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História Vazio - Passado presente


Escrita por: ChisanaRumiko

Notas do Autor


"Chisana, vc atrasou!"
Um diazinho de nada, gente, "mim" perdoa ;---------;
Mas olha, fiz esse bem grandinho, pra compensar :3
"Mas tá grande pra caralho!"
É, eu sei, eu ia fazer um duplo... Mas é mais fácil postar tudo de uma vez .-. Pensa como se estivesse lendo um duplo kkkkk
O atraso foi pq *pigarreia* uma CERTA AMIGA MINHA JOGOU MACUMBA EM MIM
E eu passei o domingo inteiro no meio do mato (longa história)
Eu teria postado ontem, mas voltei só meia noite pra casa, e aí fiquei tipo "nah, já é segunda mesmo"... Desculpa, gente, sou preguiçosa mesmo kkkkkkk

BORA CORTAR O PAPO FURADO O/

Boa leitura, chuchus! <3

Capítulo 54 - Passado presente


Hanji chegou ao escritório com um humor anormalmente excelente. Sentia que havia feito um bem para o melhor amigo que mais ninguém poderia fazer, só faltava contar a ele. Sempre que imaginava a expressão surpresa de Levi quando contasse sobre o encontro da noite passada, sentia um frio na barriga. Estava louca para contar ao menor, mas esperaria um momento mais oportuno para fazer-lhe uma surpresa.

Praticamente saltitante, atravessou os corredores da agência cumprimentando até mesmo quem não tinha afinidade nenhuma com ela — o que foi incômodo, mas não estranho, visto que tudo era esperado vindo de Hanji. Passou pela frente do escritório da Equipe de Casos Especiais e conteve a vontade de entrar para dar bom dia. Sabia que, se o fizesse, não resistiria e sorriria feito uma boba para o melhor amigo, entregando-se por completo. Porém, ao passar na frente da porta incomumente aberta, deparou-se com a mesa de Levi vazia. Na ponta dos pés, esgueirou-se pela porta para checar o interior, e confirmou o que pensava: o baixinho de cabelos negros não se encontrava ali.

— Bom, dia, pimpolhos! — cantarolou enquanto adentrava. Colocou sua bolsa em cima da mesa do melhor amigo e então se virou para os amigos. — Como foi o encontro com o moreno lindo modelo da Levi’s? — brincou enquanto dava palminhas. — Quero saber de tudo!

Todos da equipe se retraíram e murmuraram um “bom dia” discreto, com os olhos focados em qualquer lugar da sala. Todos, exceto por um certo integrante de cabelos cinzentos que logo fez uma carranca ao notar a presença da morena.

— “Modelo da Levi’s”, que trocadilho infeliz — murmurou Oluo, claramente insatisfeito. — Verdade, será que devemos contar antes que seja tarde demais e acabarmos sendo despejados daqui? — resmungou, cruzando os braços.

— Oluo, não exagera — respondeu Petra, mas na realidade tão insegura quanto o parceiro.

— Despejados? — repetiu a morena, agora adotando um semblante mais sério. — O que aconteceu?

— Você é quem nos diz! — resmungou o de cabelo platinado, pondo os braços para cima. — Eu até agora quero entender o que diabos deu naquele pirralho psicótico!

— Não precisa exagerar — repreendeu Gunther, sem firmeza nenhuma na voz. — Mas também acho que ele...

— Quando é que alguém vai me explicar o que aconteceu? — reclamou Hanji, pondo as mãos no quadril.

— Fomos até o colégio que você nos disse — contou Eld, após um longo suspiro. — E encontramos esse tal de Eren.

— Essa parte eu já entendi, quero saber o que aconteceu depois.

— Esse é o problema, nem nós entendemos o que foi aquilo — interveio Petra. — Ele fez uma cara de pânico assim que nos viu e começou a correr feito um louco. Pensamos que poderia ter visto alguém que estava o ameaçando, ou que tinha alguma rixa no colégio, mas...

— Mas acabou que o assunto era com a gente mesmo — completou Gunther. — O moleque achou que éramos da máfia, ficou virado no cacete quando o encurralamos, Petra até teve que atirar.

Gunther! — repreendeu a ruiva, visivelmente nervosa com o tópico levantado.

— Atirar? Você atirou nele? — disse Hanji, num misto de surpresa e raiva que fez com que todos que assistiam a cena sentissem um calafrio descer-lhes a espinha. — Você está louca?

— N-não! E-eu só... — gaguejou Petra, pondo as mãos para frente num gesto instintivo de autodefesa.

— Ela só estava tentando se defender — interrompeu Oluo, igualmente irritadiço. — Afinal de contas, era uma luta injusta.

— Injusta? — rosnou Hanji. — Eram quatro adultos contra um adolescente. Como isso pode ser injusto?

— Eram quatro adultos que não podiam triscar um dedo no garoto enquanto o garoto podia meter murros e chutes em nós.

— Ah, claro, e dar um tiro é muito melhor do que revidar um murro — ironizou a morena, quase no auge de sua ira. — Eu juro que se vocês tiverem feito algum mal àquele garoto, eu mesma cuido de...

— Ele está bem — disse Eld, antes que a ameaça fosse feita. — Ficou com alguns arranhões, já que o imobilizamos no asfalto de um beco, mas está bem.

— Sorte a de vocês, porque senão quando Levi descobrir...

— O Heichou também já sabe — lamentou o loiro, apertando a ponte do nariz com o polegar e o indicador. — Aparentemente, o garoto ligou para ele enquanto corria. E o chefe viu tudo...

— Puta merda, não era pra nada disso ter acontecido! — praguejou a morena, quase arrancando os cabelos.

— E nada teria acontecido, se aquele moleque não fosse um transtornado! — acusou Oluo.

— Como isso pode ter sido culpa dele?!

— Eu geralmente não costumo transferir a culpa para os outros, mas dessa vez temo ter que concordar com Oluo — disse Eld, cruzando os braços. — Por que ele fugiu de nós, para início de conversa? Vocês não tinham conversado?

— Eu liguei, mas caiu na caixa — resmungou Hanji. — Acho que ele ainda estava na última aula, então mandei mensagem.

— E ele respondeu?

— Que tipo de adolescente não olha o celular assim que a aula acaba?

— O tipo que tem treino de baseball logo em seguida. — As peças finalmente estavam se encaixando na cabeça de Eld. — Então quer dizer que ele não respondeu?

Hanji arregalou os olhos quando também chegou à mesma conclusão.

— Ai meu Deus... — murmurou a morena. — Ele não deve ter checado o celular...

— Provavelmente não — confirmou Eld.

— E nós aparecemos como um bando de palhaços na frente dele — resmungou Oluo. — Eu sabia que isso não ia dar certo, você devia ter ido junto.

— Não dava, eu fiquei até tarde conversando com algumas vítimas hospitalizadas — justificou-se a de óculos. — Caramba, agora tudo faz sentido...

— Bom dia, policiais competentes e responsáveis — cumprimentou Levi, com uma expressão de poucos amigos e voz tão ácida quanto o seu sarcasmo. — E vejam só que surpresa, se não é a minha ex-parceira que jurou nunca me deixar na mão. Que encontro feliz, não é mesmo?

 

 

Ymir não demorou muito para achar Bertolt. O amigo estava nas escadas que levavam para o terraço, acompanhado de outros três garotos que, dada a fisionomia, provavelmente se tratavam de veteranos — o olhar jocoso em sua direção também facilitava o julgamento.

— Vaza — murmurou a morena, apontando o polegar sobre seu ombro para o corredor atrás de si.

— O quê? — indagou um dos garotos, enquanto os outros dois apenas lhe direcionavam sorrisinhos indiscretos. Enquanto Bertolt, limitava-se a arquear as sobrancelhas, demonstrando divertimento.

Vaza. — Ymir podia não ter a fama de “boa de briga” como seus amigos, mas com certeza não precisava disso. Tudo que precisava era de seu tom de voz perfeitamente macabro e seu olhar de poucos amigos, que sem falha mexia com os que não estavam habituados. E aquela vez não foi exceção.

— O que uma pirralha do segundo ano... — murmurou outro com a voz vacilante, que logo se interrompeu ao ouvir Ymir o cortar com muito mais propriedade.

— É melhor vocês irem — disse em tom de ameaça.

Os veteranos não ficaram muito felizes com a forma ousada com que a mais nova os enfrentava, mas a realidade era que não estavam a fim de procurar por problema àquela hora da manhã, ainda mais para conversar com um garoto que sequer os defendia. Na verdade, Bertolt parecia muito mais interessado no que a garota tinha para dizer do que nas besteiras que conversavam. Sendo assim, os três apenas se levantaram dos degraus nos quais estavam sentados e, após olhar Ymir de cima a baixo com desgosto, se retiraram.

A morena, porém, manteve os olhos fixos nos de coloração escura à sua frente. Estes que retribuíam o olhar de forma intensa e curiosa, demonstrando abertamente a surpresa que sentia por vê-la ali, quase se encrencando com veteranos — o que era extremamente incomum vindo dela —, apenas para que conversassem. Depois de alguns segundos, Bertolt abriu um amplo sorriso e deu dois tapinhas no lugar vago ao seu lado no degrau. Ymir manteve-se impassível em pé exatamente onde estava, confirmando que ficaria ali ao cruzar os braços. O moreno abaixou a cabeça para conter um sorriso e então relaxou um pouco mais.

