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História Você vai lembrar - Jilan - Você vai pedir por mim.


Escrita por: AlphaMarkhab

Notas do Autor


Oooi, meus amores 💛 Tudo bem?

Eu escrevi essa fanfic aqui numa das minhas hazes de soninho, ela é bem bobinha e tranquila em comparação ao resto da série dela 💛 apesar do shipp inusitado, eu gostei bastante de escrever e espero que vocês também gostem de ler.

Apenas um aviso antes da leitura:

Eu acho que eu não precisaria estar me explicando aqui, mas todos esses anos de internet me provaram que, na verdade, eu preciso :'D

Essa história surgiu a partir de um devaneio adolescente, açucarado, melodramático e ✨fantasioso✨. Que isso fique bem claro desde o início, porque premissa é bonitinha e tal, mas a gente tá falando de um universo onde as coisas não são tão ruins quanto elas de fato são na realidade. Vamos lembrar que isso aqui é uma fanfic, sim?

Em outras palavras, na maioria esmagadora das vezes o seu webnamoradx vai ser SIM só um otário fazendo catfishing com você. Não confie tanto nas pessoas, não saia mostrando fotos do seu rosto ou do seu corpo (sobretudo se você for menor de idade) e tenha cuidado ao conhecer pessoas pela internet. A rede pode ser uma fonte de mágicas amizades ou de tráfico de pessoas, não tem meio termo, não.

Enfim, é isso 💛 boa leitura!!!

Capítulo 1 - Você vai pedir por mim.


Fanfic / Fanfiction Você vai lembrar - Jilan - Você vai pedir por mim.

Hey...

JinJin?

Está aí?

 

A-Jin!

Estou aqui! Desculpe a demora

Estou sendo alugado :(

 

Não tem problema, imaginei que você estivesse ocupado...

 

Não estou! Não de verdade

E só que um amigo meu resolveu me arrastar pra uma festa justo hoje

Estava tentando convencer ele a não me levar

 

Qual amigo?

 

Aquele que não gosta de festas rs

Eu só acho engraçado que ele fica o fim de semana todo em casa, já casei de chamar ele pro rolê

Ele nunca vai, mas hoje cismou que quer ir nessa festa, assim do nada

Não tão do nada, na verdade é a festa do primo dele... Mas mesmo assim!

 

Você deveria estar feliz, JinJin

Achei que gostasse de festas

 

Eu gosto! Mas é que eu não queria ir nessa festa...

O primo do meu amigo é aquele cara chatão lá da escola que eu te falei

 

Hm, aquele metido que você não suporta?

 

Ele mesmo D: eu nem achei que fosse ser convidado

Acho que ele só saiu chamando qualquer um pra encher a casa

Aí meu querido amiguinho decidiu que seria uma ótima chance de eu apresentar a vida pra ele

Posso com uma coisa dessas???

 

É melhor que você vá...

Se ele não tem costume com festas e tal

Seja um bom amigo não deixe que ele dê nenhum vexame :')

 

A-Jin é tão bonzinho ♡︎

Eu vou acabar indo... Tenho medo de deixar esse meu amigo sozinho no meio daquele monte de meninas apaixonadas

Mas eu acho bem pouco provável ele dar vexame, ele é tão comportadinho que dá pena

 

Sei bem como é, eu também conheço um jovem monge

 

Ah! E assim que chamam ele lá na escola

Mas enfim, deixa isso pra lá

O que meu A-Jin queria me dizer? 

 

Não é nada, não ♡︎ não se preocupe

 

A-Jin... Não faz assim :"( converse comigo

Eu tenho te reparado tão pra baixo esses dias

É algo comigo?

Eu te chateei de alguma forma?

 

Não!

Não é isso, não pense assim...

Você nunca me aborrece

 

Então o que há de errado?

Alguém te maltratou, foi?

Eu juro que só preciso de um nome >:( quem tiver feito meu A-Jin ficar triste vai se arrepender

 

Não, JinJin ♡︎

Ninguém me fez nada, não se preocupe

 

Então é por causa do seu aniversário, não é?

 

Não é isso...

Bem, não exatamente

Você não estava ocupado?

 

Pra você eu nunca estou

E no momento, é mais importante pra mim saber o que está acontecendo com o meu xuxu...

 

Ah, JinJin... É que eu vou fazer 18 amanhã

Vou ganhar o que eu pedi de presente, meus pais vão fazer um almoço, mas eu sinto que algo está faltando...

Eu não me sinto feliz

Mas me sinto um ingrato :"(

 

Você não é nenhum ingrato

Às vezes, quando algo está fazendo falta, é porque realmente tem alguma coisa faltando

 

Você está faltando

Eu queria tanto que você estivesse aqui amanhã...

 

Eu queria muito estar aí, meu bem

Com todo o meu coração

Como eu não posso ir até a sua casa pra te dar um abraço, eu queria pelo menos passar a noite aqui contigo

Ser o primeiro a te dar parabéns quando desse meia-noite

Mas nem isso eu posso, meu amigo insiste em ir na tal festa e eu não posso deixar ele sozinho

 

Não perca bons momentos por minha causa, JinJin

Você deve ir na festa com ele

 

Eu vou voltar em tempo!

Ele dorme cedo, vai enjoar da festa rapidinho

Eu volto correndo pra ficar com você ♡︎

Se você quiser, é claro...

 

Eu sempre quero!!

Falar com meu Jinjin sempre me faz tão feliz

Mas eu não quero atrapalhar a sua noite

E eu talvez fique um pouco ausente hoje...

 

Você nunca atrapalha ♡︎♡︎♡︎

Hm, vamos fazer assim, então

Eu vou me ausentar aqui, mas volto para te dar parabéns quando for meia-noite

E antes disso, se você precisar de mim, é só me mandar uma mensagem que eu volto ♡︎

Vou levar o celular pra estar sempre com você

 

Tudo bem, JinJin :")

Ah!! Eu posso te pedir uma coisa?

 

Tudo que o meu A-Jin quiser

Só não te dou o mundo inteiro porque ele não ia caber nas suas mãozinhas :D

 

JinJin é tão bobo! ♡︎♡︎♡︎

Eu só queria pedir para você usar algo amarelo hoje... Pra lembrar de mim

 

É claro! Vou atrás de algo amarelo agora mesmo

E se você tiver algo azul ♡︎ poderia se lembrar de mim também?

 

Com certeza!!!

 

Agora eu realmente preciso ir salvar a pele do meu amigo...

Me chama se precisar de qualquer coisa, tá bem?

Eu venho te salvar ♡︎

 

Você sempre vem ♡︎

 

Sempre!

Até mais!

 

 

— Você não teria nenhuma roupa amarela por aí, teria?

Jingyi perguntou, tentando parecer casual. Colocou o celular de lado por um momento e se jogou sobre a cama, já cansado de esperar.

— Amarela? — Sizhui perguntou estranhando. Parou de arrumar sua gravata para olhar o amigo com uma sobrancelha erguida. — E você gosta de usar amarelo, por acaso?

— Eu não odeio amarelo.

— Eu nunca te vi usando nada amarelo, pelo menos não depois do nosso uniforme do primário. Por que isso de repente?

— Você tem a porcaria da roupa ou não?

Sizhui olhou Jingyi com a testa franzida e os braços cruzados, daquele jeito que fazia quando não estava convencido do que ouviu. Ele ficava igualzinho ao tio Wuxian daquele jeito, céus. Chegava a ser assustador o quão parecidos os dois podiam ser, isso porque ele era adotado.

Jingyi pigarreou, sentindo as bochechas esquentarem pelo olhar inquisidor que recebeu. Não era como se Sizhui não soubesse sobre A-Jin. Ele era seu melhor amigo, não havia como ser diferente. A questão era que ele sabia, mas não aprovava. Não o impedia, nem lhe aplicava sermões com cinco horas de lição de moral sobre os perigos da internet, mas deixava sua insatisfação clara de outras formas. Nessas horas ele mais parecia o tio Wangji, que também não era pai biológico dele, mas bem que poderia ser.

— Certo. — Jingyi se deu por vencido, erguendo as mãos em desistência. — A-Jin me pediu para usar algo amarelo hoje, é a cor favorita dele.

— Ah, por favor... — Sizhui revirou os olhos, se voltando para o espelho. — Fala sério. Vocês dois são tão melosos que chega a me constranger.

— Você só fala isso porque é bobo demais pra ter uma namorada! Se não fosse por mim você ainda nem teria beijado uma menina.

— Eu não sou precoce como você!

— A gente tem 18 anos, Sizhui!

Sizhui o olhou, agora realmente irritado. O rosto vermelho dele mostrava o quão desconfortável aquele papo todo sobre meninas o deixava. Ele era tão ingênuo, coitadinho. Como Jingyi havia dito a A-Jin, Sizhui era só um jovem monge, não tinha nenhuma iniciativa para sair, beber, fazer as merdas que todo adolescente faz. Isso era desde sempre, Sizhui também havia sido aquela criança quietinha e reservada que odiava sujar a roupa, Jingyi nem sabia como os dois acabaram se tornando melhores amigos tão depressa. Inesperadamente, um cabide de roupas amarelas foi jogado sobre Jingyi, que caiu com as costas na cama pelo susto do golpe.

— Ai, porra! Por que está me atacando?! — Perguntou, se defendendo com os braços. — O que foi que eu te fiz?

— Você não queria uma roupa amarela?! — Sizhui jogou outro cabide na sua direção. — Toma aqui a sua roupa amarela!

Jingyi acabou rindo do rostinho constrangido de Sizhui, que saiu marchando em direção ao banheiro do quarto. Pegou as roupas que haviam caído no chão e deu uma boa olhada nelas. Era um conjunto finíssimo de um amarelo intenso e levemente brilhante, composto por uma bermuda social, um blazer do mesmo tecido e um lenço estreito de aparência chique. Por mais que amarelo não fosse a sua cor, precisou admitir que era um traje bem bonito.

— Por que eu nunca te vi usando isso aqui? — Gritou para Sizhui, já começando a se despir para experimentar o conjunto.

— Porque, ao contrário de você, eu não gosto de amarelo. — Sizhui respondeu através da porta.

— E você tem essa roupa por...?

— Quem me deu foi meu tio Zixuan. É claro que ele não me daria nada menos chamativo que isso. Eu só vesti uma vez, num almoço de família, porque papai disse que seria desfeita não usar.

Jingyi terminou de vestir o conjunto, se olhando no espelho. Decidiu manter a camisa branca simples por baixo do blazer, não ficou nada ruim. Mesmo com os tênis pretos e os brincos discretos nas orelhas, se sentiu bem com a roupa mais requintada.

— Ficou bom em você. — Sizhui admitiu ao sair do banheiro. — Pode ficar, se quiser.

— Tem certeza?

— Você estaria me fazendo um favor. Meu pai é doido pra se livrar dessa coisa, mas me proibiu de jogar fora. Se eu disser que eu te dei, ele vai ficar menos irritado.

Jingyi concordou, ainda se admirando.

— Obrigado tio Wangji. — Cantarolou, ajeitando os cabelos.

— E como eu estou? — Sizhui perguntou, virando-se para o amigo.

Jingyi comprimiu os lábios, sinceramente preocupado, com uma mão na cintura e outra coçando a testa meio sem jeito.

— Parece que você vai se casar. — Constatou.

Sizhui jogou as mãos para cima, frustrado.

— É a quinta vez que eu troco de roupa hoje. Desse jeito nós vamos chegar atrasados.

Jingyi o olhou com um pouco de pena. Eles estavam indo numa social na casa de um garoto da idade deles, não a um enterro ou audiência de custódia, mas não era como se pudesse exigir que Sizhui soubesse como se preparar para aquele tipo de evento.

— Vai deixar eu te ajudar agora? — Jingyi perguntou.

Mesmo contrariado, Sizhui fez que sim.

— Tá, olha. Antes de qualquer coisa, ninguém chega na hora numa social. A postagem dizia que o rolê começa às cinco, ou seja: eles esperam que a casa esteja cheia bem depois das sete. Nem rela, que a gente 'tá até adiantado.

Jingyi se colocou atrás de Sizhui para tirar o paletó elegante que ele havia colocado. Largou a peça sobre a cama de qualquer jeito, quase provocando um infarto no amigo, que preferiria colocar tudo no cabide direitinho para guardar.

— Outra coisa. — Jingyi continuou, desfazendo a gravata do outro. — Aquele presente ali, você não vai levar. Mesmo que às vezes pareça, seu primo não tem mais seis anos. Se tiver que dar algo a ele, dê outra hora. Ninguém leva nada para uma social porque a gente quer ocupar as mãos com outras coisas.

— Tipo o quê? — Sizhui perguntou inocentemente.

Jingyi riu com malícia.

— No seu caso, antes do fim da noite eu quero te ver com um copo vazio numa mão e a cintura de alguma garota bonita na outra.

Sizhui corou outra vez.

— Tá, vamos ver. Você tem um cinto mais neutro? — Jingyi perguntou. Em segundos Sizhui voltou com um cinto de couro preto com uma fivela igualmente escura e mais discreta. — Bom. Troca.

Sizhui começou a trocar o cinto enquanto Jingyi vasculhava sua própria mochila.

— Onde foi que eu deixei... Achei!

— Achou o quê? — Sizhui perguntou com suspeita, já receoso com o que o amigo aprontava.

— Nada não, deixa eu ver você. — Jingyi pediu, dando uma olhada boa na aparência geral de Sizhui. — Não, ainda está muito formal.

Ele se aproximou e puxou as mangas da camisa social branca, arregaçando-as até pouco acima dos cotovelos de Sizhui. Também abriu os primeiros três botões da camisa dele, desarrumando a gola de um jeito estiloso.

— Isso não vai ficar muito indiscreto, não? — Sizhui perguntou.

— Só o suficiente. Agora, em vez desses sapatos de pai de família, vá colocar os seus all stars, os vermelhos.

— Tênis?!

— Sim, anda logo.

Jingyi também remexeu a caixinha de joias de Sizhui na intenção de fazer uma boa combinação. Todas as coisas dele eram tão básicas que era até meio difícil fazê-lo parecer jovem. Conseguiu fazer um bom trabalho no fim, sentando o amigo já calçado na beirada da cama.

— Tem mais algumas coisas que eu preciso te dizer. — Jingyi apoiou um joelho no colchão, começando a pincelar muito suavemente uma sombra marrom nos olhos de Sizhui. — Quando chegar lá, não precisa se curvar para ninguém. Eu sei que você vai achar desrespeitoso, mas tenha em mente que metade deles já vai estar meio bêbada porque sempre tem um esquenta na casa de alguém. Basicamente, ninguém se importa. Fica bem quietinho agora.

Com as mãos habilidosas de quem já havia feito aquilo mil vezes, Jingyi delineou os olhos de Sizhui com um pincel preto. Não era nada chamativo, só o suficiente para fazer os olhinhos dele parecerem mais abertos e menos entediados. Quem olhasse depressa nem imaginaria que ele estava maquiado. Por fim, completou com um lip tint enquanto explicava mais algumas normas básicas da convivência em uma social.

— Vem, levanta. — Jingyi o levou até o espelho, prendendo uma corrente prateada na calça de Sizhui e outra no seu pescoço, por cima da pele exposta. Deslizou no seu braço esquerdo as pulseiras que conseguiu encontrar na caixinha dele e alguns anéis na sua mão direita. — E agora, o toque final.

Tirou do bolso o que havia encontrado na sua mochila e estava escondendo dele. Era uma gargantilha finíssima que ficava confortavelmente justa no pescoço. O plano de Jingyi era usá-la com seu próprio look, mas com aquele blazer chamativo não iria combinar. Quando se afastou para que Sizhui contemplasse sua própria imagem no espelho, Jingyi admirou seu trabalho com orgulho.

— O que você achou?

Sizhui parecia igualmente admirado e assustado.

— É... Ousado.

— Com certeza, mas da forma correta. — Jingyi sacudiu os ombros dele de maneira encorajadora. — Não vai passar despercebido por ninguém, vai chamar a atenção das pessoas certas.

Os dois se olharam novamente. Jingyi diria que agora sim eles pareciam os garotos mais bonitinhos do rolê.

— Que inferno, por que você tem que ser tão charmosinho? — Jingyi perguntou retoricamente, se afastando do amigo para terminar de se aprontar.

A porta foi aberta sem aviso e os pais de Sizhui entraram por ela. Eles deram uma boa olhada nele e seus queixos caídos indicavam que mal reconheciam o próprio filho. Enquanto o tio Wuxian parecia explodir de empolgação, o tio Wangji só tinha os braços cruzados e a testa minimamente enrugada.

— O nosso bebê está tão crescido, amor. — O tio Wuxian disse, balançando o braço do marido. — Olha pra ele, todo arrumadinho pra sair...

