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História Verdade ou Desafio - Inevitable thoughts


Escrita por: lineya21

Notas do Autor


Gente, se eu conseguir postar esse capítulo ainda hoje sem desmaiar de sono, é histórico, ok?
Eu não tenho muito mais comentários a fazer a respeito dos capítulos sem dar spoiler. Sobre minha vida, arrumei um emprego (de novo) (acho que esse dura), mas como a carga horária é menor talvez eu consiga pelo menos ir escrevendo um pouquinho que seja por dia.
AH, importante: por uma questão de lógica, vamos presumir que a história se passa ou nos US ou na França itself - exceto que eu não sei nada da França /o/
Enfim, bear with me.
Mais informações no final.

Capítulo 45 - Inevitable thoughts


Para minha sorte, a primeira pessoa que encontrei ao sair do banheiro foi Kentin. Mesmo tendo aberto uma torneira e jogado água em cima dos cortes, minhas mãos ainda sangravam. Eu sentia que tinha cortes leves no rosto e outras partes do corpo que ardiam, até no couro cabeludo, mas as mãos estavam piores. Lembrei de como Kentin tinha feito curativos muito bem feitos nas minhas mãos antes, e ele era a única pessoa que poderia me ajudar a não deixar que ninguém visse o quanto a situação estava feia.

Kentin fez uma expressão estranha quando mostrei as mãos, embrulhadas em toalhas de papel, encharcadas de sangue.

- O que você fez? – ele perguntou com cuidado.

Encolhi os ombros, como se não fosse nada.

- Quis bater no espelho do banheiro feminino dessa vez – falei timidamente – acabei quebrando. Pode não contar a ninguém?

Kentin passou a língua pelos lábios antes de responder.

- Lynn, eu não sou idiota. Se você tivesse socado o espelho, estaria com as juntas cortadas e não as palmas. E estou vendo os cortes no seu rosto e nos seus braços. Você brigou com alguém?

Não respondi. Encarei Kentin, assustada que ele tivesse percebido uma coisa daquelas. Diante do meu silêncio, ele suspirou.

- Vamos cuidar disso.

Kentin afanou algumas ataduras que ficavam guardadas em um armário na secretaria da escola e se sentou comigo em uma sala vazia em silêncio. O garoto não disse nada enquanto cuidava das minhas mãos – disse que eu tinha sorte que não ter nenhum estilhaço de vidro na pele, e que pelo jeito não precisava de pontos, mas que se eu percebesse sangue nos curativos, teria que procurar um médico. Quando ele terminou eu agradeci e me levantei rapidamente, mas Kentin segurou meu pulso.

- Lynn, olha só – ele disse em uma voz calma, mas grave – Eu fui vitima de bullying a vida praticamente toda, e eu não esqueci que você me ajudou muitas vezes. Eu conheço os sinais. Não posso te forçar a falar, mas vou perguntar mesmo assim: tem alguém te machucando?

Soltei o pulso do aperto dele bruscamente, a respiração ficando difícil. A pior parte era que eu queria falar, precisava falar, mas... não conseguia. Abri a boca e cheguei a tomar ar, mas não conseguia falar, como se as palavras ficassem atravessadas na garganta, de um jeito que nem o ar passava. Eu não sabia mais o que Debrah estava fazendo comigo, mas não conseguia falar. Engoli em seco.

- Foi só um  acidente, ok? Tá tudo bem.

Saí quase correndo, sem a menor vontade de ir para casa. Sabia que tinha que falar com Rosalya e Lysandre, mas nada, nada me parecia uma boa idéia. Só o que sabia era que precisava me esconder, e nem sabia do que. Estava descendo o corredor, pensando no que ia fazer, quando ouvi a voz de Rosalya e congelei. Me aproximei devagar da porta de uma sala e escutei a voz da minha amiga, aguda como sempre ficava quando ela estava irritada.

-... mas se ela nem atende o telefone! Não dá pra ajudar assim!

- Rosa, eu sei – ouvi Lysandre falar, naquele tom que ele usava frequentemente com nós duas, de quem tenta conter uma criança rebelde – Mas veja o lado dela.

- Ah, nem vem – Rosalya guinchou em um tom cada vez mais agudo – foi você quem disse pra ela não fazer nada...

- Nada precipitado – Lysandre a cortou, com um tom grave e contido – como, por exemplo, o que ela acabou de fazer. Aposto que o motivo de ela não querer atender o telefone é que Debrah já cobrou a insolência dela e ela não quer falar sobre isso.