— Não é comum você vir falar diretamente comigo — disse Bertolt, retomando o contato visual.

— Não é comum você não ter Reiner por perto.

Aquela constatação tirou o sorriso do garoto.

— Eu não preciso dele para me vigiar vinte e quatro horas por dia.

— Nossa, o que tem de errado com você? Está agindo tão estranho — ironizou a de pele pintada, revirando os olhos.

— Eu acho... que preciso começar a ser mais independente — respondeu abertamente, olhando-a profundamente nos olhos. Estes que se estreitaram quando percebeu a seriedade nas palavras. — Sinto essas cobranças dos Titãs às vezes, e tento mostrar ao máximo que posso agir sozinho sem problemas.

— Mas vocês são... — “Vocês são uma dupla”, ia dizer quase que no automático. Porém, para sua felicidade, foi capaz de repreender-se antes de pôr os pensamentos em palavras. — Não me conte essas coisas, não quero saber.

— Aí está algo que não é incomum — disse o outro, rindo novamente.

— O quê?

— Você não querer se aproximar.

— Engraçado ouvir isso da pessoa que está tentando afastar até mesmo a garota que ama.

Outra vez, Ymir foi capaz de tirar-lhe o sorriso que mal surgiu em seus lábios. Parecia que aquele era o passatempo da morena de pele pintada.

— Não pergunta nada, mas também não deixa nem um  detalhe passar despercebido, não é mesmo? — constatou Bert, agora um pouco mais amargo.

— Vamos acabar logo com isso — murmurou a garota, jogando a cabeça para trás para demonstrar o quanto queria logo sair dali.

— Antes, deixe-me te perguntar uma coisa que vem me incomodando há algum tempo. — Bert, da mesma forma que fazia quando estava lidando com negócios, a analisou minuciosamente para checar a reação que teria. Sendo assim, não deixou escapar o exato momento em que Ymir engoliu em seco, o que indicava que ela, de fato, ficava nervosa em sua presença. Arriscaria  um palpite e diria que Ymir ficava muito mais nervosa do que como ela ficava quando perto de Reiner. — Se não quer se aproximar ou qualquer coisa do tipo, por que sempre me ajuda?

— Eu... tenho meus motivos — disse sem encará-lo, mais concentrada em pôr as mãos nos bolsos do casaco.

O moreno estreitou os olhos para a garota, tentando verdadeiramente entender sua  forma estranha de agir. Ela sempre fora assim, desde que se viram pela primeira vez no primeiro ano, quando o grupo se conheceu. Para ser sincero, Bertolt sempre teve uma estranha sensação de déjà-vu em relação à amiga, mas nunca chegou a conversar sobre isso com ela. Até porque ela mal dava abertura para uma conversa casual, quanto mais sobre a estranha sensação que tinha sempre que a olhava nos olhos.

No final, desistiu de insistir nos motivos da garota para querer ajudá-lo. No final, só haviam benefícios, então não via porquê não aceitar. Após um longo suspiro, decidiu ir logo para a parte da conversa que realmente interessava.

— Ok, sou todo ouvidos.

Ymir soltou a respiração que nem ela mesma havia percebido que estava segurando.

— Soube que Eren se meteu em uma confusão?

— Conte-me uma novidade, por favor — resmungou ácido, revirando os olhos.

— Não foi uma confusão qualquer. Disseram que tinha uns homens atrás dele, perseguição com carro e tudo.

— É sério?

— Também ouvi falar que deu até polícia no lugar, ou algo do tipo.

— Hm... — Bertolt finalmente mudou a postura, agora muito mais entretido pela conversa. Passou uma mão pelo queixo apenas para tentar disfarçar o sorrisinho de satisfação que se alojava em seus lábios. — Ok, mas isso...

— E tem mais — continuou Ymir. — Ficou sabendo que teve uns tiros num beco não muito longe daqui?

O quê?

— Coincidência ou não, bate com os horários do Jäeger. Não foi muito depois do treino de baseball, pelo que fiquei sabendo.

— E como você sabe de tudo isso?

— Os tiros foi porque uns caras me contaram ontem de noite, eles estavam perto do lugar. Eu só fui ligar isso ao Eren depois que eu escutei uma conversa entre Armin, Jean e Marco hoje de manhã.

— Marco sabe do que aconteceu?

— Provavelmente até com mais detalhes, já que estavam todos conversando sobre isso.

— Bom... Muito bom. — O sorriso do moreno apenas se alastrava, ganhando um tom quase macabro.

— O que mais me deixou incomodada era que Armin não parecia muito preocupado com Eren. — Ymir seguiu com a narração dos fatos, tentando ignorar ao máximo a feição assustadora do amigo. — Ele falava mais como se... Sei lá, como se estivesse preocupado com o que teria acontecido aos caras que estavam atrás do suicida. Achei isso estranho, já que ele e Mikasa são meio neuróticos com o Jäeger.

— E com razão. — Bertolt já não conseguia mais esconder a felicidade doentia que sentia ao ouvir tudo aquilo. — Mais alguma coisa? Sabe se alguém foi assassinado?

— Assassinado?

— Houve tiros, não foi?

— S-sim, mas...

— E como estava o Jäeger? Com a cara quebrada? Algum machucado sério, ou coisa do tipo?

— Ele me parecia bem, na verdade. — Deu de ombros. — Está com um arranhão bem de leve na mandíbula, mas nada muito chamativo. Na verdade, eu me atrevo a dizer que ele parecia até feliz, para alguém que foi perseguido.

— A serenidade de alguém que acabou de eliminar seus alvos — sussurrou, mais pensando em voz alta do que de fato falando com  a morena.

Bertolt — repreendeu Ymir, sabendo exatamente a  linha de raciocínio do amigo. — Você não tem provas pra fazer uma acusação dessas. Pelo menos, não dessa vez.

— Isso não é um problema. — O moreno se levantou quase que em um  pulo. Sentia o sangue ferver com aquelas notícias, só não sabia se era de raiva ou de entusiasmo. — Dessa vez, Eren não sai ileso. Está na hora de alguém mostrar pra ele que ele não pode fazer o que quiser e quando quiser. E eu sei exatamente como fazer isso.

Dito aquilo, Bertolt simplesmente passou por Ymir, sem agradecer ou despedir-se, e seguiu seu rumo. A garota de pele pintada respirou fundo algumas vezes, só então notando o quanto estava nervosa. Quem a olhasse por fora, acharia que ela estava perfeita em sua cobertura de indiferença como sempre, mas bastava pôr a mão em seu peito que sentiria o batimento levemente alterado.

Eram tantas memórias que lhe passavam pela cabeça que não sabia exatamente no que pensar. Dentre as várias perguntas que lhe saltavam, a que mais a incomodava era “Por quanto mais tempo pretende continuar nessa farsa?”. Sabia que tinha que se redimir, mas... Até onde teria que se afundar para que sentisse que estaria tudo bem?

— Ymir?

No mesmo instante, a morena deu um pulo e virou-se. Reconheceria aquela voz mesmo se estivesse de fones de ouvido, então não ficou muito preocupada com o que a outra poderia ter visto ou ouvido, só... Não queria que isso acontecesse.

— Christa? — perguntou a de pele pintada, ainda com algum nervosismo em sua voz. — O que está fazendo aqui? Por que não me esperou na sala?

— Porque eu fiquei preocupada — admitiu a loira. Depois de um suspiro, foi até a outra e segurou-lhe a mão firmemente. — Você estava agindo estranho hoje de manhã, e Mikasa ficou bem pilhada com isso.

— Ah, Mikasa sendo Mikasa, pra variar — resmungou, revirando os olhos. — Ainda arranjo uns calmantes pra ver se ajuda a garota.

— Sorte a minha que Eren e os meninos chegaram, e aí ela se distraiu com eles. — Ia continuar falando, mas percebeu que a outra adotou um semblante estranhamente vago ao escutar o nome do amigo de olhos verdes. — Ymir? Está tudo bem?

— Hm? A-ah... está sim. — Inclinou-se para deixar um casto, mas carinhoso, beijo no topo da testa da menor. — Só estou pensativa. Vem, vamos voltar pra sala, antes que mais alguém além de Mikasa comece a encrencar comigo.

— O que não é lá muito difícil — brincou a loira enquanto deixava-se ser guiada pela mão quente entrelaçada com a sua.

— Ei, Chris... — murmurou a mais alta, sem conseguir encará-la nos olhos. — Você... ouviu o que eu estava conversando com Bertolt?

Depois de um curto — quase imperceptível — momento de silêncio, a loira responde com um tom de voz forçosamente animado.

— Ah, você conseguiu achar o Bert? Nem vi que vocês estavam conversando!

 

O clima na sala ficou ainda mais tenso com a chegada do líder. O desconforto reinava no peito de todos ali presentes, até mesmo no do próprio Levi.

— Ei, Raviolle... — chamou Hanji num fio de voz.

— Não me vem com essa merda agora, Zöe — rosnou o menor, cerrando os olhos para a morena.

— Vocês eram... parceiros? — Gunther arriscou perguntar.

— Claro que éramos. Por que outro motivo eu confiaria nessa louca? — Levi dirigiu-lhe outro olhar afiado. — Se bem que “confiar” agora parece uma palavra um pouco inadequada.

— Está mesmo tão irritado assim? — murmurou Hanji, entrelaçando os próprios dedos.

— Pareço estar brincando?

