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História Uma Vez Mais - Tentativas


Escrita por: RafaelaRuna

Notas do Autor


Hey, pessoal!
Apesar da demora, aqui está o capítulo novo :3
A faculdade sugou meu tempo na semana passada feito um drácula, então peço desculpas pelo atraso.
Enfim, gostei bastante deste capítulo, espero que concordem comigo ^^
Aqui contamos com a ilustre aparição dos casais secundários que faltavam! *Gritinhos de felicidade*
E espero que vocês tenham tantos mini infartos com a parte do nosso casal principal quanto eu tive escrevendo *o*
Boa leitura!
Kisses :***

Capítulo 4 - Tentativas


O amanhecer já adentrava pelas janelas do quarto de Camus. Seus olhos azuis se perderam por alguns instantes nos raios de sol que o alcançavam na cama, no entanto logo se voltaram para o invasor grego que havia dormira em seu quarto.


- Seria bem mais fácil se o Shaka estivesse conosco. Mas sinto que ele não é o único cavaleiro faltando. – Milo reclamava da iminência da nova Guerra Santa há uns bons minutos, desde que acordara. Sabia que o aquariano fazia pouco caso de suas palavras, mesmo assim persistia. O confortável cafuné que recebia, no colo de Camus, também o tornava incapaz de se queixar pelo desinteresse.


- Deve estar falando do Fênix. Athena também o dispensou. - O francês fingiu estar prestando atenção ao assunto. Preferia ignorar a faladeira do outro.

- Tem razão! Não o vi em lugar algum! – O escorpiano assentiu, sacudindo a cabeça suavemente contra os dedos do namorado. - E como você soube disso? Normalmente estou mais inteirado das novidades que você!


- O Hyoga comentou comigo, no aeroporto. – Camus respondeu prontamente, esboçando sua costumeira indiferença.


- Oh, claro! Tinha que ser! – Escorpião se afastou num rompante, levantando-se da cama e procurando suas roupas pelo chão.


- Vai continuar com esse ciúmes absurdo? – O francês revirou os olhos. Sabia que Hyoga estava ficando cada vez mais bonito, no entanto era insano que o grego mantivesse ciúmes daquele rapaz que como era um irmão para ele. - Está sendo irracional!


- Aposto que ele seria bem mais racional do que eu! – Milo indagou, localizando sua calça dentre as vestes. - E se quer saber, o Shaka e o Fênix...oooh! Como eu não percebi isso antes?


- O que? – O francês estranhou a pausa dramática.


- Eles estão sozinhos! - O grego abriu o seu sorriso mais travesso, e o lançou para o aquariano. Quase se esqueceu que estava irritado com ele. - Interessante...


- Que sorrisinho imbecil é esse, Milo? – Aquário estreitou os olhos, desconfiado. Conhecia bem aquele olhar de quem chegou a uma conclusão indiscreta.


- Nada demais, Camus. Apenas estou admirado que Athena tenha colocado dois de seus melhores cavaleiros para brincar de casinha. – O escorpiano contou de uma vez, mordendo os lábios.


- Não seja ridículo. O Ikki não gostava de uma menina? – Camus cortou, em censura.


- Ah, isso não quer dizer nada! Você também já não teve umas namoradinhas? – Escorpião sorriu, caminhando na direção da cama, agora vestido.


- É, eu tive. – O francês deu de ombros, fingindo não se arrepiar quando o grego se aproximou perigosamente dele, subindo na cama.


- E veja com quem você está agora! – Milo provocou, roçando seus lábios nos de Camus, que apenas aceitou a proximidade. - Admita que sou muito melhor que  elas!


- Que seja...  – Resmungou baixo, pouco antes de ser beijado.


Camus gostava dos beijos daquele fofoqueiro chato. E como gostava! Pensava que namoravam por causa da performance de Milo em todo o tipo de contato físico, e preferia ignorar a possibilidade de ama-lo da mesma forma que sabia que o escorpiano o amava. Não gostava de pensar em seus próprios sentimentos.

Quando separaram os lábios, se olharam ardentemente. Os olhos azuis, escuros e taciturnos, analisaram o rosto à sua frente, que logo foi enfeitado por um belo sorriso.


- Você não acha nada disso estranho, Camus? – Milo perguntou, ciente que o olhar do outro estava fixado em seus lábios.


- Acho que temos uma nova missão e que não devemos nos meter no que não é da nossa conta. - O aquariano encerrou com o sermão, concentrado na boca diante dele e cansado das fofocas.


- Esqueci que estou falando com o cara mais chato do Zodíaco. Talvez eu deva especular com outra pessoa. – O grego levantou-se novamente, irritado. Sempre levava um gelo de Camus.


- Faça o que quiser. – O francês fingiu descaso, se arrumando na cama, como se fosse voltar a dormir. - Você sabe em qual quarto estarei.


A batida de porta que Milo deu ao sair do quarto deixou-o ciente que o escorpiano partira furioso. Era sempre assim. O grego esperava qualquer demonstração de atenção, e nunca recebia. Por fim, saía.

Camus supunha que talvez fosse essa a causa do ciúmes que Milo passara a nutrir de Hyoga. Como mestre e discípulo, os aquarianos conversavam bastante, naturalmente. Poderia ser essa atenção que empregava ao mais jovem que aborrecesse Escorpião, uma vez que não a possuía.

Detestando ter que pensar naquilo, apenas fechou os olhos e deixou os sentimentos de Milo de lado. Ele que se resolvesse com as suas próprias inseguranças!


 

***** Alguns minutos depois *****

 

Escorpião cruzou o corredor do hotel até seu quarto, no andar inferior ao de Camus. Xingava-o mentalmente, e se amaldiçoava por ter passado a noite com ele.

Tentou destrancar sua porta, no entanto estava tão irritado que suas mãos chegavam a ficar trêmulas.


“Maldito! Maldito seja Camus!” – Repetia em pensamento, tentando acertar a chave na fechadura.


- Uma ajudinha? – A inconfundível voz de Afrodite se fez ouvir ao lado. Milo desviou seu olhar para o pisciano. Este carregava seu típico sorriso, adornado por gloss.

- Obrigado, Afrodite. Estou bem. – Tentou ocultar seu nervoso para não descontar no outro. - Eu só...


- Como sempre, ele te deu um gelo, não foi? – Afrodite o interrompeu, aproximando-se e cruzando os braços. Aquele cenário não era novidade para ninguém.