Ouvi Rosalya bufando.

- Isso é ridículo, Lynn sabe que pode falar com a gente...

- Rosa, Rosa – Lysandre cortou novamente, com um tom mais brando dessa vez- senta aqui. – ele ficou em silêncio por um momento, então continuou, em um tom cauteloso – Olha, eu não acho que ela consiga falar direito com mais ninguém. Quando ela deixou de falar a verdade pro Castiel eu presumi que fosse a raiva que ela sente, por causa da história dos dois. O que pode ser, claro, mas... não acho que seja só isso. Quantas chances ela já teve, Rosa, de contar pra mais alguém, ou de desenvolver um plano melhor...

- É o que eu tenho dito – Rosalya bufou – ela tem que reagir...

- Só que ela não consegue, Rosa. Por exemplo – Lysandre falou, como se tivesse uma idéia súbita – Sabe aquelas histórias que a gente vê por aí de violência doméstica?

- Ahn? – Rosalya indagou, confusa.

- Sempre vejo coisas assim – Lysandre falou, um pouco afobado – Situações horríveis que duram por anos, e sempre tem alguém pra perguntar, “por que ela não denunciou antes”, e sabe, é isso. Porque o tipo de coisa que acontece nesses casos, é o que está acontecendo aqui: a pessoa que abusa, que assedia, faz um tipo de tortura psicológica que... faz com que a pessoa sinta que não tem mais solução, que não pode falar com ninguém. É o que Debrah fez com ela, eu acho. Tornou ela incapaz de se levantar. De pedir ajuda, de sequer tentar.

- Mas ela a desafiou... – Rosalya começou.

- De modo imprudente – Lysandre confirmou – porque por mais oprimida que ela esteja sendo, as vezes ela pode se deixar levar pela raiva. Mas a Lynn que a gente conhece, Rosa, a Lynn esperta, que planeja, que compra briga... essa, Debrah está conseguindo sufocar. Por isso ela nem tenta mais lutar contra. Porque Debrah a convenceu de que não há solução.

Os dois ficaram em silêncio, enquanto eu respirava com dificuldade. Não tinha visto as coisas daquele ângulo. Não via a mim mesma como vítima de alguma coisa. Me via como uma idiota que tinha se metido onde não devia. E tinha certeza que aquilo não tinha solução. Mas o modo como Lysandre falava me deu a impressão de algo mais: de que minha falta de reação era irrazoável.

Saí pelo corredor, sem deixar que me vissem. Talvez Lysandre tivesse razão em muita coisa – talvez Debrah estivesse bagunçando minha cabeça para que eu não reagisse, talvez esse fosse o motivo de eu ter vontade de ficar sozinha o tempo todo, de não querer mais falar com ninguém. Mas a questão era, eu conseguia pensar em uma saída. Eu só não queria chegar àquele ponto. Não queria ser igual a ela. Mas talvez resistir fosse inútil, mesmo.

 

Fui para a casa da minha tia, porque não queria que minha mãe visse minhas mãos com ataduras tão cedo. Planejava usar um suéter com as mangas bem compridas. Ou talvez aproveitasse as noites frias que andávamos tendo e colocasse luvas. Ela podia estranhar, mas sua preocupação constante com a gravidez fazia com que minha mãe acreditasse só no que queria acreditar.

Eu gostava de ir para o apartamento da minha tia não apenas porque podia ficar com o gato no colo, pensativa, mas porque minha tia sabia quando eu precisava de espaço. Bastou ligar para ela e dizer que queria ficar sozinha um pouco e ela me disse para ir para lá enquanto ela trabalhava, e que ela mesma avisava minha mãe, para eu não ter que lidar com “por quês”.  Fiquei sentada em um canto perto da sacada, o gato ronronando no meu colo, deixando os pensamentos vagarem até que eu me sentisse um pouco melhor. Meu celular vibrava dentro da bolsa jogada em um canto, mas com o passar dos minutos parei de prestar atenção no som. Fingi para mim mesma que era uma abelha na janela.

Então vieram as batidas na porta, mais difíceis de ignorar.

- Lynn, eu sei que você está aí – ouvi Lysandre dizer – fomos... fui até sua casa e sua mãe disse que você veio para cá...

Coloquei o gato no chão, suspirando, e fui abrir a porta. Lysandre ainda estava falando quando eu abri a porta, mas eu não estava prestando atenção. Ele olhou para mim, surpreso, e Rosalya, atrás dele, me encarou timidamente.