— Só acho que você está exagerando, Levi.

Aquela foi a gota d’água. O homem de olhos cinzentos fuzilou a amiga apenas estreitando as pálpebras e atirou a pasta que tinha em cima da mesa. O barulho fez com que Hanji desse um pulo enquanto suava frio. Não era incomum os dois brigarem, mas era, sim, incomum Levi adotar aquela postura com ela.

Aquilo não estava nada bem.

— Exagerando, Hanji? Faz ideia de como Eren ficou depois do que aconteceu?! — Levi rosnava, muito próximo de chegar a gritar. A cada palavra, a mulher se retraia cada vez mais. — E tudo por uma palhaçada sua!

— Você nem ouviu a história pra vir me julgar! — devolveu a morena, mas não muito segura de seus argumentos.

— Eu ouvi tudo ali da porta, estúpida!

— Rivaille, você não fale assim comigo!

— Como você espera que eu fale?! — Agora, Levi tinha chegado ao ponto de se exaltar, o que surpreendeu a todos de sua equipe.

— Sinceramente, Levi. Eu entendo que você goste do garoto, mas vir falar comigo dessa forma por causa de um acidente com ele já é demais. — Percebeu a fúria crescente do melhor amigo e apressou-se a falar antes que ele explodisse em palavras. — Foi só um acidente! Por que você está tão transtornado?

— Hanji, Eren quase levou um tiro! — esbravejou o menor. — Eu juro que teria exposto seus órgãos em praça pública se alguma coisa séria acontecesse com ele!

— Não fui eu que puxei o gatilho! — gritou Hanji de volta, começando a desesperar-se com o estado do amigo. — Levi, por favor, se acalma!

— Ah, agora você me pede calma? Vem cá, você pensou com calma quando teve essa ideia ridícula e insensata?!

— Ninguém teria imaginado nesse final, Levi. Não foi culpa minha!

Os dois finalmente pararam de atirar acusações e apenas se encaravam. Nenhum dos integrantes da equipe teve coragem de interromper aquele momento, tão singelo e, ao mesmo tempo, tão íntimo. O olhar de Levi era intenso sobre o de Hanji, que era atento e cauteloso. Passados alguns segundos naquela mesma situação, o menor avançou lentamente até ficar a poucos centímetros da morena. Gunther pensou em ir para separar os dois — nunca se sabe o que os dois agentes mais insanos da agência podem fazer quando de cabeça quente —, porém, foi impedido por um puxão de Eld.

— Eu não queria ter que dizer isso, mas... — sussurrou o homem de cabelos negros com o tom de voz claramente contido.

— Dizer o quê, que é pra me afastar do seu namoradinho? — caçoou Hanji. — Levi, foi só um acidente, um mal-entendido.

— Que não teria acontecido se eu não tivesse apresentado os dois.

— Foi ele que disse que queria conhecer seus amigos, o que eu fiz foi apenas tentar...

— Sem me perguntar primeiro? — Estalou a língua. — Vem cá, minha opinião não conta nem um pouco?

— Pra você ser contra, como sempre?

— Por algum motivo eu sou contra.

Hanji não conseguiu evitar revirar os olhos.

— Você se envergonha de nós, é isso? — murmurou a morena, cruzando os braços.

— Quantos anos você acha que tem para me fazer uma pergunta de merda dessas?

— É a única explicação que eu tenho para essa sua atitude de cuzão, porque, sinceramente, eu não estou te entendendo.

— E quando é que você me entende? — resmungou Levi, massageando as têmporas. Afastou-se o suficiente para recostar-se à mesa mais próxima. — Eu só quero manter ele o mais afastado possível de todo esse caos.

— Você nos considera “caos”? — indagou Hanji, quase ofendida.

— Você sabe do que eu estou falando — reclamou o menos, balançando uma mão para ela. — Não quero que ele se meta em confusão, ou que algo lhe aconteça...

— E por isso mesmo você deveria contar com a gente — interrompeu Eld. Ambos os líderes se surpreenderam com a intromissão do loiro, e justamente pela surpresa que se mantiveram calados. Com o silêncio, o segundo no comando pôde continuar com sua linha de raciocínio. — Heichou, nós entendemos que você se preocupe com a integridade de Eren. Mas nós estamos ao lado da polícia, não somos os bandidos. É bom que ele nos conheça, e que saiba que pode contar conosco caso precise. Afinal de contas, quanto mais pessoas, melhor, não é?

Levi permaneceu algum tempo pasmo, completamente sem palavras. Contar com outras pessoas nunca sequer fez parte de seu vocabulário, principalmente quando se travava de um assunto importante como aquele. Teve que considerar várias vezes o que o seu Braço Direito lhe propôs, ainda mais quando imagens da noite passada lhe atravessaram a mente.

— Cheguei em má hora? — perguntou Erwin, parado na porta da sala. Ele havia batido na porta que, por sinal, estava aberta, mas obviamente Levi estava imerso demais em  seus pensamentos para perceber tal detalhe. — Alguns agentes vieram falar comigo sobre uma briga aqui, e eu já queria conversar com você, Levi, então...

Boa sorte — resmungou Hanji enquanto pegava sua bolsa e marchava para fora da sala.

Erwin assistiu a amiga ir embora com os olhos arregalados, para depois voltar-se para Levi num misto de surpresa e divertimento.

— Hanji resmungou para mim ou é impressão minha? — perguntou o loiro de olhos azuis, apontando para si mesmo.

— Você não foi o único — murmurou Levi, passando uma mão pelo rosto. — O que quer comigo?

— Muitas coisas, para falar a verdade.

Smith — resmungou o menor, em tom de aviso. Não porque se incomodava, já que particularmente não ligava para aquelas brincadeiras enquanto não passasse para o contato físico. Porém, o olhar triplamente curioso de seus subordinados chegava a ser quase molesto. Erwin não se preocupava porque imaginava que ninguém iria entender aquelas indiretas, uma vez que Levi sempre foi contra falar de sua vida sexual com os outros. — Poupe-me dessa palhaçada e me diga logo o que veio fazer aqui.

— Hm... — O Diretor cruzou os braços, analisando o ex-namorado de cima a baixo. — Vocês brigaram mesmo dessa vez, não foi?

— Vamos pra sua sala — ordenou o menor, já se direcionando à porta.

— Também prefiro — concordou o loiro, seguindo-o com um sorriso divertido, mas confuso.

 

— Seja bem vindo de volta, Oyabun — cumprimentou William, curvando-se perante o homem de meia idade que adentrava o cabaré já acompanhado de duas damas e vários guarda-costas.

— Ah, Will! — cumprimentou Pixis, com seu sorriso mais afiado. — Sempre bom revê-lo, amigo. Já disse que não precisa de tanta formalidade comigo.

— Entendido. — Pôs-se novamente na posição ereta para poder olhar para o chefe diretamente nos olhos. Aproveitou para observar discretamente os acompanhantes, e confirmou que as duas mulheres não passavam de meros “brinquedos” de Pixis. Já os outros homens, não perderam tempo e começaram a se dispersar pelo bar que havia próximo à entrada. — Devo esperar mais alguém?

— Sim, sim — confirmou enquanto livrava-se das acompanhantes. — Um velho conhecido nosso.

William, por mais surpreso que estivesse, limitou-se a apenas arquear as sobrancelhas por milésimos de segundo, forçando mais ainda as linhas de expressão em seu rosto marcado pelos anos.

— Levi-kun se juntará a nós? — ousou perguntar, não esperando que o semblante do chefe fosse se tornar tão desgostoso.

Levi-kun? — repetiu para demonstrar seu desagrado.

— Desculpe-me, senhor. Rivaille-san — corrigiu-se com a expressão impassível.

— Melhor assim — resmungou enquanto caçava seu cantil dentro da jaqueta para tragar um gole do que provavelmente seria uísque. — Ele não virá. Não ainda.

— Mas ele está bem?

Pixis cerrou os olhos para William, pondo nos lábios um sorriso ácido que faria qualquer um dar para trás, mas não o seu velho companheiro. Este, que apenas permaneceu com seu olhar impassível, mesmo que por dentro sentisse uma pontada de angústia.

— Primeiro, você me vem com essa de “Levi-kun”, como se ele ainda fosse uma criança. Agora, vem e me pergunta se ele está bem... — Passou uma mão pelo seu bigode vasto. — Pensei que já tínhamos conversado sobre como Levi deve ser tratado.

— Alguns hábitos são difíceis de se esquecer — justificou-se, abaixando a cabeça. — Mudar a forma como o chamo é possível, mas acredito que nunca serei capaz de não me importar mais com ele.

— Seu companheirismo com ele às vezes me preocupa, Will. Cuidado com isso.

— Eu não acho que a palavra certa seja “companheirismo”. — William reergueu a cabeça para poder olhá-lo diretamente. — É mais como uma preocupação paterna, Dot. Algo que você deveria entender melhor do que eu.

Pixis ficou pasmo com a resposta do amigo. O que não durou muito tempo, pois logo adotou um semblante enfurecido e quase o puxou pelo colarinho para soltar alguns desaforos, se não tivesse sido interrompido. Um pigarreio vindo de trás de si chamou sua atenção, que acabou por ser justamente a pessoa que esperava: Rod Reiss, um homem de meia idade que precisava urgentemente dar um jeito nos ralos fios do que deveria ser um bigode, porém, muito mal cuidado. Ele vestia uma roupa social preta com uma camisa branca de botão por debaixo, e um chapéu igualmente negro para terminar de compor a vestimenta.

