História Um conto de fadas Shirlipe - Primeiras impressões

Alguns encontros são orquestrados pelo destino. Não é coincidência Não é casualidade...

São Paulo, 1h 30 da manhã.

Recostado confortavelmente no banco de veludo, ele ladeava o rosto para mirar os grossos filetes de água que corriam enfileirados pelos vidros laterais de seu carro. Abstraído, Felipe deixava as mãos soltas sobre o volante demorando-se propositalmente para dar a partida. Permitia-se um breve momento de descanso após a discussão nauseante que tivera á instantes atrás. Havia acabado de romper seu noivado.

Não estava necessariamente arrependido ou triste, já era algo que cogitava fazer a muito tempo, mas o término não foi pacífico.

Jéssica, sua noiva, ainda tentou impedir o desenlace. O seu extenso porém  nada convincente repertório romântico não conseguiu comove-lo e persuadi-lo a voltar atrás em sua decisão...

- Mas você me ama! Não ama? – lançava-se aos braços do noivo agarrando-o pelos ombros em uma tentativa inútil de beija-lo.

Felipe irredutível,  deu as costas e foi embora a deixando sem resposta.

- Você me paga Felipe, você me paga... – irada e com o orgulho ferido ela proferia insultos indizíveis.

Felipe então pode perceber que a natureza de sua noiva se inclinava cada dia mais para a arrogância e o egoísmo.

Mas ela não desistiria assim tão fácil de Felipe. Não se tratava de amor, Jéssica  simplesmente detestava perder o que ela achava que era seu...

A chuva começava a tamborilar mais violentamente contra o para-brisa quando ele enfim girou a chave pondo o carro em movimento.

- Mimada, Jéssica é mesmo uma patricinha incorrigível... – afirmava pra si enquanto refazia o trajeto de volta pra casa.

O trafego da zona oeste naquele horário não concentrava um enorme fluxo de automóveis como era comum de se ver no turno inverso. Ainda assim, Felipe dirigia cautelosamente sem exceder na velocidade, reduzindo sempre que se aproximava de avenidas movimentadas.

Felipe sentiu o celular vibrar em seu bolso. Era Jéssica. Bufou e logo desligou o aparelho. Nesse décimo de segundo de desatenção entre visualizar o número dela e ignora-la, Shirlei atravessou correndo a frente do veículo.

Os pneus do carro atritaram bruscamente contra o asfalto chiando após uma freada inesperada e Felipe pôs os olhos na figura feminil a sua frente. A  rapidez com que ele agira manobrando o carro a uma distancia de três passos dela fora crucial para impedir um acidente. Tinha sido só um susto. 

Aliviado após certificar-se que nada tinha ocorrido a garota ele suspirou longamente relaxando os nervos e soltando as mãos do volante ainda trêmulo.

Felipe não desviou o olhar de Shirlei por nenhum momento.

Confusa, ela movimentava-se com alguma dificuldade caminhando até o meio fio tentando recuperar algo que ficara preso no bueiro. Sem êxito, acabou voltando-se na direção do ônibus acenando para que ele parasse.

- Ela tá mancando ?

Sem se importar com a chuva que caía ainda mais volumosa e fria, Felipe desceu do carro e rapidamente retirou a bota de Shirlei que havia ficado presa entre os vãos do bueiro.

- Moça, moça... – Tentou alcança-la, mas ela já havia tomado o ônibus que dobrava a esquina e sumia de vista...

A manhã já despontava quando Shirlei chegou em casa. Febril com as roupas úmidas e coladas ao corpo desferrolhou cuidadosamente a porta. Adentrou a sala medindo os passos para não fazer barulho e na ponta dos pés subiu a escada apressadamente alcançando o seu quarto.

- Filha? – Shirlei ouviu o sibilar italiano da voz de Francesa vindo do corredor.

- Mãe? A senhora ja esta acordada...? – replicou nervosamente. Não queria que a vissem naquele estado. Não queria dar explicações.

- Estou... Mamma mia! O que houve com você??

- Nada. Eu, eu... –  Shirlei cambaleou em direção a Francesca tomada por uma falta de ar repentina.

Ainda apoiava-se na mãe quando subitamente sentiu a visão escurecer perdendo complemente os sentidos, desmaiou...