- Pedi pro Lys não falar que eu estava aqui. Não sei se você quer falar comigo.

- Por que achou isso? – falei, confusa.

- Você não atende quando eu ligo – Rosalya respondeu, chorosa – então pensei...

Bufei e saí do caminho para que eles entrassem, sem prestar atenção.  Me sentei novamente no chão perto da sacada, observando o sol baixando no céu.

- Estava cansada, Rosa, não estava a fim de falar com ninguém – resmunguei.

- Mas abriu a porta para o Lys... – ela começou.

- Sim, porque eu tinha certeza que você estava junto – falei, cortando-a – e sei que você ia bater até derrubar a porta. Rosa, desculpa – falei, dando de ombros – mas você me conhece, às vezes preciso evitar as pessoas um pouco.

- Mas Lynn, estávamos preocupados – Lysandre falou, em um tom sério, que normalmente me deixaria apreensiva, mas não causou nenhum efeito – Você desafiou Debrah e depois vocês duas sumiram. Ela fez alguma coisa?

Escondi as mãos dentro das mangas do suéter discretamente. Elas estavam tão enfaixadas que eu tinha certeza que se eles não olhassem direito pareceriam luvas.

- A gente brigou – falei, dando de ombros – como sempre.

Rosalya estava em silêncio, os olhos estreitos.

- Lynn? – ela disse, desconfiada – o que é isso no seu rosto, arranhões? Vocês saíram no tapa?

Me mexi, desconfortável, tentando jogar o cabelo na frente do rosto, mas então Rosalya olhou para minhas mãos com mais cuidado.

- Lynn – ela disse, e para minha surpresa, Rosalya tinha um tom mais assustado do que agressivo – o que ela fez?

Suspirei e acabei contando a história, sem emoção na voz. Conhecia Rosalya o suficiente para saber que se não contasse logo ela ficaria insistindo, então achei melhor seguir o roteiro de sempre: eu contava o que houve, ela se irritava, gritava mil impropérios enquanto Lysandre tentava acalmá-la e eu estava livre para deixar a mente vagar enquanto Rosalya se iludia em achar que havia saída ou que podia armar algum plano mirabolante para acabar com aquilo.

Mas Rosalya não parecia irritada, parecia assustada. Eu nunca tinha visto ela usar aquela expressão antes, apesar de tudo, e percebi que só então ela entendia o quanto eu estava encrencada. Precisou que eu ficasse seriamente machucada fisicamente para que ela entendesse o que eu estava sentindo por meses, e aquilo me deixou mais magoada que antes.

- Lynn, isso tem que parar. – ela falou finalmente.

- Não me diga – resmunguei. Rosalya não se ofendeu, ainda assustada demais.

- Lynn, você tem que denunciá-la! – ela gemeu – O que ela está fazendo, é ilegal, ela não pode sair ameaçando a vida das pessoas...

- Rosa, você não entendeu – falei, um pouco mais alto do que pretendia – ela não se importa nem um pouco. Eu não vou arriscar que ela cumpra as ameaças e entre em uma matança de todas as pessoas que eu amo.

- Ok, essa situação é muito delicada – Lysandre falou, sentando ao nosso lado, em um tom paternal – Lynn, eu sei que fui eu quem disse para que você não reagisse sem pensar, mas você já fez isso. Alguma coisa tem que ser feita. A loucura dela é tanta que você fazer o que ela quer não garante a segurança de ninguém, então, se você denunciá-la, talvez haja mais chances de...

- Não posso arriscar – falei novamente – já disse mil vezes. Suponha que eu denuncie ela hoje. O que eu tenho? Minha palavra, algumas testemunhas de que a gente se detesta, o que é óbvio considerando o Castiel, e só. Ninguém vai preso por ser idiota. Eles chamam ela, interrogam, ela é menor, os pais a liberam. Antes que alguém possa provar algo, toda a minha família e amigos estão mortos, ou intensamente torturados. E o pior é que ela dificilmente vai deixar provas. Não, obrigada.

Rosalya balançava a cabeça, desolada.

- Lynn, não pode ser só isso. Tem que ter algo que você possa fazer. Isso não pode continuar.

- Só vai parar quando ela estiver morta.

As palavras saíram sozinhas, quase como um suspiro de alívio, por estar finalmente dizendo em voz alta algo que estava cozinhando dentro de mim havia meses. Eu pensava naquilo o tempo todo – desde momentos onde imaginava voar nela na sala de aula com o lápis que estava usando como estaca, até planos elaborados que eu mal percebia estar fazendo.