— Estou interrompendo alguma coisa? — perguntou o recém-chegado, retirando o chapéu ao adentrar o local.

— Não, não é um problema. — Pixis deu uma última olhada em William, com a intenção de repreendê-lo. — Nós teremos bastante tempo para conversar depois.

William apenas se curvou, numa forma de respeito tanto pelo chefe quanto pelo representante da família Reiss. Ambos passaram pela figura reverente e foram para onde sempre iam ao se encontrarem. Não era exatamente uma reunião oficial, já que tanto a localização quanto o número de pessoas na discussão não eram adequados para tomar decisões importantes. Todavia, Pixis via em Rod um excelente companheiro para, pelo menos, trocar ideias. Neste caso em específico, o qual sabia que Rod tomaria uma parte importante da decisão final, era vantajoso que soubesse dos próximos passos do amigo.

— Aqui estamos — anunciou Pixis, abrindo a porta de uma sala pequena, mas aconchegante, para que o outro entrasse. — Espero que não tenha se incomodado com William.

— Não, não foi um problema — murmurou Rod, mesmo que desgostoso. Apossou-se de uma das garrafas de bebida que havia na mesinha de centro e encheu dois corpos, servindo um para o amigo. — Mesmo os clãs superiores estão cientes da admiração que o melhor assassino da Yakuza tem dentre os de classe mais baixa.

— É porque ele saiu desse buraco — caçoou Pixis, tragando da bebida no copo. — Ele é visto como um herói, só não entendo o porquê.

— Isso não importa, o que importa é o que faremos com ele — resmungou o outro, passando uma mão pelo queixo. — Sabe que os clãs mais nobres estão cada vez mais irritados com as atitudes dele.

— Isso não é novidade, era assim desde que esse moleque aprendeu a usar uma faca.

— Há quem diga que ele é o culpado pela morte de Kenny — acusou Rod, adotando um tom de voz mais baixo e sombrio. — Todos sabemos que o Ackerman tinha uma atitude de merda, mas uma lealdade incontestável. E que, coincidentemente ou não, também foi chamado de herói ao se tornar o maior caçador de polícia do submundo.

— O que está sugerindo? — murmurou o calvo, rindo forçosamente. — Que Levi nos traiu e Kenny levou a culpa em seu lugar?

— Não é impossível, sabemos do histórico dos dois.

— Eles se odiavam — lembrou com tom de aviso. — Kenny muitas vezes bebia e tentava arrancar o pescoço de Levi fora. Era uma desgraça tentar impedi-lo, não sei se está lembrado disso.

— Mas isso era quando Levi era criança.

— E já não te diz alguma coisa?

— Todos sabemos que o moleque só saiu desse puteiro de merda e foi para o subsolo treinar com os outros por causa de Kenny. Dot, só você não vê isso... Kenny foi a porta de entrada de Levi para a Yakuza.

— Vai ver ele achava que Levi ia morrer mais rápido se entrasse. — Pixis deu de ombros enquanto dava mais um gole na bebida. Aquela conversa estava começando a deixá-lo nervoso, principalmente porque temia que Rod, uma hora ou outra, fosse encurralá-lo. — Levi era um magrelo que mal conseguia se colocar de pé. Quem acharia que uma criatura ridícula daquela iria se tornar uma verdadeira dor de cabeça pra Yakuza?

— Kenny — insistiu Rod, completamente impassível. — Ele viu algo em Levi, e por isso treinou o moleque pessoalmente.

— Kenny não treinou Levi, ele estava junto com os outros no...

— Não adianta tentar disfarçar, Dot — reclamou Rod, cada vez mais impaciente com a insistência na mentira do amigo. — Criança nenhuma iria saber lidar com um Yakuza com a facilidade que Levi teve. Você deve se lembrar muito bem do rito de passagem dele. — Com aquele argumento, Pixis apenas engoliu suas palavras. Sabia que o outro tinha razão. — Ackerman tinha uma ligação com Rivaille. A questão é...

— A questão é o que isso tem a ver com o problema de agora — Pixis o cortou, inclinando para aproximar-se e murmurar mais baixo, mas sem perder em nada o quê de ameaça em sua voz. — O que vocês estão me pedindo é para me livrar de um de meus melhores homens, simplesmente por um capricho. Pode ser a família Reiss ou o clã que for, eu não irei mandá-lo pra Muralha se não me mostrarem exatamente por que devo sentenciá-lo à morte. Faz ideia da revolução que se iniciaria no subsolo? Ele é o orgulho e a inspiração daquele povo. Atrevo-me a dizer que até os que fazem parte das favelas da superfície entrariam na revolta, já que é uma espécie de herói para eles.

— E no que isso acarretaria? Eles não são nem um terço do que a Yakuza é.

— Mas representa mais da metade do total que temos nessa área. É muito a se perder.

Rod murmurou uma ofensa qualquer enquanto apertava com força a ponte do nariz. Aquela discussão não estava indo nem um pouco como esperava.

— Levi não é um mártir, Dot — Rod falou pausadamente, como se tentasse se convencer além do amigo. — Ok, ele foi uma peça fundamental nas três invasões que a polícia fez em nosso território, mas...

— Quer mais?

— Olha, Pixis...

— Não, Reiss, é você que tem que me explicar o porquê dessa insistência toda em cima dele.

— Nós não confiamos nele! — rosnou Rod, explodindo as palavras que prendera desde que pisara naquele cabaré. — Não percebe? Ele é uma farsa! Conquistou a simpatia de todos para agora se virar contra você! É o que o clã dos Ackerman sempre quis!

— Levi não é um maldito Ackerman! — explodiu Pixis de volta. — Será que vocês não entendem isso?!

— Ele foi criado por um!

— Ele foi criado por mim! — gritou, fazendo o amigo dar para trás. — Levi é o meu maldito filho!

Rod o olhou no fundo dos olhos de Pixis, como se quisesse decifrá-lo além das palavras que dizia. Assim que o calvo reestabeleceu a calma, um sorriso discreto e felino surgiu no canto da boca do membro dos Reiss.

— Foi você que fodeu Kuchel e deixou ela morrer?

— Bem que eu queria — resmungou Pixis, pegando de uma vez a garrafa e virando no gargalo mesmo. — A puta era gostosa.

— E de onde você tirou esse espírito de paternidade?

— Do meu cu, Rod — atirou as palavras grosseiramente, o que apenas fez o outro rir mais. — Sabe que eu não posso ter filhos, o que é uma vergonha para o líder da Yakuza.

— E isso faz com que seja pai de todo mundo agora?

— Não é todo mundo... — Mais uma tragada. — Aquele moleque é especial.

— Especial só se for no tratamento que você dá pra ele — caçoou Reiss, levantando-se para dar dois tapas no ombro do outro. — Vamos.

— Para onde?

— Para fora, já conversamos o que eu queria.

— Não faço tudo que você quer — resmungou, mas pôs-se de pé. — E qual a sua conclusão?

— Que você não é capaz de lidar com Rivaille.

Pixis, sem mais paciência nenhuma, puxou o outro pelo colarinho e sussurrou bem próximo de seu rosto.

— Eu meti o filho da puta em uma cela por porra nenhuma apenas porque vocês decidiram que ele estava de gracinha na polícia e agora vem me dizer que eu não sei lidar com ele?

— Filho da mãe? — caçoou o outro, sabendo que o líder não passaria de ameaças. — É sério isso?

— É, é bem sério — rosnou Pixis, apertando ainda mais a roupa do amigo contra o pescoço. — As ruas de Maria foram banhadas com sangue dos nossos companheiros, e quando todos fugiram, Levi foi o único a ficar e lutar pelo que é nosso. Só com aquilo, ele já provou mais do que qualquer um que é um dos nossos.

— E por que está na polícia agora?

— Por ordem minha, e você sabe disso.

— E eu me pergunto o porquê disso... — murmurou enquanto balançava a cabeça e afastava a mão do outro de seu colarinho.

— Mete o teu focinho onde for assunto seu, Reiss.

Rod deu uma boa risada antes de dirigir-se à porta para retirar-se.

— Sempre um prazer conversar contigo, Dot.

— Gostaria de dizer o mesmo, mas você não é uma loira tesuda.

Os dois foram interrompidos por um pigarro. Ao olhar para além da porta, ambos viram a figura esguia de William parado no corredor ao lado de uma outra mais curvilínea que não tardou a ser reconhecida pelos olhos libidinosos de Pixis.

— Falando em tesuda... — murmurou o líder da Yakuza, sorrindo como se tivesse vinte anos de idade de novo. — Aí está a famosa Carmen, dona do melhor cabaré de Maria.

— Oh, poupe-me de seus comentários baratos, velho bêbado — reclamou a mulher, passando uma mão pelos cachos falsamente negros.

— Falou a adolescente — brincou Rod, que logo engoliu as palavras ao receber um olhar afiado da mulher.

— Posso não ter mais trinta anos, mas ainda estou em melhores condições do que vocês, dois patrimônios históricos tombados.

Ambos os homens deram a rir, como se a minutos atrás não estivessem a trocar ameaças. Carmen olhou sorrateiramente para ambos e permaneceu com sua melhor expressão neutra.

— Vim aqui porque os dois estavam fazendo barulho demais, e os clientes estavam incomodados.

