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História Você sou eu e eu sou você (jikook) - Talvez sozinho não seja tão fácil


Escrita por: b_penny_b

Notas do Autor


Boa leitura💜

Capítulo 4 - Talvez sozinho não seja tão fácil


Fanfic / Fanfiction Você sou eu e eu sou você (jikook) - Talvez sozinho não seja tão fácil

"Eu odeio ter te decepcionado
E me sinto tão mal com isso
Eu acho que o carma vai voltar
Porque agora sou eu quem está sofrendo, sim"
(Nobody's Perfect — Jessie J)

∆∆∆

Algumas pessoas chamavam aquilo de remorso, outras pessoas diriam que era algo como auto reflexão ou meditação. Jimin chamava aquilo de: coisa que parece uma intoxicação alimentar.

Porque eram todos os sintomas que sentia quando comia algo fora da validade ou quando consumia alguma comida temperada demais. Náuseas, dor no estômago, aquela dor de cabeça chata e a vontade de se deitar na cama e ficar lá vegetando por horas.

Ele mantinha a bochecha apoiada contra a palma da mão de uma forma nada elegante e sabia que estava fazendo algo errado pela forma como os serviçais parados ao lado da porta o olhavam como se ele estivesse cometendo um crime.

Mas ele não ligava. Não quando seu coração estava doendo. E até aquele dia ele nem sabia que o coração realmente podia doer a menos que fosse sinal de um infarto. Será que era hora de procurar um cardiologista? Jeon Jungkook finalmente havia conseguido comprometer seu sistema cardiovascular?

Ele bufou mais uma vez, cutucando a comida com o garfo. Ele não era fã de comida italiana, o que talvez fosse motivo para seu estômago doer com a mera ideia de colocar aquilo na boca.

Se estivesse na sua casa, teria provavelmente feito um lamen e comido assistindo televisão. Mas como ali ele era Sua Majestade, o rei Park, foi forçado a se sentar naquela cadeira escandalosamente confortável em uma mesa exageradamente grande e comer uma comida que ele definitivamente não gostava.

Era estranho ver as coisas daquele ângulo. A sala de jantar estava completamente vazia, com exceção dele e dos dois serviçais, um homem e uma mulher. Os dois não diziam uma palavra e mal lhe olhavam nos olhos, parecendo ter até medo de serem desrespeitosos.

Aquilo lhe agoniava.

O silêncio foi rompido quando as portas foram abertas pelos guardas do lado de fora. Jimin soltou o garfo e jogou a cabeça para trás, apoiando os braços na cadeira e sussurrando um "obrigada, meu Deus" quando viu alguém entrando, saltitante.

O som dos saltos batendo no chão eram familiares e ele sorriu largo ao ver Rosé cruzando a sala de jantar. Claro que não era sua irmã de verdade. Era uma cópia, um pouco mais delicada e mais sorridente.

Ela sacudia uma folha nas mãos.

— Minnie, eu não acredito que você saiu daquela vivo! Eu já estava escolhendo a roupa para o seu funeral, juro juradinho! — Rosé se jogou na cadeira mais próxima, de forma dramática. Ela colocou a folha sobre a mesa e empurrou na direção dele. — Mamãe mandou avisar que ela já voltou para Jeju. Sabe, a velha história de que se a antiga rainha ficar no palácio por muito tempo o povo vai desconfiar que algo muito grave aconteceu no acidente e blá blá blá.

Ótimo. Definitivamente não era sua irmã. Rosé nunca usaria a expressão blá blá blá, ela odiava monossílabos sem sentido. Ela nem abreviava palavras por mensagem, que dirá falando em voz alta.

Ele fez uma careta diante da declaração dela. 

— Aí está seu cronograma de amanhã, o Min Yoongi pediu para eu te entregar. Sinceramente essa coisa me dá um nó no cérebro, não sei como alguém consegue organizar isso — disse ela, se apoiando na mesa e olhando diretamente para ele com um sorriso. — Me diga, qual a sensação de sair da água sendo carregado por aqueles braços malhados? Ele fez boca a boca em você? Quero detalhes!

Jimin piscou algumas vezes e encarou a garota. Rosé não tinha mais aquele tom rosado nos cabelos, que estavam completamente loiros e lisos. Os lábios pintados de vermelho vivo e um vestido da mesma cor, o cumprimento batia abaixo dos joelhos.