O silencio pairou por alguns segundos na sala, mas eu não conseguia sentir remorso pelo que tinha dito.

- Isso não tem graça, Lynn – escutei Rosalya dizer em uma voz mínima.

- Não estou brincando – falei em tom monótono, com uma estranha sensação de apatia misturada a determinação. Quanto mais eu pensava naquilo, mais sentido fazia. Encarei Rosalya e Lysandre – Todo esse tempo tentando me convencer que eu não sou igual a ela, quando até vocês concordam que sou. Então... que seja, sabe. Admito. Sou igual a ela. E quero ela fora do meu caminho.

Lysandre suspirou e se sentou mais perto de mim no chão, enquanto Rosalya lhe dava espaço, parecendo nervosa.

- Lynn, olha só – Lysandre disse em uma voz paternal, e eu me preparei para o sermão com um suspiro dramático – Você não pode fazer o mesmo que ela. Entenda, Debrah... ela realmente não se importa com as conseqüências. Ela não liga se for presa, morta, qualquer coisa assim. E você não faria isso, faria? Consigo mesma, com a sua família?

Ergui as sobrancelhas, me sentindo levemente ofendida.

- Está dizendo que eu não tenho a mesma coragem que ela? Ou que não sei me cuidar para não acabar mal? – falei, sabendo que estava distorcendo a conversa. Lysandre tomou ar para responder, com ar indignado, mas eu ergui a mão e continuei – Sabe, de todas as loucuras dela, Debrah me disse algo que realmente fez sentido. Se você continuar fazendo o que todo mundo faz, vai chegar aonde todo mundo chega. E se eu continuar me importando com as conseqüências, andando na linha... nada vai mudar.

Rosalya se arrastou para meu lado. Pela primeira vez ela parecia assustada pela minha sanidade, o que era estranho, já que eu me sentia mais lúcida que nunca. Ela pegou minhas mãos nas suas.

- Lynn, me prometa – ela disse com urgência – Que você não vai fazer nenhuma besteira. Pelo menos que vai pensar antes de fazer. E se realmente, realmente você achar que pode, que deve... pelo menos fale comigo.

Eu ri, e fui salva de responder por Lysandre, que falou algo com indignação, querendo dizer que ela não podia me apoiar naquilo, e Rosalya respondeu em um tom igualmente ofendido, mas eu parei de escutar. Peguei o gato de volta no colo e fiquei encarando a vista da janela, pensativa. Seria mesmo uma idéia tão ruim? Eu não queria ser como ela. Mas aparentemente eu não podia evitar, se levasse em conta tudo que todo mundo dizia. Talvez fosse isso que ela quisesse – bagunçar minha cabeça até eu surtar. Mas talvez também, fosse hora de finalmente parar de ser a boazinha da história. O único motivo de ela estar ganhando essa briga era que eu não tinha coragem de jogar tão sujo quanto ela. E eu podia fazer isso, se fosse o preço para me livrar daquele terror.

No dia seguinte cheguei na escola muito mais cedo do que o necessário e me enfiei no sofá no canto da biblioteca, esperando poder evitar todo mundo. A escola estava em polvorosa por causa de todos os eventos a seguir – principalmente o baile que aconteceria antes da peça e do evento dos pais. Era animação demais e eu não conseguia acompanhar.

Estava mergulhada na leitura de um dos meus romances preferidos quando escutei alguém xingando baixinho. Ergui a cabeça e levei um susto: Castiel estava sentado a uma das mesas, rabiscando furiosamente no caderno enquanto folheava um livro a esmo. Prendi a respiração, nervosa. Queria correr dali, mas seria inevitável passar por ele. Talvez se eu fosse bem silenciosa...

- Lynn?

Encarei Castiel, nervosa, mordendo os lábios com  força. Ficamos olhando um para o outro sem dizer nada por alguns segundos. Minhas pernas provavelmente não me agüentariam em pé, mas afinal, eu conhecia Castiel – ele ia tentar me impedir de sair.

Finalmente, Castiel fechou o caderno. Ele largou tudo em cima da mesa e veio despreocupadamente até mim, se sentando ao meu lado no sofá, a uma distância educada. Ainda assim, me encolhi.

- O que foi? – falei rispidamente.

Castiel ergueu as mãos. Ele parecia tão irritantemente calmo, o que estava me deixando muito mais nervosa.

- Só quero falar com você. Escuta – ele disse quando bufei e fiz menção de me levantar, seu tom ficando mais duro quando ele segurou meu braço – Você não pode me dar cinco minutos?

