séculos e ver vocês todos morrerem.

Cancelou a mensagem.

- Você gosta mesmo de mim, ou eu sou só… a primeira pessoa que você beijou, e você gosta da minha amizade, e gosta de beijar, e não sabe diferenciar uma coisa da outra?

Cancelou a mensagem.

- E se quando eu voltar, tiver passado tanto tempo e você tiver percebido que eu não fiz tanta falta?

Cancelou a mensagem.

- E se você não estiver aqui quando eu voltar?

Cancelou a mensagem.

- E se…

Uma batida na porta. Kira pulou no lugar, mas se recompôs a tempo. Sua mãe entrou no quarto, um semblante sério em seu rosto.

- Vamos? - perguntou. A chuva não havia parado, mas não era mais uma tempestade. Nenhum relâmpago ou trovão, e o céu já não era mais tão escuro.

Pela última vez, Kira pressionou “cancelar”, e se levantou da cama.

***

Estava claro quando Stiles acordou, o que significava que a forte tempestade havia passado. Não que o céu estivesse limpo, ainda cinza e nublado. Esfregou o rosto, tirando a remela de seus olhos, e virou para Isaac ao seu lado.

O beta ainda dormia, e ninguém podia culpá-lo. Depois do que Stiles fizera, Isaac devia estar esgotado. Por quanto tempo havia durado? Uma hora, talvez? Indescritível.

Mas tinha que deixá-lo recuperar alguma energia emocional se quisesse mais no futuro. Olhou em volta, preguiçosamente se perguntando o que faria em seguida. O relógio ao lado da cama marcava duas da tarde, o que significava que havia dormido um pouco mais de quatro horas. O quarto era relativamente arrumado. Uma pilha de livros em um canto, canetas e papéis espalhados pela mesa, mas nada muito gritante. Havia uma saco de dormir no chão, porém, e um conjunto de coisas próximas a ele que Stiles logo percebeu serem de Nathan.

Se levantou, silencioso e ágil como um gato. A mochila escolar de Nathan estava ali, junto com outra cheia de roupas e um tênis. Elas emitiam uma energia própria, como todas as coisas emitem, mas nada que interessasse. Stiles pegou a mochila pela alça e a arrastou para o outro lado da cama. Ao deixá-la no chão, se certificou de que Isaac a veria assim que acordasse. 

Quando desceu as escadas, o cenário com o qual se deparou era completamente diferente comparado ao de quatro horas atrás. Liam estava acordado, para começar. Ele e Mason comiam hambúrgueres no sofá, falando baixinho um com o outro. Hayden parecia já ter terminado o seu, a julgar pelos papéis de embalagem na mesinha de centro, e falava com alguém no celular:

- Eu sei Val. Eu estou lembrando de tomar os remédios, pode deixar.

Esticado no outro sofá, Theo dormia sob um cobertor. Ele trouxera Mason de volta, então, mas onde estava Corey?

- A gente não conseguiu convencer ele - Mason respondeu quando perguntou. - Falamos como era perigoso, mas ele não… não sei se não acreditou, ou se foi outra coisa, mas não quis voltar.

Uma pena, Stiles pensou. Se Corey ficasse com eles, Scott iria se apegar, e sua dor seria tão mais doce quando a quimera morresse.

Vindo da cozinha, Derek apareceu, provavelmente atraído pela voz de Stiles. Muito apegado, muito carente e inseguro. Vulnerável, facilmente manipulável. Praticamente já vivia na palma de sua mão. Ele seria o mais divertido.

- Oi, lindo - cumprimentou quando Derek se aproximou para beijá-lo. Levou suas mãos ao rosto do outro, acariciando sua barba, e sorriu docemente quando se separaram. - Você está com um bafo horrível. 

- Você também - Derek rebateu. - Não está com frio?

Ele esfregou os braços arrepiados de Stiles, suas mãos levemente molhadas. Não estava com frio. Não estava com dor nas costas, ou em suas pernas. Sequer estava com muita fome. 

- Oh, estou - Stiles encolheu seus braços, tentando se aquecer. - Esqueci meu moletom lá em cima. Seu moletom, quer dizer. Eu não roubei, nem nada. 

- Aham. Eu vou lá pegar, vai comer alguma coisa. 

- Vê se as cápsulas ainda estão no bolso e traz elas pra mim, por favor? - Beijou-o de novo. - Mas cuidado para não acordar o Isaac. Vamos deixar ele dormir o máximo possível. 

Havia mais pessoas na cozinha do que Stiles antecipara. Malia tinha seus dedos, queixo e a toalha de mesa sujos da mostarda enquanto devorava seu hambúrguer. Um outro jazia largado sobre as embalagens de papel na frente de Scott, que brincava com o canudo de seu copo meio cheio de refrigerante. Parrish também estava ali, sentado ao lado de Lydia, mas eles não estavam comendo nada. Todos pareciam ter interrompido suas conversas com a chegada de Stiles, inclusive Melissa, que lavava a louça, e John, que estava…

John parou no lugar, no meio de dar outra mordida em seu lanche. Seus olhos estavam arregalados, como uma criança que fora pega no ato. 

Stiles reprimiu a vontade de revirar os olhos.

- Eu vou permitir, dessa vez - Se forçou a dizer, porque era o que o Stiles antigo diria. Na verdade, o antigo Stiles faria uma cena dramática, mas já não tinha toda aquela paciência. De qualquer forma, colocou as mãos na cintura em uma pose repreendedora. - Mas só dessa vez.

- Sério? - John ergueu uma sobrancelha para ele.

- Pai, tem coisa mais importante acontecendo - Gesticulou ao seu redor. Quando John abaixou o olhar, Stiles sabia que o fizera se sentir um idiota. Foi até Scott, colocando uma mão em seu ombro. - Ei, cara. Tudo bem?

As pontas de seus dedos tocaram a pele exposta de seu pescoço. Oh, sim, a dor continuava boa. Mas, depois de Isaac, aquilo era notícia velha. Isaac era o melhor com o luto. Talvez devesse tentar culpa com Scott.

- Estou bem - Scott respondeu, erguendo seus estúpidos olhos de cachorrinho para ele. - Como você está? Dormiu bem?

- Como um bebê - Acariciou sua barriga. - E com um bebê, que dormiu quietinho, aliás. Estou tão orgulhoso.

- O quê? - Parrish perguntou. Ele soava mais confuso do que surpreso, o que significava que não conseguia ver a barriga, não tinha quebrado o feitiço. Melhor assim, Stiles logo decidiu. Não precisava de mais drama desnecessário.

- Parrish! - Ergueu a voz, falando mais rápido a cada palavra. - Você está aqui! É claro que está, eu vi você. Você aqui, ótimo. Melhor aqui, onde todo mundo pode te ver, não é? Não que estejamos preocupados com você andando sozinho por aí, é claro. Não é como se você estivesse fazendo nada preocupante, ou ilegal, ou imoral, ou… 

- Stiles - Lydia o repreendeu. - Nós estávamos falando justamente disso.

- De ele roubar os corpos? A propósito, Lydia, graças a Deus que você está viva. Eu estava me corroendo de preocupação. Parrish, cara, será que não tem como você, sei lá, não roubar cadáveres?

- Stiles - ela repetiu, enquanto Parrish se encolheu ao seu lado. - Não é culpa dele. Ele não sabe o que está fazendo. Isso é claramente alguma força sobrenatural.

- Sempre é - Derek voltou para a cozinha, trazendo o frasco com as cápsulas em uma mão, e o moletom na outra. - Aqui.

- Obrigado, amor - Aceitou o moletom, colocando-o com um sorriso satisfeito no rosto. Derek o olhou estranho por um instante, mas logo disfarçou.

- Isaac parece bem - Ele encheu um copo com água, falando com Scott. - Eu escondi as coisas do Nathan no quarto de Melissa, pensei que seria mais fácil assim. Ele está acordado, talvez desça para comer - Se virou para a enfermeira. - Espero que não seja um problema?

- Não, é claro que não - Melissa negou com a cabeça, esfregando os pratos. 

- Eu disse que ia terminar de lavar. 

- Derek, é muito educado da sua parte, mas você não tem que fazer isso. 

- Ele é assim mesmo - John sorriu de lado, mirando Derek com uma intensidade que faz o beta abaixar a cabeça, sem jeito. 