Conduta da família real. Sem roupas muito reveladoras ou abertas, afinal, a realeza era o exemplo de pureza, elegância, conservadorismo e todos os princípios sobre os quais a Coreia fora alicerçada.

Claro que Rosé não andaria por ali com suas saias curtas na metade da coxa. Ela era uma princesa, não a secretária pessoal do rei.

— O que? — ele voltou a si e percebeu o que ela havia dito. Seu rosto se distorceu em uma carranca. — Ficou louca?

Ela pareceu decepcionada.

— Aish, não rolou nada mesmo? Nem uma respiraçãozinha boca a boca? Que frustrante! — ela cruzou os braços e se jogou para trás na cadeira da mesma forma que Jimin. — Enfim, não se pode ganhar todas, não é? Mas enfim, não vi o general Jeon por aí, você dispensou ele por hoje?

Jimin bufou. De novo ele. Por que todos pareciam agir como se ele soubesse cada passo do "general"? Rosé era definitivamente a décima pessoa a perguntar sobre Jungkook na última hora, e ele estava enlouquecendo.

Pois não fazia ideia de onde o homem estava e isso sempre foi seu pior pesadelo: perder aquele riquinho mimado de vista.

— Podemos não falar sobre o re… general? — Jimin se corrigiu a tempo. Precisava perder a mania de falar 'Sua Majestade' ou 'o rei', pelo menos até que saísse daquele lugar invertido.

Rosé estreitou os olhos na direção dele, desconfiada. A Rosé que ele conhecia, provavelmente teria apenas suspirado e concordado em mudar de assunto, mas ele sentia que aquela versão de sua irmã podia ser muitas vezes mais irritante que a original.

— Oh, problemas no paraíso? — ela soltou com um olhar de "sinto muito por você, irmãozinho". Jimin franziu a testa, pronto a questionar o que ela queria dizer, mas Rosé bateu na mesa com força. — Beleza, tenho uma novidade que talvez possa te alegrar.

Ele ergueu uma sobrancelha, esperando a tal notícia que alegraria seu dia de merda.

— Eu fui me encontrar com um cara hoje. Antes que pergunte, sim, eu levei seguranças e deixei a mamãe e o papai bem avisados e na verdade eu o achei bem agradável, um bom partido — disse ela  — O nome dele é Rudter Green. É um magnata holandês, ele tem muitas posses na Europa, América do Norte e Oceania. É bonito, tem um sobrenome aceitável e foi o primeiro cara que disse o quanto eu era inteligente ao invés de falar sobre meu cabelo. Trinta e poucos anos, nunca foi casado e tem o título de marquês na Inglaterra, graças a sua antecedência britânica por parte de pai.

Jimin piscou algumas vezes. O que aquela versão dele responderia? Ele não tinha a mínima ideia.

Sua irmã nunca pareceu ligar muito para essa questão de casamentos lucrativos. Ela normalmente namorava com um cara ou uma garota diferente a cada ano e acabava terminando o relacionamento por não ter muito tempo, Rosé na verdade nunca demonstrou realmente se apaixonar, as coisas para ela sempre foram muito robóticas.

Mas para aquela Rosé, pela forma como seus olhos brilhavam e seu sorriso estava ansioso por sua resposta, aquilo devia ser muito importante. 

Ele apelou para a resposta coringa.

— Se você estiver feliz, também vou estar — Jimin disse, estendendo a mão e pegando a taça. O vinho era a única coisa que estava descendo.

Ela respirou fundo e assentiu para ele, batendo palminhas. Em seguida pareceu se lembrar de que deveria agir como uma dama e esticou as costas, olhando para Jimin com total seriedade.

— Obrigado, Minnie! Pretendo ir devagar com as coisas, não quero me apressar e acabar me arrependendo. —  ela falou. Ele assentiu em total concordância, enquanto bebia um gole do vinho. Pelo menos ela tinha juízo. — Estamos pensando em nos casarmos no final do mês, o que acha?

Ele realmente não precisava saber qual a sensação de ter vinho saindo pelo nariz e tinha plena certeza que ninguém naquela sala precisava ter visto a cena, mas foi inevitável. Rosé o olhou enojada assim como os serviçais, Jimin tossiu com força, tentando expelir o vinho de suas vias respiratórias.

Isso era ir devagar? O que seria ir rápido para ela?

Ele levou um tempo para se recompor, seus olhos ainda estavam lacrimejando pela ardência do álcool quando ele conseguiu falar com ela.