- Dessa vez eu diria até que ele me prendeu num esquife. – Milo emitiu uma baixa risada, sem muito humor. Era quase uma risada de autopiedade.

- E os franceses ainda são considerados românticos!  - Peixes bufou, ajeitando os cabelos com as pontas dos dedos.


- É mentira! O sotaque é a coisa mais romântica que sai daquele homem! – Escorpião comentou, desta vez rindo com mais vontade.


- Ah, então vamos falar de outras coisas! E não aceito recusas! – Sem aviso, Afrodite envolveu-o pelo ombro e o puxou consigo para atravessarem o corredor. Queria leva-lo ao salão de refeições do hotel, onde poderiam conversar sem perturbações.

O grego acatou, acompanhando o pisciano. Não era alguém com quem conversava frequentemente, uma vez que suas Casas eram relativamente distantes, no entanto o considerava uma companhia agradável. Era uma das poucas pessoas que o ouviam atentamente.


Ao chegarem no salão, escolheram uma das muitas mesas vazias, e se sentaram nas cadeiras adjacentes. Próximos a eles estavam somente Shura, que lhes cumprimentou com um breve aceno de cabeça, e o cavaleiro que fuzilou Afrodite com os olhos desde que ele chegara com Escorpião, Máscara da Morte.


Capricórnio percebeu o olhar do amigo direcionado ao sueco imediatamente. Seria difícil não notar, na verdade.


- Do que estávamos falando mesmo? – Tentou voltar ao assunto anterior, porém foi miseravelmente ignorado.


Ele temia o comportamento de Câncer. Afrodite e Máscara da Morte costumavam ser ótimos amigos, ao menos até serem ressuscitados. Desde então, o italiano passou a lançar olhares velhacos para o pisciano, isso quando não estava arrumando confusão com ele.


Peixes, que se afastara por causa dos acessos de ódio do canceriano, não parecia estar se importando muito com a situação. Nem mesmo com o olhar de evidente reprovação, que lhe era violentamente desferido, e fazia Shura se sentir envergonhado por estar junto ao desagradável emissor.


A conversa entre o belo do Santuário e Milo se deu normalmente, em que Escorpião já se incomodava com os olhares de ódio de Máscara de Morte em sua direção, porém tratou de ignorar.

As gargalhadas proferidas pelo pisciano em meio ao diálogo rasgavam o ambiente, e chegavam como eletricidade aos ouvidos do italiano. O intuito do sueco de incomoda-lo era visível, e fora bastante eficaz.

Câncer chegava a ranger os dentes. Sempre via Afrodite com algum cavaleiro, sempre! Não conseguia deixar de especular que ele tivesse caso com algum, ou quem sabe até mais de um. Não seria de se espantar, considerando o charme do sueco.


Não sabia porquê se importava com isso, e tampouco queria saber. Gostaria apenas de matar Escorpião e acabar com aquilo.

- Você é um completo idiota, sabia? – Shura interrompeu a sequência de olhares assassinos que o italiano dispensava a Peixes, com sua voz ponderada. – Antes vocês eram inseparáveis, e agora Afrodite não quer nem chegar perto de você por causa desse seu comportamento bizarro! Por que está agindo assim?


- Odeio ele! Sempre se esfregando nos cavaleiros! – Máscara da Morte cuspiu as palavras como se fossem veneno.

- Por Athena, eles só estão conversando! E, inicialmente, sabemos que Milo é comprometido! – Capricórnio indagou, irritado.

- Ele deve ser mesmo muito bom de conversa, afinal cada dia está com um, inclusive com o macho dos outros! – O canceriano acusou, recebendo olhares de advertência do amigo.

Shura bufou, respirando fundo. Sabia o que estava acontecendo, porém não queria se meter. Máscara da Morte, seu amigo “heterossexual”, estava revoltado por estar irremediavelmente apaixonado por Afrodite e não saber lidar com isso.

- Sentiu saudades dele enquanto esteve morto e finalmente entendeu o que isso significa, não é? – O guardião da décima Casa finalmente revelou suas suspeitas.

- Você está louco. – Câncer se levantou em sobressalto, deixando-o só na mesa.

O italiano partiu porta afora sem olhar para trás...ao menos não para ele, porque quando saiu lançou um último olhar de maldição a Afrodite.

Shura sorriu. Acertara na mosca.

 

***** Em Atenas *****

 

Na porção residencial da Casa de Virgem, vigorosamente invadida pela luminosidade que se projetava no interior dos cômodos, especialmente no quarto principal, Shaka despertara.


Ficou estático na cama por alguns minutos, de olhos fechados, com os pensamentos desfocados...ou melhor, atados à única coisa em que ele não queria pensar. Naquela pessoa que lhe despertava tantas emoções inapropriadas.


Ikki estava tão bonito. Transcendentalmente bonito, quase irreal. Traços tão rudes, e tão formosos ao mesmo tempo. Os olhos azuis em brasa, os lábios que teimavam em não deixar sorrisos amplos escaparem, a voz potente, o jeito másculo.


Teria sido um sonho?

Levantou-se da cama, cruzando o curto corredor que desembocava na sala de jantar. Abriu os olhos ao chegar, apenas para verificar se o presente estava lá.

Deu de cara com o Shiva de bronze, como torcia para que acontecesse. Foi real.

O que significava que o garoto logo chegaria para treinar com ele!


Apressou-se para entrar no banho, onde uma chama invadiu seu estômago ao pensar que Ikki logo chegaria. Uma vez concluído, saiu e se secou. Em seguida, correu ao seu quarto para se vestir, enrolado na toalha.

Optou por uma túnica branca grega que chegava até o final de suas nádegas, com uma faixa para amarração firme na cintura e calças da mesma cor, com as barras justas nos tornozelos. Os pés estavam agradavelmente descalços, e assim ficariam.

“É um bom traje para um treino.” – Pensou, satisfeito.

Se dirigiu ao seu altar de lótus, no salão principal de sua Casa, e levitou sobre ele enquanto penteava custosamente seus longos cabelos, agora embaraçados por conta do banho. Após alguns minutos dispensados na tarefa, sentiu aquele cosmo chegar no Santuário.


Esforçou-se para terminar de pentear os fios loiros, ainda molhados, antes que o outro chegasse. Não queria que Ikki o flagrasse em uma atividade tão incondizente com a imagem perfeita e impecável que preferia passar.


Sua tentativa não foi muito feliz. Ao invés disso, o japonês chegou com um sorriso discreto, trazendo uma mochila nas costas.