Enchi os pulmões de ar para dizer que não, então parei. O motivo de eu gostar daquele canto específico era que eu já tinha verificado e ele ficava um pouco mais longe do alcance das câmeras e  microfones de Peggy. Engoli em seco. Disse a mim mesma que não fazia mal ceder à curiosidade um pouco, ignorando que o toque dele no meu braço me deu um choque inesperado de saudade. Me acomodei de novo, puxando meu braço do seu aperto.

- Ok – falei fracamente, me forçando a olhar para ele, sem expressão. O que você quer?

Castiel suspirou calmamente, como se lembrasse um discurso preparado e me encarou.

- Eu sinto muito, por tudo. – Seu tom era suave, e ele certamente tinha memorizado e ensaiado as palavras de novo e de novo, porque ele nunca ficava tão calmo quando se tratava de pedir desculpas. – Você tinha razão. Eu fui egoísta o tempo todo, eu só estava vendo o meu lado das coisas. Eu quero que você me perdoe por isso.

Uni as sobrancelhas, sentindo o queixo cair. Engoli em seco, confusa, mas recuperando a postura seca.

- Por que você se importa? – falei.

- Porque estou indo embora. Muito em breve, se lembra? – ele respondeu casualmente, e eu fingi que a lembrança daquilo não machucava tanto – Eu não quero deixar pontas soltas.

Ri com sarcasmo, ficando irritada.

- Ah, claro. É por isso, é porque sou uma ponta solta. – falei, rancorosa.

Castiel pareceu verdadeiramente irritado com minha reação. Ele passou os dedos pelos cabelos, bufando, antes de falar.

- Será que pode parar? Agora é você quem está distorcendo minhas palavras, quando me acusou de fazer isso durante nosso relacionamento.  – eu fiz um bico, sem querer, e Castiel suspirou, sua expressão se abrandando novamente. Ele continuou: - Olha. Eu só quero ter certeza de que você está bem. Eu preciso dizer isso, mesmo que você não confie em mim, eu sinto que você está escondendo algo. - Senti um frio na espinha, sem conseguir responder. Ao me ver hesitar, ele continuou, tranquilamente: - Seu comportamento mudou tanto nesses últimos meses, Lynn... Eu sinto que você precisa de ajuda. Então vou perguntar, uma única vez: você está bem?

Ele ficou esperando que eu falasse, mas eu estava com um bolo na garganta. Tentei respirar fundo, o ar entrando e saindo com dificuldade, me fazendo sentir que eu estava sufocando. Engoli em seco, desistindo de conter as lágrimas que ameaçavam cair. Uma delas rolou pelo meu rosto quando consegui falar, em uma voz fraca e irritada.

- Você. Vai. Embora. Pare de bagunçar minha cabeça!

- Mas...

Me empertiguei, de frente para ele, furiosa. Ergui um dedo para ele, me sentindo trêmula, tentando entender porque ele estava fazendo aquilo comigo tão de repente.

- Você quer ir embora com uma consciência limpa? Tudo bem – falei, engolindo em seco, tentando manter alguma compostura.  – Ótimo. Não estou bem. Nem perto disso – adicionei, dando uma risada amarga – Mas vou ficar. Então, não se preocupe. Não desperdice seu tempo pensando em mim. Só... vá seguir seus sonhos.

Castiel tomou ar para responder, mas a bibliotecária escolheu aquele momento para entrar no recinto, cantarolando com um café. Seu olhar imediatamente caiu sobre nós dois, de modo severo, como se achasse que estávamos dando uns amassos lá no canto. Castiel pareceu perceber e se levantou, olhando feio para mim.

Ele voltou a se sentar, fazendo o que parecia um dever atrasado, com uma expressão ainda mais fechada que antes. Eu queria sair dali e ir chorar em um canto, mas não queria que ele tivesse essa satisfação, de me ver abalada, mesmo que não pudesse esconder a cara de choro. Respirei fundo, tentando me concentrar no personagem que morria de assepsia, pensando na amada.

Poucos minutos depois, escutei Castiel se levantar e jogar suas coisas dentro da mochila. Quando achei que ele tinha saído, levantei a cabeça, apenas para vê-lo parado na minha frente.

- Devolve isso pra mim? – ele disse friamente, jogando no meu colo o livro que estava usando. Eu ergui as sobrancelhas, chocada, enquanto ele colocava a mochila nas costas – Não tenho tempo pra isso.