— Fim do mês? O que é isso, um contrato? Você está se casando ou vendendo ações de uma empresa? — ele ralhou, a voz ainda fraca e rouca.

Rosé torceu o nariz, lançando o típico olhar de quem estava completamente perdida. Talvez Jimin estivesse falhando muito em sua atuação.

— Foi você quem disse que eu precisava me casar antes do final do ano! O que deu em você agora? — ela sacudiu a cabeça devagar, completamente confusa com o comportamento dele.

Aquilo foi um choque.

Obviamente, Jimin sabia muito bem dos compromissos da família real e de como os casamentos eram quase como negócios e levados muito a sério. Para as mulheres, garantia a boa imagem da família e mantinha relações vantajosas para o Reino. Já para o rei, garantia que a dinastia se manteria no trono e o sangue real passaria adiante para a próxima geração.

Jungkook não tinha irmãs e seu irmão mais novo tinha decidido se mudar para o exterior em um ato de rebeldia para tentar escapar das regras da vida na corte. Jimin nunca presenciou um contrato daqueles, então imaginar sua irmã sendo submetida a aquela situação era um pouco demais para ele.

Que tipo de tirano maldito ele era?

Aquela versão sua realmente estava negociando Rosé como uma moeda de troca?

Ele bufou. Estava sendo demais, sua cabeça tinha voltado a doer e ele precisava apenas de escuro e silêncio.

— Minha cabeça está doendo, eu preciso deitar um pouco — disse Jimin.

Ele se afastou com pressa, sem dar tempo para Rosé dizer nada. Ainda sentia os efeitos do acidente e apesar de o neurologista dizer que não haviam tido danos graves, sua cabeça parecia prestes a se partir ao meio.

Quando chegou ao quarto, que era tão grande e tão vazio como todos os outros cômodos, Jimin se jogou na cama e se encolheu, abraçando o travesseiro fofo demais com força. Ele fechou os olhos, repetindo uma canção que havia aprendido com a babá latina que cuidou dele e de Rosé até que eles estivessem com idade suficiente para cuidarem de si mesmos.

Jimin nunca soube falar espanhol e não sabia muito sobre a tradução, mas sabia que era algo sobre flores brigando. Ótimo. Até as flores discutiam em seu mundo.

Ele só queria dormir. Talvez ele acordasse pela manhã e aquilo não passasse de um pesadelo.

(...)

Maybe it's better this way

We'd hurt each other with the things we'd want 

said

We could have been so good together...

— O senhor se importa de mudar de estação? — Jungkook não resistiu. Seu dia estava sendo péssimo, talvez o pior que ele tinha em anos e aquela música de término de relacionamento não estava sendo muito animadora.

Não que ele estivesse lamentando um término ou algo do tipo, mas estava realmente irritado ao ponto de qualquer melodia que tivesse a ver com mágoa e rancor lhe tirar do sério.

O taxista não hesitou em fazer o que ele pediu, o que talvez tenha sido ainda pior, pois ouvir Nobody's Perfect de Jessie J, definitivamente não era algo que melhorasse seu humor. Mas ele não ia continuar pedindo ao taxista para mudar até que a música parasse de tocar sua ferida.

O homem não fez perguntas, mas pela forma como olhava pelo espelho retrovisor, era possível notar que não era algo comum alguém da patente dele pegar um táxi.

Claro que não. Porque o general Jeon tinha habilitação. Jungkook a encontrou junto com suas coisas quando lhe entregaram na enfermaria, mas era inútil e tinha uma foto horrorosa. Ele odiava não saber dirigir naqueles momentos, que costume idiota sempre ter alguém para levá-lo a todos os lugares.

Quando o carro estacionou diante do prédio, Jungkook respirou fundo. Lar doce lar então. Ou quase isso.

Ele pagou o taxista e parou na calçada por alguns momentos. Era um sobrado de cinco andares, com tijolos à vista e trepadeiras de rosas que cobriam toda a lateral, janelas rústicas e uma sacada para cada apartamento. 

Era o mesmo lugar onde Jimin morava. Isso quando não passava as noites no palácio, o que era basicamente a semana toda.

Era um bairro de classe alta, muito próximo da casa da família real, o que dizia que mesmo quando estava longe, Jimin ainda estava muito perto. 

E ao entrar, abrindo a porta com a chave que estava presa a um chaveiro ridículo de um alienígena com uma coroa, ele encontrou uma casa muito bem organizada. A sala de estar era espaçosa, haviam plantas enfileiradas na janela e um passa pratos de pedra rústico que dava uma visão ampla da cozinha.