Ele se aproximou de Sizhui para ver o look por completo, mas acabou por pegar o garoto desprevenido num dos seus abraços de pai emocionado.

— P-pai...

— Sabe o que eu acho que está faltando? — Jingyi comentou para o tio Wuxian, que o olhou imediatamente com aquele sorriso enorme. — Um perfume. Mas um dos seus, tio. Tudo que Sizhui usa tem cheiro de bebê.

Sizhui o olhou feio, mas o tio Wuxian o largou e saiu correndo do quarto para buscar o dito perfume. Enquanto isso, o tio Wangji finalmente se aproximou deles com sua postura dura, olhando para os dois com alguma preocupação.

— Vocês só estão indo nessa festa porque é aniversário do seu primo. — Wangi disse diretamente para o filho, que concordou com um aceno discreto. — Por favor, se comportem de acordo e tenham juízo.

— Nós teremos, tio! — Jingyi respondeu. — Pode ficar tranquilo, eu cuido dele. Não vou deixar nada vergonhoso acontecer, eu prometo.

O tio Wangji pareceu considerar as palavras de Jingyi por um momento, mas acabou só passando a mão larga pelo cabelo dele num gesto carinhoso. Os pais de Sizhui gostavam de Jingyi, o conheciam desde que ele era um garotinho e sabiam que, apesar da sua natureza festeira, ele era muito responsável.

— Pronto, cheguei! — O tio Wuxian voltou como um raio pela porta, mostrando dois frascos de perfume para Jingyi. — Esse é especiado e esse é mais terroso. Qual você acha melhor?

Jingyi pensou por um momento, se decidindo pelo especiado.

— Gosto mais desse. Vai chamar um monte de garotas...

— Jingyi. — O tio Wangji chamou em tom de aviso.

— ... Para interações bem comportadas que não comprometam a pureza do nosso bebezinho. — Jingyi se apressou em continuar a frase.

Jingyi aplicou o perfume nos lugares certos e se deu por satisfeito.

— Por que você tinha que nascer tão bonito? — Wuxian também perguntou, suspirando enquanto olhava o filho. — Na sua idade eu também era bonito assim, não tinha um minuto de paz. Um monte de menininhas vinham correndo atrás de mim toda hora. A nossa sorte é que você é comportadinho, porque eu não era e o seu pai também não. Sabe que a gente costumava sair escondido das festas e ir pros quartos e...

— Não, pai! — Sizhui implorou, pegando a carteira e o celular às pressas. — Apenas não, ok? Nós já estamos de saída.

Jingyi tirou a carteira de Sizhui da mão dele, abrindo e tirando apenas o documento e algumas notas dela.

— Outra lição para você. — Jingyi se aproximou para colocar o dinheiro e a identidade na parte interna da calça de Sizhui. — Você leva um trocado de garantia, o documento para saberem o que fazer contigo se algo der errado, as chaves e o celular no bolso da frente. Entendido?

— Olha lá, amor. Eles já estão até compartilhando os macetes... — O tio Wuxian voltou a choramingar.

— Mas é claro! Me dê algum crédito, tio. — Jingyi riu.

— Está certo. — O tio Wuxian limpou uma lágrima imaginaria do rosto, voltando a sorrir. — Vão. E não ousem voltar antes das três!

Os dois saíram de casa sob o olhar atento dos pais de Sizhui, que ainda estava meio deslocado por estar usando algo tão informal. O caminho até a casa do anfitrião da festa não era longo, então os dois iriam andando mesmo.

— Não se preocupe, você vai arrasar. — Jingyi comentou distraidamente, dando uma checada no telefone.

— Isso se você não me ofuscar com essa roupa refletora de guardinha de trânsito... É muito estranho te ver de amarelo, sabia?

De fato era. Jingyi era mais inclinado a usar roupas claras e sem destaque porque preferia caprichar nos acessórios. Não era difícil vê-lo com uma camisa e uma bermuda simples, mas cheio de anéis e pulseiras nas mãos.

— Ah, claro, seu amarelofóbico. — Brincou Jingyi. — Eu também achei bem diferente, mas sabe. São as coisas que eu faço pelo meu A-Jin.

Sizhui o olhou contrariado outra vez. Sendo justo, Jingyi até admitia que já fazia algum tempo que seu amigo havia parado de implicar com a existência de A-Jin. Agora ele só parecia preocupado com o rumo que as coisas vinham tomando. Jingyi havia conhecido A-Jin há quase seis meses num jogo online, desde então os dois não passavam um dia sem se falar. Na escola, as pessoas já comentavam que Jingyi andava sorrindo demais para o telefone nos últimos tempos, mas só Sizhui sabia que aquela animação toda era devida a um namorado online.

— Como você pode ter tanta certeza de que ele não é um tarado de 40 anos tentando te sequestrar? — Sizhui perguntou, já sem muita esperança de ser levado a sério. — Ou um traficante de órgãos querendo o seu fígado?

— Porque eu o conheço. — Jingyi respondeu, simples e convicto. — Eu saberia se ele fosse um pervertido, e ele não é. Você também saberia se aceitasse falar com ele.

Jingyi desviou os olhos de Sizhui, mirando a subida da rua com um sorrisinho sonhador nos lábios.

— Ele é gentil e doce e tímido. E é muito sozinho, também. Me disse que tem poucos amigos, que não gosta muito das pessoas da escola dele e passa pouco tempo com os pais... E ele fica tão feliz quando a gente conversa.

— Mas, Jingyi... — Sizhui abrandou um pouco a irritação na sua voz, agora só soando genuinamente receoso. — E se ele não for um tarado, mas for alguém que você não goste? Ou alguém que você não ache bonito? Você nunca viu o rosto dele. Não sabe nem como ele se chama.

— Ora, isso não é tão importante, é? — Jingyi deu de ombros. — Essas coisas são pequenas perto do que nós fomos construindo... Eu estou apaixonado por ele, Sizhui. De verdade.

Sizhui o olhou chocado. Que Jingyi estava encantado pelo tal A-Jin ele já sabia, mas ouvi-lo dizer com todas as letras que estava apaixonado pareceu surpreendê-lo de verdade. E outra, como assim aquelas coisas não eram tão importantes? Era de informações básicas que Sizhui estava tentando falar ali!

— Não fique tão preocupado. Eu sei o que estou fazendo.

— Se você está dizendo...

Os dois chegaram à casa do primo de Sizhui pouco depois das sete. Jin Rulan era, como Jingyi havia dito a A-Jin, um metido. Um otário rico que se achava o dono da escola, Jingyi estava grato por aquele ser o seu último ano ao lado dele. Assim como o próprio Rulan, a enorme casa era pomposa. Havia luzes coloridas ligadas no jardim e uma música altíssima já bombava lá dentro. Sizhui travou no lugar quando começou a ouvir a movimentação, mas Jingyi o puxou consigo até a entrada. Se ele havia insistido tanto para ir naquela festa, ao custo da sua noite com A-Jin, agora ele iria naquela festa de qualquer jeito.

O lugar estava cheio, mas não tão cheio quanto provavelmente estaria mais tarde. Rulan havia convidado a escola toda e mais um pessoal de outro colégio, pelas estimativas de Jingyi a casa estaria abarrotada antes das dez. O hall de entrada permitia acesso a dois ambientes e a uma escadaria. A sala ampla da direita havia sido transformada numa pista de dança com flashes coloridos para todos os lados e uma TV exageradamente grande, que tocava uma seleção de músicas animadas. As escadarias que davam acesso ao andar de cima e ao jardim de trás estavam lacradas com um grande totem de madeira, provavelmente para impedir que alguém encontrasse os quartos privados e fizesse algum uso indevido deles. A sala da esquerda possuía um monte de sofás e poltronas e pufes espalhados, além de uma grande mesa de bebidas. Uma porta de vidro, também exagerada, mostrava um gramado lateral com luzes penduradas e tapetes com almofadas, onde várias pessoas riam e conversavam.

Sizhui estava um pouco desconfortável. Jingyi se aproveitou do choque dele com o ambiente para ver se A-Jin não havia mandado nenhuma mensagem precisando do seu colo, mas ele ainda estava quietinho.

— Eu acho que não foi uma boa ideia. — Sizhui disse próximo ao seu ouvido para ser entendido. — A gente pode ir pra casa?

Jingyi o olhou indignado.

— Ah, não! Você quis vir, agora a gente vai ficar, pelo menos um pouco.

Olhou em volta tentando achar novamente a mesa de bebidas.

— Eu já sei do que você precisa.

Acanhado como um bichinho, Sizhui mal conseguia se focar no caminho. Ele só olhava tudo em volta com os olhos brilhantes de quem nunca havia pisado numa festa adolescente antes, Jingyi sentiu até um pouco de inveja. Já estava tão acostumado com aquele tipo de ambiente que sentia até falta da emoção de sentir o chão vibrando abaixo dos seus pés e da sensação de ficar bêbado no primeiro copo.

Os dois chegaram à mesa das bebidas. Na extremidade mais próxima da porta existiam várias pilhas de copos. Eles eram de uma cor perolada, estampados com felicitações aos dezoito anos de Rulan em dourado e vinham com pulseiras amarradas na alça. Uma pequena legenda havia sido colocada na mesa e indicava o uso das fitinhas: azuis para os solteiros, vermelho para os comprometidos e amarelo para quem só queria curtir a festa sem ser incomodado. Jingyi teve que admitir que achou a dinâmica interessante. Pegou uma pulseira vermelha para si e uma azul para Sizhui, já tratando de travar a fita no pulso vazio dele da maneira mais visível possível.

Mais adiante existiam várias garrafas de bebida expostas para que os convidados se servissem. Jingyi improvisou um drink qualquer, não era bom com aquelas coisas, só colocou menos álcool no seu porque precisava estar em condições para atender A-Jin e vigiar Sizhui.

— Toma. — Estendeu o copo para Sizhui, que o olhou meio estranho. — Acredite, você só aproveitar de verdade quando perder a capacidade de julgar.

Sem questionar mais, Sizhui bebeu um gole.

Ele imediatamente começou a tossir.

— Ah, fala sério! Você pode fazer melhor que isso. — Jingyi lhe dava tapinhas amigáveis nas costas tentando não rir. — Só vai com cuidado e tenta tomar de uma vez.

Os dois se afastaram da mesa para que Sizhui pudesse ter seu ataque de tosse sem incomodar quem estava se servindo. No canto da sala em que foram se refugiar, um sorriso familiar se sobressaiu de uma pequena aglomeração. Jingyi acenou ao reconhecer Ouyang Zizhen.

— E aí, cara! — Zizhen o abraçou de lado. — Não achei que fosse te ver aqui. Você disse que não vinha.

— Eu não viria. — Jingyi revirou discretamente os olhos. — Mas eu tive que vir acompanhar esse aqui.

Ele indicou Sizhui, que finalmente se recuperou do engasgo. Ao ver de quem se tratava, Zizhen arregalou os olhos.

— Lan Sizhui? — Ele perguntou, chocado. — O jovem monge?!

Sizhui ia se curvar, mas Jingyi o impediu antes que ele pudesse pagar esse mico.

— O-oi, Zizhen...

— Nossa! — Zizhen exclamou, lhe dando uma olhada pouco discreta. — Você nem parece você. Está tão bonito!

— Eu sei, fui eu que fiz! — Jingyi disse, orgulhoso. — Agora a gente só precisa deixar ele alegre e arrumar uma menina bonita pra dançar com ele.

— Jingyi! — Sizhui o repreendeu, mas Jingyi não lhe deu a menor atenção.

— Já terminou seu copo? — Jingyi perguntou, distraidamente.

— Eu não vou beber essa merda!

— Só porque você engasgou na primeira vez? Quem foi que ficou a semana toda dizendo que queria experimentar, não foi você? — Jingyi questionou, não deixando Sizhui retrucar antes de emendar, no seu melhor tom infantil e sem-vergonha: — Eu te desafio a virar esse copo.

Com as bochechas coradas de raiva, Sizhui levou o copo aos lábios. Novamente, apesar da determinação, ele não conseguiu beber mais que o primeiro gole.

— O que foi que você deu pra ele? — Zizhen, que até então só observava a discussão, tirou o copo da mão de Sizhui. Ele levou o copo ao rosto, cheirou o conteúdo e bebeu um gole. A careta não foi tão feia quanto a de Sizhui, mas era claramente desgostosa. — Porra, não quer dar gasolina pro garoto de uma vez, não?

— Ah, qual é?! Eu estou me esforçando aqui. — Jingyi retrucou, afagando as costas de Sizhui.

— ... Vou preparar algo mais leve pra ele. — Zizhen sugeriu, se afastando.

Jingyi deixou que ele fosse, ajudando Sizhui a se recuperar da tosse.

— Você quer me matar? — Sizhui perguntou exasperado. — Só porque eu te pedi pra me trazer?

— Não, relaxa. Eu te amo demais pra te matar. — Jingyi garantiu enquanto arrumava as roupas dele. — Só achei que você fosse mais resistente, me desculpa.

Jingyi viu um grupo de garotas se aproximando e endireitou a postura de Sizhui, as indicando sutilmente para o amigo.

— Acena pra elas. — Sugeriu num comentário discreto. — Com a mão direita. E dá um sorriso.

Timidamente, Sizhui fez como Jingyi havia pedido. As garotas acenaram de volta aos risinhos, balançando as várias pulseiras azuis em resposta. Dava para ver que elas estavam cochichando, surpresas por Sizhui ter comparecido. Elas não eram as únicas. Mesmo naqueles poucos minutos de festa Jingyi já havia notado um monte de meninos e meninas reparando em Sizhui. O desgraçado era tão naturalmente lindo, um sonho. Sendo novo no rolê e estando bem arrumado como estava, ele ofuscou Jingyi quase que completamente. Se não fosse seu blazer amarelo brilhante, estaria completamente apagado ao lado dele.

— Gostou de alguém? — Jingyi perguntou, sorrindo. — Tenho certeza que qualquer uma delas iria querer te beijar.

— Jingyi, vamos com calma. — Sizhui pediu, todo corado e envergonhado apenas com os acenos que recebeu.

— Certo, certo. Só me deixe saber se alguém chamar sua atenção, que eu faço um arranjo pra você.

Jogar ideia nas pessoas para Sizhui não seria nenhum problema, na verdade seria até bem fácil. Ele era o príncipe da turma deles, todo responsável e compromissado, e Jingyi era amigo de quase todas as meninas que os dois conheciam. Na verdade, receber as confissões que Sizhui sempre dispensava era tarefa sua desde a oitava série, quando os dois começaram a pensar em meninas de fato.

Uma outra garota passou por eles acompanhada de alguns amigos. Ela acenou especificamente para Jingyi, fazendo questão de balançar sua fita azul na sua direção. Jingyi nem acenou, apenas ergueu o braço indicando sua fita vermelha. A menina compreendeu e voltou a caminhar em direção ao jardim, nem um pouco constrangida.

Quando se virou para Sizhui, Jingyi o encontrou com a boca aberta em choque.

— Que foi? — Jingyi perguntou, dando de ombros.

— Como assim, "que foi?" Você acabou de dispensar Wang Xiaomei!

— ... Sim, e daí?

— E daí que você está atrás dela desde o fundamental, se não me falha a memória. Você me fez entregar flores pra ela por três anos! — Sizhui respondeu como se fosse óbvio.

Jingyi respirou fundo, rolando os olhos pela sala.

— Ela nunca me correspondeu. Eu parei de tentar, ora.

Sizhui o olhou com desconfiança.

— Ou você desistiu por causa do garoto do jogo. — Acusou ele.

— Também tem a ver com A-Jin, ok? Eu te disse que estou apaixonado por ele, é com ele que eu quero ficar agora. Se Xiaomei não quis me dar moral em todo esse tempo, agora eu não quero mais ideia com ela também!

Sizhui não retrucou. Ele ficou calado e pensativo até Zizhen voltar com as bebidas.

— Você vai jogar fora esse álcool de posto que você está bebendo. — Zizhen tirou o copo da mão de Jingyi, despejando o conteúdo num vaso de planta próximo e encaixando o copo vazio num outro que trazia. — Eu fiz esse pra te deixar feliz sem derreter o seu cérebro. E esse aqui é pra você, Sizhui.

Sizhui pareceu agradado pelo cheiro. O primeiro gole também desceu melhor, não provocou nenhum engasgo e seu rosto se retorceu bem menos.

— Bom, não é? — Zizhen perguntou, recebendo um aceno sorridente em resposta. — Prove o seu também, Jingyi.

Jingyi também aproximou o copo do rosto, identificando o cheiro de morango e limão. Pela cor, imaginou que fosse uma limonada rosa batizada com alguma coisa. Provou e reparou que a doçura da bebida cobria quase completamente o gosto do álcool, mascarando a sensação desagradável e deixando apenas a refrescância das folhas de hortelã trituradas que boiavam na superfície.