- Cheguei em um mau momento? – Brincou, vendo a situação de Shaka.


O perfume dos cabelos do virginiano se espalhou por toda a Casa, e sua beleza ao penteá-los era de tirar o fôlego. Curiosamente, o indiano já estava de olhos abertos, encarando o mais jovem com seus orbes azuis.


Fênix estava ludibriado com a cena de raro esplendor diante dele, e principalmente com aquele homem de atributos tão angelicais, ainda mais explícitos que o normal. Talvez estivessem mais evidentes graças às vestes inteiramente brancas, ou aos cabelos mais próximos de seu rosto.


- O que achou? Que meus cabelos se penteassem sozinhos? – O virginiano retrucou, escondendo a vergonha com sua típica grosseria.


Ikki revirou os olhos e cruzou os braços...mas não podia deixar de reparar no quanto aquele loiro boçal era encantador.

- Vai demorar muito? – Questionou, forçando-se a interromper seus próprios pensamentos. Se aproximou gradualmente, e ao chegar na distância que julgou ser adequada, bem além do que desejava, se sentou no chão e largou a mochila ao seu lado.


- O que trouxe na mochila? – Shaka ignorou a pergunta, dirigindo seu olhar para ela.


- Coisas. – Ikki desconversou, irritado com a bisbilhotice do loiro.


Ali, se viu obrigado a continuar admirando Shaka em sua escovação de cabelos. 


Poderia descrever aquilo como uma tortura. Cada movimento demonstrava tanta cordialidade com os fios embaraçados, quase compaixão. Tinha inveja daquela cabeleira que o outro amava tanto e dispensava um tratamento tão gentil.


Quem dera Shaka afagasse seu corpo com a mesma paixão que tocava os próprios cabelos...mas não! Preferia esnoba-lo!


- Você não está com roupas de treino. – Seu devaneio foi subitamente interrompido pela constatação do outro.


- Eu trouxe outras. Me troco quando formos começar. – Disse, reprimindo certo ódio em sua voz.


- Então é isso que tem na mochila? – O loiro sorriu por descobrir o que o outro trouxera. Estava verdadeiramente curioso.


- Não enche! – Ikki bufou, desviando o olhar.


Se invejava os cabelos de Shaka por receberem tanta atenção, invejava mais ainda a escova que se esgueirava entre os fios loiros. Quem dera fossem suas mãos calejadas...

- Ikki, siga à direita pela Casa de Virgem e encontrará uma grande porta de madeira. Entre e vá se trocar no meu banheiro. – O loiro disse, repentinamente. O outro o olhou aturdido por alguns instantes, no entanto seguiu a indicação do mais velho.


Pegou a calça de moletom vermelha e a regata azul que trouxera na mochila e fez exatamente o que Shaka lhe disse. Ele encontrou a porta de madeira escondida na porção mais sombria da Casa Zodiacal, e empurrou-a para entrar na residência de Shaka.


“É aqui que ele mora...” – Concluiu, um pouco chocado. Sem cerimônia alguma, Virgem o mandou se trocar na casa dele enquanto terminava de pentear seus cabelos...uma atitude bastante intrigante.


Sem tempo para pensar nisso, senão ficaria louco, adentrou no primeiro cômodo: a sala de jantar, composta por uma mesa de madeira com quatro cadeiras simples. Sorriu ao ver que seu presente estava lá, num lugar com tanta visibilidade.

Ele adentrou no espaço, cujas paredes eram pintadas de laranja e possuía uma decoração bastante sutil. Mal podia acreditar que aquela morada ficava dentro da fortaleza de pedra do Santuário.

Na sala, havia uma paredes coberta por estantes embutidas, repletas de livros, e um sofá vermelho baixo, ao lado de dois pufes vinho. No chão, um tapete persa cobria toda a extensão do cômodo.

Ele seguiu pelo corredor que Shaka mencionara, e encontrou o banheiro, na primeira porta à direita. Logo à frente, havia outra porta, onde deduziu ser o quarto.

Enlouqueceria se conhecesse o quarto do virginiano, então apenas entrou no banheiro para se trocar.

Ainda era surreal estar ali.

 

***** Em Roma *****

 

Hyoga despertou preguiçosamente de seu sono. Não costumava acordar tão cedo, no entanto uma movimentação na cama chamou sua atenção.

Após abrir seus olhos extremamente claros, de um azul translúcido e gelado, mirou a cabeça do jovem que fingia repousar em seus braços.

Não era surpresa que Shun estivesse preocupado. Na noite anterior, Andrômeda se queixara com ele sobre a omissão da Deusa quando questionada. Estava preocupado com a missão, com o destino da Terra, com ele e os demais cavaleiros e, principalmente, com o irmão...

- Dormiu mal? – Sua voz taciturna cortou o silêncio do quarto.

O mais novo aconchegou-se nele, apoiando a cabeça em seu peito. O russo não tornaria a perguntar, sabia que Shun lhe responderia quando estivesse pronto.

- Não cheguei a dormir. – Confessou, direcionando seus amplos orbes verdes na direção do rosto de Cisne.

Permaneceram naquela cálida troca de olhares por tempo suficiente para que os cantos de seus lábios começassem a se curvar para formar sorrisos.

Ah, aquela paixão que os dominava não os permitia admirar um ao outro seletivamente, sem envolver o ardor potente que se apossava de seus peitos!

Estavam apaixonados. Há muito, muito tempo...e agora, mais maduros e decididos, finalmente estavam provando do fruto que a resistência sempre lhes privou de saborear. Como aqueles meses de namoro estavam sendo maravilhosos!

Aquele vínculo especial que tinham tornava-os um livro aberto aos olhos do outro. Hyoga sabia o que faria o menor se resignar com a situação, ao menos momentaneamente.

- Ligue para o Ikki. – Fora direto e objetivo.

- Não sei se devo, Cisne. – Shun confessou, exibindo uma melancolia quase infantil em sua face. - Ele perceberia a minha voz abalada.

Era verdade. Seria ainda pior se Ikki identificasse a preocupação do irmão, e também ficasse aflito.

 Apesar de suas breves ressalvas com Fênix, o russo considerava que o conhecia bem. Sabia que se Ikki tivesse algum problema, resolveria por si só e jamais deixaria o irmão mais jovem ciente do que passara. Mas o contrário era praticamente impossível para o leonino: protegeria Andrômeda a qualquer custo.