E assim como todo o restante, aquele lugar era igualzinho ao apartamento de Jimin, com exceção de que nas fotos na prateleira, ele não aparecia nenhuma vez. Todas fotos de Jungkook com sua família, fotos dele com Namjoon, com Yoongi e até mesmo com Jin, o médico da corte. Mas nada de Jimin. Assim como no apartamento de Jimin não tinha nenhuma foto em que ele aparecesse.

Jungkook fechou a porta, jogou as chaves na tigela de porcelana que havia sobre uma mesinha e ficou descalço antes de se jogar no sofá, que por sinal era muito desconfortável. Alguém tinha que ensinar Jimin a comprar móveis. Ou ensinar o próprio Jungkook, nesse caso?

Aquilo tudo era tão confuso que sua mente dava um nó até em pensamentos simples.

Seus olhos se prenderam no teto que parecia baixo demais comparado com o teto do seu quarto no palácio. Ele respirou fundo e soltou o ar devagar.

Ele havia sido duro com Jimin? 

Não.

Park merecia ouvir aquilo e muito mais.

Apesar de que Jeon sentia uma pitada de remorso por ter dito aquilo com tanta rispidez. Nunca tinha visto Jimin sem palavras ou parecendo magoado com nada que ele dizia, mas então ele explodiu daquela forma e viu os olhos daquele baixinho insolente se apagando como se um vento frio soprasse uma vela.

Ele sacudiu a cabeça.

Não devia se sentir culpado por dizer a verdade. Não depois de tantos anos ouvindo desaforos dele sem fazer nada além de retrucar com piadinhas bobas.

Jimin merecia sentir na pele o que ele sentiu por anos. Aquele peso de ser julgado e criticado a cada passo, de viver ao lado de alguém que o desprezava completamente e não tinha vergonha de dizer isso todos os dias.

Park Jimin precisava de uma dose do próprio veneno.

Seu telefone vibrou no bolso e ele se lembrou de que tinha comprado um novo já que o seu havia se perdido no acidente. Mas quem já tinha conseguido seu número novo?

Ele franziu a testa ao erguer aquele aparelho diante dos olhos.

Sou eu, Namjoon
Como pode ter mudado de número sem me avisar?
E nem pense em dizer que está cansado, não vai dormir sem antes me dizer o que rolou entre você e Sua Majestade
Disseram que ele nem tocou na comida e parece que estava com cara de quem perdeu um bichinho de estimação

Ele bufou e bloqueou a tela. Então Jimin estava provando do bom e velho remorso, isso era bom. Jungkook até sorriu.

— Bem feito — Jeon sussurrou para si mesmo.

O lugar era silencioso e cheirava a desinfetante de lavanda. Era estranho saber que não haviam guardas do lado de fora e não imaginava o que iria jantar, tinha certeza que não sabia preparar nada que estivesse nos armários.

Mas era um tanto reconfortante, como poder respirar livremente.

Ele saiu do palácio sem que o seguissem perguntando onde ia e sem que precisasse levar quinze homens consigo. Pegou um táxi sem precisar esconder o rosto e agora estava completamente sozinho e não corria risco de sofrer nenhum atentado por isso.

Era uma coisa que ele jamais pensou que provaria. Normalidade.

Poder sair e fazer coisas que jovens normais faziam como ir em festas e beber até ficar louco e subir nas mesas para cantar uma música brega, ou ir ao shopping sem ser cercado por uma dezena de pessoas pedindo fotos. Simplesmente andar na rua, com o rosto livre e sem ser atacado.

Desde que se conhecia por gente sua vida era controlada pelos outros. Aos seis anos já tinha uma agenda lotada e sempre era seguido de perto por pessoas dizendo: faça isso, não vá a esse lugar, você tem que dizer aquilo.

Ele amava seu povo, amava seu cargo e amava ser o rei. Havia nascido para aquilo e até a morte daria sua vida por seu país. Mas não podia fugir do fato de que viver sempre sob as cobranças intensas da realeza era inevitável.

Governar, sorrir, proteger, não mostrar fraqueza. Essa era a imagem que o Reino da Coréia precisava ver: um rei imponente e poderoso, que nunca se deixava vencer por nada. Quase uma máquina imbatível e indestrutível. Não um humano, não alguém sujeito a falhas e as mesmas paixões que os demais.

E era exaustivo manter essa imagem.