- É, ele é - Stiles fez sua melhor voz de namorado orgulhoso. - Ele também é um pouco obcecado por limpeza. Se deixar ele lavar até o banheiro.

- Cala a boca, Stiles - Derek voltou para seu lado, abrindo o frasco para pegar uma cápsula em sua palma.

- Isaac? - Scott chamou, e todos ficaram em silêncio. Por um momento, Stiles pensou que Isaac houvesse descido, mas, a julgar por como Scott inclinava a cabeça para o lado, como se focasse sua audição, era mais provável que estivesse falando com o beta ainda no quarto. - Você vai descer?

Mais silêncio. Até mesmo Malia havia parado de comer para observar. Instantes se passaram, até que os ombros de Scott abaixaram em derrota. Ele deixou o corpo cair sobre o encosto da cadeira, largando o copo de refrigerante sobre a mesa. Todos trocaram olhares, mas ninguém disse nada. Aquela dor era diferente, mas ainda não boa o suficiente. Stiles não se incomodou em tocá-lo.

Pegou a cápsula. Respirando fundo, colocou-a em sua língua, engolindo-a com a água em um único gole. 

- Ugh, delicioso - Fez uma careta, puxando uma cadeira para si ao lado de Scott. O amigo o encarou, perguntando com o olhar se estava tudo bem. Stiles assentiu, contorcendo o rosto em uma falsa expressão de enjoo. Derek se sentou na ponta da mesa, esticando sua mão para pegar a de Stiles. Como sempre, Stiles escondeu suas mãos nas mangas do moletom, não deixando que o tocasse. Quando Derek reclamou, simplesmente mostrou a língua para ele. - Então, do que estavam falando sobre o Parrish?

- Sobre o que fazer com o que sabemos - seu pai respondeu. - Nós sabemos para onde está levando os corpos. Eu voto em ir resgatá-los.

- E se eu roubar eles de novo? - Parrish estava tenso. - E se eu machucar mais pessoas para fazer isso?

- Eu voto em observarmos - Lydia falou. - Ele vai tentar roubar o corpo de Nathan. Quando isso acontecer, talvez consigamos falar com ele, descobrir exatamente o que está acontecendo.

- Talvez dê para trazer ele de volta - Stiles ponderou. O que eles realmente deviam fazer era prender Parrish em um lugar cercado de cinzas da montanha. Tentar interagir com Parrish em seja lá que estado ficasse quando ia atrás dos corpos parecia estúpido e perigoso. Alguém definitivamente iria se machucar. - Talvez você consiga, Lydia.

- É perigoso - Derek protestou.

- E qual a novidade? - Deu de ombros. - Alguma coisa a gente tem que tentar. Não podemos só deixar ele jogar o Nathan em uma pilha de corpos na floresta para apodrecer com os outros.

Ao seu lado, Scott parou de respirar. Seu corpo inteiro travou no lugar com a dor que aquelas palavras trouxeram, como Stiles sabia que aconteceria. Continuou falando, não deixando que ninguém notasse:

- Então nós precisamos de um plano, e precisamos rápido. Parrish, cara, você não se lembra de nada?

- Eu lembro - Parrish se ajeitou em sua cadeira, desconfortável. - Eu li o livro dos doutores. Eu lembro de todos os corpos, mas eu… eu não me lembro de pensar. Era como se estivesse agindo por instinto.

- Um instinto de levar eles para o Nemeton? - Acentuou suas palavras com um tom de urgência. - Ótimo, incrível. Você está praticamente acobertando os doutores. Você não se lembrou deles? Talvez eles tenham feito alguma coisa com você para…

- Não - Parrish o interrompeu. - Eu não sei o que está acontecendo comigo, mas não tem nada a ver com eles. Eu tenho certeza.

- Ótimo - Suspirou. - Dois problemas simultâneos.

- Não é exatamente um problema - Malia deu de ombros. - Eles já estão mortos, mesmo.

- Malia! - Melissa a repreendeu, sua expressão horrorizada acompanhando a de todas na mesa. Oh, Stiles adorava Malia.

- O quê? Os doutores estão indo atrás de gente viva. Eles são um problema de verdade, Parrish não. Por que estamos perdendo tempo com isso?

- Não devíamos - disse John. - É simples, vamos recuperá-los.

- E se eu roubar eles de novo? - Parrish repetiu. - Xerife, quatro policiais estão feridos por minha causa. Queimaduras de segundo e terceiro grau.

- Não podemos só deixá-los lá.

- Eu acho que é a melhor opção até sabermos o que está acontecendo.

- E quando você levar Nathan? - Melissa havia desligado a torneira e se virado de costas para a pia, sua atenção completamente voltada para a conversa. - Ele nem mesmo vai ser notificado como uma pessoa desaparecida? A mãe dele nem vai saber que…

Simultaneamente, todos os lobisomens olharam na mesma direção. Melissa não continuou, espantada com o movimento repentino. Eles eram mesmo como cachorros. Apenas animais fingindo civilizados. Era nojento.

- O que foi? - Stiles perguntou, se fazendo de estúpido e olhando na mesma direção que eles.

- Isaac disse “Que se foda a mãe dele” - Malia esclareceu, dando outra mordida em seu hambúrguer. Interessante. Qual seria a história por trás? Independente do que fosse, aquele era claramente um tópico delicado, e Stiles lembraria disso. 

- Isaac? - Scott chamou mais uma vez. - Desce aqui com a gente. Por favor.

Nada aconteceu. Pela falta de reação de Derek e Malia, não houvera resposta.

- Você quer que eu suba com… - o Alpha se interrompeu. As sobrancelhas de Derek se ergueram levemente, mas ele tentou disfarçar. Malia não se preocupou com isso, deixando bem claro para todos qual havia sido a resposta. Scott abaixou a cabeça, fitando suas mãos em seu colo. Ainda mais interessante.

- Bom, eu voto em observar - Stiles ergueu uma mão no ar. - É como a Lydia falou, talvez ela consiga falar com a segunda personalidade dele. Precisamos saber mais sobre o que está acontecendo antes de agir.

- Está bem - John concedeu. - Parrish, você não pode ficar desacompanhado, então. Seria bom que você ficasse…

- Ele pode ficar na casa do lago - Lydia falou. - Seu apartamento está destruído, Jordan, você não pode ficar lá. A casa do lago era da minha avó, mas nós a usávamos para prender Malia e Liam nas luas cheias antes de aprenderem a controlar.

- O Liam aprendeu a se controlar? Na última lua cheia, ele saiu pelado por aí - Stiles lembrou a todos. - Liam, cara, por que você estava pelado, mesmo?

- Estava calor! - Liam gritou da sala, por cima das risadinhas de Mason e Hayden. - E a gente combinou que não ia falar mais disso!

- Eu não combinei nada - Se virou para Scott. - Será que ele tem controle o suficiente para aguentar a Super Lua na quarta-feira?

- Eu tenho! - Liam agora estava na entrada da cozinha. - Vocês não vão ter que me prender, eu posso controlar. É sério. 

Parecia um desastre prestes a acontecer. Mesmo que Liam por algum milagre conseguisse se controlar, Stiles tinha certeza que poderia dar-lhe um empurrãozinho. O que fizera com Isaac… o quanto poderia expandir aquela habilidade?

- Se você tem certeza - Stiles deu de ombros. - Então o Parrish fica na casa do lago até descobrirmos o que está acontecendo com ele. Você que vai ficar com ele? - perguntou para a Banshee.

- Talvez um de nós devesse… - Scott começou, logo sendo cortado por Lydia:

- Ter muita gente por perto vai fazê-lo repetir o que aconteceu com os policiais. Eu fico com ele na casa do lago. Só eu. Assim que ele começar a agir estranho, eu chamo um de vocês. Nós o seguimos de longe até o Nemeton, e só lá tentamos falar com ele.

- Sim - Parrish assentiu. - Essa criatura, ela… eu acho que ela reagiria mal se o caminho até o Nemeton fosse interrompido. É como se ela tivesse uma missão. Qualquer tentativa de comunicação tem que ser feita depois de completá-la.

- E se você matar a Lydia antes de ela chamar uma de nós? - Malia perguntou, lambendo os dedos de mostarda. 

- Não vai acontecer - Lydia se apressou em responder. Ela colocou sua mão sobre a do policial, que empalideceu visivelmente com as palavras. - Eu não sei explicar, mas eu sei que… eu sei que vou estar segura, está bem?