- Eu não consigo imaginar um motivo para tudo isso estar acontecendo. – Shun interrompeu sua explanação silenciosa. - Para precisarmos que ele e o cavaleiro de Virgem estejam mais próximos.

Hyoga permaneceu calado. Não estava muito inspirado para elaborar uma teoria plausível, que acalmasse o japonês, então optou por velar seu silêncio compreensivo e paciente.

 Shun confiava nele, não havia dúvida disso. Tanto que lhe confidenciou uma suspeita...

- Temo que Athena esteja planejando usar os sentimentos deles como armas. – Relatou ao mais velho, que lhe lançou um olhar interrogativo.

- O que quer dizer? – Cisne acariciou os cabelos do outro, tentando ajuda-lo a relaxar. Não queria que a pergunta soasse, em hipótese alguma, acusatória.

- Eu ainda não sei muito bem... – Bufou, largando-se na cama desarrumada. Não tinha ideia do que estava acontecendo, e ao mesmo tempo entendia tudo perfeitamente. Era um sentimento dúbio e incômodo, que lhe roubara o sono.

 - Escute. – Hyoga inclinou-se na direção do mais jovem, deixando um beijo gentil em seus lábios, antes de prosseguir. - Seja lá qual for a intenção de Athena com isso, há um importante propósito envolvido. Até compreendermos a situação, devemos nos manter firmes.

 As palavras abrandaram a angústia de Shun. Hyoga não lhe disse para deixar suas desconfianças de lado, o que seu lado cavaleiro lhe aconselhava a fazer, para pensar em outra coisa...apenas lhe pediu firmeza. Isso não seria difícil com o apoio incondicional que recebia. Poderia ser firme.

Com um sorriso amplo de agradecimento, tomou os lábios do namorado com paixão. Em seguida, levantou-se da cama e se dirigiu à escrivaninha, onde seu celular carregara durante a noite toda.

Antes de fazer o que pretendia, lançou um olhar confiante para Hyoga e explicou:

- Ligarei para ele. – Concluiu, recebendo um sorriso de alívio do russo.

Enquanto ligava para Ikki, voltou a se sentar na cama. Cisne apenas o mirava com encantamento, admirando a beleza do japonês. Gostava de vê-lo daquela forma, determinado. E era melhor ainda saber que, de alguma forma, contribuiu para aquilo.

 

***** Em Atenas *****
  


 

No salão da Casa de Virgem, Shaka finalmente terminou de pentear seus cabelos. Não sabia o que fazer com a escova, então a jogou junto da mochila de Ikki, num canto qualquer próximo à entrada.


Ficou analisando a mochila surrada por algum tempo, após esta ter sido golpeada por seu objeto. Quase morreu de susto quanto um som alto e estridente foi emitido dela, pensando ser sua culpa. Numa análise mais calma, percebeu que se tratava de um toque de celular.


Se viu tentado a atender o celular e acabar logo com aquele barulho...mas era errado invadir a privacidade de Ikki! Provavelmente encontraria todo o tipo de obscenidade dentro da mochila, o que seria muito constrangedor para Fênix e para ele.


Riu de si mesmo com isso. Por que se importava com o que o garoto carregava consigo?

E a música insuportável continuou. E continuou. E continuou...até a paciência de Shaka se esgotar.

Antes que tivesse chance de raciocinar, seus dedos já mergulhavam no bolso externo da mochila, tateando os pertences em seu interior.

Tomou o aparelho preto nas mãos e o atendeu, furioso, vendo o nome de Shun na tela. Faria aquele barulho cessar de qualquer maneira e xingaria o maldito Andrômeda assim que o visse!

Só então percebeu que teria que conversar com o irmão de Ikki. Ficou paralisado. O que o garoto pensaria se soubesse que estavam juntos?

Vendo que não teria outra alternativa, Shaka se deu por vencido e levou o celular até o ouvido. Sabia que se arrependeria disso, mas já era tarde demais para recuar.

- Ikkiii! – O timbre meigo e inconfundível do jovem Andrômeda se fez presente do outro lado da linha.


- Não é o Ikki. – Shaka decidiu ser sincero e direto, caso contrário poderia se ver tentado a desligar na cara do garoto.


Um silêncio constrangedor se fez entre os dois. O loiro mal conseguia imaginar as mil suspeitas que Shun deveria ter àquela altura. Cortando o silêncio, o japonês pigarreou. 

- Como vai, Shaka? – Perguntou, simplesmente. 


Houve outro silêncio constrangedor, este ainda mais longo que o anterior. O indiano amaldiçoou o Amamiya mais jovem em pensamentos por ter reconhecido a sua voz. 

- Seu irmão está se trocando. – O cavaleiro de ouro comentou, apenas para justificar a ausência de Ikki.


- Ah...desculpe. Não quis atrapalhar. – Shun quase engasgou de vergonha.

Shaka finalmente percebeu a que a sua frase remetia. Ikki estava junto com ele, se trocando, pouco após a alvorada. O mais jovem certamente pensou que seu irmão dormira nos braços dele.


Nenhum dos dois sabia mais o que dizer. Shun parecia chocado, embora uma risadinha pudesse ser ouvida ao fundo.


- É que vamos treinar. Quer que eu o chame? – O loiro tentou consertar o terrível mal entendido que ele mesmo provocara. 


- N-não, obrigado. Hm... ele está bem? – O cavaleiro de bronze estava se segurando para não rir.

- Eu diria que sim. E como está a missão? – Virgem mudou bruscamente de assunto, tentando resgatar seus trejeitos inquisidores. 


- Confusa, mas bem. – Shun respondeu, sem muita empolgação, antes de se despedir. - Certo...então até mais, Shaka.

- Até breve, Andrômeda. – O indiano retribuiu, agradecido por aquele tormento finalmente chegar ao fim.

Shaka estava tão furioso após desligar que simplesmente jogou o celular dentro da mochila de Ikki e voltou a levitar sobre a lótus, a fim de tentar amenizar seu constrangimento pelo vexame.

Para piorar a sua situação, Fênix estava voltando, dirigindo-se até ele. O virginiano olhou-o com uma cólera arrebatadora, de uma forma que o cavaleiro de bronze considerava implacavelmente sexy.

- Vejo que a Rapunzel está pronta! – Ikki provocou, reparando que os cabelos molhados de Shaka já pareciam perfeitamente alinhados.

O loiro manteve aquele olhar assassino sobre ele, como se o culpasse por algo. O japonês não entendeu o motivo, mesmo assim se divertiu com a expressão inédita do mais velho.