O celular vibrou mais uma vez e ele olhou.

Não esqueça de checar seu cronograma de amanhã, enviei para o seu email
Temos que voltar a ativa, vai ter que deixar sua dor de cotovelo de lado
Boa noite, general :)

Jungkook franziu a testa.

Dor de cotovelo? O que ele queria dizer com aquilo?

Jungkook decidiu que não precisava se preocupar com nada a respeito daquela versão sua. Afinal ele só precisava esperar que V descobrisse algo e o mandasse de volta. 

Ele se levantou. Sua conclusão era que se fosse dormir cedo não teria que lidar com a fome e poderia assaltar a cesta de frutas da cozinha do palácio no dia seguinte, sabia que Jimin fazia isso o tempo todo e ninguém o criticava.

Jeon se arrastou em direção ao quarto.

Ele já tinha estado na casa de Jimin antes. Em uma noite que, em uma de suas fugas, Jungkook se perdeu e teve que ligar para Jimin de um telefone público. Demorou tanto até que Park conseguisse encontrá-lo que Jeon quase teve uma hipotermia.

Ele levou uma das piores broncas da vida, e como estavam mais perto da casa de Jimin que do palácio, o general o levou ali e cuidou dele até que estivesse bem suficiente para voltar ao palácio. Apesar disso, ele nunca entrou no quarto de Jimin, já que ficou na sala perto da lareira.

Aquela coisa toda durou uma madrugada e  Jungkook se lembrava de cada detalhe daquele lugar. Era estranho pensar que foi a única noite em anos em que eles conversaram sem brigas ou alfinetadas. 

Seus olhos percorreram o quarto assim que ele acendeu a luz. A cama estava bagunçada, talvez fosse a única coisa fora de ordem na casa toda. Jungkook se arrastou até ela e sentou.

Seu corpo ainda doía por inteiro. Ele jogou a cabeça para trás, sentiu algo em seu pescoço voltar para o lugar com um estalo dolorido e levou sua mão ao local.

E ele olhou em direção a mesa de cabeceira em busca de um relógio, mas esqueceu completamente de ver as horas quando avistou o porta retrato. Não era uma foto qualquer, era a foto tirada no dia que Jimin e Jungkook partiram para seus anos de serviço na marinha. Ambos com os uniformes brancos, ambos sorrindo para a câmera. 

Ele franziu a testa em confusão e pegou o porta retratos. O que aquela foto fazia ali?

Jimin tinha aquela foto em sua cabeceira ou era uma exclusividade de Jeon Jungkook daquele universo?

Ele soltou o porta retratos virado para baixo na mesa de cabeceira com mesma velocidade que tinha agarrado o objeto.

Não precisava prestar a atenção naquelas coisas fúteis, afinal era só uma foto.

Só tinha que fingir ser o general até que tudo se ajeitasse e isso seria moleza. Só gritar e ficar na cola de Jimin como um carrapato o dia todo, ele podia fazer esse papel com muita facilidade. Só precisava aguentar até voltar para casa.

Então ele demitira Jimin e não teria que olhar para ele nunca mais. Ele jamais admitiria, mas pensar nessa possibilidade fez seus ossos tremerem.

(...)

Ele chegou a conclusão de que além de odiar Jeon Jungkook, odiava também o guarda roupas dele. Em todo aquele closet que devia ser maior que seu apartamento, Jimin não encontrou nada que não tivesse bordados, pedrarias, tecidos coloridos e estampas chamativas.

O que ele tinha contra usar algo discreto?

Ali estava o motivo pelo qual era tão fácil armar um atentado contra ele. Cada um daqueles blazers parecia gritar: o rei está aqui, atirem em mim!

— Que merda — ele murmurou com um suspiro, passando a mão por um blazer azul. Outro fato era que só tinha meia dúzia de gravatas. Ele sabia que Jungkook odiava gravatas com todas as forças e não sabia nem mesmo fazer o nó sozinho, mas era um absurdo que em um closet daquele tamanho só tivessem seis gravatas. E todas horrorosas. 

Jimin respirou fundo. Sua alternativa mais discreta era uma camisa branca e uma calça azul petróleo, por isso ele decidiu que passaria o dia sem gravata, apesar de a ideia parecer horrível. Era como se faltasse algo.

Ouviu uma batidinha na porta enquanto ele terminava de prender as abotoaduras mais simples que encontrou. 