— Vocês têm clientes até a essa hora da manhã? — perguntou Rod, verdadeiramente surpreso.

— Ficaria ainda mais pasmo se visse o movimento à noite — murmurou Pixis.

— Sabe como é, é aquela história — murmurou a mulher, mexendo nos cachos negros aparentando desinteresse. — “Não, amor, eu só estou indo para o trabalho”.

— Nossa, Carmen, esperava um pouco mais de  amor vindo de você — murmurou o representante da família Reiss, mas sem esconder o quanto se divertia com aquilo.

— Amor é a última coisa que devia esperar de mim — murmurou a mulher, mas de uma forma fria e sem emoção que fez com que Rod percebesse rapidamente que a conversa entre os dois não era exatamente o que poderia ser chamada de “amistosa”.

— B-bem, eu... Vou indo. — Rod virou-se para o amigo para estender-lhe a mão e cumprimentá-lo, gesto compreendido e retribuído pelo outro sem demora. — Foi muito bom conversar contigo, meu amigo. Vou pensar mais um pouco nas coisas que me disse. Só... dá uma segurada na bebida. E vê se fica longe do meu pescoço da próxima vez.

— Eu não prometo nada, Reiss — respondeu o outro, tão frio quanto a mulher de cabelos negros.

Rod fez um rápido cumprimento e retirou-se, sendo acompanhado de William. Assim que se viram sozinhos no corredor, Carmen virou-se para o homem e o fuzilou com os olhos. Sem dúvidas, Levi aprendera muito com ela.

— “Ele é o meu maldito filho”? — repetiu a mulher, cruzando os braços. — Eu já ouvi muita merda de você, Dot, mas essa talvez tenha sido a pérola do século.

— Não exagere, eu realmente gosto do moleque — resmungou Pixis, balançando uma mão para a morena.

Gosta… — repetiu com ironia. — Se ele dependesse de você, já tinha morrido na sarjeta.

— Qual é o problema com você e William? Agora deram para ser advogados do diabo?

El diablo aquí es usted — murmurou Carmen. Logo em seguida, aproximou-se do ouvido do outro para sussurrar-lhe em tom de aviso. — Deixe o meu menino em paz.

— Ótimo, agora todo mundo acha que é pai e mãe do moleque — reclamou, intencionando afastar-se, mas foi impedido pela mulher, que segurou-lhe a camisa para mantê-lo perto.

— Eu o acolhi quando ele era só um garotinho de cinco anos. Sem casa, sem comida ou muito menos uma mãe. Eu lhe dei abrigo e tudo que ele precisava para sobreviver, e você veio e o tirou de mim.

— Tudo o que ele precisava? Do tipo, uma aula sobre reprodução ao vivo?

Carmem o empurrou com toda a sua força, mas apenas resultou no outro cambaleando para trás. Queria estapeá-lo ali mesmo, mas sabia que isso só pioraria a situação.

— Não bastava levá-lo pro seu covil no submundo? — rosnou a mulher, ainda mais irritada quando recebeu sobre si o olhar jocoso do outro. — Eu não entendo essa proibição estúpida que me fez de chegar perto dele. Quero vê-lo, Dot, e tenho o direito disso.

— Você só é uma prostituta que deixou que o moleque visse quantas tetas quisesse. Não tem direito disso.

— Pare de bancar o durão, Dot. Por acaso está com medo que eu o convença a parar com essa palhaçada?

— Ele sabe que estará morto no momento que sair da minha proteção. — Ambos adotaram um semblante sério, quase assassino. Sabiam das verdades que diziam, e o problema era justamente que não havia um meio termo. Era tudo ou nada. — Carmen, entenda. Eu estou tentando protegê-lo, mas da minha maneira.

— Que é falha — acusou a outra, sem dó. — Não estou pedindo muito, só quero vê-lo… Estou cansada de caçar novidades por William. E eu sei que Levi só não vem mais me ver por pedido seu.

— Ele sabe o que é melhor pra ele, Carmen.

— Dot… — suspirou a mulher, cansada daquele drama. — Eu devo isso a Kuchel. Não posso abandoná-lo como fiz com ela…

Mas Pixis não deu ouvidos. simplesmente virou-se e seguiu seu caminho para o grande saguão, onde foi visto pelos seus homens e logo estavam todos reunidos. Não queria mais pensar em Levi naquele dia, seu limite para aquele maldito moleque já tinha sido ultrapassado há muito tempo.

 

— E agora que acabamos os assuntos sérios… — disse Erwin, sorrindo ternamente para o baixinho de cabelos negros. — Não vai me contar o que aconteceu entre você e Hanji?

— Ela só estava sendo ela mesma, uma louca — resmungou o menor, passando uma mão pelos fios negros de seu cabelo. — Talvez eu pense em me desculpar, se ela vier primeiro.

— SInceramente, vocês dois são duas crianças de dez anos ou o quê? — brincou o loiro, comprimindo os olhos enquanto sorria. — Qual a loucura que ela fez dessa vez? — Estranhamente, Levi se manteve calado. seus olhos sequer o captavam em seu campo de visão, pois parecia concentrado demais em algo imaginário no chão. Erwin não demorou muito para perder o sorriso. — Algo relacionado àquela correria de ontem à noite?

Bingo”, pensou o maior assim que viu o outro finalmente levantar a vista para olhá-lo com surpresa.

— Você parecia bastante preocupado — comentou com casualidade. — Era alguma coisa importante?

— É… pode-se dizer que sim — murmurou Levi, incerto de suas palavras.

— Algo relacionado à sua equipe? — arriscou outro palpite.

— Por que acha isso?

— Vocês estavam discutindo abertamente na sua sala, na frente de todos. Geralmente, você procura por lugares mais reservados pra dar um sermão nela.

— Sabe como é, eu não tenho muitas opções aqui na agência — resmungou novamente.

— Por que não me conta de uma vez o que aconteceu? — pediu com a voz manhosa. — Pensei que podíamos contar um com o outro.

— Erwin... — gemeu Levi, cobrindo o rosto com uma das mãos para esconder o rubor. — Você... não faz ideia do quanto eu queria conversar com você sobre isso...

— Mas?

— Mas não é o tipo de coisa que eu possa conversar com meu ex — disse, quase constrangido.

Erwin sentiu seu corpo paralisar. Na verdade, era mais como se o mundo estivesse em câmera lenta, até que a ficha finalmente caísse.

— Você... — Teve que clarear a garganta antes de continuar. —... Encontrou outra pessoa?

— Então... — murmurou o menor, passando uma mão pela nuca. Gesto que o fez imediatamente recriminar-se e abaixar a mão, como se estivesse insultando Erwin.

— Ah... entendi — murmurou o loiro, tentando processar aquela informação e a dor em seu peito ao mesmo tempo. — Você achou outra mulher pra usar de brinquedo e Hanji tentou avisar para a pobre coitada que é melhor ela se afastar antes de ter o coração destroçado.

— De onde você tirou essa história absurda?! — exclamou Levi, ofendido. A explosão momentânea fez com que encontrasse os olhos de um anil profundo novamente, o que o fez retrair-se novamente.

— Quantas vezes eu não já assisti o mesmo filme, Levi?

— Eu não faço isso com frequência — resmungou.

— Me diga o nome das cinco últimas mulheres com quem saiu.

— Teve a Danny, a Thaís, aquela loira e a amiga dela...

— Nomes, Levi — lembrou-lhe Erwin.

— Sabe que eu sou péssimo pra gravar nomes.

— Não é o que eu vejo nos seus relatórios.

— Isso é diferente, é meu trabalho. Se a pessoa for importante, eu com certeza vou lembrar do nome.

— As pessoas com quem você sai não são importantes então?

— Nem todas.

— Nem todas?

— Eu nunca vou me esquecer dele — disse sem pensar. Arrependeu-se no mesmo instante.

Dele? — Erwin cruzou os braços enquanto arqueava uma sobrancelha. — De quem está falando?

Levi fechou os olhos, dando um suspiro pesado. Viu em sua mente o sorriso caloroso de seu garoto ao acordar de manhã e sussurrar-lhe “bom dia”. Dos olhos verdes que transbordavam uma energia eletrizante a qual Levi se recarregava de bom grado — principalmente nos seus piores dias. Da maciez e do calor de sua pele levemente bronzeada que tinha o cheiro mais delicioso do mundo. E então a voz...

“Dorme comigo, amor...”, escutava em eco, em meio às poucas, mas preciosas lembranças que tinha de seu namorado.

“Amor...”.

— De Farlan — respondeu o menor, tão rápido que chegou a engasgar-se com a própria saliva, e teve que pigarrear para clarear a voz. — Nunca vou ser capaz de esquecer ele.

Erwin levanta uma sobrancelha novamente, não muito convencido. Porém, acaba cedendo quando percebe que havia algo diferente com a expressão de Levi... Era como se suas barreiras estivessem se abaixando, mostrando uma certa fragilidade. E, de fato, as únicas vezes que o vira se expor tanto era quando citava seu falecido e amado “irmão”, o que também era raridade.

— Vem cá — chamou, já o puxando para um abraço.

— O que está fazendo?! — resmungou o de cabelos negros assim que sentiu-se envolto pelos braços do ex. Debateu-se sem muita insistência, pois imaginava que o outro respeitaria o seu tão amado espaço pessoal. — Caralho, Erwin, eu não...