- Tive a impressão de ter ouvido vozes. – Fênix questionou, guardando as mãos nos bolsos de seu moletom folgado. - Com quem estava falando?

“Ouviu a minha voz mas não ouviu o toque do próprio celular? Qual o problema desse garoto? Se bem que posso usar isso a meu favor...” – Shaka viu ali uma chance de se safar de explicações. Bastava omitir que conversara com Shun e nem precisaria ouvir o outro reclamar por ter sua mochila “revirada”.

- Me deixe em paz, Fênix. – Ralhou, levantando-se de sua meditação suspensa. Ele se aproximou consideravelmente de Ikki, enfrentando-o, para reafirmar suas palavras.


- Fala sozinho então?  - O leonino não desistiu, todavia o olhar decidido do outro o paralisou. Era hora de ficar quieto.

O guardião da Casa voltou a tomar certa distância, e se posicionou para o combate. Queria afastar logo os pensamentos do momento constrangedor que vivera.

Fez uma postura curiosa, com as mãos espalmadas, uma erguida até a altura do ouvido e a outra diante de seu peito, posicionada como uma lâmina. As pernas estavam separadas, uma bem atrás da outra, conferindo-lhe maior superfície de equilíbrio. 


Ikki apreciou a cena antes de montar a sua própria postura. Mas era tão difícil não se distrair com aquela figura celestial à sua frente...o maldito tinha que ser tão lindo?

Achava-o, relutantemente, irresistível. Era fissurado pelos cabelos fluidos, pelos olhos esmagadoramente profundos, pela boca que constantemente esboçava aquele insuportável sorriso de deboche e pelas palavras hostis que decolavam de seus lábios rosados.

Seus sentimentos por Shaka eram assustadoramente intensos e sufocantes. Desejava aquele cavaleiro de ouro para si, e não era capaz de lutar contra isso...e mesmo que fosse, não lutaria. Obstinado, como todo leonino, preferiria explorar essas sensações inéditas.

Queria distribuir beijos famintos e toques íntimos por todo o indiano. Desde de seus lábios, suas bochechas coradas, até as mais reclusas porções de sua carne.

Se imaginava esbravejando com qualquer um que tentasse algo suspeito com o seu loiro. Não era difícil sonhar com visitas constantes ao Santuário, somente para vê-lo, conversar sobre o que ele pensou em sua última meditação, se maravilhar com sorrisos fugazes...


- Você está pronto? Podemos começar? – Shaka o trouxe de volta de seu devaneio, como costumava fazer. Na verdade, teria o chamado antes, caso não tivesse se perdido em seus pensamentos também.

Ikki estava tão lindo com aquela roupa deplorável, que mais se assemelhava a um pijama improvisado...

- Estou sempre pronto! – O mais jovem consentiu, fechando os punhos diante de seu peito. Os braços fortes pareciam ainda mais belos naquela posição. Os músculos pareciam tão sobressalentes e convidativos. – Começamos quando você quiser, Shaka.

“Não devo reparar os músculos dele.” – Virgem se repreendeu mentalmente, desviando o olhar para o rosto de Ikki.

Péssima decisão. Aqueles olhos que pareciam conter um pedaço do oceano eram sua perdição. Gostava demais de olhar aquele moleque.

- Sem armaduras, sem poderes. – Ikki se certificou, intrigado com o comportamento de Shaka. Ele parecia aéreo.


- Absolutamente. – O virginiano concordou, afastando os pensamentos que tivera. - Vou pegar leve com você.

- Eu que deveria dizer isso! – Fênix abriu um sorriso brando pela provocação. Como aquele cavaleiro gostava de irrita-lo! - Dispenso a sua piedade, Virgem!

- Está bem. Mas garanto que irá se lamentar por isso. – O cavaleiro de ouro alertou, esculpindo um sorriso desafiador em seu rosto perfeito.

Era a deixa de Ikki. Queria impressionar o outro, queria dar o primeiro golpe. Precisava ver um mero vestígio de surpresa naquele rosto que nunca se permite demonstrar abalo algum por suas ações intempestivas.

Avançou e tentou acertar o peito de Shaka com o seu punho firme, no entanto o mais velho fez um recuo impressionante, desviando sem dificuldade dele. Arriscou o mesmo golpe com o outro punho, porém a mão que o mais velho deixara erguida ao lado da cabeça desceu rapidamente para bloqueá-lo.

A outra mão do virginiano, até então fixa e aberta diante de seu peito, se fechou e trilhou a curta distância até o rosto de Ikki, golpeando-lhe na bochecha. O japonês caiu ao chão com a força aplicada.

- O que foi isso? - O cavaleiro de bronze perguntou, aturdido com aquela manobra de ataque e defesa combinados numa só técnica, conceito que lhe soava bastante familiar.


- Pratico Yoga, por isso possuo plena consciência corporal. – Shaka não pareceu surpreso com a reação de Ikki. Sabia que o mais jovem o subestimaria. - Ao contrário de você, com essas investidas desmedidas.

- Como meros exercícios podem ajuda-lo dessa forma em batalha? – Fênix levantou-se num pulo só e questionou novamente, intrigado.


- Observe, Fênix. – O loiro refez sua posição e convidou o outro silenciosamente a tentar ataca-lo novamente.

Ikki obedeceu, e desta vez avançou sobre Shaka com uma enorme velocidade, tentando acerta-lo no rosto. O indiano simplesmente deu um passo para o lado no instante em que o mais jovem o alcançaria, deixando que o leonino passasse direto por ele.

Com um pasmo Ikki de costas para si, o virginiano se virou e enlaçou o pescoço do garoto com os braços e lhe desferiu um forte chute nas costas. Ao desvencilhar-se do pescoço do garoto, este caiu no chão, sem chance alguma de revidar.


- Isso é insano! – Reclamou Fênix, engasgado por conta do duro enlace que sofrera. 


- Observe de boca fechada! Não estou disposta a ouvir suas considerações vazias! – Virgem bradou, satisfeito com o semblante ofendido do cavaleiro de bronze.


O leonino não se deu por vencido, e se levantou com uma genuína carranca de orgulho ferido. Pensaria em uma estratégia para não continuar sendo humilhado daquela forma pelo cavaleiro de ouro, que parecia se divertir com o seu estado aparentemente indefeso.

Fênix crispou os punhos novamente, e desta vez esperou até que Shaka o atacasse. Logo aconteceu, e o loiro se aproximou com uma investida de aço, que foi bloqueada por um chute forte e inesperado nas pernas.