— Pode entrar — ele respondeu com desânimo. A porta do closet abriu e o homem entrou, os olhos fixos em uma planilha que estava presa no antebraço, enquanto se aproximava dele um tanto ofegante.

— Bom dia, Majestade — Yoongi cumprimentou, se curvando rapidamente antes de erguer uma das páginas para olhar a segunda. — Precisamos ser rápidos, temos muitos compromissos que foram reagendados por conta do atentado. 

Min Yoongi, pelo menos em seu mundo, era um de seus melhores amigos. Desbocado e com pavio curto, ele podia parecer um baixinho carrancudo, mas não passava de uma criança grande e era sempre o primeiro a topar qualquer loucura que envolvesse um pouco de adrenalina. Tipo assaltar a adega do rei.

Apesar de aquele ali parecer um tanto frio e distante, o que lhe dizia que talvez não fossem tão amigos assim.

— Claro — Jimin disse com um sorriso forçado.

Só então Yoongi desviou o olhar das páginas e o encarou, com a testa franzida em total confusão. Seus olhos atentos e perfeccionistas percorreram todo o corpo de Jimin como um radar em busca de algo errado.

— O senhor vai sair assim? — perguntou, tentando soar delicado. Jimin olhou para si mesmo. Calça, sapatos, camisa. Ele estava bem vestido, qual era o problema?

— Algum problema? — Jimin devolveu a pergunta.

— De forma alguma, parece só… simples demais pra você. — o Min deu de ombros, decidindo não discutir e voltando a atenção a planilha. Afinal ele deveria estar subindo pelas paredes com todo o trabalho que refazer toda a agenda semanal do rei lhe deu. Jimin estava acostumado a ver Rosé indo dormir tarde para recolocar os compromissos que Jungkook não conseguia cumprir, um dos motivos pelos quais ele tinha tanta aversão pelo rei. Que agora não era mais o rei. — Primeiro vamos a um almoço com o primeiro-ministro britânico e em seguida precisa visitar o ensaio da cerimônia do festival. O restante eu lhe passo no carro.

Jimin concordou. Ele sentiu um frio na barriga e  seus ossos gelaram quando ele percebeu que realmente ia ter que fingir ser o rei. Era mais que um faz de conta, ele estava a frente de uma nação e cada passo seu era importante. Engoliu seco e se manteve parado olhando para o espelho.

Talvez realmente não fosse tão fácil assim ser rei.

— Oh, antes que eu me esqueça. — Yoongi enfiou a mão no bolso da calça, em seguida passou para o próximo até encontrar algo e estender para Jimin. 

O loiro estendeu a mão e observou quando Yoongi colocou na palma estendida um anel. Largo, de prata e com pedras grandes e negras. Ele reconhecia a jóia, Jungkook usava todos os dias. Era o anel da dinastia Jeon.

— Estava no dedo do general quando ele foi levado a área hospitalar, tive um trabalho enorme para conseguir pegar antes que alguém notasse — disse Yoongi, com um olhar sério de advertência. Ele tocou no ombro de Jimin. — Tome mais cuidado da próxima, Majestade.

Jimin ia questionar a respeito do que deveria ter mais cuidado, mas Yoongi não lhe deu tempo de falar nada, apenas deu as costas e andou em direção a porta, um sinal claro de que estava com pressa e eles precisavam ir. Ele apenas jogou o anel no bolso da calça e o seguiu.

Min continuou dizendo algo, não era alto suficiente para que Jimin ouvisse, então ele supôs que fossem palavrões.

Quando os dois saíram do closet e chegaram ao quarto, Jimin prendeu a respiração por alguns segundos. Era difícil olhar nos olhos de Jungkook logo depois da discussão da noite anterior, ainda mais quando ele sequer tinha conseguido tocar no café da manhã por conta daquilo.

Mas ali estava ele, parado no meio do quarto, com a sua mesma postura de sempre, o queixo bem erguido e as costas bem retas, as mãos em frente ao corpo.

Ele olhou para Jimin por meio segundo antes de desviar o olhar. E ele estava um desastre completo. A camisa amassada, a calça com o friso torto e os três primeiros botões abertos. Era estranho ver ele sem as típicas argolas na orelha e os outros brincos que costumava usar. Nenhum anel, nenhuma pulseira.

Jungkook, que normalmente parecia uma joalheria ambulante, estava discreto e vestindo apenas as roupas que Jimin costumava usar todos os dias.

Os dois fizeram uma careta ao prestarem atenção nas vestimentas um do outro. Chamariam Jungkook de desleixado, e diriam a Jimin que ele estava simples demais. 