- Lydia, qual é - Stiles revirou os olhos. - Isso está ficando ridículo.

- Isso não é… - Ela suspirou, frustrada. - Eu estou dizendo como uma Banshee. Não é ingenuidade, é algum… é instinto. Eu sei.

Huh. Interessante. Todos na mesa trocaram olhares, até eles por fim caírem sobre Scott. Alguns instantes se passaram até o Alpha perceber que todos esperavam uma decisão.

- Oh. Ah… - Scott esfregou os olhos, franzindo as sobrancelhas como se tentasse pensar. - É, okay. Pode ser.

Patético. 

- Bom, então é isso - Stiles juntou as mãos sobre a mesa. - Essa é a conclusão deste tópico. O próximo da lista deveria ser a tempestade bizarra de agora pouco. O que vocês acham? Uma quimera nova, ou uma…

- Oh, foi só a Kira - Malia deu de ombros, como se não fosse nada demais.

- Kira? - Lydia ecoou. - Tem certeza?

- Uhum - A beta evitou encontrar o olhar de qualquer um. - Começou assim que eu saí da casa dela. E, uma vez, ela acabou com a energia do bairro inteiro enquanto a gente via um filme de terror. Eu sei que foi ela.

- Alguém conseguiu falar com ela, aliás? - Stiles se voltou para Scott, que, mais uma vez, não percebeu a atenção sobre ele. Seus olhos estavam sem foco, dissociativos. Ele realmente não conseguia manter o foco em coisa alguma.

- Ela nos mandou mensagem - Lydia respondeu. - Mas ela não atendeu nenhuma das nossas ligações. Ela… ela realmente foi embora.

- Eu disse - Com uma última mordida, Malia finalmente terminou seu hambúrguer, limpando as mãos nas embalagens de papel. - Próximo tópico.

- Certo - Stiles apontou para seu pai e Melissa. - Que tal o que vocês dois estavam investigando até às seis da manhã?

- Nós descobrimos uma conexão entre as quimeras - John trocou um olhar com a enfermeira. - Eles são os doutores do medo, então eu pensei que poderia haver alguma semelhança médica entre os adolescentes transformados.

- Hayden fez um transplante de rim - ela explicou. - Lucas, um transplante de córnea. Tracy, Donovan e Nathan todos tinham enxertos de pele alogênicos. Significa “coletado de um indivíduo da mesma expécie”.

- O quê? - Scott perguntou. Havia levantado a cabeça com a menção de Nathan, uma expressão confusa em seu rosto. - Desculpa, eu não… do que você está falando?

Melissa pressionou seus lábios juntos, uma tristeza passando por seus olhos. Repetiu o que dissera, mais devagar dessa vez.

- Enxerto de pele - Scott repetiu. - Você sabe para quê?

- De acordo com a ficha dele… - hesitou. - Aos três anos, ele foi admitido no pronto-socorro com queimaduras graves. Elas cobriam toda extensão de suas pernas - Uma longa e desconfortável pausa se seguiu. - Você não sabe nada sobre?

Scott negou minimamente com a cabeça, suas sobrancelhas franzidas em uma expressão perdida. 

- Isaac deve saber - disse Stiles. Uma nova onda de dor emanou de Scott, como o esperado. - Mas qual é a conexão? O que isso quer dizer?

- Todos tinham partes que vieram de outra pessoa - Lydia raciocinou. - Eles já eram quimeras, tinham dois pares de DNA. Foi por isso que os doutores os escolheram.

- Foi a conclusão que chegamos - John concordou com a cabeça. - Temos uma pista, então. Sabemos que há mais quimeras, podemos usar isso para achá-las.

- Você quer checar a ficha médica de todos os adolescentes de Beacon Hills? - Stiles ergueu uma sobrancelha para o pai.

- Se for preciso - Ele passou uma mão pelo rosto. - Vamos começar com os desaparecidos, descobrir se algum está nessa história. E então todos da sua escola na faixa de dezessete e dezoito anos. Eu não… eu não sei como vou convencer meus policiais dessa teoria, mas…

- Você tem que tomar cuidado, John - Derek falou. - Precisa de uma boa explicação. Não só para seus oficiais, mas para o FBI.

- O quê? - O xerife apenas franziu as sobrancelhas, como se pensasse que não houvesse escutado direito. Scott, por outro lado, soltou um longo suspiro:

- Eu tinha até esquecido disso. Meu pai veio aqui.

- O quê? - Foi a vez de Melissa perguntar. - O que ele veio fazer aqui?

- Ele veio… - Fechou os olhos com força, tentando se concentrar. - Ele começou a falar que… a gente tinha faltado na escola nos mesmos dias e… e ele falou… que eu sabia o nome do Josh, e eu não…

- Parece que uma câmera de trânsito nos flagrou levando o corpo da Tracy da delegacia - Derek teve piedade e assumiu. - Ele disse que o FBI estava investigando os assassinatos, e que encontraram muitas coisas que nos ligam a eles.

- O FBI está atrás da gente? - Stiles não conseguiu se segurar. - Oh, isso fica cada vez melhor. 

- Você não sabe nada sobre isso? - Derek perguntou para John, que negou com a cabeça.

- Tecnicamente o FBI não é obrigado a me dizer nada - disse, falhando em esconder a preocupação em sua voz. - Ainda mais se eu faço parte da investigação.

- Meu pai falou que foi mandado para São Francisco por três dias - Scott disse. - Acho que outros agentes vão vir. Do jeito que ele falou, pode ser a qualquer momento.

- Quem são os agentes que estavam com McCall? - o xerife perguntou para Parrish. - Agente Grahan?

- E a Agente Owens - Parrish assentiu.

- É claro que é. Precisamos decidir o que vocês vão dizer. Precisamos de uma história para...

Não precisam, Stiles pensou. Podiam resolver toda aquela situação usando o papel que o feiticeiro lhes dera. Ponderou, por um momento, se deveria falar alguma coisa. Por um lado, deixar o FBI se envolver tinha potencial para muito caos e discórdia. Por outro, eles poderiam acabar atrapalhando os planos de Stiles para Derek. Ou qualquer plano, na verdade. Seria muito imprevisível, muito fora de seu controle. Valeria o risco? Talvez devesse manter as coisas do jeito que estavam. Ou talvez…

Uma mão de Derek em seu braço chamou sua atenção.

- E se usarmos o papel? - Ele perguntou. Oh, era tão inteligente. Tornava o jogo muito mais interessante, muito mais desafiador. Stiles queria beijá-lo até fazê-lo sangrar. O queria se contorcendo no chão aos seus pés. Queria sentir cada uma de suas respirações contra sua pele, enquanto Stiles tirava dele tudo o que tinha, dia após dia.

- O quê? - John e Melissa perguntaram ao mesmo tempo. Stiles sustentou o olhar do namorado por um tempo, considerando como agir em seguida.

- Pode funcionar - Acabou dizendo. - Algo como "vocês deveriam suspender as investigações"?

- Estão falando daquele papel que usamos para interrogar o Theo? - Lydia perguntou.

- Ugh, nem me lembre desse dia - Escondeu o rosto nas mãos. - Mas é, é esse papel.

- Que papel? - John voltou a perguntar. - Do que estão falando?

- Um tempo atrás o feiticeiro nos deu um papel enfeitiçado. Super útil, sério, apesar de ser um pouco sinistro. Todos que leem o que tem nele, tomam aquilo como verdade. Sem perguntas, nem nada, eles só aceitam.

O xerife piscou, absorvendo aquela informação.

- E ele deu esse papel para você?

- Tecnicamente foi para o Derek.

- E você só… tem essa coisa? Há quanto tempo isso vem acontecendo? Você já usou esse papel comigo?

- Não! Não é tão livre quanto você está pensando. Tudo o que eu escrevo aparece para o feiticeiro, e se ele achar que eu estou abusando, ele vai pegar o negócio de volta. Era para eu usar só para conseguir adiar minhas provas e não repetir de ano. Levou quase uma hora para eu convencer ele a me deixar usar o papel no Theo - Deixou escapar um grunhido. - Oh, eu não quero nem pensar em como vai ser a ligação dessa vez.

- Isso porque ele nos disse para não ligar - Derek se juntou às lamentações.

- Podemos usar esse papel com o meu pai, também? - Havia uma nota de esperança no tom de Scott, assim como amargura. - Ele disse que quando voltar ele quer "respostas" - Lançou um olhar cansado para Melissa. - Mãe, por que ele?