— Não estou aqui como seu ex-namorado ou chefe — disse em um tom duro quando o puxou com mais força, completando o abraço. Só quando sentiu que o menor havia se acalmado, prosseguiu, dessa vez com a voz mansa. — Estou aqui como seu amigo, Levi... Ainda não entendeu isso? Admito que agora eu queria muito poder te beijar, mas se for só de um abraço que você precise, então que assim seja.

Honestamente? Levi estava surpreso. Sabia que Erwin era insistente, e por isso não pensava que ele fosse abrir mão de cortejá-lo apenas porque Levi precisava de um amigo, não um amante. Realmente, como foi capaz de duvidar logo de Erwin? Ele podia ter os defeitos que fosse, ainda assim não podia dizer que ele não era um excelente amigo.

Aos poucos, envolveu-o com seus próprios braços e apertou-o contra si.

— Você é um idiota... — murmurou Levi, rude como sempre.

— Eu sei.

— Um idiota masoquista.

— Essa última parte é novidade — brincou o loiro. Esperava mais alguma chacota, mas o que veio foi um silêncio confortável, até que o menor o respondesse.

— Obrigado — sussurrou, quase inaudível.

Erwin ficou em estado de choque por alguns segundos. Mesmo depois de já ter relaxado — e sorrido —, não soube exatamente o que fazer depois daquele agradecimento e ficou quieto, apenas aproveitando o tempo que ainda tinha com ele em seus braços.

Mais um tempo abraçados.

— Eu queria ser capaz de esquecer todo o caos da minha vida — segredou-lhe Levi, hesitante. — Esquecer de todo o fardo que eu tenho que carregar. Esquecer de toda essa merda e... não sei, ser alguém melhor. Que pudesse estar com alguém e não me sentir culpado por isso.

Era como se aquelas palavras perfurassem o corpo de Erwin. Tinha plena consciência — mais do que ninguém — da dor de Levi ao escutar as amaldiçoadas palavras: “eu te amo”. Sabia também que esse foi o verdadeiro motivo principal da separação dos dois, por mais que o menor inventasse desculpas diferentes... O problema era que não sabia que o sentimento não era recíproco. Acreditava que Levi o amava mais do que somente como amigo, e que apenas não tinha coragem de admitir isso para si mesmo devido à perda de Farlan.

E por acreditar nisso, esperaria.

Um dia, ele iria encontrar o perdão mais precioso — o perdão a si próprio —, e conseguiria seguir em frente. Poderia amar de novo. Ou melhor, poderia admitir que o amava também. Erwin nunca se apaixonou por alguém como havia se apaixonado por Levi, foi uma conexão arrebatadora que sentiu assim que seus corpos se tocaram. Amava sua teimosia, sua dedicação, sua lealdade... Amava a relação de confiança que tinham. E por isso, por tudo isso que Levi era e representava para si, esperaria.

— A palavra que você procura não é esquecer, e sim superar — explicou com ternura.

— Porra de superar, Erwin...

— Se você não consegue se perdoar por tudo que aconteceu, então é porque você ainda não superou. — Afastou-se apenas o suficiente para olhá-lo nos olhos e pôs as duas mãos nos ombros do menor. — Você é tão digno de uma vida feliz quanto qualquer outra pessoa, Levi. O que eu vejo na minha frente não é um monstro homicida como você pensa que é. Eu vejo um homem com um excelente dom pra luta corporal, com uma insana habilidade assassina, mas que também é um dos maiores covardes que eu já conheci.

Covarde? — repetiu Levi, indignado.

— Covarde porque não tem coragem de enfrentar seu passado, seus medos, e admitir que é merecedor de tudo que você tem hoje. Uma casa, um trabalho digno, amigos... pessoas que te amam e se importam contigo.

— Fácil falar quando se é o menino do berço de ouro — atirou Levi, dando um passo para trás e tirando as mãos do outro sobre si. — Eu tirei a vida de muitos, e arruinei a vida de ainda mais gente. Faz ideia do que é carregar o peso de uma vida, Erwin?

— Sabe que sei. Infelizmente, esse é um cargo que eu também carrego.

— De quantos, treze?

— Não se trata de quantidade, Levi...

— Trata sim — rosnou. — Quarenta e cinco é o que os arquivos têm de mim como policial. Mas na vida... eu já passei dos cem há muito tempo. Muito tempo.

Os dois permaneceram em silêncio, concentrados na conversa muda que seus olhos trocavam. Estavam tão imersos um no outro que sequer notaram quando Mike bateu na porta. Por não ter nenhuma resposta, abriu a porta sem medo — afinal de contas, aquela sala era sua também, já que era o vice-diretor. Porém, não se deparou com o vazio da sala... e sim com o chefe em um momento um tanto íntimo com seu subordinado. Só de ver a forma intensa como se olhavam já deixava claro o que estava acontecendo ali.

— Estou interrompendo alguma coisa? — perguntou Mike, com um discreto desgosto na voz.

Levi praticamente dá um pulo ao escutá-lo, realmente assustado — o que não era nem um pouco comum. Erwin apenas olha para o amigo e suspira com pesar, dando-lhe um olhar cansado como se dissesse “você tinha que chegar agora, não é?”.

— Não, não era nada — resmungou o loiro dos olhos azuis. — Diga, Mike.

— A equipe cinco teve alguns problemas com a mídia — disse o maior, sem rodeios e com a voz completamente profissional. — Estão discutindo agora se medidas mais sérias precisam ser tomadas, e a sua presença lá é mais do que necessária.

— Entendo... — murmura pensativo. Realmente, não tinha o que fazer. Antes de seguir o amigo, foi até o homem de cabelos escuros e olhos felinos e deixou um casto beijo em meio aos fios negros. — Fica bem, baixinho — sussurrou, esperando alguma resposta agressiva pelo apelido pejorativo, mas Levi apenas assentiu. Com isso, Erwin segue com Mike corredor afora. — Detesto quando esses ratos da mídia aparecem pra começar com essa palhaçada...

E assim, resmungando, os dois se retiram. Mas antes, Mike não pôde deixar de dar um olhar afiado para Levi, que se limitou a revirar os olhos e ignorar. Quando se viu sozinho, passou uma mão pelos cabelos enquanto suspirava pesadamente, tentando pôr em ordem todo o caos que estava em sua cabeça naquele momento, depois do nó que Erwin deu em sua cabeça — um dom que ele tinha, com certeza.

Com o coração pesado, saiu daquele lugar que começava a deixá-lo nauseado. A passos largos, foi até sua sala e entrou sem cerimônia alguma, assustando os subordinados da mesma forma que Mike havia feito consigo. Com sorte, viu que Hanji já não se encontrava mais ali — provavelmente, foi trabalhar de verdade. Sendo assim, não fez questão de dar explicações aos olhos curiosos recaídos sobre si.

— Petra, comece a juntar todos os locais rastreados, eu quero as imagens das câmeras que tiver — ordenou ao sentar-se em sua mesa, sem perder mais tempo.

Sem nem pensar duas vezes, os outros se puseram a trabalhar também, todos calados e concentrados.

Já era pouco depois das seis da noite. Todos da Equipe de Casos Especiais já estavam reunindo o resto dos materiais coletados hoje, à exceção de Levi, que ficou no escritório apenas monitorando devido ao seu afastamento do trabalho em campo. O chefe, por sinal, já estava ficando realmente irritado com aquela situação, e planejava em algum momento ir até o “todo-poderoso” Zackley questionar seu afastamento — mesmo que já estivesse encrencado demais para querer exigir alguma coisa do chefe.

Estavam prestes a deixar o escritório, todos em silêncio, como estiveram durante o dia inteiro. Depois da discussão entre o chefe e a outra líder de esquadrão, mas ninguém sequer pensou em tocar novamente nesse assunto. Na verdade, não ousaram tocar em mais assunto nenhum; o silêncio entre os membros era quase sepulcral, como nunca antes foi. Sem piadas, sem brincadeiras, sem momentos descontraídos.

E o dia acabaria assim, os diálogos reduzidos a quase nada, se da porta não ecoasse três tímidas batidas, tão modestas que quase passaram despercebidas. Levi arqueou uma sobrancelha e suspirou. Esperava que viesse, uma hora ou outra.

Timidamente, a porta foi aberta, e dela surgiu uma cabeleira cor de avelã, bagunçado daquele jeito único e peculiar que só aquela mulher conseguia deixar. Hanji adentrou na sala dando cada passo cuidadosamente, como se esperasse entrar num campo minado a qualquer segundo. A mulher parou na frente da mesa do amigo, fazendo aquele olhar manhoso que Levi não só conhecia muito bem como adorava, só não admitiria em voz alta para que a morena não se aproveitasse dessa “arma secreta”.

Sendo assim, fez de tudo para tentar manter-se impassível perante àqueles olhos brilhantes, mas o sorrisinho que se formou no canto de seus lábios foi mais forte. Sorriso que foi refletido nos lábios da morena, porém com maior abertura e leveza, num gesto sutil de gratidão. Outro gesto de gratidão que se seguiu, só que desta vez sem metade da sutileza, foi o abraço que Hanji ofereceu ao dar a volta pela mesa, correndo de encontro ao amigo. Levi a acolheu em seus braços, dando-lhe ainda alguns afagos no largo de suas costas. Com isso, a mulher o apertou ainda mais forte, e murmurou em seu ouvido.

— Eu sou uma idiota cabeça de vento. E sinto muito, muito mesmo.