— Muito bom. — Jingyi admitiu, bebendo mais um pouco. — Acho que vamos colar com você.

— Ah, chega mais. — Zizhen respondeu. – 'Tô com uma galera ali no canto, a gente só 'tá esperando a casa encher pra ir dançar.

Os três se aproximaram de um dos sofás da sala, se unindo ao grupo de jovens que conversava alto para se sobressair com a música. Jingyi acenou geralmente para todos, já estava acostumado a ver aqueles rostos nas festas da escola, mas como Sizhui era novidade, todo mundo queria cumprimentá-lo pessoalmente.

— Quem diria, o nosso jovem monge resolveu deixar o monastério! — Uma das colegas de classe deles exclamou. — Demorou, hein?

— Que bom que ele demorou. — Um garoto comentou. — Se não a gente não teria nenhuma chance, vocês estão vendo? Como as meninas só tem olhos pra ele?

— É verdade, ninguém sabe falar se outra coisa. — Jingyi confirmou, cheio de orgulho. — Sizhui, olha só como todo mundo está feliz de te ver.

É, mais ou menos. Jingyi sabia que existia uma certa inveja rondando seu amigo, por isso passou o braço livre pelo ombro dele de maneira protetora.

— E essa pulseira vermelha aí? — Alguém perguntou, indicando Jingyi com a cabeça. — Finalmente tirou Xiaomei da cabeça?

Um coro se uivos imaturos circulou o grupo. Jingyi só revirou os olhos, sorrindo.

— Eu fui fisgado, confesso! — Admitiu.

— E quem é ela? — Uma garota perguntou. — A gente conhece? É lá da escola?

Jingyi pareceu um pouco desconfortável pelas perguntas incisivas, rindo sem jeito. Explicar sua situação atual seria como implorar para ser zoado pelo resto da noite e não estava disposto, mas também não era bom em inventar mentiras sob pressão.

— Ela não é da escola. — Sizhui foi quem respondeu, para a surpresa de todos. — É uma garota do bairro dele. Muito bonita, simpática também.

Jingyi olhou Sizhui com tanta gratidão que mal conseguia disfarçar o quanto estava comovido. Eles sempre iam ao socorro um do outro. Jingyi se lembrou que ir numa festa com Sizhui não era nada além da sua obrigação pelas tantas vezes em que havia sido salvo por ele. Sizhui havia sido bem inteligente na mentira também, porque Jingyi morava num bairro distante. Ninguém ali poderia conhecer a tal garota, o que logo os fez perder o interesse e encerrar a discussão.

— E onde está o meu primo? — Sizhui perguntou, parecendo um pouco mais disposto a participar da conversa.

— Ah, você não vai chamar ele aqui, vai? — Jingyi protestou. — Seu primo é chatão, cara.

— Relaxa, eu só quero desejar parabéns adiantado. — Sizhui garantiu.

— Olha, eu não vi ele ainda, não. — Um dos garotos na roda respondeu.

— Eu vi, mas só quando eu cheguei. — Zizhen comentou. — Ah, olha ele vindo aí!

Zizhen indicou um garoto que vinha na direção deles com a cara enfiada no celular.

— Que milagre ele não estar todo pavoneado, né? — Alguém disse. — Já que é a festa de dezoito dele, achei que ele iria aparecer aqui com um roupão feito de ouro ou algo assim.

Não era exagero dizer que Rulan era um pavãozinho. Vindo de uma família muito rica e que tinha aquela cultura de ostentar, ele sempre aparecia na escola com roupas de marca e enfeites nos cabelos estranhamente longos para um garoto. Jingyi não o chamaria de extravagante, mas era impossível não notar quando ele chegava em algum lugar. Naquele dia, porém, Rulan usava um rabo de cavalo simples, sem adereços, e uma camisa larga demais para ele. A peça era clara e Jingyi não conseguiu ver direito as cores da estampa por causa das luzes de festa, mas definitivamente não era nada do que se esperava dele.

Rulan parecia apressado, também. Cumprimentava as pessoas que o paravam no caminho sem lhes dar muita atenção, focado em digitar alguma coisa no celular. Ele continuou andando em direção ao jardim sem dar a Sizhui muito tempo para se levantar e cumprimentá-lo.

— Ah, não se preocupa. Daqui a pouco ele volta. — Jingyi comentou, secretamente aliviado.

O celular de Jingyi vibrou e ele se deixou atender, vendo que Sizhui estava entretido na conversa do grupo. Abriu a janela de A-Jin, vendo que era uma mensagem dele, e sorriu com pesar.

 

Meu JinJin TT me salve!!!

 

O que houve, meu bem? :"(

Estou aqui... As coisas estão ruins em casa?

 

Não... Eu só queria que você estivesse aqui

Tem outras pessoas aqui, mas eu só queria você

 

A-Jin TT assim você parte meu coração

 

Desculpa meu amor...

Eu não queria atrapalhar a sua festa

 

Não é isso! Eu já disse que você não me atrapalha

É só que eu também queria estar aí com você...

A-Jin não tem nem ideia do quanto é querido

Mas eu tenho algo que pode te animar!

 

— Sizhui, venha tirar uma foto minha naquela parede!

Jingyi se levantou, chamando Sizhui consigo e entregando seu telefone a ele. Sizhui pareceu meio tonto ao se levantar, mas deveria ser mais um desequilíbrio pela posição em que estava sentado. Jingyi fez uma pose genérica na frente da parede de mármore da sala e esperou que Sizhui tirasse a foto.

— Pronto? — Perguntou, ainda parado.

— Ah, ainda não. — Sizhui pareceu se atrapalhar por um momento, mexendo alguma coisa nas configurações da câmera, mas logo a foto foi tirada e Jingyi pegou seu celular de volta. — Veja se ficou bom.

Os dois se aproximaram para ver o resultado na tela do telefone.

— Ficou ótimo! — Jingyi sorriu.

Abriu a janela de A-Jin novamente, começando a fazer a edição da foto antes de enviar. Havia ficado meio escuro por causa da baixa luz do ambiente e dos flashes coloridos, mas dava para ver que a sua roupa era amarela como havia sido pedido. Cortou seu rosto e enviou a foto.

— Você ainda não mostrou o rosto pra ele? — Sizhui perguntou.

Jingyi soltou um suspiro, guardando o celular no bolso.

— Não. — Respondeu. — Olha, eu sei o que você vai dizer, e eu sei que parece estranho, mas confie em mim.

— Eu confio, agora o seu A-Jin confiar é outra história. — Sizhui retrucou. — E você também não parece confiar muito nele, se está cortando seu rosto das fotos que envia.

Jingyi iria responder, mas não podia ignorar que Sizhui tinha um ponto. Não era como se não confiasse em A-Jin. Como os dois permaneciam anônimos, já havia contado coisas relativamente pessoais a ele e, em troca, também recebeu segredos. O problema era que, depois de seis meses, também já estava começando a ficar incomodado por não poder ver um rosto. A-Jin era muito arisco e inseguro, Jingyi o achava muito puro para ser só um babaca fazendo catfishing. Tinha medo de insistir demais e acabar afastando seu A-Jin, e sua prioridade no momento era não perdê-lo.

É claro que no meio de tudo isso alguma insegurança nascia. Jingyi já havia passado noites demais acordado, pensando na decepção que poderia sofrer se A-Jin não fosse como ele havia sonhado, mas é que era tão melhor só pensar nele como o garoto meigo com quem conversava todo dia. A-Jin já estava muito impregnado na sua vida para que pudesse se desacostumar com ele agora. Há meses ele era a primeira pessoa com quem Jingyi falava ao acordar e a última de quem se despedia antes de dormir. Sentia que perderia A-Jin em qualquer um dos cenários e por isso estava permanecendo de propósito na ignorância, esperando que ele um dia se revelasse espontaneamente. Até lá, por segurança, Jingyi também não iria se mostrar. Ele não era tão estúpido quanto parecia às vezes.

— Ei, nós estamos indo lá pra pista! — Zizhen gritou para eles, chamando-os. — Vamos?

Jingyi olhou para Sizhui com um sorriso mais tranquilo, disposto a deixar o assunto morrer.

— Vem, vamos dançar.

Antes de ir para sala da pista, o grupo passou novamente na mesa das bebidas para reabastecer os copos. Zizhen era surpreendentemente bom com aquelas coisas, preparou drinks saborosos para todos com uma agilidade admirável. Sizhui pareceu gostar especialmente do seu, já que secou o copo em minutos, fazendo Zizhen lhe preparar outro antes que eles finalmente saíssem para dançar.

Ao provar o copo do amigo, Jingyi percebeu que com certeza era o açúcar. Sizhui sempre teve gosto por coisas doces e as bebidas açucaradas pareceram funcionar para ele. Jingyi achou a sacada de Zizhen bem curiosa, mas estava com medo do que aconteceria quando aquela bebida toda batesse...

Era pouco mais de oito horas e a casa estava bem mais cheia. Jingyi segurou a mão de Sizhui para não se perder dele enquanto os dois se embrenhavam na pista, mas estava complicado mantê-lo perto quando ele queria acenar pra todo mundo. Ele já estava de fogo? Tão rápido? Jingyi se perguntou se ele havia comido o suficiente antes de sair de casa, se deveria pegar uma água pra ele ou algo assim.

Para alguém que nunca havia ido numa festa, Sizhui dançava até bem. Ele ainda era tímido e meio desajeitado, e talvez fosse a sua inexperiência que o estivesse fazendo parecer tão adorável para as meninas que não paravam de vir cumprimentá-lo. Para Jingyi, o mais chocante nem era ver garotas com o rostinho corado puxando Sizhui para dar selinhos nas suas bochechas, mas sim ver Sizhui deixando elas fazerem isso e aproveitando os cumprimentos. Seu rosto se enchia de espanto toda vez que ele ousava um pouco mais e o sorriso em seu rosto não deixava dúvida: Sizhui já estava meio bêbado. Em sã consciência ele não estaria tão confortável no meio daquele monte de meninas.

Jingyi estaria enciumado se não estivesse tão orgulhoso.

— Hm, todo garanhão ele, né? — Zizhen comentou no ouvido de Jingyi em determinado momento. — Olha só que gracinha.

— É, nosso menino está crescendo... — Respondeu distraidamente, já mais inclinado a sorrir pelo álcool que soltava seus sentidos.

Só então Jingyi reparou a proximidade de Zizhen. Os dois estavam praticamente dançando juntos e não que isso fosse um problema, Jingyi gostava dele. Na verdade, gostava tanto que não duvidaria se Zizhen dissesse que eles já haviam se beijado algumas vezes em festas como aquela, e apesar da pulseira amarela no pulso dele, àquela altura Jingyi já havia aprendido a interpretar certos sinais. Resolveu deixar Sizhui se divertir com suas novas companhias um pouco e não viu grandes problemas na mão respeitosa de Zizhen em sua cintura, guiando a dança. Também se apoiou nos ombros dele e os dois riram, já meio altos, encontrando facilmente um jeito daquilo funcionar.

Além de festeiro, Jingyi também era namorador. Ele gostava de flertar, não parou mais depois que descobriu o quão divertido era dar uns beijinhos sem compromisso nos amiguinhos solteiros. Quinze minutos sem perder a amizade, sempre. Nunca havia tido um relacionamento sério, embora quisesse muito, então só se limitava às ficadas de uma noite de que tanto gostava. Nos últimos tempos, porém, não andava flertando com muita gente nas festas e estava começando a sentir falta. Zizhen era bonitinho e tinha uma pegada gostosa, do tipo que faria Jingyi sentir os joelhos moles com apenas um sorriso, mas agora já não soava certo tê-lo tão pertinho, a meio caminho de selar sua boca. Só conseguia pensar em como queria que fosse A-Jin no lugar dele.

— Ah, Zizhen... — Jingyi o interrompeu, o afastando gentilmente. — Eu acho melhor a gente não... Sabe?

Zizhen sorriu meio sem graça e se afastou sem reclamar.

— A garota do seu bairro, não é? – Ele perguntou, coçando a nuca sem jeito. — Me perdoe, eu me esqueci.

Jingyi odiava dar e receber foras, porque por mais compreensiva e mútua que a coisa fosse, era sempre um constrangimento. Enfiou a cara em seu copo, bebendo longamente enquanto Zizhen fazia o mesmo. Os dois olharam para Sizhui e o viram afogado numa montanha de meninas, decidindo que a sua deixa para disfarçar a vergonha seria ir ao resgate dele.

— Acho melhor eu ir buscar uma água pro jovem monge. — Zizhen comentou brincando, começando a se afastar. — Você quer mais um drink?

— Ah, eu gostaria sim. — Jingyi disse, esperando Zizhen sair para se embrenhar no meio daquele monte de garotas sedentas.

— Olha só, minhas queridas, com licença. — Ele disse, passando a mão no cinto de Sizhui para conseguir tirá-lo da pista. — Me desculpem, ele precisa respirar!

— Isso não é justo! — Uma das meninas reclamou, contrariada. — Você quer ele todo só pra você!

— Não quero coisa nenhuma! — Jingyi balançou a fitinha vermelha na cara dela. — Não se preocupa, não, meu bem. Só vou levar ele pra beber uma água, tomar um arzinho. Eu já trago de volta.

— Ele me traz de volta! — Sizhui confirmou, rindo e piscando para suas amigas, que ficaram pálidas na hora. — Esperem por mim!

Jingyi iria tirar tanto da cara de Sizhui no dia seguinte.

— Quem diria!? Meia hora e você já se arranjou? — Jingyi comentou rindo, se sentando com Sizhui nos pufes no canto da pista.

— Garotas são incríveis, Jingyi! — Ele disse, a língua enrolada dentro da boca dificultava um pouco a fala, que ainda abafada pelo volume da música custava a fazer sentido. — Elas são tão bonitas e tão simpáticas! Ah, e tão cheirosas... Daiyu disse que sempre gostou de mim e Chuntao quer que eu conheça os pais dela!

Jingyi caiu na gargalhada, arrependido por ter se distraído com seu climinha com Zizhen e perdido aquela cena.

— ‘Tá bom, deslumbradinho. — Jingyi retirou os cabelos do rosto do amigo, contente por ele. — E quantas você já beijou?

— No rosto? Um monte! Eu só queria dar um beijinho numa delas, mas aí todas começaram a pedir e eu não poderia negar! É falta de educação, não é?

— É, não deixe suas amiguinhas tristes. Faça o que você quiser, contanto que todo mundo esteja confortável. — Recomendou, assumindo seu tom responsável outra vez.

Sizhui concordou, provando que estava animadinho o suficiente para se soltar da timidez, mas não para perder o controle. Jingyi se sentiu bem mais aliviado com isso.

— Muito bem, mas eu não estava falando de beijinhos murchos no rosto. Eu quero saber se você já ficou com alguém de verdade!

— Ah, não... — Sizhui respondeu resmungando. — Eu tenho vergonha. Eu preciso de outra bebida!

— ‘Tá na mão. — Zizhen voltou, encaixando outra rodada da bebida docinha na pequena pilha de copos vazios na mão de Sizhui, estendendo também uma garrafa de água para ele. Ele então se virou para Jingyi, todo tímido de repente. — Aqui está o seu.

Jingyi agradeceu com um aceno igualmente acanhado, dando um gole no drink. Aquele era o melhor de todos, havia sido muito bem batido com espuma de gengibre e tinha até uma folhinha em cima. Zizhen era tão fofo que Jingyi estava começando a sentir remorso por tê-lo dispensado em favor de uma pessoa que nem existia. Quer dizer, existia, ainda que não como Sizhui havia descrito. Sentiu tanta vontade de encher Zizhen de beijos que seu coração até bateu mais forte, mas a culpa de ficar com outro que não fosse o seu A-Jin o impediu de mover um dedo.

Enquanto Sizhui bebia água e descansava um pouco, Jingyi tirou o celular do bolso, dando uma checada na janela de mensagens de A-Jin. Ele ainda nem havia visualizado a foto. Já eram nove e meia, Jingyi estava atento ao horário para não deixar de parabenizar A-Jin a meia-noite, mas a verdade é que não podia se impedir de pensar no que seria pior: se arrepender de ficar com Zizhen ou de tê-lo dispensado.

— Ah, sai desse celular! — Sizhui disse, tentando tirar o aparelho das mãos do amigo. — A-Jin não está aqui! Você deveria parar de pensar nele um pouco!

Na tentativa de situar Jingyi na festa, Sizhui derrubou metade do conteúdo restante do seu copo no blazer amarelo dele.

— Oh, caralho! — Jingyi xingou, se levantando às pressas para tirar o casaco antes que a umidade atingisse sua camisa. Se virou para Sizhui, sacudindo a roupa para tirar os respingos mais grossos. — Tome mais cuidado!