Um pequeno sorriso se formou no rosto igualmente cansado da enfermeira.

- Sabe o que é realmente triste? De todos os namorados que eu tive, seu pai foi o melhorzinho.

- Você também saiu com o Peter uma vez, não foi? - Stiles lembrou, gerando exclamações de nojo e confusão por toda a mesa. - Você realmente precisa rever seus critérios para homens, Mel. Eu podia te dar umas dicas, tenho um ótimo gosto para homens.

- E onde está o papel? - John se apressou para voltar ao assunto.

- Em casa - Derek respondeu, propositalmente ignorando Stiles. - Eu posso ir buscá-lo. Mas nós temos que pensar muito bem no que escrever. As palavras são muito importantes. 

- Eles provavelmente já tem tudo registrado, não tem como só fazer eles abandonarem o caso. Mas eu posso fazer com que o transfiram para mim, e aí eu resolvo.

- Devíamos pegar o depoimento deles - Parrish falou.

- Nosso depoimento?

- Você, Scott e Isaac - esclareceu, apontando. - Vocês poderiam dizer que ela estava só desmaiada, eu não sei. Algo assim. Precisamos também de um motivo para vocês estarem na delegacia naquele momento. Se vocês forem conosco, vai mostrar que o xerife também está investigando. Mesmo se esse papel mágico convencer os Agentes Grahan e Owen, os relatórios do caso ainda têm que ser convincentes, ou pelo menos credíveis, para qualquer um que ler.

- Ele tem razão - John concordou. - Devíamos já fazer isso hoje. Como Scott disse, os Agentes poderiam aparecer a qualquer momento.

- Parece um plano terrível. Vou pensar em algo melhor no caminho - Lydia se pôs de pé. - Eu vou com vocês. 

- Oh, a gente vai…? - Scott piscou, desnorteado. - Okay, eu vou… chamar o Isaac. 

- Eu vou buscar o papel - Derek falou, e então se voltou para Stiles. - Quer vir comigo?

- Hm? - À sua volta, cadeiras se arrastaram contra o chão enquanto todos se levantavam e seguiam seus caminhos. - Para a delegacia?

- Para casa. O apartamento, quero dizer - Ele logo se corrigiu, e Stiles fez uma nota mental daquele momento. Casa era uma palavra-chave. - Lá você pode comer alguma coisa e dormir mais um pouco. 

- Eu não ganhei hambúrguer? - Seu queixo caiu em indignação. - Por que todo mundo ganhou hambúrguer e eu não?

- O seu está ali - Malia apontou para uma sacola de papel sobre a bancada da pia. - Scott! Você vai querer o seu?

- Pode comer! - Veio a resposta do topo da escada. Malia sorriu, satisfeita, e puxou as embalagens de papel e o copo de refrigerante para si. 

- Viu? - Stiles disse para o namorado. - Eu tenho o que comer aqui. 

- Stiles…

- Você vai ter que ir na delegacia dar o seu depoimento, e eu vou ficar no apartamento sozinho - Fez um biquinho. - Abandonado, sem ninguém. Destinado à solidão. 

- Stiles.

- Eu quero ficar aqui mais um pouco. Não estou mais tão cansado - Acariciou a bochecha do outro, puxando-o para um beijo. - Você tem que parar de se preocupar tanto. 

- Com você? Nunca - Ele o beijou mais uma vez antes de finalmente se levantar. - Me ligue se qualquer coisa acontecer. 

- O que poderia acontecer? - Arregalou os olhos. - Oh, eu retiro o que disse. Universo, eu retiro! Isso não foi um desafio! Por favor, estamos cansados.

- Não esquece a cápsula, okay?

- Vou colocar o alarme - prometeu, já pegando seu celular. - Vai lá. Te amo. 

- Eu também te amo.

E então Derek se foi, deixando-o sozinho na cozinha com Malia. Fitando o hambúrguer da garota, Stiles contemplou brevemente as diferentes maneiras que podia usar comida em seus planos. Wolfsbane não era uma opção, eles com certeza conseguiriam cheirá-la. O que aconteceria com um lobisomem que ingerisse cinzas da montanha misturadas no tempero da carne? Perceberiam sua presença ali? Seu sangue se tornaria negro como com envenenamento por acônito? Ou talvez Stiles não necessariamente precisasse envenenar a comida. Cacos de vidro. Pequenos cacos de vidro que cortariam todo o interior de suas bocas. Quando estivessem gritando, bochechas rasgadas e sangue escorrendo por seus pescoços, Stiles os mataria como quisesse.

***

Cada segundo naquele quarto era insuportável. Scott não podia entender como Isaac conseguia ficar ali.

Ele ainda estava deitado no mesmo lugar, mal parecia ter se mexido. Seus olhos estavam fechados, mas dava para saber que estava acordado por seus batimentos. O ar do quarto inteiro parecia pesar, fazia sua cabeça doer. Luto era um cheiro tão forte, mas não era o que mais se destacava. Não, aquele era o de Nathan. 

Scott encarou, por um momento, o espaço vazio onde as coisas de Nate antes ficavam. Não devia tê-lo deixado ali. Devia ter feito alguma coisa. Não pudera fazer nada por Tracy, Lucas ou Josh, mas Nathan… Scott realmente pensou que podia fazer alguma coisa. Esperou que pudesse fazer alguma coisa. 

Você podia ser humano, e eu ainda ia te querer no meu pack.

Cerrou os olhos com força. Contou até dez, respirou fundo. Estava bem. No momento, estava bem. Tinha que estar. 

Foi até a cama, se sentando no espaço vazio ao lado de Isaac, onde Stiles havia dormido. 

- Isaac? - falou baixo. - Você estava ouvindo?

Isaac não respondeu, ou deu qualquer sinal de que o escutara. 

- Nós temos que… - Havia um aperto em seu peito. - Temos que ir na delegacia dar depoimento. Eu não sei exatamente o que temos que falar, mas a gente descobre no caminho. Você precisa vir, também. Você estava nas gravações. 

Ainda nada. Scott suspirou, massageando as têmporas. Tinha que sair daquele quarto, sua cabeça começava a latejar. 

- Eu sei que você me disse para não subir aqui, desculpa por… - Não tinha certeza de como completar a frase. Queria se desculpar por tantas coisas. - Mas a gente precisa mesmo tirar o FBI do nosso rastro. 

Mais e mais segundos de silêncio se seguiram. Scott esticou o braço, querendo tocá-lo, mas antes que pudesse, Isaac se afastou. Em um movimento rápido, estava de pé, andando até o guarda-roupa. Ele pegou uma troca de roupa, já que ainda usava as manchadas de sangue. A porta do banheiro abriu e se fechou, e, de repente, Scott se viu sozinho no quarto.

***

Depois que todos saíram, Stiles ajudou Melissa a arrumar a cozinha. Malia havia terminado seu segundo hambúrguer e se trancado no banheiro para lavar a sujeira de molho de suas mãos, boca e roupa. Stiles limpou a mesa, jogou fora as embalagens, secou a louça, e Melissa o ajudou a guardá-la. 

Quando terminaram, Melissa fez uma lista de compras e perguntou se um deles poderia ir ao mercado no bairro vizinho. Hayden se voluntariou, o que fez Liam se voluntariar, o que fez Mason se voluntariar também, porque era o único dos três que estava de carro. Melissa lhes entregou a lista e algum dinheiro, e então voltou para seu quarto, buscando mais algumas horas de sono antes de seu próximo turno.

Bom, aquilo não era divertido. Stiles havia esperado poder se aproximar de Liam. Pediria para que o beta lhe contasse tudo o que acontecera com os doutores. Hayden disse que o haviam machucado, então Stiles lhe perguntaria sobre. Quando sentisse seu medo, faria exatamente o que fizera com Isaac. Um ataque de pânico soava fantástico.

Se lembrava de Scott, de seu medo quando havia girado a espada cravada em seu peito. Se lembrava de seu pai, uma arma apontada para Argent, aterrorizado com a chance de vê-lo atirar em seu único filho. Se lembrava das pessoas que matara no hospital. E o mais importante, se lembrava de si mesmo. 

Era tão patético, tão fácil de intimidar, e seu medo havia sido tão viciante. Não eram suas lembranças, é claro. Como poderiam ser? Era a aura. Era como memória muscular. De todas as sensações, o medo era sua preferida. Não que as outras fossem ruins. Luto, medo, raiva. Afinal,um Nogitsune se alimentava de caos e discórdia.