Ikki sorriu, pela primeira vez no treino. Conseguiu derrubar o virginiano ao chão, que lhe mirou com irritação.

- Achou que ficaria me batendo o dia todo? – Brincou, oferecendo a mão para ajudar Shaka a se levantar. Este relutou um pouco, porém acabou aceitando a ajuda.

Após reerguer Shaka, os dois ficaram frente à frente. Ikki não parecia muito interessado em largar a mão macia do outro, que também não aparentou incômodo com a proximidade.

O mais jovem olhou o cavaleiro de Virgem como se visse algo sobrenatural. Aqueles cabelos dourados, que já começavam a secar, os olhos feitos de fragmentos do mais azul céu de primavera, o corpo esguio e a estatura um pouco maior que a sua...e aqueles lábios rosados que pareciam clamar por ele.

O indiano então soltou a mão do outro, recuando um passo. Estava envergonhado por não ter resistido ao cavaleiro de bronze.

Bastava tê-lo empurrado, brigado com ele...então por que queria permanecer daquela forma, unido a ele?


- Você é mesmo muito bom em combates físicos. Tenho que admitir. – Ikki quebrou a tensão do momento com um elogio. Sabia que o outro, orgulhoso como era, não lhe trataria mal se apelasse para seu ego. 


- Nada que você já não soubesse, cavaleirinho. – A resposta do outro foi emitida em tom sutil, demonstrando coisas que o próprio Shaka se assustou ao constatar.

Aquele tom doce vindo do bronco cavaleiro de Virgem era simplesmente impensável. Apesar do evidente deboche das palavras, não havia nada além de um carinho sincero na suavidade implícita nelas.

Então a mente de Ikki o guiou de volta para aquele toque nas mãos macias do loiro. Para a forma brusca que teve seu pescoço envolvido pelos braços do mais velho durante o treino, da respiração ofegante de Shaka bagunçando seus cabelos curtos. Para o perfume que se espalhou pela sexta Casa enquanto seu guardião penteava os cabelos.

Ikki se sentiu patético por estar tão evidentemente apaixonado.

Fingia querer desfazer a pose austera de Shaka, dobrar seu orgulho e rasgar seu escárnio recorrente, no entanto o que queria de verdade era ser amado por aquele cavaleiro que parecia acha-lo nada mais que um insignificante pirralho de bronze mergulhado em sentimentalismo. 


Queria que o virginiano dissesse que pensou nele enquanto estiveram separados, que lhe contasse coisas que ele não sabia, se importasse com o que ele comeu no almoço e com o horário em que foi dormir, que sentisse saudades dele e se abrisse sobre seus problemas...coisas que, tinha certeza, nunca conseguiria daquele impassível guerreiro.

Então por que estava ali? Por que estava tão desesperado para, ao menos tentar, conquista-lo, embora fosse explicitamente em vão?

Porque gostava demais dele para apenas desistir...


- Por quanto tempo mais pretende ficar divagando, Fênix? – A voz austera do alvo de seus pensamentos partiu sua linha de raciocínio. - Quer prestar atenção no treino? Se continuar se distraindo assim, vou perder minha paciência com você!


- Paciência? Você tem isso? – Ikki recorreu ao sarcasmo para disfarçar seu embaraçoso flagra.

Shaka ignorou a zombaria e voltou à sua posição inicial de combate. Não daria ao garoto a chance de irrita-lo. Mas adoraria que o contrário acontecesse...e sabia que a melhor forma para isso era questionar as estratégias de aproximação do japonês.

- Só por curiosidade, por que queria tanto treinar comigo? – Relaxou um pouco sua pose, como se soubesse que não seria golpeado naquele momento.

- Eu já disse. Meus amigos estão longe. – Fênix limitou a sua resposta às reles palavras evasivas. Não daria explicações mais profundas.

- Sim, você já disse isso. Mas eu quero saber o motivo real. – O virginiano insistiu, adorando ver o pedido silencioso de socorro que brilhou nos olhos de Ikki. Tocou no ponto fraco do garoto: aquela paixão insana.

- Com quem você sugere que eu treine, já que acha que estou cheio de opções? – O cavaleiro de bronze recorreu ao suspense em que Athena os deixara. Era verdade que Shaka era a única companhia que desejava...e mesmo se não fosse, também não teria outras alternativas.

- Aqueles cavaleiros que estão na entrada do Santuário, por exemplo. – O indiano fora mais esperto. Sabia muito bem que o leonino usaria aquele argumento.

- Os amiguinhos do Jabu? A gangue de unicórnios? – Ikki abriu um amplo e incisivo sorriso de troça. Não recorreria a eles nem se estivesse desesperado! - Acha mesmo que eu me misturaria com aquela ralé, Shaka?

- Hm...nível muito baixo para você? É isso? – O loiro se espantou com a resposta indolente do garoto. - Você me lembra um velho cuja bengala atolou na lama da montanha, ao repudiar aquele grupo de cavaleiros dessa forma.

Sempre se achando o dono do mundo...” – Se irritou com isso, principalmente com a normalidade com que Fênix desdenhava os demais. A sinceridade de Ikki era sua arma mais letal, e ao mesmo tempo sua maior fraqueza.

- É muita arrogância sua falar esse tipo de coisas de colegas, Ikki. – Shaka comentou, em tom de conselho. – Quero ver do que se vangloriará no dia em que um deles salvar a sua vida!

- Esteja certo que isso nunca acontecerá! E se soubesse o quanto eles são inúteis, não acharia arrogância da minha parte! Muito pelo contrário, concordaria comigo! – Ikki riu brevemente, irritado com a intromissão. Odiava conselhos. – Agora, se já tiver acabado, podemos voltar ao treino?
 


O cavaleiro de bronze firmou sua posição de confronto. Estava ficando entediado com aquela conversa.

- Você é bem convencido para um cavaleiro de bronze, sabia? – Virgem ficou lívido com o descaso de Ikki por suas palavras.

- Não me faça rir! Você me chamando de convencido? – O japonês trincou os dentes de raiva. - Não é você o cavaleiro que oferece rendição aos outros em troca de ser venerado como uma divindade? Eu sou, no máximo, extravagante comparado a você!

- Garoto egocêntrico! - Desta vez foi Shaka a se enfurecer.

“Maldita presunção juvenil!” – Bradou Virgem mentalmente, quase retorcendo seus próprios pensamentos. Quem aquele pirralho pensava que era para acusar um santo de ouro de hipocrisia?