— Ainda bem que sabe que só tem merda nessa sua cabeça — caçoou o outro em resposta, dando um riso contido e nasalado.

— Não foi isso que eu disse — resmungou.

— E que nem por isso deixa de ser verdade. — Pensou que retrucaria de volta, mas ela se manteve em silêncio. Aquele abraço demorado o fez lembrar de outro que recebera mais cedo, de um loiro insistente que se mostrava sempre disposto a ajudá-lo, e por isso seu coração se comprimia. — Eu também não devia ter gritado com você daquela forma.

— Isso está parecendo uma reconciliação de casal! — disse Hanji entre risos.

— Cale a boca, maldita quatro-olhos, eu estou tentando falar alguma coisa decente aqui.

— Não se preocupe, amor, eu já te perdoei.

— Quem precisa perdoar aqui sou eu. — Afastou-a. — E só tem uma pessoa que eu deixo me chamar de “amor”, fedentina.

Fedentina? — murmurou, segurando-se para não rir. Pelo menos, não muito alto. — Você está cada vez mais criativo com os apelidos que... Ei, espera, tem uma pessoa que te chama de...?

A frase ficou no ar. Levi se limitou a desviar o olhar, alheio ao rubor evidente em seu rosto e a outro não tão evidente em seu pescoço. Este que era apenas um círculo levemente avermelhado, tão discreto que somente foi visto devido ao movimento feito pelo menor, deixando exposta toda a lateral de seu pescoço.

A marca de um beijo.

Fraca, discreta, mas ainda assim uma marca que dizia claramente “ele é meu”. Eren estava mesmo conquistando seu espaço na vida de Levi de uma forma quase assustadora, mas nunca imaginou que o garoto fosse, além de ciente do que estava a causar no mais velho, ousado o suficiente para marcá-lo também como seu.

— Hm, desculpa interromper — murmurou Eld, aproximando cautelosamente. Os dois o olharam com surpresa, pois tinham esquecido completamente os olhares curiosos sobre si. — Mas... está tudo bem? Digo, vocês não estão mais chateados, certo?

Hanji mordeu o lábio inferior e olhou para Levi com certa expectativa. Só não sabia exatamente se era sobre estarem já desculpados ou se era pela imagem um tanto obscena que criou em sua mente de seu amigo com o namorado enquanto sussurrava em seu ouvido “Vai, amor...”.

É, com certeza a segunda opção era a mais provável.

— Estamos de bem agora, amoooor? — murmurou Hanji, segurando-se muito para não cair na gargalhada.

— Hanji, que tal se fazer de muda ao invés de se fazer de tonta? — resmungou Levi enquanto revirava os olhos, sorrindo disfarçadamente.

— Isso é um não? — arriscou Petra, olhando para a dupla incerta ao colocar uma mecha solta atrás da orelha.

Agora, não era mais apenas Hanji; todos olhavam para Levi com expectativa. O líder se limitou a suspirar, mas com um sorriso crescente no rosto.

— Olha, eu ainda quero te dar uma surra... — começou, mas logo foi interrompido pela amiga escandalosa, que pulou em seu pescoço e beijou-lhe no rosto. Deu alguns empurrões na morena enquanto resmungava sobre germes e saliva enquanto ouvia os risos e chacotas da sua equipe, mas no final das contas, deixou que ela permanecesse com os braços o envolvendo. — Você é desgraça pura, Hanji, sinceramente...

— Eu sei que você me ama também — disse a morena, convencida.

— E vocês também, que só ficam aí, assistindo ao show — resmungou o líder para sua equipe.

— Não sei do que está falando — brincou Gunther, pondo as mãos para cima.

— Ah, e eu também não sei o que minha mão vai fazer na sua cara, palhaço — retrucou o menor de volta, gerando mais uma onda de risos. — Não sei o que eu ainda estou fazendo com vocês, deveria demitir todo mundo.

— Mas eu não trabalho pra você — murmurou Hanji.

— Tenho meus contatos — respondeu Levi, com um sorriso felino.

— Gostaria de lembrar que eu também sou amiga de Erwin, e que também sou uma das melhores agentes do estado.

— Mas não ganhou o prêmio de melhor agente quatro vezes, muito menos é a ex do chefe, não é mesmo?

— Disse muito bem: ex — murmurou a mulher, aproximando-se do ouvido do amigo para completar. — E eu acho que um certo moreno dos olhos verdes não ficaria feliz em descobrir seus planos, não é mesmo?

— Nem pense em dizer uma palavra pra ele ou... — Levi foi interrompido pelo toque incessante de seu telefone. Murmurando algumas pragas, tirou o celular do bolso e olhou na tela quem o ligava. Não se surpreendeu nem um pouco ao ver que era o nome do seu garoto.

— Falando no diabo... — murmurou Hanji, soltando-se do amigo com um sorrisinho malicioso.

Levi revirou os olhos e virou-se de costas para os outros presentes na sala para que não vissem o brilho involuntário que seu rosto ganhava sempre que falava com o namorado.

— Antes que você comece, eu não posso passar outra noite contigo — murmurou o homem de cabelos negros, com o tom de voz convencido. — Agora que deixamos isso bem claro... Oi pra você também, Eren.

Hanji foi a primeira a cair na risada, seguida de Gunther. Petra, Eld e — principalmente — Oluo ainda não se sentiam confortáveis o suficiente quando o assunto era o namorado do chefe, mas deram um sorriso ao ver o quanto o líder estava mais relaxado.

— Incrível como você sempre tem as ideias mais absurdas — resmungou Levi, prensando a ponte do nariz. — Não, Eren... Você é burro ou o quê?... Essa foi a coisa mais estúpida que eu já ouvi... Vá em frente, pode tentar. A única coisa que você vai conseguir é um curto-circuito e provavelmente uma sequela para o resto da vida.

— O que ele está tentando fazer? — quis saber Hanji, franzindo o cenho.

Levi virou-se para a amiga e cobriu a parte do microfone do celular com uma mão para abafar o som.

— Esse imbecil quer mexer na fiação da casa — resmungou o de cabelos negros, rolando os olhos.

— Por quê?

— Sei lá, ele explodiu a tomada do quarto dele, ou alguma coisa do tipo. — Mais um revirar de olhos, para depois franzir o cenho. — O quê? Não, claro que não!... Eu soluciono casos policiais, não casos de estupidez crônica... Vem cá, nunca te ocorreu que não se deve colocar coisas metálicas numa tomada?... E por que você... Caralho, eu pensei que você já tinha saído do fundamental.

— Eu podia fazer tantas piadas — sussurrava Hanji para Petra —, mas acho que ainda não estamos tão “de bem” assim.

— Eu ouvi isso, quatro-olhos! — atirou Levi, lançando um olhar mortal para a amiga. — Hm? Ah, sim, ela está comigo... Não, eu ainda estou no escritório, a tonta que veio aqui pra me atormentar, como sempre... Meu humor está ótimo, obrigado — disse a última parte com uma ironia quase ácida. — O quê? Nem pensar! — Deu mais um olhar de poucos amigos para a morena. — Ok, ok... Espera. — Tirou o celular da orelha e estendeu para Hanji, que entendeu de imediato e foi saltitante para o lado do melhor amigo. Porém, antes que pegasse o aparelho, Levi retraiu o braço e acionou a função de viva-voz. — A ideia de deixar os dois conversando ainda não me agrada muito.

Será que dá pra você parar de agir como uma mula e passar logo o telefone? — resmungou Eren do outro lado da linha, parecendo cansado. Os membros da equipe de Levi arregalaram os olhos no mesmo instante, surpresos com a ousadia a qual Eren tratou o líder.

— Mula? Olha só quem fala — retrucou de volta. Continuaria com mais alguma resposta, mas o incômodo de ter a amiga praticamente salivando ao seu lado o fez pular a parte das ofensas mútuas. — Eu pus no viva-voz, então dobre um pouco sua língua, ok?

Hanji? Está me ouvindo? — perguntou o garoto, ignorando completamente o namorado.

— Estou sim, coisa linda — respondeu a morena, quase dando pulinhos. — Antes de mais nada, gostaria de dizer que simplesmente amo como você lida com a implicância do Raviolle.

— É pra compensar o que eu faço na cama com ele — respondeu Levi com naturalidade, dando de ombros.

Infelizmente, eu não posso discordar — disse Eren, rindo. — Mas ele é mais manso quando estamos só nós dois.

— Não foi isso que eu ouvi quando eu te... — interrompeu-se o chefe ao ver o olhar chocado de sua equipe. Oluo, em particular, estava até com o rosto bastante corado. — Oh, merda... esqueci que eles estavam aí — murmurou, pensando alto.  — Meu Deus, eu preciso calar a boca.

— Não se contenha — murmurou Petra, piscando um olho.

Enfim, Hanji, eu queria te pedir desculpas — disse o garoto, ignorando o burburinho que ouvia ao fundo da ligação. — Eu não olhei meu celular depois do treino, e também estava com preguiça de ver todas as mil mensagens que meus amigos me mandaram depois do... hm, incidente de ontem à noite, que acho que você já ficou sabendo... E também, como eu passei a noite com Levi, não deu pra ver suas mensagens, porque... É, acho que você já entendeu.

— É, eu entendi tudinho — murmurou a morena, num tom malicioso.

Mas, bem, eu queria agradecer a você pela tentativa. Teria dado certo se eu tivesse visto sua mensagem.