Seria um dia exaustivo.

Jungkook encarou aquele homem, tendo em mente todas as mágoas que lhe tiraram o sono pela madrugada. E Jimin não ter noção alguma sobre como se vestir apenas serviu para que ele ficasse ainda mais indignado com a situação.

Ele tinha um closet do tamanho daquele quarto e conseguiu sair de lá vestido como um gerente de loja de colchões, era lamentável.

Yoongi nem precisou olhar para eles enquanto andava até a porta.

— O cronograma está muito apertado, vou tentar encaixar um horário para o "joguinho de encarar" de vocês, mas vai ter que ser entre as 17:00 e 17:30 — ele resmungou mal humorado. — Agora quero os dois andando.

Nenhum deles disse nada, apenas obedeceram.

Jimin saiu do quarto, sentindo suas pernas tremerem ao pensar no que estava prestes a fazer. Ele sentiu Jungkook na sua cola, alguns passos atrás.

— Ergue a cabeça — Jungkook sussurrou. Quando Jimin o olhou, ele não vacilou em nenhum momento, sequer parecia que havia acabado de dizer algo. Seus olhos fixos nas costas do homem que ia na frente deles. — Um rei não abaixa a cabeça, é sinal de fraqueza e derrota. Sempre mantenha o queixo erguido e o olhar no que estiver na sua frente.

Aquilo soou um pouco rude. Jungkook era cheio de si e Jimin tinha ciência disso, e sabia que o moreno faria de tudo para esfregar na sua cara cada coisa em que ele falhasse a partir daquele momento.

E talvez ele merecesse.

Park obedeceu, empinou o nariz com soberba e encarou as costas de Yoongi.

Ele olhou para Jungkook de relance, avistando o ponto pendurado sobre o ombro dele.

— Tem que colocar isso no ouvido — falou o loiro. Jungkook tocou o objeto pequeno com uma careta de desagrado. Aquela coisa incomodava, como Jimin conseguia ficar com aquilo no ouvido o dia todo? — Precisa ouvir todos da sua equipe. Cadê sua arma?

Jungkook arregalou os olhos e o olhou como se ele fosse louco.

— Eu não vou andar por aí armado! — o moreno sussurrou como se aquilo fosse um absurdo.

Jimin respirou fundo. Se sua vida dependesse de Jungkook naquele dia, voltaria para casa em um caixão.

As coisas não podiam piorar.

(...)

Jimin não sabia falar inglês. E era um encontro com o primeiro-ministro britânico. 

Talvez isso justificasse a crise de pânico que ele estava prestes a ter quando se deu conta disso. Mas era tarde para fingir que estava passando mal ou algo do tipo.

Suas pernas estavam bambas quando ele saiu do elevador no prédio onde o encontro aconteceria. Seu coração estava prestes a pular para fora do peito quando ele avistou o homem, de pé no meio daquela sala grande e luxuosa.

Jimin engoliu seco, apertou as mãos e tentou abrir um sorriso, mas não adiantou muito. Havia fotógrafos e provavelmente o secretário do homem. Por instinto ele olhou em volta no salão, para ver se seus homens estavam a postos, não encontrou nenhum deles.

Atrás dele, Jungkook acompanhava cada passo de Jimin. Ele andava como um soldado, olhava em volta desconfiado como se estivesse prestes a ser atacado, aquilo era um desastre, já era visível no rosto do primeiro-ministro que o comportamento de Jimin não estava sendo dos melhores.

Jimin e o homem se cumprimentaram com uma reverência. Jungkook estava tão focado em todas as coisas que Park estava fazendo errado, que se assustou a ponto de soltar um gritinho agudo quando ouviu uma voz direto em seu ouvido.

— Já podemos nos posicionar, general? Você ainda não disse nada — Namjoon parecia apreensivo e ofegante, como se estivesse andando.

Jimin olhou sobre o ombro depois do grito, com os olhos arregalados e não foi o único a lhe lançar um olhar de repreensão, já que Yoongi basicamente lhe mostrou os dentes.

Jungkook arregalou os olhos e encarou o relógio de pulso. Já tinha visto Jimin fazer aquilo dezenas de vezes, não devia ser difícil. Mas tinham três botões na lateral, qual era o certo?

Ele olhou para Jimin, que mantinha o olhar nele por cima do ombro enquanto fazia um sinal frenético com o dedo nas costas. Esquerda. Estava apontando para a esquerda.  Então deveria ser o primeiro botão.