- Agradeça por essa não ser uma batalha de verdade, caso contrário eu te aniquilaria! Esse seu tipo ignorante de orgulho me enoja! – Shaka desfez a postura de batalha e se afastou do mais jovem. Não ficaria na companhia dele nem por mais um segundo.

“Temperamento infernal!” – Acusou, se perguntando como ele e aquele jovem, que conseguia ser tão afável às vezes, sempre acabavam brigando.

- Se me aniquilasse, eu voltaria e lhe exigiria eternas revanches! Está lidando com a ave Fênix! – Ikki ameaçou, parado no mesmo lugar que estava antes, observando o outro.

- Devo ter feito algo terrível para receber você como karma. – O loiro replicou, deixando o japonês sozinho, lançando-lhe olhares furtivos. – Agora entendo porquê Athena o deixou aqui. Eu também estou passando a desdenhar a sua presença.

- O que quer dizer? – O japonês exibiu um tom de voz austero para o mais velho.

- Troque-se e vá embora da minha Casa. O treino acabou e você não é mais bem vindo aqui. – Virgem notificou, pouco antes de deixar a Casa.

Ele caminhou pelo jardim principal, e em seguida tomou uma direção onde suspeitava que o outro não ousaria incomoda-lo. Logo estava naquela porção reclusa do Santuário, diante das Árvores Salas Gêmeas.

Se sentou na posição de lótus entre elas, a fim de relaxar. Nem tentaria meditar, uma vez que seria perda de tempo no estado em que se encontrava. Seria uma desonra meditar tão transtornado!

"Alguém dê-me paciências para aturar esse garoto e sua paixão impetuosa!" – Suplicou para alguma divindade, que ele não sabia ao certo qual era.

Cobriu as têmporas com as mãos, sentindo o quanto seu rosto estava quente...fervendo de raiva! Não poderia ser pior! Ou poderia, uma vez que sentiu o cosmo de Fênix se aproximar de sua localidade.

“Como ele ousa me incomodar depois que tudo que disse?” – Se questionou, incrédulo. Ikki era criatura de ações mais impulsivas e aleatórias que já vira.

- Desculpe. – Foi tudo que o mais jovem disse quando já estava próximo o bastante para ser ouvido.

Ikki estava arrepiado por voltar ao jardim, depois de tantos anos cumprindo sua promessa de afastamento. O mesmo lugar para onde seu cosmo enviou flores para aquele mesmo cavaleiro, que agora lhe encarava febrilmente com seus olhos azuis.

- Apenas vá embora, Ikki. – O loiro pediu, firme, embora seu interior se sacudisse com a voz grave do outro.

- Você sabe que não vou. – Fênix disse, sem nada na voz além de uma calma forçada. – Gostaria de jamais ter que brigar com você novamente. Só não suporto que fale comigo como se eu fosse estúpido!

- Desculpe se aparentei pensar isso. – Shaka também reconheceu que abusara um pouco de seu ar de superioridade. - Garanto que, das muitas coisas que penso a seu respeito, essa não é uma delas.

Houve um silêncio velado entre os dois. Os olhares se encontraram brevemente, porém logo o transe em que mergulharam foi interrompido por Ikki, que quebrou as barreiras da distância autoimposta e se sentou ao lado de Shaka, entre as árvores. Seu braço esquerdo roçando no braço direito do virginiano, que lhe lançou um olhar mordaz, aconselhando-o a se afastar. O japonês ignorou e continuou daquela forma, desviando suas atenções para o horizonte.

O perfume das flores do jardim adjacente era carregado até lá pelo vento, assim como uma pequena dose de pólen que o fez espirrar. Shaka nada disse, apenas riu fracamente pelas feições contorcidas de Ikki.

- Por que não consigo ficar irritado com você? – Virgem murmurou, encarando o mais jovem.

 A pergunta retórica do virginiano fez Ikki sorrir. Por mais que se esforçasse para isso, também não conseguia se irritar com ele.

- Obrigado pelo treino, Shaka. – Disse, pretensioso. Já estava planejando uma segunda dose.

- Disponha. – O loiro apenas sorriu fracamente, sem nem desconfiar do que estava se passando na cabeça do japonês.

- Eu voltarei amanhã para continuarmos. – Arriscou, preocupado com a possibilidade de ser repreendido.

- Se convidando para uma nova luta comigo, Fênix? – Shaka demonstrou estarrecimento por um instante.

- Seria idiotice esperar por um convite seu. – O cavaleiro de bronze assentiu, sorrindo de lado.

Shaka fez uma menção a sorrir também, no entanto estava incerto do significado daquele gesto, então reclinou.

- Eu te ajudo a pentear o cabelo da próxima vez. – O leonino aproveitou para brincar, recebendo uma cotovelada de advertência do mais velho.

- Engraçadinho. – O indiano emitiu um riso baixo e apaixonante.

Seu olhar encontrou o de Fênix, que estremeceu ao vislumbrar aquele sorriso, com a expressão relaxada e o semblante transbordando receptividade. E os lábios clamavam por ele, daquela forma estranha que só ele ouvia, em sua mente.

Estava louco. Louco de paixão por Shaka.

Seu rosto passou a se aproximar lentamente de Virgem. Avanços calmos e ritmados, sutilmente coordenados num ângulo específico, onde as bocas se encaixariam perfeitamente no final.

O loiro demorou a entender o que ele pretendia, e recuou no momento em que sentiu a respiração quente do outro colidir com a sua.

“O que?!?” – Sua mente martelara a mesma perguntava repetidas vezes.

O afastamento de Shaka assustou o japonês, que lhe questionou com o olhar. Chegava a parecer magoado.

- Ikki, não faça isso... – O cavaleiro de ouro bradou, austero.

O semblante de Ikki não negou sua decepção. O garoto foi recusado um segundo antes de conseguir o que vinha querendo há tanto tempo.  

- Você tinha que estragar esse momento? – Ikki se afastou do loiro também, indignado. - Do que está com medo, Shaka?

Era uma boa pergunta. Shaka não sabia o que o motivou a repelir a aproximação do outro. Havia decidido dar uma chance a Fênix...então por que não conseguiu aceitar o beijo, que confessava também querer? Estava sendo estúpido.

O mais jovem não deu a ele tempo de lidar com os seus dilemas. Apenas agarrou-o pelos braços e o jogou na grama, pulando como uma fera sobre ele. Os olhos arregalados e assustados do loiro imploraram por justificativas, que Fênix não parecia disposto a lhe dar.