— Ah, desculpa! — Sizhui pediu abobalhado. — Eu não vi que estava entornando...

— Deixa eu colocar com os outros casacos lá no hall. — Zizhen sugeriu. — Lá você vai saber onde está e ninguém vai pegar, aí não vai precisar ficar com ele na mão.

Para de ser fofo, que inferno! Eu já estou carente e meio bêbado e tentado a trair o meu webnamorado, você não me ajuda sendo o cara mais bonitinho e gentil que eu vi hoje, me fazendo drinks gostosinhos e me ajudando a cuidar do Sizhui e se oferecendo pra ser meu pau mandado!

Era o que Jingyi queria dizer.

Mas ele não disse. Se contentou em só dar o blazer para que Zizhen se livrasse dele. Pelo menos assim ele ficaria longe e não seria uma tentação. Se virando para Sizhui, Jingyi agradeceu por ele ter só derramado bebida no seu casaco. Ele poderia ter vomitado, o que seria muito pior. Ainda sentado no seu lugarzinho, Sizhui balançava a cabeça no ritmo da música com o resto do drink numa mão a garrafa de água na outra.

— Você sabe onde o seu celular está? — Jingyi perguntou.

Sizhui colocou a garrafa no chão e apalpou seus bolsos, tirando o celular a chave de casa de lá.

— Está tudo aqui!

— Muito bem. — Jingyi acabou desfazendo a pose, relaxando os ombros e bebendo um pouco mais do seu drink docinho de gengibre. — Já quer ir embora?

— Assim, tão cedo? — Sizhui exclamou, se levantando. — Não! Não, por favor! Eu estou me divertindo, a gente não pode ir embora agora!

Jingyi concordou, mesmo que a contragosto. Não iria embora e largaria Sizhui lá sozinho, mas também não iria forçá-lo a ir para casa só porque não estava se divertindo tanto quanto ele. Abriu novamente a conversa de A-Jin para conferir se ele estava on-line, mas não estava, e seguia sem visualizar sua mensagem. Ele deveria estar tão chateado, pobrezinho. Se ele estivesse lá, Jingyi com certeza estaria menos aborrecido.

— Ah, Rulan! Finalmente! — Sizhui gritou, acenando para o primo que passava.

Jingyi revirou os olhos, enfiando ainda mais a cara no celular. Se fingisse que não estava vendo, talvez não precisasse cumprimentar aquela peste que era o primo de Sizhui.

— Feliz aniversário! — Sizhui cumprimentou animadamente quando Rulan se aproximou.

— Ah, obrigado. Bom te ver aqui, você nunca sai. — Rulan cumprimentou desinteressado quando chegou perto o bastante. Ele também estava digitando alguma coisa no celular e não parecia muito disposto a dar ideia para a conversa do primo.

Jingyi ergueu os olhos minimamente para Rulan, que fez o mesmo. Eles se cumprimentaram com o mínimo de educação e voltaram a digitar em seus respectivos telefones. A conexão com a internet estava horrível, provavelmente porque havia muita gente usando, as mensagens não estavam sendo entregues na hora.

Jingyi não prestou atenção na conversa de Sizhui e seu primo, estava muito ocupado olhando fixamente para a mensagem pendente na esperança de que ela fosse enviada logo. Em determinado momento, Rulan se despediu educadamente e se afastou, logo em seguida Zizhen retornou sem o casaco nas mãos.

— É impressão minha ou ele ‘tá bem pra baixo? — Comentou Zizhen.

Sizhui suspirou, terminando de espremer a garrafa de água na boca e explicando:

— Ele ‘tá meio triste, mesmo. Não era pra menos, ele não tem muitos amigos. Aposto que a metade desse pessoal nem fala com ele na escola.

Jingyi finalmente deu alguma atenção ao assunto, guardando o celular no bolso e olhando Rulan se afastar deles.

— Pelo que eu me lembro tem uns cinco ou seis caras que ficam atrás dele o dia todo na escola. — Comentou.

— É, mas não são exatamente amigos dele. — Sizhui corrigiu, estranhamente sóbrio. — Eles são só uns interesseiros que querem se aproveitar dele ser rico.

Em outro momento, Jingyi teria dito que aquilo era o que Rulan ganhava por ser um metido, mas se lembrou imediatamente de como A-Jin sofria por não ter muitos amigos e se apiedou um pouco. Não que a pena mudasse o fato de que Rulan era chatinho, mas ninguém merecia ser tão sozinho.

— Enfim, vamos voltar para a pista! As minhas amigas estão me esperando. — Sizhui chamou, já se embrenhando no meio das pessoas outra vez.

Sozinho com Zizhen, Jingyi sentiu o rosto começando a esquentar outra vez.

— Hm... Você quer dançar? — Zizhen perguntou, sem jeito. — Só dançar, eu prometo.

Jingyi considerou a proposta por um minuto, pensativo. Só dançar não era nada demais, era? E ajudaria o tempo a passar um pouco mais depressa também, não estava afim de permanecer naquela agonia de esperar por uma resposta de A-Jin enquanto perdia uma festa que, por mais que não quisesse admitir, estava boa.

— Certo. Só dançar.

De fato, os dois só dançaram. A mão de Zizhen ainda estava na cintura de Jingyi, que também se segurava nos ombros dele, mas nenhum limite foi cruzado ali. Após os primeiros minutos de constrangimento, a risada divertida voltou aos lábios dos dois e eles passaram a aproveitar a presença um do outro de forma puramente amigável. Os vários drinks também estavam começando a bater e de vez em quando Jingyi dava uma conferida em Sizhui, mas ele parecia perfeitamente bem se afogando em garotas bonitas.

De uma hora para a outra as pessoas começaram a sair da pista. Jingyi se equilibrou no aperto seguro de Zizhen para não acabar caindo no meio da correria, mas não antes de puxar Sizhui para perto.

— Acho que a comida chegou. — Jingyi comentou.

Se afastar de Zizhen foi complicado porque estava meio tonto e, sinceramente, gostando de ser segurado. Os três foram juntos até a aglomeração na sala das bebidas, onde uma nova mesa estava cheia de fast-food. Antes que os colegas devorassem tudo, Jingyi pescou três pacotes de lanche e uma garrafa grande de refrigerante e saiu correndo para o jardim, seguido e um Zizhen ligeiramente preocupado e de Sizhui, que não parava de rir sabe-se lá do que.

Eles se acomodaram em um dos tapetes no jardim lateral, apoiando as costas nas várias almofadas espalhadas. Jingyi puxou Sizhui pela mão quando o viu começando a tombar, endireitando sua postura antes que ele pudesse se deitar.

— Não deita, não! — Ordenou, abrindo a garrafa de refrigerante. — Se não, você vai passar mal. Pode ficar aí bem sentadinho.

Jingyi e Zizhen abriram os pacotes de lanche, jogando o conteúdo sobre o tapete. Haviam três caixas de batata frita, um pedaço grande de bolo de chocolate, dois hambúrgueres embalados, três pedaços de pizza e uma caixa de nuggets. Jingyi sorriu ao se lembrar que aquele era o tipo de comida favorito do seu A-Jin, mas também agradeceu pela quantidade farta de açúcar, gordura e sódio. Com aquilo tudo na barriga, Sizhui não iria passar mal tão cedo.

— Toma aqui. — Jingyi jogou um dos hambúrgueres para Sizhui, além de uma das caixas de batata. — Come tudo.

Sizhui pareceu se dar conta de que estava com fome, mal se lembrando de tirar o papel antes de meter os dentes no hambúrguer. Jingyi respirou aliviado, pegando um dos pedaços de pizza e enchendo a boca com ele. Zizhen lhe repassou a garrafa de refrigerante e Jingyi bebeu um gole, aliviado. Por mais que gostasse de ficar bêbado, uma pausa para beber qualquer coisa não-alcoólica era sempre bem-vinda.

— Então quer dizer que você está namorando? — Zizhen comentou casualmente, sendo o mais sóbrio dos três. Deu uma mordida em seu próprio hambúrguer, ainda mirando Jingyi com os olhos de interesse. — Me conte como ela é.

Jingyi ergueu as sobrancelhas, grato por estar de boca cheia. Pelo menos a desculpa de engolir lhe dava tempo para bolar uma mentira decente.

— Ah, ela é muito linda. — Mentiu, pensando mais uma vez em que rosto A-Jin teria. — E muito fofa, sabe? Boazinha. Eu gosto de tudo sobre ela.

— Deve ser incrível mesmo, pra te fazer desistir do resto. — Zizhen concordou, enfiando um punhado de batatas na boca. — Ouvi dizer que Xiaomei está arrasada.

— Como é?! — Jingyi perguntou indignado. — Eu dei mole pra ela por anos da nossa vida e ela não estava nem aí pra mim, e agora está chateada?

— Acho que ela estava tentando fazer charme pra você. — Zizhen deu de ombros. — Ou talvez você não tenha insistido o bastante.

— Ah, não vem não. — Jingyi revirou os olhos, pegando mais um pedaço de pizza. — Eu fiquei atrás dela, fiz um monte de elogios, puxei assunto, mandei flores. Ela nunca me correspondeu, eu iria fazer o que? Continuar em cima da menina?

— Mais do que você já ficava seria importunação. — Sizhui amassou o papel vazio do hambúrguer, pegando a garrafa de refrigerante da mão de Jingyi. — E eu confio que você tem bom-senso o bastante pra saber disso.

Jingyi estranhou. Sizhui estava aparentemente bêbado, mas conseguia soar perfeitamente sóbrio de vez em quando. Esquisito. Poderia ser só mais um dos traços incomuns do lado festeiro dele. Jingyi descartou a chance quando viu o amigo arrotar, algo completamente fora das boas maneiras que ele tanto prezava, e só deu de ombros.

— Agora come o doce. — Entregou a embalagem de bolo de chocolate para Sizhui, que começou a comer sem demora.

— Enfim, nós estávamos falando da sua namorada. — Zizhen lembrou. Jingyi quis arranjar um jeito de calar a boca dele. — Como vocês se conheceram?

— Foi num joguinho online! — Sizhui atropelou a resposta de Jingyi, falando por ele com a boca cheia de bolo. — E olha, que incrível! A garota morava pertinho da casa dele. Desde então eles não param mais de se falar.

— Sizhui... — Jingyi choramingou, enfiando a cara quente na mão.

— Quando nós estávamos vindo pra cá, mesmo, ele não parava de falar nela. — Sizhui continuou. — Disse até que estava apaixonado.

Zizhen abafou uma risada do rosto corado e sem jeito se Jingyi. Então aquela era a vingança de Sizhui por ter ficado falando de A-Jin para ele? Jingyi fez questão de olhá-lo como quem dizia que teria volta, e ele se calou com mais um pedaço enorme de bolo.

Os três terminaram de comer em silêncio, cercados pelas conversas animadas dos amigos que também estavam largados no jardim. Depois de acabar com o conteúdo dos pacotes e secar a garrafa de refrigerante, Jingyi sorriu satisfeito, começando a se levantar.

— Agora que estamos todos de barriguinha cheia... — Jingyi começou, ajudando Sizhui a se colocar de pé. — A gente pode voltar para a pista se você quiser.

— Então vamos! — Sizhui exclamou animado, mas Jingyi o segurou pelo colarinho antes que ele pudesse correr.

— Vamos só passar no banheiro primeiro. — Corrigiu Jingyi.

— Eu não preciso ir ao banheiro!

— Mas eu preciso, e nós temos que ficar juntos!

Com o rosto retorcido em descontentamento, mas sem contestar mais, Sizhui acompanhou os dois amigos até um dos banheiros do térreo. A fila era pequena e Zizhen ficou cuidando de Sizhui para que Jingyi pudesse ter paz por uns poucos minutos. A porta se abriu e Jingyi deu um encontrão no corpo que saía, se afastando rapidamente para encontrar Rulan o olhando assustado.

Na intenção de dar passagem um para o outro, os dois foram para o mesmo lado. Jingyi segurou Rulan pelos ombros para evitar um novo encontrão, os girando na porta.

Jingyi estava alto o suficiente para rir da situação, mesmo sendo Rulan ali, mas a expressão tristonha no rosto dele impediu qualquer riso. Ele parecia abatido, com as bochechas cheias e os olhos avermelhados e úmidos. Mais uma vez naquela noite, Jingyi se apiedou dele.

Na verdade, Jingyi mal conhecia Jin Rulan. A sua pouca interação com ele só acontecia porque ele era primo do seu melhor amigo, mas as suas atitudes esnobes repeliam Jingyi, impossibilitando qualquer aproximação por parte dele. Mesmo com todos os seus defeitos, Jingyi não pôde deixar de pensar que ninguém merecia estar tão triste no próprio aniversário, ele parecia não estar aproveitando sua festa nem um pouco.

— Desculpa. — Os dois disseram em uníssono.

Em seguida, Rulan correu dali.

Enquanto fechava a porta e respirava fundo, aproveitando o momento sozinho, Jingyi pensou novamente em A-Jin. Se olhou no espelho e ajeitou os cabelos depois de lavar as mãos, sacando o celular do bolso. Em segundos, como se sentisse sua aflição, A-Jin respondeu.

 

Como meu JinJin está bonito ♡︎

 

Gostou???

Escolhi pensando em você ♡︎♡︎♡︎

 

Tão atencioso :')

A minha roupa não é tão bonita... Não é nem minha pra falar a verdade

Eu não ando muito animado pra me arrumar :"(

 

Mas A-Jin D: não fique assim...

Tenho certeza de que você está bonito, mesmo simples ;)

 

Eu não teria tanta certeza...

 

Por que não me deixa decidir? :D sabe que minhas opiniões são sinceras

 

Eu adoraria poder te mandar uma foto agora, JinJin...

Mas eu não posso

Me perdoa, sim?

 

Jingyi não queria admitir que achou aquilo estranho. Não queria, se recusava, mas em seu coração algo pareceu fora do lugar, sim.

 

Não tem problema, A-Jin :')

 

E como está sendo a festa?

 

Tudo está indo muito bem!

Meu amigo está se divertindo tanto que está fazendo valer a pena

Ele se adaptou estranhamente bem ao ambiente e ao pessoal, por incrível que pareça

Já tá doidão inclusive

 

Eu posso imaginar hahaha 

Mas e você? Está se divertindo?

 

Se estivesse no humor certo pra festejar eu estaria adorando, com certeza

Mas não é bem o caso hoje, sabe?

 

JinJin... O que houve? Você soa triste

 

Eu estaria me divertindo tanto se você estivesse aqui

Eu sinto saudade de você, mesmo nunca tendo te visto

Se você estivesse aqui a gente poderia dançar juntinho

Rir, conversar... Eu ia te abraçar tão forte

Queria tanto ver o seu rosto, A-Jin

 

Jingyi era o tipo de pessoa impulsiva que frequentemente se arrependia das suas decisões. Estava sendo sincero nas suas mensagens para A-Jin, o álcool na cabeça também ajudava muito a desenfrear sua honestidade, mas se arrependeu assim que processou que estava cobrando um rosto de A-Jin. Já não adiantaria apagar a mensagem, A-Jin já havia visualizado. Logo em seguida, seu ícone se apagou e uma notificação chegou para Jingyi.

A-Jin está offline.                         

Se frustrou, esfregando os olhos com força para não chorar. Estava muito próximo disso, bem mais sensível que o seu normal. Saiu do banheiro quando começou a ouvir as batidas de quem estava na fila, esperando que a agitação do lado de fora bastasse para segurar seu coração no lugar. Foi até o canto onde deixou seus amigos e, de fato, a vontade de chorar passou, mas só porque no lugar dela se instalou o desespero.

Zizhen estava sozinho.

Jingyi sentiu a pressão baixando por um momento.

— Pelo amor de deus, cadê o Sizhui? — Perguntou para a figura exasperada de Zizhen.

— Eu não sei! — O garoto respondeu, atônito. — Ele pediu para eu pegar uma água para ele e quando eu voltei, ele já tinha sumido.

Jingyi choramingou, cobrindo os olhos. Se recompôs após reclamar por um segundo, colocando os pensamentos em ordem da forma que sua mente nublada permitiu.

— Vem, vamos atrás dele.

Segurou a mão de Zizhen e a colocou no seu cinto, prendendo-a ali para que ele não se perdesse também. Procuraram primeiro nos lugares mais vazios, os jardins e a sala das bebidas, mas não havia nem sinal de Sizhui. Já passava das dez e as pessoas não pareciam muito sãs, não adiantaria perguntar. Por fim os dois encararam a pista, que agora estava completamente lotada.