Jungkook levou próximo a boca. Yoongi o encarava como se ele tivesse o cérebro de uma minhoca, parecendo abismado com a lerdeza descomunal do homem.

— Claro, tenente! — Jeon engrossou a voz para dizer, o rosto de Yoongi se torceu ainda mais, com total desconfiança.

— Entendido — Namjoon respondeu prontamente, aliviando a mente preocupada de Jungkook.

Jimin encarou o homem à sua frente à medida que o desespero crescia. 

— It's a pleasure to meet you in person, Majesty — disse o homem com um sorriso gentil.

You

A única palavra de toda a frase que Jimin conseguiu entender. Mas You o quê?

Ele sorriu e assentiu, torcendo para que não fosse uma pergunta.

— I think we can talk about the recent direct attacks by Russian forces, do you think this is a good topic to start with? — se a primeira frase o confundiu, a segunda foi a confirmação de que ele não podia fazer aquilo.

Ele levou a mão à cabeça, esperando ser bom pelo menos para encenar uma careta de dor. Pelo olhar preocupado do homem,  funcionou. Ele ergueu um dedo, um sinal de que estava pedindo tempo.

Yoongi parecia prestes a infartar. O que tinham feito com o rei e o general naquela manhã?

— Ahn… excuse me por um minuto — ele disse depressa.

Se levantou e andou apressado e de cabeça baixa em direção a porta. Ao passar por Jungkook, que estava parado na frente da porta como um moleque entediado, Jimin fez um gesto quase invisível para que o seguisse para fora, e mesmo sob o olhar quase fulminante de Yoongi, o moreno o seguiu.

Jimin fechou a porta assim que os dois se viram no corredor.

Os guardas que estavam posicionados ao longo do corredor, olharam de forma discreta para os dois, muito curiosos sobre qual rebuliço podia estar acontecendo.

— Eu não sei falar inglês! — Jimin confessou com desespero.

Jungkook respirou fundo. Ele sabia bem disso, foi ele mesmo que disse a Jimin que se não fosse obrigado não se dedicaria tanto a um idioma tão difícil, quando podia gastar o tempo com algo mais útil. Ele tinha uma parcela de culpa.

Mas não ia admitir isso e deixar passar a chance de ver Jimin pedir ajuda, ao vivo e a cores. Seria um espetáculo.

— E eu não sei o que Namjoon está dizendo com "código isso e código aquilo", mas estou me virando. Você não é o sabichão, Jimin? Se vira! — Jeon disse, cruzando os braços e erguendo o queixo para olhá-lo por cima.

E era aquela expressão que ele queria emoldurar. A testa franzida, o lábio inferior se sobressaindo e seus olhos olhando de um lado a outro para evitar os dele. Jimin era orgulhoso e admitir que precisava de ajuda era como dor física para ele, talvez até pior.

— Eu preciso de ajuda — ele disse, olhando os próprios pés, e com voz de quem estava pedindo a Jeon um pouco de maconha. 

— Não ouvi, fale pra fora — o moreno insistiu. Jimin praguejou.

— Eu preciso de ajuda — disse ele, um pouco mais alto e um tanto raivoso. Respirou fundo e mesmo que aquilo quase o fizesse engasgar, ele completou: — Por favor, Majestade.

Jungkook, diferente dele, não tinha o orgulho muito inflado e apenas de ouvir o "por favor", sussurrado enquanto Jimin lhe olhava com os olhos do Gato de Botas, foi suficiente para que ele se desse por satisfeito.

— Certo — Jungkook falou — Você vai dizer exatamente o que eu mandar.

— E se não funcionar? — o loiro perguntou.

Jungkook deu de ombros.

— Vai funcionar, eu não costumo errar — disse Jungkook — Mas tem um preço.

Óbvio que tem — Jimin resmungou, contrariado.

— Eu cobro depois, digamos que você fica me devendo — Jeon olhou sobre o ombro dele, para os guardas que parecia que matariam para ouvir o que os dois estavam falando. Ele sorriu e se aproximou mais de Jimin. — Agora você vai voltar lá e vai dizer o seguinte...


Notas Finais


Espero que estejam gostando🥰
Acredito que a fanfic vai acabar tendo mais de 10 capítulos, me dei conta de que eles são todos enormes e estou precisando dividir em dois pra não ficarem muito grandes.
Logo tem mais💜


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