A sensação de ter o peso de alguém sobre o seu corpo era tão nova. Virgem não podia negar que estava gostando daquele toque, daquela proximidade. De ver Ikki sobre ele, de forma que ninguém antes ousara estar.

- Onde está o seu bom senso, garoto? – Se pronunciou, temendo que Fênix tentasse beija-lo novamente. Desta vez, corria um sério risco de não resistir. Para desestimular o mais jovem, decidiu confronta-lo com toda a sua altivez.

- Vejo em seus olhos que também há...algo! – Ikki ignorou o mais velho, e demonstrou todo o desespero que amargurou o seu peito perante a recusa. - Você não pode negar isso!

- Sim, realmente há algo...no entanto não é o que você deseja. – Shaka decidiu confessar que estava relutantemente atraído pelo pirralho de bronze. - O que temos é, no máximo, uma detestável atração física! Nada além disso!

- Fale por você! – O mais jovem aproximou seu rosto do virginiano, ciente que poderia acabar recebendo um golpe, mas não estava assustado com essa possibilidade. Seria bem pior nunca provar daqueles lábios. - Então é disso que está com medo? De me querer da mesma forma que sabe que eu te quero?

A respiração ofegante de Shaka foi a confirmação que Ikki precisava. Entendia a ressalva dele. Era um cavaleiro de ouro que nunca sequer considerou se apaixonar por alguém. Quem diria beijar um cavaleiro de patente mais baixa e com uma reputação sombria...

O ar que ambos inalavam já se tornara um só. Os olhos se fecharam em antecipação por aquele toque. As línguas pareciam pegar fogo. Pontadas já podiam ser sentidas em seus baixos ventres.

O cheiro da pele e o sabor da boca estavam prestes a tornarem-se uma simbioe. Faltava tão pouco...

 - Mas o que é que está acontecendo aqui? – Uma voz se fez ouvir, próxima a eles.

Os dois se separaram em sobressalto, sentando na grama fuzilando o jovem que aparecera bem na fatídica hora.

Jabu ficou pálido como um fantasma ao avistar a cena que interrompera. Apareceu para acabar com a gritaria que ouvira da entrada do Santuário, e cujo cosmo alterado de Ikki denunciou a localização...só não imaginou que o encontraria em uma situação tão delicada. Temeu pela própria vida. Fênix o mataria, tinha certeza.

 - Desculpem-me, não quis int... – Tentou se justificar, esboçando um sorriso simpático para Fênix.

- Já interrompeu! – O leonino se levantou num salto, avançando para dar uma surra naquele infeliz. - Satisfeito, imbecil?

- N-não precisamos recorrer à violência, I-Ikki! Eu deixarei você com a sua loira bonitin...  – O olhar apavorado de Unicórnio se desviou para a figura que acabara de levantar do chão também, e que Ikki estava prestes a beijar. - Espere, é um loiro! O que? E um cavaleiro de ouro ainda!

O escorpiano estava incrédulo. Sabia que muitos dos cavaleiros mantinham casos entre si, diria até que a maioria. Porém, nunca imaginou que Ikki fosse um deles. Por outro lado, não poderia culpa-lo. Até ele mesmo daria uns pegas naquele cavaleiro de ouro se tivesse chance.

Fênix estava prestes a pular no pescoço dele, quando Shaka o apanhou pelos ombros, impedindo o ataque.

- Eu só ouvi a gritaria e pensei que...poderia ser uma invasão ou algo assim. Como está tudo bem por aqui, acho que já vou. - Não resistindo ao sarcasmo, e até rindo perante o perigo, Jabu alfinetou. - Até breve, senhores.

O leonino e o virginiano ficaram parados, observando-o ir embora. A audácia de Unicórnio atingira proporções épicas.  

- Você tem razão sobre eles. – Shaka comentou, visivelmente irritado com a ousadia daquele garoto.

 O mais jovem permaneceu em silêncio. Estava morrendo de raiva, é verdade, porém a frustração era maior que tudo. Não sabia se teria outra chance de se aproximar tanto de Shaka a ponto de arriscar um beijo. E todo o progresso fora perdido por causa do Jabu!

Do maldito e insignificante Jabu!

- Está irritado, Fênix? – A voz do loiro soou embargada. Era visível que sim.

Ikki lançou-lhe um olhar de súplica, pouco antes de se virar na mesma direção que Jabu tomara. Iria embora, e iria sem ter beijado o cavaleiro de Virgem.

- Até mais. – Se despediu, com o timbre grave e afetado.

Shaka o observou partir, pensando no que faria na situação dele. Fênix estava esperando por aquilo há tanto tempo...

Pensou que combinara com Ikki um novo treino no dia seguinte. O japonês voltaria...ou será que não? A intuição de Shaka lhe alertou que Ikki estaria chateado demais para voltar.

Seria uma data importante, e ele estava resoluto quanto a torna-la um marco ainda maior. Tinha um plano em mente para levar Fênix ao Santuário, que incluía um cúmplice inusitado, para lhe confessar o que estava vivendo.

Sua natureza racional lhe sabotava, tornava-o receoso, contudo já era hora de parar de se negar a viver o que seu coração pedia. Bastava de ostentar a aparência de homem intocável!

Ele queria ser bem mais que isso...

Não poderia perder aquele garoto, o único capaz de lhe fazer esquecer os tormentos que vivera na morte. Estava sendo sua luz, sua salvação, mesmo entre tantas brigas e mal entendidos...

Apesar dos conflitos, havia muito equilíbrio em sua dinâmica. Se complementavam, como opostos invariavelmente conectados. Talvez fosse por isso que Fênix estivesse se tornando sua primeira paixão.

E ele colocaria seu plano em ação. Não deixaria que nada os atrapalhasse desta vez, a começar por si mesmo.  

Se Ikki o queria, Ikki o teria. 


Notas Finais


Se também quis matar o Jabu, levanta a mão o/
Ficaria muito feliz com um comentário seu (xingando o Jabu, ou talvez me xingando também, afinal a conspiradora por trás de tudo sou eu HUEHUEHUE)
Será o Milo vai se vingar do Camus pelos gelos?
Será que o Máscara da Morte vai aceitar que está caidinho pelo Afrodite?
Será que o Shun e o Hyoga vão descobrir o plano da Saori?
Será que o Ikki vai finalmente conseguir dar um beijo nesse virginiano complicado? HUEHUE
Descubra no próximo capítulo *suspense on*
Kisses :***


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