Quando não achou Sizhui na primeira volta, Jingyi se desesperou de verdade. Parou por um momento, segurando Zizhen pelo braço e olhando atentamente em volta. Estava embriagado, aborrecido, com um pouco de sono e era meio míope também. As luzes de festa não ajudavam, então sua busca não resultou em nada. Começou a pensar no que iria fazer se Sizhui não estivesse mais na festa, onde iria procurar.

— Ali! — Zizhen apontou, chamando a atenção de Jingyi para uma pequena roda de pessoas no canto mais afastado da sala.

Uma roda no meio de uma pista de dança poderia significar várias coisas. Jingyi se arrependia amargamente das três ocasiões em que estivera no centro de uma comoção, só a lembrança era suficiente para fazê-lo se arrepiar inteiro de constrangimento.

Na primeira vez, ele havia acabado de fazer quinze anos, estava na sua primeira festa e saiu bebendo tudo o que viu pela frente sem comer ou beber água. Como resultado, Jingyi deu perda total. Sua visão escureceu e ele só se lembrava da horrível sensação do teto preto. Acordou na casa de alguém no dia seguinte, se sentindo tão mal quanto era humanamente possível. A ressaca foi tranquila, o difícil mesmo foi aguentar as piadinhas.

Na segunda vez, chamou toda a atenção da social para si mesmo quando passou mal e vomitou no jardim da casa de uma menina com quem queria ficar. Em sua defesa, o vexame não havia sido totalmente culpa sua, já que estava sentado e comportadinho na sala esperando ser notado pela anfitriã da festa. Também havia saído de casa devidamente alimentado e hidratado, aquele dia não tinha nada para dar errado — não fosse por um desgraçado que passava a cada cinco minutos lhe oferecendo shots de algum destilado demoníaco com sabor de nêspera. A bebida era doce, não queimava na garganta e era muito saborosa, então Jingyi aceitou todos os vários copinhos que lhe foram entregues. Foi um desastre quando o negócio bateu.

Na terceira vez, essa bem mais recente, Jingyi acabou no centro da roda por estar passando vergonha. Mas não foi nenhuma vergonha bobinha e facilmente esquecível, mas sim algo que fazia as entranhas de Jingyi se revirarem até hoje. Uma garota com quem estava dançando derramou toda a bebida do seu copo na calça de Sizhui, bem no meio das pernas. A calça era cinza e a mancha ficou muito visível, então não pôde nem disfarçar. Antes fosse apenas isso, um acidente com uma mancha inconveniente, dava para aguentar ser zoado por isso. A verdadeira desgraça começou quando a garota, transtornada como Jingyi havia visto poucas vezes na vida, decidiu que iria ajudá-lo puxando a calça dele para baixo.

E a sua cueca naquele dia era tão feinha.

Jingyi sentiu um arrepio só de lembrar, então se focou em abrir espaço entre as pessoas para chegar a tempo de impedir Sizhui de passar um trauma daqueles. Ele com certeza nunca mais iria sair de casa se acabasse pagando um mico tão grande na frente de tanta gente. Zizhen ainda o estava segurando pelo cinto e vinha logo atrás, se desculpando com as pessoas em quem Jingyi esbarrava de propósito. Um coro de uivos animados surgiu da roda e Jingyi rezou para quem pudesse ouvi-lo, implorando para ser Sizhui ali e para não ter vomitado.

No fim, Sizhui era mesmo o centro da comoção e ele não estava passando mal como Jingyi temia. Chegou a achar que ele havia cuspido uma iguana a julgar pela cara de absoluta descrença do pessoal em volta, mas estava tudo perfeitamente bem com ele. Bem até demais.

Sizhui estava beijando uma menina. Na boca.

E, céus, que beijão.

Jingyi arregalou os olhos, levando às mãos a boca para conter uma exclamação chocada. A mão firme de Zizhen em suas costas foi o que impediu seu corpo de cair para trás com tudo. Por um momento, chegou a pensar que estava vendo uma miragem. Não precisou nem fazer o arranjo, Sizhui estava mesmo beijando uma menina que ele mesmo havia conseguido e sem a menor reserva.

Aquele era o mesmo Sizhui envergonhado que quase morreu do coração no seu primeiro beijo? Porque Jingyi jamais imaginaria que uns copos de bebida e algum encorajamento seriam tão efetivos na hora de cortar as inibições de alguém como o jovem monge. E Sizhui beijava a menina com uma vontade que chegava a dar gosto, Jingyi sentiu um leve sabor de inveja em sua própria boca. A garota estava feliz da vida nos braços dele e ele a sustentava com um aperto que só faltava tirá-la do chão.

Nossa. — Ouviu a voz de Zizhen, que estava igualmente estático.

— ... Nossa. — Jingyi repetiu, sem ideia de algo melhor para dizer. — Diz pra mim que eu não estou tendo alucinações sozinho.

— Não está, não. — Zizhen concordou. — Você sabe quem é aquela? Ele já gostava dela antes, ou o que? Porque eu nunca ganhei um beijo desses, inclusive achei que Sizhui era puro demais pra saber essas coisas.

— Ele é. — Jingyi deu de ombros. — Bem, era.

Não queria sair dali sob o risco de acabar perdendo Sizhui de vista outra vez, só ele sabia o quanto a perspectiva de deixar seu melhor amigo bêbado por aí era assustadora, mas ficar olhando também estava difícil. Não que fosse exatamente repulsivo, mas era estranho porque Sizhui era seu coleguinha do primário. E agora ele estava lá, todo corajoso e desinibido com uma menina praticamente no seu colo, beijando-a com tanto vigor que fazia todo mundo ao redor salivar.

— Ai, olha. — Jingyi virou seu copo. Não satisfeito, tomou o de Zizhen das mãos dele e despejou o conteúdo na boca também. — Eu posso te pedir outro drink? Não vou sair daqui, depois a gente pode continuar dançando se quiser...

Estava sendo um folgado, se aproveitando do interesse de Zizhen para ter favores de graça, mas não se envergonhava nem um pouco. Agora era mais uma questão de Jingyi precisar desesperadamente estar bêbado para conseguir levar aquela festa até o fim.

— É claro... — Zizhen respondeu com uma risadinha alegre. O arrependimento de não ter ficado com ele bateu em Jingyi outra vez. — Um mais forte dessa vez?

— Mais forte. — Confirmou.

A mão de Zizhen se soltou do seu cinto e ele desapareceu entre as pessoas. Enquanto estava sozinho, Jingyi ligou seu celular e viu que a janela de A-Jin ainda estava aberta. Estava arrependido por ter mencionado a história sobre mostrar o rosto e começando a entrar em paranoia, pensando se A-Jin o havia abandonado por causa da insistência. No desespero de obter alguma resposta dele, Jingyi resolveu mandar outra mensagem. Suspirou de alívio quando viu o ícone dele ficando online.

 

Hey

Você não adivinha

Meu amigo monge está beijando uma menina bem na nossa frente!! :O

 

Jura?!

O seu amiguinho cheio de pudores?

 

Sim! :O

Dá pra acreditar???

Isso porque eu achei que ele fosse querer ir embora às dez

Hm, e falando nisso

Eu ainda estou atento ao horário, A-Jin

Vou voltar pra te dar parabéns quando for meia noite

Você vai esperar por mim?

 

É claro, JinJin...

Mas eu acho que você deveria me esquecer e ir curtir a sua festa  

 

Eu jamais conseguiria

Estou pensando em você desde a hora que saí de casa

 

Mas e se alguém chamar a sua atenção?

E se você quiser dançar com outra pessoa?

... Ficar com alguém

Eu não quero que você se impeça por minha causa

 

Eu jamais faria isso.

Meu A-Jin é único pra mim

Eu não quero mais ninguém.

 

Mas e se a oportunidade surgir?

 

A oportunidade já surgiu e eu escolhi não ir adiante

 

Mas você quis?

 

Eu não quero mais ninguém além de você

Eu sei que você está inseguro porque eu disse que queria ver o seu rosto

Eu quero te ver, mas não quis pressionar você, por favor me perdoe

Eu não me importo de esperar, eu não preciso disso agora

E se você disser que não quer também, eu não vou mais pedir, eu prometo

Só não fique estranho comigo...

Nem se afasta de mim, A-Jin

Por favor. Você pode perdoar esse tolo que mora no seu celular?

 

Não há nada para perdoar, JinJin...

Eu sabia que essa hora iria chegar um dia

Eu só quero que me responda uma coisa

Por favor, seja honesto

 

Eu prometo.

 

Em algum momento você desconfiou de mim?

Das minhas intenções? Dos meus sentimentos?

Você já chegou a achar que eu estava enganando você?

Esse seu pedido agora... Foi motivado por insegurança ou por suspeita?

 

Foi porque eu estou apaixonado por você, A-Jin. Estou falando muito sério, estou sendo honesto

Eu nunca desconfiei de você

Não depois que te conheci

Nenhuma pessoa mal intencionada se empenharia tanto apenas para enganar alguém

Nós já nos conhecemos há meses, conversamos todo santo dia

Eu só sinto tanto desejo de te ver porque eu sonho contigo toda noite

Com o som da sua voz, o formato do seu rosto...

Mas eu confio em você, e sei que você só não se sente seguro em se mostrar pra mim agora

Não te perder é mais importante pra mim

Eu posso esperar pelo tempo que for, mesmo que eu fique ansioso às vezes

Quando a hora chegar, nós vamos fazer isso juntos

 

... Eu não sei o que dizer

 

... Diga que eu não estou apaixonado sozinho pelo amor de deus

Eu acho que vou infartar

 

Não!!

É claro que não!

Você não está sozinho nessa

Eu quero dizer isso há tanto tempo...

Mas achei que seria estranho, que você iria se afastar de mim

Eu também não quero te perder, é por isso que eu tenho tanto medo

Eu não conseguiria mais ficar sem você, eu também quero te ver

Eu também quero ter um rosto pra pensar o dia inteiro, todo dia...

E quero que você me veja

E eu quero que seja hoje

 

O coração de Jingyi quase saiu pela boca. A música alta parou de entrar em seus ouvidos e ele encarou o celular como se esperasse que aquela fantasia de bêbado acabasse a qualquer momento, mas ela não acabou. A mensagem continuava ali, A-Jin estava mesmo dizendo que correspondia seus sentimentos e que também queria vê-lo.

Jingyi já era naturalmente emotivo, o álcool só piorava tudo. Fungou com a cara ainda enfiada no celular, parado no meio da pista de dança, se sentindo o maior idiota da face da terra.

 

... Ainda está aí?

 

Desculpa a demora, eu só fiquei sem palavras!! Eu estou tão feliz!!!

 

É você quem faz tudo valer a pena pra mim, JinJin...

Eu quero muito fazer isso, só não te mando uma foto nesse segundo porque não posso

 

E que tal quando eu voltar meia-noite?

Ou a qualquer hora, quando você quiser

Eu posso ficar acordado a noite toda te esperando

 

Quando for meia-noite

Eu prefiro meia noite, tem que ser hoje

Assim eu vou poder ouvir você me desejando parabéns...

Ficamos combinados assim?

 

SIM SIM SIM SIM

Eu vou ver o meu A-Jin!!!!! EU MAL POSSO ACREDITAR AAAA

 

Você vai ♡︎

Eu preciso ir, mas estarei aqui no horário que combinamos, ok?

 

Eu vou estar esperando!! ♡︎♡︎♡︎♡︎♡︎♡︎♡︎

 

Zizhen voltou com dois copos estranhamente grandes de um drink com cheiro de pêssego e vodca de baunilha. Jingyi se virou para ele após guardar o celular no bolso, pegando seu copo e brindando com o de Zizhen sem se importar com os respingos derramados entre eles. Haviam traços molhados no seu rosto também, mas isso era porque ele era só um adolescente emocionado.

— O que houve? — Zizhen perguntou, levemente preocupado. — Aconteceu alguma coisa?

— Aconteceu. — Jingyi respondeu com um sorriso que mal cabia no seu rosto, sorvendo um longo gole do seu copo. De fato, Zizhen não havia economizado na bebida. — Eu estou feliz!

Jingyi deu uma olhada em Sizhui por cima do ombro de Zizhen, conferindo se ele estava bem. Ele ainda estava beijando a garota de antes, porém com menos atenção voltada para si, e parecia estar confortável e se divertindo. Se voltou para o outro amigo, que ainda parecia receoso.

— Vem dançar comigo! — O puxou em sua direção, aproveitando o ritmo mais frenético da música que havia acabado de começar.

Zizhen deu de ombros por fim, provavelmente já estava acostumado a fase chorona dos seus amigos bêbados. Ele trouxe Jingyi para mais perto e foi igualmente segurado por ele, dançando com o amigo no embalo da música agitada.

A festa pareceu chegar ao seu auge depois das onze. A casa estava impossivelmente cheia, a pista apertada tornava o ar abafado e Jingyi sentia o suor escorrendo pelo seu rosto, mas não estava nem aí. Depois que o último drink acabou, Zizhen se livrou dos copos deles e Jingyi jogou os cabelos curtos para trás. A música também pareceu mudar, se transformando numa batida eletrônica que não era o tipo de coisa que Jingyi gostava de escutar nos seus fones de ouvido, mas que amava em festas. O vidro das janelas vibrava e o chão parecia gelatina debaixo dos seus pés. Se sentiu leve como não se sentia há muito tempo.

A garota que estava com Sizhui foi embora em determinado momento e ele se juntou aos outros dois amigos. Jingyi estava fascinado pela figura descontraída dele, com o rosto corado e sorridente e todo carimbado de marquinhas de batom, pulando pela pista como se aquela fosse a última festa em que iria na vida. Talvez fosse mesmo, do jeito que ele estava, o tio Wangji iria matá-lo quando chegasse em casa.

Zizhen disse que iria ao banheiro e Jingyi aproveitou a chance para tomar um ar. Trouxe Sizhui consigo e os dois se sentaram na sala das bebidas, que estava consideravelmente mais vazia que a pista. Largados no sofá, rindo de qualquer coisa enquanto esperavam pelo outro amigo, Sizhui e Jingyi se sentiram no céu. Zizhen voltou do banheiro com três garrafas de água e alguns doces para que eles recuperassem pelo menos um pouco da noção, também se jogando no sofá.

— Garotas são incríveis. — Sizhui voltou a afirmar, olhando abobado para o teto decorado da sala. — Elas são maravilhosas.

— São, sim. — Jingyi concordou, empurrando o ombro do amigo de maneira amistosa. — Agora você entende porque eu sempre quis te trazer no rolê?

— Nunca mais me deixe negar uma festa...

— Eu vou me lembrar disso, olha lá.

Ambos riram mais uma vez. Jingyi puxou o celular do bolso e tirou uma foto dos três juntos, fazendo caretas para a câmera. Postou a foto na rede social, mas a internet estava mesmo lenta naquele dia.

— Olha, Rulan pode ser o que for, mas ele realmente sabe dar uma festa. — Zizhen comentou, curvado sobre o corpo de Sizhui para ver a legenda da foto nas mãos de Jingyi. — Me marca...

Jingyi entendeu que Zizhen queria ser sinalizado na foto, mas Sizhui não era muito ativo nas redes sociais e não fazia ideia do que o amigo estava dizendo.

— ‘Tá bom, então.

Dando de ombros, Sizhui puxou o rosto próximo de Zizhen e deixou um selo estalado nele. Envergonhado e em choque, Zizhen encarou Sizhui com sérias dúvidas sobre o seu estado.

— ... Ok? — Jingyi perguntou, estranhando.

Sizhui continuava sorrindo, mas Zizhen só parecia atordoado e acanhado demais para fazer qualquer coisa. Ele voltou lentamente ao seu lugar no sofá, cobrindo a bochecha rosada com a mão. Zizhen era extrovertido demais para ficar tão tímido, provavelmente ele estava sem graça porque Sizhui era muito bonito. Jingyi não conseguiu segurar o riso.

— Você é o bêbado beijoqueiro, então? — Jingyi perguntou, ainda se acabando de rir. — O Zizhen fica eufórico, eu fico emotivo e você beija tudo que aparece na sua frente. Tem como isso dar mais errado?

Mais uma leva de risadinhas se seguiu ao comentário não respondido. Aos poucos Zizhen foi relevando mais a vergonha, até porque sabia que Sizhui era lamentavelmente hétero e que não conseguiria nada com ele. Um pigarro e uns goles a mais na sua garrafa d'água bastaram para que ele voltasse a fazer parte das conversas.

— Meninos, vocês viram o aniversariante por aí? — Uma garota bonitinha, mas meio desalinhada, se aproximou do canto deles, ajeitando o vestido e conferindo a maquiagem num espelhinho de bolso.

— Eu vi ele na mesa de bebidas quando fui pegar água... Já tem uns minutos. — Zizhen respondeu. — Mas seu não iria atrás dele se eu fosse você.

— E por quê? — Ela questionou, confusa.

— Ele estava entornando uns copos de bebida pura, parecia prestes a ter uma síncope.