Mas não era mais o Nogitsune. Não precisava se alimentar, estava só… passando o tempo. Era um jogo, queria ver o quão longe conseguiria chegar. Não tinha um plano exato, ainda, e talvez não precisasse de um. Podia só estar ali, e vê-los cair um a um, ver como tudo se desenrolava. Já sabia o que queria fazer com Derek, só precisava decidir para que caminho levar os outros. 

Se bem que, depois de Nathan, o próximo passo lógico parecia ser Liam. Quebraria Scott tão profundamente, seria delicioso. Poderia depois se livrar de Scott, quebrar Isaac além de qualquer reparo. E então, mataria Isaac. O ouviria implorar e se debater por horas, trancado em um lugar escuro e apertado - um freezer seria poético -, até a wolfsbane finalmente fazer seu coração parar.

Eram apenas ideias, é claro. Tinha que ser esperto e agir devagar. Pequenas coisas que empilhariam umas nas outras. Podia arrastar aquilo, fazê-los dançar por meses, anos. Sua prioridade, então, era descobrir o que iria fazer com aquele maldito bebê.

Obviamente, não podia deixar que o feiticeiro o tirasse naquela sexta-feira. Ele iria querer tirar sua aura, e Stiles nunca o vira lutar para ter alguma ideia do que fazer contra ele. Cinzas da montanha funcionariam? Poderia prendê-lo em um círculo assim que o bebê nascesse? Não, muito arriscado. Sua melhor chance era encontrar uma maneira de adiar o parto, dar-lhe mais tempo.

Talvez pudesse apenas suborná-lo. De quanto dinheiro precisaria para convencê-lo a deixar a aura em paz? Era tudo com o que o feiticeiro se importava, de qualquer jeito. É, aquilo podia funcionar. Ainda assim, precisaria de mais do que apenas uma semana. O pensamento de ter que carregar aquela criança por mais tempo do que o necessário era irritante, mas poderia fazê-lo. Havia um lobo dentro de si. Um lobo. Chegava a ser insultante.

Naquele momento, Malia retornou para a cozinha, interrompendo seus pensamentos. Ela se jogou na cadeira ao seu lado, soltando um longo suspiro cansado. Com Theo ainda dormindo no sofá, ele e Malia eram as únicas pessoas ali.

- Ser humana é uma merda - ela reclamou, e Stiles conteve a vontade de revirar os olhos. Poderia matar seu pai adotivo. Não, faria com que ela matasse seu pai adotivo, e então a convenceria a se entregar para Eichen House, onde ficaria presa para sempre. Tal pai, tal filha.

- Nem precisa me falar - Stiles sorriu de lado. - Eu sou o único humano realmente aqui. Correr com lobos não é tão fácil quanto parece.

- Melhor lobos do que raposas - bufou, jogando sua cabeça para trás. - Elas só parecem trazer problema. Pra você, pra Kira. Ela não teria que ir se a droga da raposa dela estivesse normal.

As mãos de Stiles se fecharam em punhos sob a mesa. Como ela ousava? Devia arrancar sua língua. Arrancar seus olhos, cortar suas orelhas e cada um de seus dedos com uma faca cega.

Considerou a garota por um momento. O que tinha a oferecer? Lutava bem, é claro. Era forte, parecia ter um instinto para matar, apesar de Scott ainda não ter deixado acontecer. Era engraçada, ocasionalmente, mas isso não mudava o quanto era irritante. Desde que aparecera, só havia causado estresse para todo mundo. E agora, sem a Kira, parecia que todos teriam que lidar com aquela estupidez, da qual Stiles já havia se cansado.

E também, tinha que considerar Derek. Ela e Derek eram próximos.

Não. Ela tinha que ir.

- Kira está com medo - Sua voz era gentil. - Você não pode culpá-la por…

- Ela só foi embora sem falar com ninguém! - O mesmo discurso de antes. Deus, era como falar com uma parede. - Ela nem… ela nem ouviu nada do que eu disse!

- Ela tinha que pensar em si mesma. Eu sei que você entende. Você passou oito anos como um coiote, e coiotes são criaturas solitárias.

- Mas não é mais assim que funciona. Foi o que vocês disseram.

- Para a gente não é, mas é como você disse - Deu de ombros. - Ela não é um lobo. Por que ela ficaria?

- Por m… - Ela começou, mas se forçou a parar. Era tudo o que Stiles precisava.

- Por você? - Contorceu seu rosto em uma expressão triste. - Oh, Malia, eu sinto muito.

- Deixa para lá - Uma pontada de vergonha emanou da garota. Não exatamente o que Stiles buscava, mas era um começo.

- É que… Malia, essa é uma decisão muito grande. Eu sei que ainda têm muitas coisas que você não entende, mas você não pode esperar que alguém tome uma decisão grande pensando em outra pessoa. Isso não acontece, a menos que…

Parou de falar, desviando o olhar para fingir se arrepender do que dissera. 

- A menos que o quê? 

- Nada, é que… - Respirou fundo. Seu calcanhar começou a bater no chão, e gesticulou com as mãos de forma nervosa. - É só que as pessoas normalmente tem que pensar em si mesmas, sabe? Eu sei que em um pack isso é um pouco diferente, mas ainda assim. Lydia não deixaria de… sei lá, ir para uma faculdade do outro lado do país só porque eu não quero, entende? Só é diferente em casos… bom, como eu e o Derek. Eu tomo todas as grandes decisões pensando nele, a prova está bem aqui - Apontou para sua barriga. - Mas isso é porque eu amo ele.

Viu o exato momento em que a compreensão atingiu os olhos da garota. Era um jogo tão estúpido, mas seria efetivo porque Malia era estúpida. 

- Ela… - As palavras morreram na garganta da garota.

- O quê? - Stiles franziu as sobrancelhas. - Oh, você achava que ela…

Um silêncio desconfortável se seguiu, e Stiles saboreou cada segundo dele. Malia fixou o olhar em um ponto da mesa, uma expressão fechada em seu rosto. Quando Stiles colocou sua mão sobre a dela, a humilhação praticamente fez sua pele formigar.

- Malia - Seu tom era doce, mas se certificou de que fosse possível ouvir uma nota de pena em suas palavras. Não podia ser sutil demais, é claro. Malia seria muito burra para perceber -, eu tenho certeza que a Kira gosta muito de você.

Inconscientemente, a garota encolheu os ombros.

- Qual a diferença? - Soava defensiva, o que era bom. Era por aquele caminho que chegariam onde Stiles queria. 

- É que… Malia, para você amar alguém… nós só conseguimos amar pessoas que estão acima, ou no mesmo nível que nós - Gesticulou para cima e para baixo com as mãos, como se montasse um gráfico. - Entende o que eu quero dizer?

Lentamente, o olhar de Malia escureceu. Stiles sentiu um arrepio percorrer sua espinha, ansioso para o que estava por vir.

- E não é culpa sua! - Ergueu as mãos em um sinal de rendição. Já havia feito aquele papel tantas vezes antes. Era apenas um garoto ansioso, tentando o seu melhor. Suas palavras se formavam rapidamente, uma atrás da outra. Suas mãos se moviam para todos os lados, e ele estava sempre desviando o olhar. Era tão fácil. - Malia, é claro que não é culpa sua! Você perdeu tanto tempo, quem pode te culpar? Todo mundo entende o seu lado, e é tão injusto, eu sei. Nós sabemos que você está tentando, e você já chegou tão longe comparado há seis meses atrás, mas… - Fez uma pausa calculada. - Ainda assim… é que… você nem sabia o que era um átomo quando te conhecemos, Malia. E, de novo: não é culpa sua! É muita coisa para aprender, levaria anos para você nos alcançar.

- Mas… - Sua voz falhou. Humilhação emanava dela em ondas.

- A gente gosta muito de você, Malia - Colocou uma mecha de cabelo da garota atrás de sua orelha. Um gesto carinhoso, seguido por palavras faladas como se fossem direcionadas a uma criança: - Eu sinto muito que ainda tenha tanto que você não entenda, e que você esteja tendo que aprender desse jeito. Não deve ser fácil para você. A gente… a gente esperava que isso não fosse acontecer.

- Que o que não fosse acontecer? - Ela praticamente rosnou. Stiles engoliu em seco.

