História Um conto de fadas Shirlipe - Encantar-se (II)

Todo o grande Amor começa como uma faísca, imperceptível,  que perambula pelo ar despretensiosa esperando o momento certo para inflamar e metamorfosear-se em sua forma mais cálida e visceral, a Paixão.

- Eu não quis jogar fora porque parece que custou caro... Eu sabia que iria te encontrar de novo, só não poderia imaginar que seria aqui, no meu apartamento... – Felipe continuou após o silencio estarrecedor e a imobilidade da empregada. A sucessão dos seus gesto e suas palavras haviam deixado Shirlei atônita

- Sim, foi presente da minha mãe... Eu estou com tanta vergonha... – Shirlei finalmente conseguiu dizer se sentindo vitoriosa por sobrepujar o seu próprio embaraço – Pensei que o senhor estava rindo de mim, do meu jeito de andar...

Felipe balançou a cabeça negativamente.

- Eu jamais faria isso, não sou esse tipo de pessoa Shirlei.

- É que... – Ela abaixou os olhos como se retomasse alguma memória  e procura-se palavras para descrevê-la – já estou tão acostumada com as pessoas me tratando com... não sei. É automático, eu vi o senhor apontando para minha perna e logo deduzi que o senhor estava rindo de mim, foi isso – sorriu tristemente.

Felipe entendeu. A sensibilidade  dele permitia vê-la com indulgencia .

Entendia os sentimentos aflitivos que Shirlei  certamente carregava, superficialmente claro, afinal não era ele o alvo de preconceito.

Não era ele que enfrentava diariamente olhares de compassividade.

Não era ele que algumas vezes submergia-se instintivamente para se proteger de sentenças que lhe eram dirigidas por conta de sua constituição física.

A insegurança de Shirlei vinha da rejeição que ela sofria e ele podia ver, era como uma ancora que a puxava para baixo.

Parecia normal Shirlei ter se mantido na defensiva e ter se enganado ao seu respeito, ela provavelmente nunca havia sido tratada com aquela delicadeza desinteressada. Mas apesar dos percalços que se figuravam cruéis demais para alguém que, aos sentidos de Felipe, transmitia uma doçura incomensurável, Shirlei tinha um olhar incandescente, ativo.

Aquele olhar dizia muito sobre ela. Foram seus olhos que encantaram Felipe desde o primeiro instante. Seriam seus olhos  que moldariam os sentimentos dele.

- Shirlei – Ele sentou-se no sofá próximo a empregada, mas não o suficiente para notar a vibração involuntária que eletrificava o corpo dela – Aqui nessa casa você vai ser respeitada, eu garanto, por mim e pela Cris... E olha, se você precisar de alguma coisa, qualquer coisa – reiterou abrindo aquele sorriso que já deixava desassossegado o coraçãozinho de Shirlei  - Você pode contar comigo... – Já era notário a propensão protetora que Felipe adquiria em relação a Shirlei.

- Obrigada, obrigada por tudo seu Felipe. E... desculpa por ter feito um juízo tão equivocado do senhor... – Desculpou-se ainda constrangida.

 - Então esta tudo esclarecido? – Felipe pôs-se de pé – Bem, eu já vou indo, não quero mais te atrapalhar Shirlei...

- Não, que isso... – o “não” dito por ela foi um desses relapsos inconscientes que temos e se configuram em um desejo intimo. A presença de Felipe já começava a se fazer vitalmente necessária para Shirlei e ela nem se quer podia desconfiar.

- Eu ainda tenho que achar o pen-drive com o meu projeto (...) – Felipe quase se esquecera desse detalhe,havia saido no meio do expediente e precisava retornar a Peripécia – Até logo Shirlei. – Ele se despediu se dirigindo ao seu quarto.

Quanto a ela precisou de alguns minutos para se reestabelecer e voltar as tarefas que era designada. Tentava lembra-se do que Cris havia dito sobre o irmão.

Felipe é um gentleman.

Ele era mesmo. Pra Shirlei ele se apresentará como um verdadeiro... Príncipe

                                                                 ***

- Ei, eu quero ouvir o que Shirlei tem a dizer sobre o primeiro dia de trabalho dela... –Giovanni tentava acalmar a algazarra verbal que eclodia na casa dos Rigoni Di Marino todo o inicio de noite quando Francesca e as irmãs se reuniam na sala para tagarelar.- Continua baixinha... – beijou o topo da cabeça da irmã lhe concedendo a vez de falar. Não era segredo pra ninguém que Shirlei era a sua favorita.

Ela demorou-se  passando o palma da mão na extremidade lateral  da botinha recuperada que repousava em seu colo.

- Ah foi tão... mágico – Ela não encontrara expressão melhor para definir – O seu Felipe é um homem tão bom e generoso... Acredita que ele retirou o meu sapato e calçou a botinha em mim como na...

- Cinderela? – Carmela interveio – Essa sua historinha é inacreditável Shirlei. Porque ele guardaria a sua bota? Ih, aposto que ele deve ter outro interesse... – afirmou cética do relato da irmã.

- Nem todo mundo é mau caráter Carmela – Foi a vez da voz italiana de Francesca sobrepor as demais.

- Pode até ser... mas pra Shirlei que vive na Shirleilândia e acha que todo mundo é bonzinho... É melhor tomar cuidado pra não se apaixonar pelo seu patrão ouviu Shirlei?

- Me-me apaixonar? – Shirlei assustou-se e começou a gaguejar – Claro que não Carmela, que ideia! Ele é o meu padrão e só isso...

- Aham, sei... – os irmãos repetiram em coro.

- É isso mesmo ... – Shirlei se fez de desentendida – E depois um homem como o seu Felipe jamais olharia para uma mulher como eu...