Sizhui prestou alguma atenção quando percebeu que estavam falando do seu primo. Logo em seguida, por motivo nenhum, ele abaixou os olhos para as mãos levemente trêmulas de Jingyi.

— Aparentemente ele não é o único. — Comentou baixinho para o amigo.

Jingyi estava corado, todo acanhado de repente. A garrafa em suas mãos estava balançando e sua instabilidade só piorou quando checou o celular e viu que faltava apenas vinte minutos para a meia-noite. Aproveitou o breve momento em que Zizhen se distraiu com a menina que o pegou de conversa para se achegar mais a Sizhui no sofá. Colocou as mãos em concha no ouvido do amigo, falando baixinho como se a música já não fosse proteger seu segredo.

— Vou ver A-Jin hoje. — Contou, cheio de empolgação. — Quando der meia-noite ele vai me mandar uma foto. E eu vou mandar uma também.

Sizhui se afastou para encarar o amigo com os olhos arregalados, exageradamente surpreso. Jingyi riu timidamente, cobrindo o rosto quente com as mãos. Achava justo se dar ao luxo de agir como um bobo depois do tanto que bebeu.

— É sério?! Vocês vão se conhecer de uma vez por todas? — Mais uma vez, Sizhui pareceu estranhamente sóbrio ao dizer. — Finalmente vai acabar esse chove e não molha?

— É! — Jingyi confirmou com animação.

— Ah, até que enfim. Já estava na hora. — Sizhui ergueu as mãos em alívio. — Eu não aguentava mais vocês dois desse jeito. Aturar o choro de um já é um saco, agora de dois é pedir pra morrer.

Jingyi franziu seu rosto.

— Como é que é?

Sizhui desconversou.

— Não me entenda mal, você reclama por dois quando se trata do seu A-Jin. — Sizhui bebeu outro gole da sua garrafa. — Mas me conte, como você está se sentindo?

— Eu acho que meu coração vai explodir. Eu não consigo parar de pensar nele! No quanto ele deve ser lindo se for tão bonito por fora quanto é por dentro. Ele disse que também está apaixonado por mim! Você acredita nisso? Olha eu vou te mostrar as mensagens...

— Não precisa, não. — Sizhui afastou o celular de Jingyi do seu rosto. — Eu acredito em você. Já me basta vocês narrando os devaneios açucarados dessas conversas, eu não preciso de nada mais descritivo.

Um par de mãos surgiu no meio deles, tapando os olhos de Sizhui. Tateando os dedos delicados com unhas bem-feitas, ele logo percebeu que se tratava de uma garota, abrindo um largo sorriso. Um beijo longo e vermelho foi deixado em sua bochecha e Jingyi quase levou uma cabeçada. Sua sorte foi que conseguiu desviar.

— Não ‘tá me vendo aqui, não?

A menina o ignorou completamente.

— Hm... Sizhui me prometeu uma dança. — Ela resmungou no ouvido dele, toda manhosa. Era uma garota mais velha ou Jingyi estava ficando louco? — Não vai me deixar na vontade, vai?

— É claro que não!

Sizhui se levantou depressa, pulando o encosto do estofado como se não pudesse simplesmente ter dado a volta nele. A menina riu da sua pressa, lhe dando a mão. Sizhui ainda teve a cara grossa de dar dois tapinhas sem-vergonha no ombro de Jingyi, quase como se dissesse que agora era a hora dele se virar sozinho.

Eu te trago aqui, te ensino a beber, te coloco no meio das meninas e você já começa a agir desse jeito?!

— Não vá muito longe da minha vista! — Ordenou. Sizhui confirmou com um aceno desinteressado.

Cruzou os braços, indignado. Enquanto revirava os olhos, conseguiu ver Rulan apoiado na porta de vidro do jardim e se dedicou a olhar um pouquinho pra ele. Zizhen tinha mesmo razão, ele parecia bem nervoso. Numa mão segurava o copo, na outra o celular. Podia jurar que ele estava prestes a arremessar o aparelho do outro lado da sala.

Iria dizer alguma coisa para Zizhen, chamá-lo de volta para a pista talvez, mas acabou dando de cara com ele e a desavisada que perguntou por Rulan no maior flerte. Se levantou, decidido a não atrapalhar. Havia dado um fora nele, o mínimo que podia fazer era deixar que ele se arranjasse com outra pessoa sem ficar em cima

Foi se sentar no degrau que levava ao jardim, relativamente próximo a Rulan, que nem o percebeu ali. Estava mais arejado lá fora, uma brisa gostosa veio refrescar os fios úmidos da sua nuca e balançar seus brincos. Seu celular vibrou e o pegou sem perder tempo. A notificação de A-Jin fez seu coração vibrar.

Quinze minutos para a meia-noite.

 

JinJin

Eu estou com medp

Medl*

Medk*

Argh!!! M E D O

Que inferno, eu não consigo nem digitar direito!!!

 

... Está tudo bem, meu amor?

 

Está, eu prometo

Eu só bebi um pouco

... bastante

... pra caralho

 

Não se preocupe, eu também bebi um pouco na festa...

Veja pelo tempo que eu levo pra digitar tudo certinho pra você

Mas por que meu A-Jin está com medo?

 

Eu não quero que você me veja

 

... você quer desistir, meu bem?

Se você quiser, não tem problema! Eu juro que não vou ficar chateado, eu posso compreender!

 

Jingyi choramingou.

Não é como se eu fosse ficar chorando por isso por uma semana. É claro que não, imagina. Por uns seis dias, só.

Jingyi sentiu os respingos de algo molhado em sua bermuda, só então reparando que o copo mãos de Rulan havia caído bem do seu lado. Se levantou às pressas, meio tonto. Aparentemente, todos haviam resolvido derramar coisas na sua roupa naquela noite.

— Presta atenção! — Resmungou, entrando novamente na sala das bebidas. Se apoiou num canto e voltou a encarar o celular.

 

Eu não quero desistir!

Eu realmente não quero

Mas eu tenho tanto medo de você não gostar de mim...

Eu sei que você não é uma pessoa superficial e você já me disse isso várias vezes, talvez eu que seja inseguro demais...

Você é o meu JinJin... Uma das únicas pessoas que são só minhas, o que há de mais doce sobre a minha vida

E se você me achar feio? A gente nunca conversou sobre o tipo de pessoa que achamos atraentes no fim das contas...

E se não gostar do meu cabelo?

Ou dos meus olhos

E se você só não for com a minha cara? Você me disse uma vez que às vezes não vai com a cara das pessoas

Pode acontecer comigo, não pode?

Como eu vou ficar se você parar de me desejar bom dia quando eu acordo?

E se você nunca mais me desejar bons sonhos antes de dormir?

Eu te vejo em tudo, JinJin... Já te associei a tudo na minha vida

Não há nada que eu veja hoje sem que você surja nos meus pensamentos

Eu pensei em você me abandonando várias vezes essa noite eu chorei em todas elas...

Eu não conseguiria te desconhecer

 

O coração de Jingyi se despedaçou. Já sabia que A-Jin era sensível, mas não imaginou que pudesse ser tanto. Pensou naquele garoto sem rosto, tão doce quanto suas palavras, encolhido sozinho na sua cama fria enquanto digitava aquelas coisas tão tristes. Seus olhos se encheram de lágrimas em instantes.

Mas também se sentiu determinado. Com o celular sobre o colo e o peito subindo e descendo em nervosismo, estalou os dedos, preparando-se para digitar um textão furiosamente.

Seu A-Jin não iria sofrer.

Não enquanto ele pudesse evitar.

 

A-Jin, eu quero que preste muita atenção ao que eu vou dizer agora

Você jamais precisaria me desconhecer

Ainda há muitas coisas que eu não sei sobre você, inclusive não sei o que pode ter acontecido para te deixar tão inseguro, mas eu garanto que não sou esse tipo de cara

Eu nunca te abandonaria por algo tão frívolo quanto aparência. Você se lembra quando eu te disse mais cedo que pessoas mal intencionadas não se empenhavam tanto só pra enganar os outros? Se eu só estivesse atrás de um rosto bonito, eu não estaria falando com você agora. Eu teria ficado com o garoto que quis me beijar hoje, mas eu gosto tanto de você que nem consegui pensar nele assim.

Eu também não conseguiria te desconhecer porque eu penso em você o dia inteiro. Fico morrendo de vontade de te contar do meu desempenho no jogo, dos meus estudos, da minha família. Eu não consigo evitar pensar em qual seria a sua opinião sobre todos os aspectos do meu dia e isso é tão mais importante que o que há por fora, A-Jin...

Eu sei tanto quanto você o quanto isso é assustador. Eu também estou morrendo de medo de você não me achar atraente eu mais bonito que você vai ver na vida, muito pelo não só o cara contrário. Eu tenho um rosto bem comum e eu sei disso.

Mas isso não importa pra mim e eu espero que também não importe pra você. Se houver algo de diferente nos seus olhos ou no seu cabelo, eu sei que eu vou gostar. Se você não gostar deles, eu te ensinarei a gostar. Eu quero que você se ache bonito sem que eu tenha que achar primeiro e, se você me permitir, nós também vamos passar por isso juntos.

 

 

Oito minutos para a meia-noite.

A-Jin visualizou a mensagem.

A-Jin não respondeu a mensagem.

Jingyi começou a chorar por causa da mensagem.

Será que estava assustando A-Jin com a sua sinceridade? Talvez ele não estivesse tão apaixonado assim, talvez Jingyi só estivesse soando desesperado demais — tanto quanto realmente estava. Se visse qualquer outro amigo seu no estado em que se encontrava, teria rido, batido uma foto e só então ido confortá-lo. Jingyi era o cúmulo da desgraça que era estar apaixonado e ser adolescente ao mesmo tempo.

Aquela pessoa estranha no seu celular já tinha seu coração na mão e o estava esmagando entre seus dedos — e toda essa palhaçada clichê e melodramática. Estava chateado como se tivesse acabado de terminar um namoro real com um pessoa tangível, crente de que havia sufocado suas esperanças de ficar com A-Jin e, junto delas, toda e qualquer chance que jamais teria de ser feliz na vida. Ele nunca mais encontraria um namoradinho, nunca mais suspiraria bobo e irritante e apaixonado no colo de Sizhui.

Sizhui? Sizhui!

Se havia ficado naquela festa só para acompanhá-lo, Jingyi tinha algum crédito com Sizhui. Agora que estava bêbado, chorando e desorientado, ele teria que ser de alguma ajuda. Invadiu a pista com o celular apertado nos dedos e os olhos borrados, procurando seu melhor amigo no meio de toda aquela galera que dançava juntinho ao som de alguma música romântica tosca. Queria mais era sair chutando a bunda de todo mundo até achar Sizhui, mas acabou o encontrando antes que pudesse se meter numa briga por pura frustração.

Sem nem se importar se estava interrompendo um beijão de Sizhui com a menina cabeçuda sem noção, Jingyi sacudiu a manga dele como um pirralho pedindo por atenção. Quando recebeu um olhar entediado e ligeiramente irritado, sem saber o que dizer para justificar o fato de estar sendo um inconveniente no rolê dos outros, abriu a boca pra chorar de novo.

— Sizhui, eu estraguei tudo! — Exclamou, cobrindo os olhos.

Sizhui respirou fundo, estranhamente sóbrio mais uma vez naquela noite. Ele beijou o rosto da garota com quem dançava, murmurando um pedido de desculpas, e se virando para Jingyi sem muita paciência.

— Me dá isso aqui. — Sizhui arrancou o celular da mão de Jingyi, conferindo as horas.

Três minutos para a meia-noite.

— Olha aqui, deixa eu te falar uma coisa. — Sizhui segurou seu rosto, forçando-o a manter seu olhar. — Você tem três minutos pra parar de chorar e fingir que não tem cinco aninhos mentalmente. ‘Tá me entendendo?

Jingyi arregalou os olhos, desacreditado. Ainda estava processando a bronca que estava tomando quando Sizhui puxou seu pulso, levando-o apressadamente para fora da pista. Ele mantinha um dos olhos no caminho e outro no celular em sua mão, acompanhando o horário quase que obsessivamente, perfeitamente equilibrado no meio das pessoas. Ele andava a passos duros e decididos, enquanto o próprio Jingyi parecia ter dois pés esquerdos.

Sizhui olhou rapidamente para os lados quando chegaram ao hall de entrada. Na ausência de alguém para repreendê-los, arrastou o totem que bloqueava o acesso às escadas e enfiou Jingyi pela abertura, passando por ela e arrastando o totem outra vez. Jingyi continuava com uma interrogação gigante na cabeça enquanto Sizhui o segurava pelos braços e o encostava na parede, começando a ajeitar seus cabelos e sua maquiagem com uma habilidade magicamente adquirida.

Jingyi estava tão chocado que não conseguiu nem perguntar que porra ele estava fazendo.

— Certo, você está aceitável. — Sizhui disse com um suspiro cansado, dando batidinhas suaves na base levemente manchada das bochechas de Jingyi. — Agora, ‘tá vendo aquela porta ali?

Sizhui apontou para a ampla porta de vidro atrás das escadas. Ela era semelhante a porta da sala das bebidas, mas dava acesso a um pequeno jardim privado onde não existia ninguém. A música de balada no resto da casa virou só um eco distante naquela parte tão silenciosa da casa, podia até ouvir os grilos cantando.

— Você ‘tá vendo aquela porta ali?! — Sizhui perguntou outra vez, enfático.

— ... Estou. — Jingyi respondeu, ainda petrificado demais pelas atitudes do amigo para não soar patético.

Sizhui soltou um novo suspiro frustrado, conferindo o celular de Jingyi e o devolvendo ao bolso da bermuda amarela dele.

— Agora você vai passar por aquela porta e fazer a sua noite, e a minha, valerem a pena.

— É o quê?! Do que você está falando, por acaso você enlouqueceu?

— Para de me questionar e vai logo, que inferno!

Sizhui perdeu a paciência com aquele demora toda e começou a empurrá-lo. Com um último pontapé nas suas costas, Jingyi voou para o gramado do jardim, ouvindo a porta se fechar bruscamente atrás de si logo em seguida.

Mas ele também ouviu outra coisa. Ali, num lugar tão calmo e silencioso, Jingyi pôde ouvir claramente o som de um celular capturando uma foto. Ele também viu um pouco da luz do flash enquanto tentava se equilibrar, mas estava tão tonto que começou a duvidar das coisas que estava vendo. Era possível que estivesse alucinando só com álcool e uns quinze minutinhos de choro?

Zizhen deveria ter colocado alguma coisa muito diferenciada na sua bebida. Era isso ou Rulan realmente estava na sua frente, com os olhinhos molhados, as bochechas coradas e o celular na frente do rosto.

Quase que imediatamente, o celular de Jingyi vibrou no bolso. Sua mão foi parar nele num gesto automático, mas não consegui pegá-lo de fato. Estava muito ocupado reparando o quão bonito Rulan ficava com seus olhos brilhantes saltados em surpresa e seus lábios entreabertos numa exclamação que nunca saiu. Acabou reunindo a coragem necessária para levar o celular ao nível do rosto, desbloquear a tela e abrir a janela de A-Jin.

Aquilo não poderia estar acontecendo.

Mas, então. Meio que estava.

A prova estava bem diante da sua cara na forma de uma fotografia de Rulan, com os olhos cheios de lágrimas e um sorriso acanhado. Para piorar, até era possível ver o vulto desajeitado de Jingyi passando pela porta, bem atrás da sua camisa azul, além do pé atrevido de Sizhui atrás dele.

A-Ahhh?!

O grito assustado finalmente saiu da garganta de Rulan, que quase deixou o celular cair. O guardou automaticamente no bolso da sua calça, mas só conseguiu porque fazia aquilo com frequência suficiente para criar memória involuntária. Cobriu os lábios com ambas as mãos, se afastando uns bons passos de Jingyi, que seguia imóvel como uma estátua.

Jingyi estava bêbado, mas não era burro. Entendeu de primeira que seu A-Jin era, na verdade, Jin Rulan, mas digerir isso estava sendo bem complicado. Seu coração começou a bater forte e as engrenagens em sua cabeça estavam girando depressa. Seu próprio celular se espatifou no chão.

— ... A-Jin?

A pergunta saiu sussurrada e cheia de esperanças. Jingyi se esqueceu quase completamente do Rulan que conhecia e só esperou, do fundo do coração, que ele fosse mesmo o seu A-Jin. Estar diante dele, a poucos passos de abraçá-lo como sempre quis, seria mil vezes melhor que apenas ver um rosto, ainda mais agora que sua cabeça processava aceleradamente todas as várias qualidades que, do nada, Rulan pareceu adquirir.

— Você me acha metido?!

A voz estridente de Rulan quebrou a magia do momento.