— É, eu também não deveria ter feito surpresa, deveria ter te avisado um pouco antes também — disse a morena, dando de ombros. — Viu, Rivaille? É assim que se acerta um mal-entendido.

— Não começa, quatro-olhos — reclamou o de cabelos negros, cruzando os braços.

O que ele fez?

— Nós...

—... Tivemos uma discussão amigável — Levi cortou a amiga, completando com um olhar afiado que dizia claramente “não dê um pio”. Porém, tratava-se de ninguém mais, ninguém menos do que Hanji.

— Com discussão amigável, ele quis dizer gritos e ofensas baratas — acusou a morena, mas em tom de brincadeira.

— Eu não te ofendi hora nenhuma — resmungou.

— Ofendeu a minha moral nessa agência.

— Que já é questionável por si só.

Levi, você realmente brigou com ela? — perguntou Eren, levemente surpreso. E um pouco chateado também. — Cara, por que você fez isso?

— Por que ela se meteu em um assunto que é meu, e ainda pôs você em perigo.

Eu não estava em perigo, pensei que tínhamos deixado isso claro ontem.

— Mas foi desnecessário.

Desnecessário é o que você está fazendo agora.

— Quer mesmo discutir isso? Tem certeza?

— Eren, não esquenta — interrompeu Hanji —, ele tem razão... pelo menos, em parte.

Ainda assim, não é motivo para...

— Está tudo bem, nós já nos acertamos — confortou a mulher, fazendo com o que o outro, mesmo que relutante, aceitasse a situação. — Por sinal, a marca que você deixou no seu boy ficou maravilhosa, pena que muito fraquinha.

Levi, instintivamente, levou a mão livre para seu pescoço, corando de leve.

Ah, ele percebeu? — disse o mais novo, levemente travesso.

— O que você fez, pirralho?!

É que é meio injusto ser sempre eu a ficar com as marcas — justificou-se. — Então eu pensei em deixar um lembrete também.

— Vou te mostrar o lembrete — ameaçou, mas mais brincando do que falando sério. — Vinte minutos e você já era, garoto.

Ah, então quer dizer que você vai passar aqui? — disse com certa ironia. — Por que será que eu estou mais ansioso do que com medo?

— Masoquismo é sempre uma opção.

Garanto que está mais pra “fetiche”.

— Minhas algemas que o digam.

Prefiro o cinto mesmo.

— Meu Deus, como eu amo vocês dois! — confessou Hanji, quase chorando de rir. — E acho que eles concordam comigo — completou, apontando para os amigos completamente sem reação.

— Ah... — gemeu Levi, vendo no reflexo da expressão de seus amigos o respeito ser degradado quase que por completo. —... Puta merda.

Eles quem? — quis saber o garoto.

— É que estamos na sala dele — explicou Hanji, completamente extasiada com a situação. — E o gênio aqui esqueceu que colocando no viva-voz, todos da equipe dele podem ouvir a conversa de vocês também.

Aaah... — murmurou Eren enquanto processava aquela informação. — Ah! Puts, Levi, é sério isso?!

— Eu não imaginei que você fosse falar tanta besteira! — resmungou Levi, passando uma mão no rosto.

Era só não ter me dado corda, eu teria parado!

— Não se preocupe, Eren — interveio Eld, quase sem conseguir conter o sorriso jocoso para o chefe. — Não é como se fosse alguma surpresa saber o que vocês fazem.

— Não somos crianças, sabe como é — murmurou Oluo, numa clara indireta à idade do garoto.

— E a bela fama que o seu namorado tem também não ajuda muito — caçoou Gunther, este com um claro sorriso malicioso no rosto.

— Mas admito que algumas coisas me surpreenderam — disse Petra, apoiando o queixo sobre as mãos entrelaçadas, com os cotovelos sobre sua mesa. — Então, quer dizer que vocês usaram algemas?

— Alguém, por favor, me mate — praguejou Levi, comprimindo a ponte do nariz entre o indicador e o polegar.

Algemas e outras coisas a mais — brincou o moreno, fazendo um tom de voz sugestivo propositalmente, conseguindo, assim, tirar da equipe e de Hanji mais algumas risadas.

Cala a boca, Eren — suplicou o mais velho, cobrindo o rosto com uma mão.

— Estou dizendo, é por isso que eu amo esse lindo! — anunciou Hanji, sendo apoiada pelos demais. Exceto Oluo, é claro.

— Ok, chega dessa palhaçada — resmungou Levi.

Não, Levi, espera...! — protestou o namorado entre risos, mas era tarde demais. O mais velho já tinha tirado a chamada do viva-voz e estava com o aparelho na orelha de novo.

— Esperar o quê, vocês terminarem de foder com a minha imagem?... Ah, não, nem ouse fazer esse trocadilho!...  Não, Eren, perdeu a chance... O quê?... Ah, sim, isso eu posso fazer. — Levi tirou rapidamente o telefone da orelha para virar-se para a equipe. — Ele agradeceu por vocês relevarem o incidente. — Fez uma pausa para escutar o que mais o garoto tinha para dizer. — E que sente muito por... Eu não vou dizer isso!

— Dizer o quê? — perguntou Hanji, com aquela carinha de criança travessa que melhorava o humor de qualquer um.

— Fica na sua, Hanji — praguejou Levi. — E quanto a você, Eren... Hm? Amanhã?... Não, não que eu saiba... — Levi fez uma pausa para franziu o cenho. — No que você está pensando?... Ah, vai se foder, Eren — disse, revirando os olhos. — Hm, entendi... Certo, vou pensar no seu caso. Falo com você depois.

E então, finalizou a chamada. Fez o possível para evitar contato visual com qualquer um naquela sala, mas depois de um silêncio sepulcral, tornou-se difícil não levantar a vista para checar o que faziam. E, claro, todos estavam com os olhos fixos no líder em expectativa.

— O que estão esperando, um discurso? — resmungou Levi, abrindo os braços. — Porque se for, eu tenho um muito bom aqui. Sobre como vocês são excelentes em se meter na vida dos outros.

— Ele diz isso, mas olha como os olhinhos dele estão brilhando — disse Hanji, quase saltitando.

Levi se limitou a gemer em irritação e virar-se para arrumar os documentos e ir embora.

— Eu já imaginava que ele não fazia o tipo “cuidadoso” — disse Gunther, pondo uma mão no queixo, como se estivesse pensativo. — Mas acho que nunca pensei que ele fosse usar algemas e cintos pra essas coisas...

— Eu sempre achei que ele tinha um quê de BDMS — comentou Petra, assentindo com a cabeça.

— Petra! — repreendeu Oluo.

— Me erra, Oluo — retrucou a ruiva.

— Vocês são péssimos — comentou Eld, rindo. — Eu acho que não vou conseguir dormir à noite com as imagens que vocês me fizeram imaginar.

— Hmm, vai se manter ocupado pensando no Heichou, Eld? — brincou Gunther, com o tom malicioso e uma arqueada de sobrancelha típica dele. — Cuidado para não se apaixonar, o namorado dele é possessivo.

— Quem sabe o garoto não concorde com um ménage — completou Petra, igualmente divertida.

— Petra, eu nunca pensei que fosse me identificar tanto com você! — disse Hanji, indo até a ruiva para abraçá-la.

— Vocês são doentes... — comentou Oluo, balançando a cabeça.

Os risos e as brincadeiras foram interrompidos pelo barulho alto da maleta de Levi se chocando com a mesa propositalmente.

— Vocês percebem que eu ainda estou aqui, não é? — murmurou Levi, no tom de voz que fazia qualquer um calar-se. — Um conselho: durmam com um olho aberto. Talvez dê alguma vantagem quando eu for esganar cada um de vocês.

— Cuidado para não errar a cabeça que for esganar, Raviolle — disse Hanji, piscando um olho para o amigo.

As risadas voltaram, porém, mais contidas. Levi foi até a morena e deu um peteleco bem dado em sua testa, fazendo-a resmungar de dor por uns bons minutos. Saiu da sala pisando duro, quase como se estivesse marchando. Olhares menos atentos diriam que ele estava fervendo de raiva — o que não era ao todo mentira —, mas quem o conhecesse bem perceberia... Um discreto sorrisinho no canto de seus lábios.

No final, não é que a ideia ridícula de Hanji tinha sido útil, de alguma forma?


Notas Finais


Eu sei, eu sei, vcs querem esganar o Erwin e essas coisas...
Mas olha pelo lado bom, ele ainda respeita esse lado "amigo" da relação dele com Levi :D

E eu nem digo nada sobre Pixis. Uma hora, eu JURO que sento e explico direitinho o que aconteceu com o baixinho dlç, mas por hora vamos ficar com pontas soltas mesmo hehehe

Boas notícias? "Amanhã" é o tão esperado dia que reuniremos Levi, Eren, Armin, Mikasa, Jean e Marco na mesma casa :3
Até lá, vamos esperar mais um capítULO DE YUTI ON ICE MEU DEUS TÁ MTO BOM ESSE ANIME ALGUÉM ME SOCORRE EU NÃO SEI MAIS RESPIRAR SEM VIKTURI NA MINHA VIDA EU NÃO TÔ PASSANDO BEM MEU ÓCULOS JULIANA MEU ÓCULOS *morta feat. enterrada*

E é isso, galerinha linda, eis o que temos para hj :D
Espero que tenha compensado a minha lerdeza, miiil desculpas >.<

~Beijos de luuz~


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