- Quando você e a Kira ficaram juntas… quer dizer, primeiro, nós não pensamos que seria nada demais. Na verdade, nós até ficamos felizes - Sorriu de lado, deixando seu olhar divagar. - A gente achou que iria demorar mais para a Kira esquecer…

Parou de falar. Juntou suas sobrancelhas em uma expressão dolorida, e abaixou a cabeça, recolhendo seus braços de volta para si. Aquela era a parte mais importante. 

- O quê? - Malia explodiu, o que fez Stiles se encolher ainda mais. Ela estava chegando lá. - Stiles, será que dá para você só falar de uma vez?

- Está bem, está bem - Quando ergueu as mãos novamente, ficou satisfeito ao ver que o olhar de Malia foi imediatamente capturado por como elas tremiam. Ele respirou fundo, abraçando o próprio corpo. - Olha, não… você sabe sobre a Allison, não sabe?

Toda a postura de Malia havia mudado. Ainda se sentia humilhada e com raiva, mas não parecia entender o que estava acontecendo. Provavelmente se sentia culpada por deixar Stiles daquele jeito, apesar de odiá-lo pelas coisas que dissera. Os grandes e inocentes olhos castanhos de Stiles diziam "eu não quero falar disso, mas vou me forçar a fazê-lo porque quero te ajudar".

- Ela era uma amiga de vocês que morreu.

- Ela era mais do que uma amiga para a Kira.

Mais silêncio. Stiles escondeu o rosto em suas mãos, se curvando para frente como se tentasse controlar uma onda de emoções que o atingira de repente. Podia fazer seus batimentos acelerarem? Isso era possível? Seria a cereja no topo do bolo.

- Não comenta isso com os outros, okay? - Subiu as mãos até os cabelos, agarrando-os por um momento. - Falar sobre ela, ou até ouvir sobre ela ainda é muito doloroso para todo mundo. Ela e o Scott costumavam namorar, Lydia era sua melhor amiga, Derek se culpa tanto por não ter conseguido salvá-la, e eu… - Seus olhos se encheram de lágrimas. Quando voltou a falar, era apenas um sussurro: - O Nogitsune matou ela. Ele estava usando o meu corpo. Se eu tivesse… se eu tivesse feito mais, lutado mais, talvez… mas eu não… eu fui tão…

Começou a respirar mais rápido. Consequentemente, seus batimentos aumentaram. Ótimo, mas era algo que precisaria aperfeiçoar. 

- Ei, ei… - Malia arrastou sua cadeira para mais perto, arrastando sua palma para cima e para baixo pelas costas de Stiles. Ele reconhecia aquele gesto. Era o que Derek fazia para ajudá-la a se acalmar nas luas cheias. - Não foi sua culpa. Não estava no seu controle.

- Mas era… mas ainda assim… - Respirou fundo mais uma vez e endireitou as costas, limpando seu rosto quando uma lágrima escorreu. - Enfim, ainda é difícil para todo mundo, como deu para perceber. Ninguém fala sobre ela. Por isso que você nunca soube sobre as duas. 

- Elas… elas namoravam?

- Eu acho que elas se amavam - Stiles fingiu não ver a dor em seu rosto, muito fixado em suas memórias. Seu tom foi ficando cada vez mais triste. - Kira ficou inconsolável depois que ela morreu. Nós tentamos animá-la por meses. Quando essa coisa entre vocês duas começou, nós pensamos “que bom”. Ela estava se abrindo de novo. Ela estava… sabe, tentando esquecer.

Era quase como se pudesse ouvir seu coração se partir. Tudo o que elas haviam passado, todos os momentos, era tudo uma mentira, agora. Ela estava repassando tudo em sua mente, reescrevendo cada segundo para caber nessa nova narrativa, e era tão deliciosamente doloroso. 

- Mas nós não pensamos que você iria se apaixonar de verdade Malia, eu sinto muito - Trouxe as lágrimas de volta. - Se a gente soubesse… teríamos falado para a Kira parar. Não é justo o que ela fez com você. Nós até chegamos a comentar com ela, mas ela nos garantiu que estava tudo sob controle. Não sei se ela também não percebeu, ou se estava mentindo, mas… provavelmente não percebeu. Como eu disse, ela gosta de você. Nós todos gostamos, Malia. Nós só queremos o que é melhor para você. Nenhum de nós te machucaria de propósito.

Malia puxou bastante ar de uma vez, prendendo-o em uma tentativa de se controlar. Suas mãos se fecharam em punhos, e Stiles pegou um deles, fazendo pequenas carícias na pele com seu polegar. Não podia ver seu rosto, mas sabia que ela estava tentando não deixar nenhuma lágrima se formar. Ela se sentia tão usada. A raiva crescia no profundo de seu ser. 

- Só é… é difícil para a gente saber o que você vai e o que você não vai entender - Usou aquele tom condescendente novamente, disfarçado de preocupação e simpatia. - A gente pensava que você sabia, eu sinto muito. 

Foi a vez da garota se curvar para frente, se dobrando em si mesma enquanto tentava controlar sua respiração. Stiles esfregou carinhosamente suas costas do mesmo jeito que ela fizera momentos antes, sussurrando confortos vazios. Deixou uma mão em sua nuca descoberta, monitorando a progressão de suas emoções. Malia estava suando, seu coração estava tão acelerado. Quase lá, estavam quase lá. 

- Se te fizer sentir melhor, Kira provavelmente não pensou que você fosse madura o suficiente para amar alguém. Quer dizer, você foi um coiote por oito anos. Ela deve ter pensado que você ainda pensava como um animal. 

Ela rosnou, e tudo o que Stiles pôde pensar foi finalmente. Sua raiva era eletrizante, fez todos seus pelos se arrepiarem. Como um impulso de energia, Stiles sentiu seu poder se expandir. Era como se ficasse maior e maior, grande demais para seu corpo. Era tão forte. Era mais forte que todos os estúpidos lobisomens juntos. Podia fazer qualquer coisa que quisesse.

Com o mesmo comando que usara com Isaac, Malia começou a perder o controle. Nas mãos que agarravam seus cabelos, garras se formaram, perfurando seu couro cabeludo. Sua respiração pesada agora eram rosnados constantes enquanto fazia seu melhor para não se perder completamente. 

- Stiles - vociferou, entredentes. - Sai daqui.

- Está tudo bem - Por quanto tempo conseguiria manter aquilo? - Está tudo bem, Malia. Só respira fundo, okay?

- Não - Negou fortemente com a cabeça, seu corpo todo tremendo com o esforço que fazia. - Você tem que… você tem que sair…

Stiles diminuiu sua influência minimamente, dando uma chance para Malia se recompor. Quando ela estava quase conseguindo, voltou com mais força. Continuou nesse ciclo por longos minutos, nunca a deixando descansar, desgastando e acabando com qualquer força que tivesse. Continuava dizendo palavras de conforto, afirmando que estava tudo bem, que não iria para lugar nenhum até que ela estivesse bem. 

Era engraçado, na verdade. Só mais um pouquinho. Se lembrava das palavras de Malia no dia em que Stiles os avisara sobre a aura. “O que é que você poderia fazer contra a gente?”.

Só mais um pouco. Precisaria empurrar só mais um pouquinho para que Malia perdesse o controle completamente. Mas ele era paciente, e tinha disciplina. Faltava um detalhe crucial para que tudo fluísse perfeitamente. 

Um carro estacionou na frente da casa. Stiles se concentrou, escutando com atenção. Liam, Mason e Hayden haviam voltado. Perfeito. 

Bom, perfeito era uma palavra forte. Perfeito seria se fosse Derek que os encontrasse naquela situação. Mas interrogatórios levavam horas, então Liam teria que servir. O importante era que fosse alguém de confiança do pack. Precisava de testemunhas. 

Fechou os olhos, focando toda sua força em um último comando: sinta. 

Malia rugiu, uma intensa raiva preenchendo toda a cozinha. Stiles teve menos de um segundo para degustá-la antes de ser jogado ao chão. 

Não conseguiu ver muito. A mesa foi virada, o vaso de vidro que a decorava se estilhaçando no chão. Cadeiras foram jogadas, colidindo com os armários e a pia, destruindo tudo ao seu redor. Seus rugidos eram tão altos, ela se movia tão rápido. Não demorou muito para que o atacasse.