Ele cruzou os braços com força sobre o peito, olhando Jingyi com revolta. Um bico enorme surgiu nos seus lábios e Jingyi achou tão bonitinho que não pode segurar o riso.

— Eu acho. — Respondeu sem pensar muito, nem se preocupando em medir as palavras.

Rulan suspirou ofendidísso, com uma mão sobre o peito e o rosto retorcido.

— Como é que é?! — Ele bateu o pé no chão. — Você também é um estúpido às vezes, sabia?

— Sabia. — Jingyi confirmou. A honestidade desenrolou a resposta sem esforço e ele não conseguiria se impedir de falar o que surgisse primeiro na cabeça.

Se aproximou alguns passos de Rulan, que seguia imóvel em sua indignação. O tremor nas suas sobrancelhas e os olhos dele se enchendo de lágrimas outra vez diziam um monte de coisas. Ele estava surpreso, irritado, envergonhado e talvez estivesse um pouco decepcionado.

— Não sou quem você esperava? — Jingyi perguntou, se sentindo consideravelmente menos bêbado pelo susto. — Está desapontado?

Rulan não respondeu. Ele só permaneceu de pé na frente de Jingyi, com uma careta raivosa e chorando em silêncio.

— Você sabia? — Rulan perguntou, claramente magoado. — Isso é parte de alguma brincadeira de mau gosto, alguma vingança por causa da escola?

— Não. — Jingyi garantiu com segurança. — Eu juro que não sabia.

Rulan soluçou dolorosamente, finalmente desistindo da sua pose marrenta e se entregando ao choro.

— Isso não pode estar acontecendo... — Ele murmurou. — Eu não acredito! Se você não sabia, como veio parar num lugar que estava fechado para você e justo agora?

— Porque eu sabia e chutei a bunda dele até aqui.

Logo atrás dos dois, escorado na porta recém-aberta, estava Lan Sizhui.

Aquele desgraçadinho filho da puta.

— É o quê? — Rulan rosnou, voltando a assumir sua postura irritantemente defensiva. — Você sabia?!

— Eu descobri por acaso! — Sizhui se impôs, não dando nenhuma brecha para ser mal interpretado. — Vocês são dois idiotas, tão óbvios que chega a dar pena!

— E como diabos você descobriu? — Foi a vez de Jingyi perguntar, se sentindo tanto curioso, quanto meio traído.

— Primeiro, Rulan tem a mania de deixar o celular desbloqueado nos almoços de família. Eu vi sem querer, antes que você comece a latir! — Sizhui já bloqueou as reclamações do primo por antecedência. — Era uma captura de tela do computador do Jingyi, apesar da janela do jogo estar na frente, dava pra ver o plano de fundo e fui eu quem desenhou aquela arte pra ele. Se não era o próprio Jingyi, era alguém próximo dele.

— Já fazem meses que eu não uso mais o seu desenho como descanso de tela. — Acusou Jingyi.

— Pois é! Na época era só um palpite, mas logo depois vocês dois começaram a alugar os meus ouvidos para resmungar um do outro! Você não parava de falar sobre como o seu amiguinho online era fofo. — Ele disse a Jingyi, logo se virando para Rulan. — E você nem tenta me olhar com essa cara de pena porque você não me convence! Você me ligou chorando na semana passada porque o JinJin te desejou bons sonhos sem um emoji de coração!

O rosto de Jingyi se encheu em remorso. Estava com sono naquele dia, não imaginou que uma mensagem mal enviada poderia ter deixado seu A-Jin tão chateado.

— Você chorou por isso? — Jingyi olhou para Rulan, verdadeiramente tocado.

— Olha aqui pra mim que eu ainda não terminei! — Sizhui chamou a atenção dos dois estalando os dedos várias vezes.

— Você não estava bêbado? — Jingyi questionou com desconfiança.

— Não tanto! — Sizhui disse como se fosse óbvio. — Meu pai é Wei Wuxian, Jingyi. Me dê algum crédito.

— E por que porra de motivo você estava fingindo?! — Rulan explodiu.

— Porque era a única forma de fazer esse aí ficar na festa por tempo suficiente para eu confirmar as minhas suspeitas! — Sizhui indicou Jingyi. — Ele nem queria vir! Se eu não fosse um perigo em potencial ele teria ido embora antes de servirem a comida.

Um momento de silêncio se fez entre eles.

— ... Mas e aquele monte de meninas que você beijou?

A pergunta de Jingyi pegou Sizhui desprevenido. Ele desviou os olhos, encurralado, mas logo voltou a ralhar impacientemente.

— Isso não vem ao caso! — Sizhui desconversou com o rosto vermelho. — Voltando a falar da burrice de vocês, eu reparei que Rulan estava chegando quando derramei bebida no seu casaco. Você já tinha enviado a foto para ele e eu não queria que fosse tão óbvio, embora vocês dois sejam burros o suficiente pra isso não ser um problema. Depois foi só confirmação, o quanto vocês dois estavam tremendo da cabeça aos pés com a cara no celular, os dois solteiros de pulseira vermelha no braço e Rulan usando uma camisa azul?! É sério, mesmo? Você detesta azul, essa camisa nem cabe em você, provavelmente é do seu pai, que outro motivo você teria para fazer tanta questão de usar a cor favorita do Jingyi? Só se ele também estivesse usando a sua.

Jingyi e Rulan se entreolharam por um momento, verdadeiramente assustados com a investigação que Sizhui havia feito. Ele definitivamente estava passando tempo demais com o tio Huaisang.

Agora, como ele havia descoberto que Rulan iria estar no jardim dos fundos naquele exato momento?

Essa parte talvez eles nunca soubessem.

— Olha, eu sei, tá? Eu também não achei que fritar a cabeça com um romancinho água com açúcar entre o meu melhor amigo e o meu primo seria um bom uso do meu tempo, mas olhando pra vocês dois agora, eu não me arrependo nem um pouco. Eu ia deixar vocês dois se resolverem sozinhos, mas graças a deus eu não deixei. Quando eu cheguei aqui, vocês estavam prestes a discutir por um rolê que nem vale a pena. Vocês dois nem têm motivo pra se detestar, a picuinha de vocês na escola é baseada puramente num preconceito que eu, sinceramente, não sei de onde saiu. Rulan é um otariozinho às vezes? Pois é mesmo. — Sizhui mais uma vez ergueu um dedo imponente na frente do primo, impedindo-o de retrucar antes que terminasse. Ele usou o mesmo dedo para apontar Jingyi. — Mas você tem que entender que ele não sabe o que é ter um amigo de verdade por causa da conta bancária do meu tio. É por isso que você é tão importante pra ele. E você, Rulan, deveria parar de encher a porra do saco do Jingyi só porque ele é extrovertido e você é tão recluso que quase não vê a luz do sol!

Olhando para o chão com as orelhas baixas e o rabo entre as pernas, Jingyi e Rulan se sentiram dois pirralhos sendo repreendidos pelos pais depois de aprontar. Seria teimosia e imaturidade deles não admitir que Sizhui estava coberto de razão da cabeça aos pés. Ele suspirou audivelmente, soando cansado, mas esperançoso.

— Vocês dois são meus amigos mais próximos. Sabem que eu não teria me empenhado tanto por algo que eu não acredito que daria certo. Já tem meses que vocês conversam todo dia o dia inteiro, vocês se conhecem. Agora que estão cara a cara, ao alcance um do outro, vocês vão jogar toda essa parada bonita fora por causa de uma briga que, como eu já falei, não faz nem sentido? — Sizhui disse, visivelmente menos irritado. — Qual é, gente. Não desperdicem o meu esforço.

Os três caíram num silêncio estranho. Jingyi tentava olhar para Rulan, mas estava muito envergonhado para tirar os olhos do chão.

— Eu já falei o que eu tinha que falar pra vocês dois. — Sizhui concluiu. — Vocês que se resolvam agora, eu vou lá me despedir das meninas e depois eu vou pra casa. Boa noite.

No mesmo pé que entrou, Sizhui saiu. O baque da porta foi a última coisa ouvida por Jingyi e Rulan, antes que o silêncio e o canto dos grilos fossem a única companhia deles.

Jingyi ainda estava tonto. Todo o álcool que havia consumido não iria sair tão cedo do seu organismo, mas estava consciente o bastante ouvir e entender tudo o que Sizhui havia dito. Ainda queria arrebentar seu melhor amigo por ter sido feito de idiota a noite toda, mas no momento a sua maior preocupação era o garoto que se abraçava todo encolhido ao seu lado.

— ... Eu achei que seu aniversário fosse amanhã.

Rulan o olhou timidamente, parecendo estranhar o tom gentil da sua voz. Jingyi se lembrou de ter sido rude com ele poucos minutos antes pelo episódio da bebida derramada e seu coração se apertou com o arrependimento.

— É amanhã. No caso hoje. Já passou da meia-noite.

Por mais que estivesse se sentindo culpado, confuso e enganado, Jingyi encontrou forças para rir. O sorriso em seu rosto se abriu com facilidade porque associar A-Jin ao menino que estava ao seu lado foi estranhamente simples. Na verdade, foi tão simples que todas as borboletas que achou que sentiria na sua barriga quando enfim encontrasse A-Jin estavam de fato lá. Talvez só estivesse tão propenso a jogar seu orgulho fora porque estava alcoolizado, mas nunca sentiu tanta certeza de algo antes. Estava disposto a esquecer tudo, todos os anos de ressentimento e ódio gratuito, e se deixar apaixonar por Jin Rulan.

— Sizhui tem razão. — Jingyi começou, procurando timidamente pela mão de Rulan, que já estava fungando outra vez. — Ele... Eu e você, sabe. Nós não temos motivos pra brigar. Eu te chamei de metido um monte de vezes e eu posso te assegurar que me arrependo. Me desculpe, A-Jin.

Ouvir seu apelido sendo verbalizado por uma voz real fez Rulan erguer seus os olhos vermelhos para Jingyi. Ele soava tão doce que não deixava a desejar em nada quando comparado aos seus sonhos. Os dedos dele se entrelaçando aos seus fizeram o coração de Rulan bater mais depressa no peito e seu rosto ficou ainda mais quente.

— Eu não me importo que seja você. — Rulan murmurou por fim, respirando com dificuldade pelo choro recente e pela estranha fraqueza que pareceu dominar seu corpo. — Eu não me importo. Contanto que aí dentro, em algum lugar, exista o meu JinJin. Eu só quero o meu namorado, só quero ficar junto dele. Eu não ligo pra mais nada.

As palavras de Rulan foram sumindo aos poucos, junto dos soluços que cortavam sua voz. Assim como ele, Jingyi tremia e não entendia como ainda não havia desmanchado numa poça diante de Rulan. O toque acanhado entre as mãos deles se tornou um entrelaçar firme, mas gentil, no qual o polegar de Jingyi não parava de deslizar sobre as costas da mão macia de Rulan.

— A-Jin... Eu quero fazer isso dar certo. Eu sei que isso pode dar certo. Nenhuma das coisas que eu te disse era mentira.

— Eu também fui sincero. — Rulan respondeu sobre ele, parecendo quase desesperado para falar. As palavras estavam engasgadas em seu peito e ele queria muito dizê-las, mas estava com tanto medo. Não queria balbuciar qualquer idiotice sem sentido e acabar estragando tudo. — Em cada palavra, eu gosto do JinJin, eu... Eu me apaixonei por ele. Eu não quero ficar sem ele, eu não quero que ele me esqueça.

— Ele não vai te esquecer.

A afirmação de Jingyi soou tão segura que mais uma leva de lágrimas silenciosas rolaram pelas bochechas de Rulan. Ele sentiu seu corpo inteiro se dissolvendo quando a mão de Jingyi rodeou sua cintura e o trouxe para pertinho.

— Deixa eu ser seu JinJin, hm?

A mão que segurava a de Rulan foi parar em seu rosto num carinho que foi muito bem recebido. Com os olhos fechados e a bochecha apertada contra o toque de Jingyi, Rulan só faltava ronronar. Rodeou o pescoço dele com os braços moles, instável como se estivesse prestes a desmaiar.

A respiração de Jingyi tão próxima ao seu rosto provocou cócegas em Rulan, que riu em meio ao choro. O beijo gentil que parou em sua bochecha só o fez sorrir ainda mais. A carícia lenta do nariz de Jingyi sobre sua pele corada também era mais que agradável.

— JinJin... — Rulan sussurrou, comovido e mergulhado no quão carinhoso Jingyi podia ser.

— Feliz aniversário, A-Jin.

Jingyi beijou Rulan com todo o cuidado que pôde reunir. Foi só um selinho longo, mas impossivelmente doce. Seu coração batia tão depressa que poderia explodir no minuto seguinte, estava suando de ansiedade e emoção e não conseguia parar de pensar no quanto a visão do A-Jin real era perfeita. O jeitinho tímido e acanhado dele, a maciez suave dos seus lábios, o formatinho da sua cintura. Tudo era mil vezes melhor que qualquer sonho que Jingyi já havia tido porque era palpável.

Se separou lentamente de Rulan, focalizando o rosto dele. Ele também tinha olhos lindos, pretinhos e redondos como duas bolinhas de vidro, que piscavam com aqueles longos cílios cheios de gotinhas transparentes. Por algum tempo Jingyi ainda esperou que estivesse imaginando coisas, que iria acordar em coma alcoólico em algum lugar daquela festa, mas Rulan calou seus últimos receios ao segurar sua nuca e beijá-lo outra vez.

O beijo foi mais profundo, mas ainda era tímido e meio desajeitado. Rulan suspirou baixinho quando Jingyi abraçou mais sua cintura, agora com ambas as mãos, e um arrepio cruzou seu corpo. Notou o calor das suas bochechas se espalhando, fazendo as roupas parecerem quentes de repente. Rulan não havia beijado tantas pessoas na vida, ele não sabia como fazer muitas coisas e o nervosismo só piorava tudo. Se deixava guiar completamente pela língua habilidosa de Jingyi, tão mole nos braços dele que não sentia nada além do próprio coração batendo.

Não era incomum que Jingyi ficasse imerso na intensidade dos próprios sentimentos e se esquecesse um pouco do resto do mundo. A juventude era uma coisa estranha, ser jovem era encantador e assustador na mesma proporção. Tudo era pra ontem. As primeiras vezes carregavam aquela ânsia de experimentar e agarrar e não deixar ir. Jin Rulan era a primeira paixãozinha verdadeira da sua vida, estava tão empolgado que sentia que poderia morrer de tanta animação. Só não estava pulando para todo lado como um filhotinho porque Rulan parecia ainda mais instável que o próprio Jingyi, carente do seu suporte.

Todo delicado e fofinho daquele jeito, Rulan nem parecia o garoto arrogante que ele vendia na escola, e talvez essa fosse a sua verdadeira face. Ele não estava sendo falso agora, isso era fácil de ver. Jingyi nunca havia se apaixonado antes, sim, mas já havia beijado uma garota apaixonada. A pobrezinha mal conseguia se sustentar sobre os próprios joelhos e Jingyi sentiu muita pena dela, uma vez que não podia corresponde-la. Mas com Rulan tudo era diferente, ele se sentiu o próprio garoto tonto prestes a bater com a cara no chão.

Jingyi só se separou dele porque percebeu os ofegos em seu rosto, afastando seus lábios com uma série de selinhos longos e afetuosos. Quando a testa de Rulan voltou a ficar lisa e seus olhos se abriram, ainda cheios das lágrimas que ele não conseguia parar de derramar, ele abriu um sorriso lindo, sincero e cheio de estima para Jingyi. Rulan era chorão, sempre havia sido, mas essa era uma das primeiras vezes em que se lembrava de estar chorando de felicidade.

— Você está aqui. — Ele murmurou, se lançando nos braços de Jingyi e sendo prontamente amparado. — Você está mesmo aqui, eu não posso acreditar...

Jingyi também sorriu, embrenhando o rosto no pescoço de Rulan e deixando um beijinho ali. Ouvir as risadinhas dele foi um incentivo para continuar enchendo-o de cócegas cheias de carinho. Agora era estranho pensar que quase discutiu feio com ele minutos atrás, quase perdeu a chance de estar tão juntinho do garoto por quem estava apaixonado.

— Meu A-Jin é tão fofo. — Jingyi murmurou com a voz ainda abafada pelo abraço. — Tão adorável, tão doce... Muito melhor do que eu sonhei.

Se afastou para encher as mãos com as bochechas coradas de Rulan, limpando as lágrimas dele com os polegares.

— Mas precisa parar de chorar. Ou vou achar que está triste de me ver.

— Nunca! — Rulan garantiu. — Eu nunca estive tão feliz, JinJin... Você é tudo que eu mais desejei no meu aniversário, mas como eu não podia te pedir para os meus pais, eu pedi essa festa.