- Não sou sua empregada! – gritei, mas ele já estava saindo pela porta, enquanto a bibliotecária me olhava feio. Bufei para ela, baixando a cabeça, sem querer mais confusão.

Franzi as sobrancelhas para o livro. Me lembrei de repente que tinha que entregar um resumo daquele livro também, que tinha até feito e largado no meu armário. Estava me levantando para ir pegar, a contragosto, porque precisava da nota, quando notei. Havia um papel dobrado no meio do livro, quase como se tivesse sido colocado ali para marcar uma página e esquecido, mas eu o puxei e abri mesmo assim, por pura curiosidade.

“Vou pensar em você a cada passo do caminho, sempre. Não importa o que aconteça daqui em diante, você sempre será uma parte dos meus sonhos.”

Fiquei encarando o papel em choque, tremendo, por um tempo que não soube determinar. Passei as pontas dos dedos sobre as letras rabiscadas na letra dele de modo descuidado. Quando o sinal das aulas tocou eu dei um pulo, lembrando que tinha coisas a fazer, que tinha que sair do meu esconderijo. Enfiei o bilhete no bolso do jeans e corri.

Nem conseguia ver as pessoas no corredor, que me xingavam quando eu esbarrava nelas, a mente totalmente absorvida por Castiel. O que ele estava fazendo? Que tipo de brincadeira maldosa era aquela que ele estava fazendo comigo? Talvez ele estivesse sendo sincero, claro. Talvez estivesse confuso. Mas porque me passar aquele bilhete tão discretamente? Talvez ele não quisesse que a bibliotecária visse, que ninguém visse, ou aquilo chegaria nos ouvidos da sua namorada. Mesmo sem ele saber que ela me mataria, ele certamente não ia querer arrumar problema com o seu caminho pro sucesso.

Cheguei no meu armário, entorpecida, dizendo a mim mesma que se pensasse mais um pouco naquilo meu cérebro ia derreter, e tinha acabado de colocar o bilhete de Castiel no meio de um livro quando escutei as batidas dos saltos de Debrah na minha direção. Senti um frio na espinha outra vez, mas mantive a expressão neutra, pegando o resumo que precisava entregar e batendo a porta do armário antes que ela me alcançasse.

- Ah, achei que estivesse fugindo de mim – Debrah disse, calma, com uma expressão serena. Ela se aproximou devagar. – Temos que ter uma conversinha, lembra?

Contive uma tontura. “Ela não sabe. Não tem como saber.” Mas Debrah me deixava tão paranóica que eu não conseguia ter certeza. Continuei fingindo inocência.

- Pra ser sincera, não – falei, honestamente. Ela abriu um sorriso meigo.

- Meu namorado está a alguns armários de distância, bem como a diretora – ela falou em um tom brando – E eles vão nos ver fazendo as pazes. Então é bom você me dar um abraço sem fazer cara feia, minha nova melhor amiga.

Mordi o lábio, tentando conter a vontade de revirar os olhos.

- Debrah, não vai colar – falei com sinceridade. Eu realmente entendia  dinâmica da coisa melhor que ela as vezes – Ninguém vai comprar que somos melhores amigas da noite pro dia. Que estamos tentando nos entender, talvez. Mas melhores amigas é demais.

Debrah sorriu serenamente e estendeu uma mão para mim. Eu me forcei a sorrir de volta, com a mesma calma, e apertei a mão dela. A garota puxou minha outra mão e segurou minhas mãos nas suas, ainda com aquele sorriso.

- Ótimo, realmente mais convincente, você tinha razão. Mas sabe, eu tive uma idéia pra isso ficar mais interessante.

Engoli em seco, me desvencilhando dela, fingindo que ia arrumar algo na minha bolsa, mas ainda sorrindo.

- E o que seria? – perguntei, a voz um pouco trêmula.

Debrah arreganhou o sorriso, como se estivesse pronta para rasgar minha garganta com os dentes.

- Vou dar uma festa do pijama na sexta. E você vai, é claro. – a voz dela baixou um pouco, um brilho malvado em seus olhos ao falar – E vamos até poder brincar de verdade ou desafio, que eu sei que você adora.


Notas Finais


Sobre a história:
Não falta muito pra Debizinha ser desmascarada. Isso também quer dizer que: não falta muito pra fic acabar. E não, não vai ter segunda temporada, pq essa foi a história que imaginei, e tentar esticar mais pra tirar água de pedra é uma coisa muito péssima. É melhor terminar uma história que a gente não quer que acabe do que ver ela agonizando uma morte horrível.


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