Gritou, pedindo socorro. Se encolheu no chão, protegendo sua barriga das garras que rasgaram seus braços, ombros e costas. Foi jogado para o lado, seu rosto colidindo com força em um dos armários. Malia avançou novamente, mas foi impedida pelo resgate que rapidamente chegou. 

Stiles se arrastou para trás, tentando ficar o mais longe possível da luta. Theo chegou primeiro, seguido por Liam. O rosto de Malia estava completamente transformado, seus olhos brilhando em azul como se todo seu lado humano tivesse sumido. Havia gritos ao seu redor. Hayden e Mason tentaram ajudá-lo a se levantar, mas apenas acabaram o puxando para mais longe. Melissa havia acordado com o barulho, e assistia o caos paralisada ao pé da escada.

Malia atacou Theo, deixando quatro cortes paralelos e profundos na lateral de seu rosto. Ela era forte, completamente selvagem, mandando um golpe atrás atrás outro. Por um momento, Stiles pensou que Theo e Liam não fossem dar conta, e que tudo acabaria um pouco mais sangrento do que planejara - não que isso fosse algo ruim. Se Malia matasse alguém, oh, isso sim seria perfeito. 

Mas, em um movimento rápido, Theo levou Malia ao chão. Stiles mal conseguiu acompanhar o que aconteceu. De um segundo para outro, Malia estava de barriga para baixo, e Theo segurava seus braços às suas costas em ângulos estranhos. Theo os forçou cada vez mais, até todos ouvirem brevemente o som de seus ossos quebrando, seguido de um rugido ensurdecedor de garota. 

Liam segurou seus ombros, chamando seu nome repetidamente. Stiles não estava mais no controle. Teriam que esperar que toda aquela raiva passasse sozinha, que Malia conseguisse encontrar o caminho de volta. Ela se debateu, rosnando e esperneando, tentando se libertar. Era até impressionante. Stiles não havia pensado que Theo fosse muito forte. Talvez fosse o fato de não ser mais um ômega. 

Foi quando Liam se curvou sobre Malia, fazendo contato visual, que a situação começou a mudar. Seus olhos brilharam em dourado, e ele rugiu seu nome, da mesma maneira que Scott faria. Não tinha o mesmo efeito, é claro, mas pareceu acender uma faísca de reconhecimento na garota. Ele continuou chamando-a, e Malia foi se acalmando mais cada vez. 

- Me larga! - Ela exigiu, ainda se debatendo com todo seu corpo. Por algum motivo, Theo realmente a soltou, e Liam não teve forças para continuar segurando sozinho. 

Malia se ergueu de joelhos. Seus braços já estavam curados, apesar de claramente ainda doerem. Ela caiu para trás, seu rosto lentamente se transformando de volta, até o brilho azul desaparecer de seus olhos. Ela era humana de novo, mas o dano que deixara para trás era grande demais. 

- O que você está fazendo?! - Liam gritou, sua voz uma acusação. - Você não tem controle? Estava atacando Stiles!

- Meu Deus - Stiles atraiu a atenção de todos para si, porque aquele era um parte crucial para sedimentar tudo. - Oh, não, não, não, não…

Levou as mãos até o bebê, apalpando cada centímetro como se procurasse algo de errado. Não achava que houvesse, não sentia nada. Quer dizer, o bebê estava agitado, mas não sentia nada relevante. Não importava, Malia precisava acreditar que sim. Seu coração já estava acelerado, o que era bom. Forçou sua respiração, tornando-a rasa e rápida.

- Stiles? - De repente, Melissa estava agachada ao seu lado. - Stiles, ei, você está bem? O que está sentindo?

- Não, não, não, ela me empurrou, não, não… - Balançava a cabeça de um lado para o outro, falando em pânico. - Não, não, e se ela machucou ele? Meu bebê, Melissa…

- Eu preciso que você respire fundo e se acalme, está bem? - Seu tom era profissional. Ela olhou em volta, procurando a pessoa mais próxima. - Hayden, eu preciso que você faça pressão aqui.

Em um instante, a garota também estava abaixada ao seu lado. Em desespero, usou as mãos para parar o sangramento de um corte particularmente profundo no braço de Stiles. Liam pegou o primeiro guardanapo que encontrou na cozinha e o trouxe para a garota, que logo se pôs a enrolá-lo em volta do ferimento. Stiles exclamou de dor, porque essa era a reação que se esperava, e continuou atuando seu ataque de pânico.

- Você vai ficar bem, Stiles - Melissa continuou, agora examinando a barriga de Stiles com toque clínicos. - Ele está se movendo bastante. Isso é um bom sinal. Está sentindo alguma coisa? Caiu sobre ele?

- Eu não sei - Cobriu a boca para abafar um soluço. - Eu não sei, eu não sei, eu não sei…

Theo se aproximou, se ajoelhando em um espaço livre perto de Stiles. Usando-o como desculpa, Stiles olhou de relance para Malia, precisando ver sua reação. Malia encarava a cena horrorizada, sangue manchando suas mãos. Havia andado para trás até suas costas estarem contra a geladeira, o mais longe possível que poderia ficar naquela cozinha destruída. Nem parecia estar respirando, seu corpo tenso como se estivesse pronta para fugir a qualquer segundo.

Então olhou para Theo. O beta pegou sua mão, seus movimentos lentos como se não quisesse assustá-lo. Quando uma substância negra subiu por suas veias, Stiles quase não conseguiu esconder sua surpresa a tempo. Não sentia nada, mas seu corpo devia estar doendo por todos aqueles cortes profundos. Tinha uma vaga noção de que estava sangrando, mas tudo o que sentia realmente era energia. O pânico, medo e caos de todos ao seu redor. Oh, se pudesse tocar Malia naquele instante.

- Eu acho que o bebê está bem - Theo o soltou, esfregando seu braço com uma expressão dolorida. - Quer dizer, eu não entendo muito, mas acho que só senti os cortes.

- Oh, graças a Deus - Se esforçou para chorar mais, se fazendo patético. - Ela me empurrou, Melissa…

- Você está bem, está tudo bem… - Ela o envolveu em um abraço delicado, acariciando seus cabelos de uma forma tão materna que fez Stiles mais uma vez imaginar como seria se ela perdesse Scott. - Está tudo bem, querido. Respira fundo comigo, sim? Devagar, vamos…

- Ela podia… - Falou entre os soluços. - Não… ela podia… ter matado ele…

Uma exclamação de horror escapou da garganta de Malia. A garota cobriu a boca em um impulso, apenas para encarar suas mãos ensanguentadas no segundo seguinte. Negou fortemente com a cabeça, tentando desesperadamente negar o que fizera, ou se convencer de que não teria deixado as coisas irem tão longe. 

Quando ergueu o olhar novamente, Stiles desviou o seu, enterrando seu rosto no ombro de Melissa e continuando sua grande cena. Ouvi-a passar correndo por todos, e então bater a porta quebradiça atrás de si. Estava feito. Com sorte, ela se transformaria e voltaria a viver como o animal imundo que era. Mesmo se não fosse o caso, Stiles duvidava que ela fosse voltar por um bom tempo. E, se voltasse, Stiles se certificaria de que não fosse bem vinda.

Continuou chorando por um tempo, apesar de mostrar a todos que se acalmara consideravelmente uma vez que Malia se fora. Quando decidiu que era o suficiente, começou a respirar fundo, se forçando a parar. Uma de suas mãos ficara abraçando sua barriga aquele tempo todo, mas a outra Theo havia voltado a segurar em algum ponto. Stiles olhou para ele, e Theo imediatamente o soltou, desviando o olhar para o chão. Oh, sim, Stiles tomaria nota daquilo também.

- Eu acho que ainda está sangrando um pouco - Hayden falou baixo, um medo tão doce emanando dela. Suas mãos estavam completamente manchadas de vermelho, ainda fazendo pressão todo aquele tempo. 

- Isso é bastante sangue - Mason estava igualmente assustado. - É bastante sangue, não é? E se tiver pegado uma artéria, ou…

- Não pegou - Melissa gentilmente interrompeu. - Felizmente, não pegou. Mas alguns desses cortes vão precisar de pontos. Stiles, querido, vamos te levar para o hospital, está bem?

- O quê? - Oh, de jeito nenhum. - Não, não, você não pode… não tem kit de primeiros socorros aqui?

- Eu sou enfermeira, Stiles, não médica.

- Mas eu estou bem. Não precisa…

- Você precisa de pontos - Ela praticamente ordenou. Stiles fechou os olhos, tirando um momento para controlar a raiva que cresceu em seu peito. Ela seria a próxima. - Nós vamos para o hospital. Me ajudem a levantá-lo.

***

Era tanta perda de tempo, Stiles queria matar alguém. Seu plano havia ido tão bem, e mal tivera tempo de aproveitar sua vitória. Agora, estava tendo que obedecer uma enfermeira fracassada que nunca conseguira nada em sua vida além de um filho medíocre. Estava completamente insatisfeito, e não deveria estar. Precisava de mais.

Melissa havia rapidamente arrumado suas coisas, dizendo que faltava apenas uma hora para seu turno começar, então ela podia muito bem já ficar no hospital. Alguém teria que trazer Stiles de volta, e Stiles absolutamente não podia dirigir, então Theo se voluntariou para levá-lo em seu carro. 

Liam, Mason e Hayden haviam ficado para arrumar a cozinha destruída. Sentado no banco do passageiro com sua cabeça deitada no vidro, Stiles fantasiava sobre encontrar todos eles mortos na sala quando voltasse. O fazia se sentir melhor. Seu celular vibrou em seu bolso, provavelmente com outra mensagem de Derek. Não se incomodou em pegá-lo.

Theo dirigia em silêncio. Se Stiles não estivesse tão entretido em seus próprios pensamentos, teria percebido que as emoções que o beta emanava não eram nem um pouco as que se esperavam. Estavam na metade do caminho quando começou a falar:

- Por que você não impediu ela? 

Stiles se virou para o beta. Ele estava usando o cinto de segurança, como se um acidente de carro matasse um lobisomem. Por um breve momento, imaginou como poderia usá-lo para enforcá-lo.

- O quê? - Perguntou, sua voz fraca e frágil.

- Por que não lutou com ela?

- Está falando sério? - Quase saiu do personagem, mas logo se recuperou. - Como… como eu ia lutar com ela? Theo, eu sou só eu. Stiles, o humano indefeso. Eu não podia ter feito nada. E eu não sei se você notou essa barriga gigante, mas…

- Eu acho que o fato de você estar grávido já é um grande indicador de que você não é só humano - Theo o interrompeu, nunca tirando os olhos da estrada. - E eu me lembro muito bem de você não sendo indefeso.

- O quê?

- No porão da escola - Havia bastante certeza na voz de Theo, o que era intrigante. Até o momento, o beta os havia seguido como um cachorrinho abandonado, desesperado por atenção. Ele era defensivo, e erguia a voz quando se sentia encurralado, mas nunca havia sido confiante. - Nathan estava nos atacando, e você empurrou ele para longe, com a sua mente. E depois você me empurrou para longe. Quebrou o meu braço, a propósito. Então não venha me dizer que você só é humano e que não podia ter feito nada.

- Você não sabe do que está falando - Soou agressivo demais. Respirou fundo, voltou ao que era antes. - Theo, é… me desculpa pelo seu braço, mas você realmente não sabe do que está falando, está bem? É complicado. Eu não posso… - Suspirou. - Eu não sou como vocês.

Houve uma pausa.

- Scott me contou o que aconteceu - Theo revelou, e Stiles prendeu a respiração em antecipação. - Você foi possuído no passado, por algum tipo de demônio japonês? Alguma coisa assim, e ele deixou um tipo de aura. 

- Scott te contou?

- Enquanto nós estávamos procurando pelos doutores nos esgotos. Kira estava com a gente. Ele disse que… essas coisas que você toma que te fazem se sentir mal são para neutralizar a aura, manter ela longe. E que você vai poder se livrar dela daqui a alguns dias, mas não agora. Ele não disse o porquê, mas eu assumo que seja pelo bebê.

Stiles o analisou por um momento. Theo não estava com medo, nem com raiva, nem… Theo não estava sentindo nada, na verdade. Não, isso não era verdade. Tinha alguma coisa, mas nada que Stiles pudesse identificar. 

- O demônio era um Nogitsune - Stiles explicou, já que Scott parecia não ter entrado em detalhes. Que mal faria, agora? - É uma kitsune corrompida, não um demônio. Mas é bem maligno, então podia muito bem ser.

- Mas eu não entendo - Ele negou com a cabeça, girando o volante para fazer uma curva. - Por que você está tomando aquelas coisas?

Stiles piscou. Por Deus, Scott realmente não havia explicado nada para aquele garoto. Quem pensou que seria uma boa ideia deixá-lo ser o Alpha?

- Theo, que parte de “ser maligno" você não entendeu?

- Mas o Nogitsune se foi, não foi? - insistiu, pela primeira vez se virando para Stiles. - Ele te deixou poderes, e eles querem se livrar deles? Quer dizer, olha para você agora - Tirou uma mão do volante para apontar seus ferimentos. - Você podia ter se defendido sozinho. Por que eles querem que você continue fraco?

Porque são covardes.

- A aura é perigosa, Theo - A aura é perigosa. Por que estou fazendo isso? O que estou fazendo? Stiles balançou a cabeça, afastando aqueles pensamentos. - Volto a repetir: você não sabe do que está fa…

- Poder é sempre perigoso - O beta deu de ombros. - Eu só acho estranho como nenhum deles nunca confia em você.

- O quê?

- Eles te tratam como se você só estivesse no pack por aproximação. Porque Scott é seu melhor amigo, e Derek é seu namorado, então é claro que você também está no pack. Você devia ser o segundo do Scott, eles deviam reconhecer o quanto você faz por eles e o quão inteligente você é.

Pensou em Isaac. “Você está agindo como um louco obsessivo”.

- E parece até que eles te culpam por você ter sido possuído - Theo continuou. - Como se tivesse sido você que tivesse feito aquelas coisas, não o Nogitsune. Você tem o controle agora, e eles não confiam em você. Isso me deixa… tão irritado.

Stiles sabia. Podia sentir sua raiva, mas era tão diferente da de Malia. Stiles não a degustava, ele a absorvia. Sentia como se fosse a sua própria, e talvez fosse. Theo não estava dizendo nada de novo. Eles sempre o haviam subestimado. Sempre duvidaram dele, Stiles sempre teve que lutar por seu respeito, e qualquer pequeno erro o fazia perder qualquer credibilidade que tivesse. Derek só queria controlá-lo, Scott ainda o via da mesma maneira que há três anos atrás, quando tudo aquilo começara.

- E tanta coisa está acontecendo - As mãos de Theo apertavam o volante com tanta força que a ponta de seus dedos estavam brancas. - Nathan está morto, e temos mais duas quimeras. Tantas pessoas já morreram, e agora perdemos a Kira. Os doutores… nós lutamos contra eles, e quase morremos, e eles ainda querem tirar esse poder de você? Só me parece que eles estão com medo.

Como covardes.

- Ou talvez… - O beta não terminou.

- O quê? - Não estava mais preocupado com seu personagem. Suas mãos tremiam. Sentia que podia quebrar todos os vidros daquele carro em milhões de estilhaços com um simples pensamento. - Talvez o quê, Theo?

O carro parou. Não abruptamente, Theo apenas o estacionou. Já estavam no hospital, em uma vaga relativamente perto da entrada. Theo se voltou para ele, seu rosto ilegível.

- Talvez o problema seja que eles saibam que você seria muito mais poderoso que todos eles. 

Foi como se Stiles o visse pela primeira vez. Theo sustentou seu olhar por alguns instantes, e então abriu a porta do carro para descer. Stiles quase o impediu,querendo ouvi-lo falar mais. Seu celular vibrou de novo em seu bolso, mas quando o pegou viu que não eram mensagens, dessa vez. Era o alarme, lembrando-o de tomar a cápsula.

Theo deu a volta no carro, abrindo a porta de Stiles para ajudá-lo a se levantar. Stiles deixou que o fizesse, guardando seu celular de volta onde estava. Por todo o caminho até o hospital, Theo o guiou, um braço circulando sua cintura. E enquanto esperavam pelo médico, Theo se sentou ao seu lado. Stiles não disse nada, apenas deitou sua cabeça no ombro do outro e repassou aqueles últimos minutos em sua mente de novo e de novo.


Notas Finais


Esse capitulo na verdade foi dividido em dois porque senao ia demorar muito pra sair e ia ficar GIGANTESCO hsuahsuahsuahsuuahs aiai esse theo...

comentem! me digam o que acharam <3


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