Confessar algo tão íntimo trouxe a timidez de volta ao rosto de Rulan, que queria se esconder do olhar atento de Jingyi a todo custo.

— Mas você não parece gostar da festa. Sempre que eu te olhava você estava triste, acuado. — Jingyi comentou, roçando seu nariz ao de Rulan num gesto que quase desmanchou o outro garoto. — E eu ainda fui tão rude com você o tempo todo... Por favor, me perdoe.

O novo abraço de Jingyi estava cheio de culpa e pedidos implícitos de perdão. Não havia argumentos para justificar a sua grosseria ao longo da noite, nem mesmo a sua implicância antiga com Rulan o fazia sentir menos culpado.

— Não tem importância. — Rulan garantiu, voltando a buscar o rosto de Jingyi para selar os lábios dele. — Eu também te devo desculpas por um monte de coisas que te fiz. Vamos esquecer isso, vamos esquecer tudo. Começar de novo. Você vai ficar comigo, não vai?

— É claro que vou. — Jingyi respondeu sem hesitar. — Eu esperei tanto por você, agora que eu te encontrei tudo vai ser diferente. Se você quiser eu posso te apresentar aos meus amigos, nós podemos nos sentar todos juntos no intervalo.

— E se eles não gostarem de mim?

O medo na voz de Rulan era claro. Jingyi procurou seus olhinhos outra vez para olhar dentro deles e se assegurar de que as suas palavras iriam ser compreendidas.

— Eles vão te amar se você mostrar quem é. E se mesmo assim eles não quiserem, azar o deles. Vamos ficar só eu e você. Você tem a mim agora, nunca mais vai se sentir sozinho.

E eles se beijaram de novo, e de novo e de novo, até Jingyi perder o ar e Rulan parar de chorar. Os soluços foram aos poucos se transformando em um monte de risadinhas que só provavam o quão pouco sóbrios os dois estavam, mesmo com toda a emoção da descoberta.

— Eu vou matar o Sizhui. — Jingyi murmurou em meio ao riso, ainda agarrado ao corpo quentinho de Rulan. — Ele poderia ter nos dito antes, a gente podia já estar junto há tanto tempo...

— Não mate ele! — Rulan tentou repreender, mas também não conseguia levar nada muito a sério. — Nós devemos isso a ele, mesmo com todo o atraso.

— Sabe o que eu acho? Que a gente devia voltar para a festa e ir encher a paciência dele.

Jingyi e Rulan descobriram muito rápido que perturbar Sizhui era um passatempo divertido que os dois tinham em comum. Jingyi se soltou dele com muito sacrifício para ir checar o estado do seu celular, que ainda estava caído uns metros à frente deles. Se abaixou meio aos tropeços para pegar o aparelho, sendo prontamente amparado por Rulan. Ele segurou seu braço, o trazendo de volta para pertinho depois que Jingyi pegou o celular e se colocou de pé.

— Ah, que droga... — Jingyi quase chorou quando viu a tela trincada do aparelho. — Vai ficar uma fortuna pra mandar arrumar.

— Não se preocupa com isso, não. — Rulan beijou seu rosto, se agarrando ainda mais ao braço que segurava. — Eu te dou outro novinho amanhã. Tem tantos desse aqui em casa.

Só então a ficha de Jingyi caiu.

Agora ele tinha um namorado podre de rico.

— A gente podia mesmo voltar pra festa. — Sugeriu, tentando dispersar a vergonha do presente absurdo que havia acabado de ganhar. — Eu quero dançar com você pelo resto da noite.

Num piscar de olhos, Rulan já estava com a boca colada na sua de novo em um beijo quase eufórico, sem tanto desajeito agora que ambos já conheciam os lábios um do outro.

— Eu acho que Sizhui vai querer ir pra casa. — Rulan lembrou. — E por mim a gente ia com ele.

Não que Jingyi fosse contra a ideia de irem embora, também já estava cansado e não tinha mais o que fazer naquela festa, já que Rulan não queria dançar. Mesmo assim achou melhor se certificar, garantir que ele não estava pensando em ir embora só por sua causa.

— Mas A-Jin, é a sua festa... Não vai querer ficar? Você mal aproveitou a noite.

Rulan negou com a cabeça, cheio de sorrisos enquanto eles caminhavam juntos até a porta.

— Tudo o que eu queria está aqui na minha frente. Eu não gosto tanto assim de festas, de qualquer jeito. Só quero ficar sozinho com você agora.

Jingyi lhe sorriu de volta, segurando sua mão.

— Vem, vamos achar o seu primo.

Os dois passaram com cuidado — ou tão sutilmente quanto possível na sua atual condição — pelo totem nas escadas e olharam em volta. Sizhui ainda estava sentado na sala das bebidas conversando com a mesma garota cabeçuda de antes, todo sorridente com a mão dela na sua. Rulan foi até ele com o braço passado ao redor dos ombros de Jingyi e o rosto quase travado de tanta vontade de rir.

— E aí, seu fingido do caralho. — Rulan cumprimentou. Jingyi cobriu a boca com uma das mãos para abafar a risada. — Já vamos embora?

A menina, independente de quem fosse, ficou surpresa por ver Jingyi e Rulan tão próximos. Mesmo irritado como estava com o seu novo apelido, Sizhui sorriu para eles.

— Vamos sim. — Ele concordou, deixando um último beijo na mão delicado da garota. — Eu te ligo.

Rulan e Jingyi se uniram numa zoação completamente imatura ao novo status de namorador de Sizhui, que só tentou relevar. Ele se levantou meio desajeitado da cadeira — talvez estivesse meio embriagado no fim das contas — e foi acompanhando os dois amigos até a saída.

— Fico feliz que tenham se acertado, mas você vai lá pra casa? — Sizhui perguntou ao primo enquanto Jingyi ia buscar seu casaco. — Se convidando assim, sem mais nem menos?

— O meu tio disso que eu posso ir dormir lá quando eu quiser. Eu até tenho um quarto na sua casa. — Rulan respondeu, todo convencido. — E além disso, JinJin vai dormir lá também, não vai? Eu quero ficar juntinho dele essa noite.

Jingyi chegou bem a tempo de ouvir essa última parte, abraçando a cintura de Rulan por trás e caminhando junto dele naquele ritmo esquisito de casal alcoolizado. Sizhui revirou os olhos com tanta força que Jingyi achou que eles fossem ficar ao contrário para sempre.

— Hm, não precisa ficar bravinho não, conquistador! — Jingyi agarrou um dos braços de Sizhui, vendo que Rulan se apressou para fazer o mesmo do outro lado. — "Ah, não, porque eu estava bêbado". — Imitou com a voz falseteada.

— "Na verdade eu não estava e só fiquei ganhando beijinhos porque estava empenhado no meu papel!" — Rulan também zombou. — "É óbvio que eu, o jovem monge, jamais iria gastar minha pureza com meninas e bebidas numa festa cheia de pessoas irresponsáveis."

— Parem de me encher, vocês dois! — Sizhui tentou se desvencilhar do aperto dos amigos, mas não conseguiu, ainda mais com eles rindo como duas gralhas nos seus ouvidos. — Vocês deveriam estar namorando em vez de enchendo o meu saco.

— Mas a gente quer saber o que foi e o que não foi real. — Jingyi cantarolou. — Conta pra gente. E aquele arrotão no jardim quando a gente foi comer?

— ... Talvez eu estivesse um pouco fora de mim naquela hora. — Sizhui admitiu, fazendo os amigos rirem ainda mais. — Argh, que vergonha. Eu preciso me desculpar com Zizhen.

— Hm, antes ou depois de se desculpar pelo beijinho que deu nele? — Jingyi provocou.

— Eu achei que ele quisesse um beijo! — Sizhui se defendeu. — Não abala minha moral dar um simples beijo na bochecha de um amigo, eu não sei porque você está fazendo tanto caso disso.

— Você nunca me deu um beijinho. — Jingyi reclamou com um falso bico nos lábios.

— Em mim também não! — Rulan balançou seu braço.

— Ah, não! — Sizhui se afastou bruscamente dos dois, que caíram na gargalhada quando perceberam que estavam sendo levados a sério. — Parem com isso agora!

Mas eles não pararam. Na verdade, Jingyi e Rulan desceram a rua correndo atrás de Sizhui o chamando de beijoqueiro. Isso na maior altura, a uma da manhã, com um monte de famílias dormindo em volta.

— Calma aí, a gente vai parar! — Rulan gritou, já cansado de correr e quase chegando à casa de Sizhui. — Espera a gente!

Sizhui parou de repente, mas não foi para esperar pelos outros dois insolentes. Ele apoiou um dos braços num poste no canto da calçada e apertou a barriga com o outro, parecendo meio verde.

— Ai, que merda... — Jingyi praguejou, correndo para socorrer o amigo.

Não que sair correndo depois de beber um monte e se empanturrar de porcaria fosse o mesmo que garantir que alguém iria passar mal, mas não ajudava, também. Ainda mais para um principiante, não era nenhuma surpresa que o estômago dele estivesse se revirando agora. Chegou bem a tempo de ampará-lo e vê-lo despejando o cardápio da festa no meio fio.

Deixou que Sizhui colocasse tudo para fora no pequeno gramado, afagando suas costas e tentando abafar o riso. Era maldade rir dele nesse estado, mas é que era engraçado demais estar presente no primeiro vexame da vida de Sizhui, isso porque nem era uma vergonha pública. Acabou por concluir que estar com ele numa festa era ficar constantemente em dúvida sobre se ele estava bêbado ou não, e tudo bem, também. Sizhui estava finalmente começando a viver e ao que tudo indicava, era ele quem assumiria o posto de namorador que Jingyi estava abandonando.

— Pronto, pronto.

Sizhui afastou Jingyi com um empurrão leve, só o bastante para ter algum espaço para respirar.

— Você ‘tá bem? — Rulan perguntou, preocupado. — Consegue andar?

— Eu ‘tô bem. — Sizhui disse, se apoiando no poste para se colocar de pé. — Muito melhor agora, na verdade. Foi a corrida. Vamos pra casa, por favor.

Sizhui parecia bem mais tranquilo e equilibrado depois de vomitar, e em poucos minutos os três chegaram em casa.

— Façam silêncio, por favor. O meu pai tem o sono leve e eu não quero que ele acorde.

O tio Wangji era um cara legal. Ele era todo caladão, na dele, mas era bonzinho e fazia umas comidas gostosas quando Jingyi estava em casa. Na verdade, Jingyi nunca entendeu como ele podia ser casado com alguém tão escandaloso como o tio Wei. Os dois tinham naturezas totalmente opostas em tudo e o sono não fugia à regra. Enquanto o menor barulho acordava o tio Wangji, o tio Wei continuaria dormindo mesmo se o mundo estivesse acabando ao seu redor.

Entraram de fininho e com os sapatos nas mãos, tentando não esbarrar em nada. Tentando, apenas, porque Jingyi bateu o quadril na mesa de jantar e Rulan ainda estava tentando não chorar depois de ter chutado o pé do sofá. Ele também teria esbarrando num ornamento pomposo se Jingyi não o tivesse segurado, todo destrambelhadinho.

A cada vez que Jingyi tocava nele, Rulan se arrepiava. Seu coração falhava uma batida, suas mãos suavam e ele se perguntou se Jingyi sentia a mesma coisa. A realização de que ele era o seu JinJin o pegava de surpresa de tempos em tempos e ele precisava processar tudo de novo, incapaz de enfiar a ideia de vez na cabeça. Isso porque aos poucos foi se tornando claro que não podia ser outra pessoa se não ele. Os trejeitos na sua fala, o carinho que usava para se dirigir a Rulan. Tudo em Jingyi gritava a sua personalidade, a mesma que morou por meio ano no seu celular.

O sorriso de Jingyi também fazia seu peito se agitar. Talvez agora fosse uma observação tendenciosa sua, mas Rulan começou a achar Jingyi tão bonito de uma hora pra outra. O rosto afiado dele, as sobrancelhas que ele com certeza fazia, o nariz fininho. E ele ainda havia tido a cara grossa de se chamar de "comum" ao descrever sua aparência. Será que ele não tinha noção do quanto era bonito?

Que o universo tivesse pena da sua alma. Estava tão apaixonado.

Chegaram ao quarto de Sizhui com algum custo, mas ele barrou a entrada dos dois. Por sorte não haviam quebrado nada na casa nem nos seus próprios corpos. O silêncio também indicava que o tio Wangji continuava dormindo.

— Esperem aqui. — Sizhui sussurrou, entrando e fechando a porta.

Sozinhos no corredor escuro, Jingyi e Rulan se entreolharam abafando risadinhas nas mãos. Tentaram ficar quietos enquanto ouviam Sizhui arrumar alguma coisa lá dentro, provavelmente um lugar para os dois passarem a noite. Rulan acabou com a distância entre eles, indo se achegar no abraço de Jingyi, que o recebeu imediatamente.

— Eu estou feliz. — Rulan disse num sussurro baixinho no ouvido de Jingyi, seguido por um beijo tímido no seu rosto. — Esse é o melhor aniversário de todos.

O tom da voz de Rulan fez um calafrio estranho sacudir o corpo de Jingyi. Podiam ver muito pouco um do outro no meio daquela escuridão, apenas o brilho dos olhinhos deslumbrados era nítidos pela luz do poste que entrava na casa, mas podiam sentir suas presenças lá com as mãos. Jingyi intensificou o aperto do seu abraço, querendo aproveitar a sensação de Rulan enchendo seu rosto e seu pescoço de selinhos menos acanhados.

Algo sobre os dois estarem agarrados no corredor da casa de Sizhui, conversando em sussurros para não acordar o pai dele, pareceu soar instigante para Rulan. O beijo atrevido que ele iniciou foi o mais desinibido que Jingyi viu dele a noite toda. A falta de luz lhe deu alguma coragem para se soltar, era a única explicação para ele ter avançado tão forte sobre Jingyi na parede do corredor.

Sizhui poderia aparecer a qualquer momento e Jingyi se sentia até meio culpado por estar beijando o primo dele na porta do seu quarto, mas é que estava tão gostosinho apertar as mãos no quadril de Rulan e deixá-lo arrancar seu fôlego. Passar aquela noite com o mínimo de decência no quarto de Sizhui ia ser um inferno

Como se lesse seus pensamentos, Sizhui abriu a porta. Num pulo Rulan foi parar do outro lado do corredor, corado e ofegante, tentando fugir do olhar julgador do primo e se manter de pé ao mesmo tempo. Sizhui só revirou os olhos, jogando a mochila de Jingyi no peito dele.

— O que é isso?! — Jingyi perguntou numa exclamação sussurrada. — Vai me colocar pra fora a essa hora?!

— É claro que não. — Sizhui respondeu. — Vocês dois vão dormir no quarto de hóspedes.

— Ah, qual é... Eu sempre fico no seu quarto. — Jingyi o olhou com indignação.

— Sim, mas agora você tem um namorado. Eu não quero ter que ouvir vocês dois se beijando. Agora vai, que eu vou pra cama. Boa noite!

Sizhui fechou a porta, cortando qualquer chance de Jingyi retrucar. Tateou o corredor em busca de Rulan, que ainda estava petrificado há alguns metros de distância.

— Estou aqui, JinJin. — Rulan o achou primeiro, pegando sua mão e o guiando até o quarto vago. — Eu sei onde é, eu ficava aqui às vezes quando era criança.

Os dois encontraram o quarto, entraram e fecharam a porta. Jingyi largou a mochila no chão e começou a procurar as luzes, mas sua coordenação estava ruim demais para permitir que se orientasse direito. Voltou a rir, tentando se policiar para não fazer barulho demais, mas sentiu um par de mãos finas o afastando dos interruptores quando finalmente conseguiu alcançá-los.

— Não acenda as luzes... — Rulan pediu num daqueles seus sussurros que faziam Jingyi recear. — Assim está bom.

Jingyi engoliu em seco. Parte da iluminação da rua entrava pelas janelas e não o deixava totalmente no escuro, mas ainda não estava sóbrio o suficiente para conseguir se situar com pouca visibilidade. Rulan o abraçou pelas costas e deixou um beijo em sua nuca, parecendo se divertir com o arrepio que causou.

Não sabia que Rulan poderia ser tão ousado no escuro. Mesmo Jingyi tinha seus problemas de timidez quando as coisas passavam de beijinhos castos o suficiente para serem compartilhados em público, mas com as luzes apagadas Rulan parecia não ligar para a vergonha. Quando se virou para ele e segurou seu rosto, Jingyi pode sentir a quentura ainda presente nas suas bochechas, mas também sentiu o atrevimento no sorriso aberto.

— A-Jin ainda não quer me ver? — Jingyi perguntou num sussurro, fingindo tristeza.

— Não é isso... — Rulan se refugiou outra vez no abraço de Jingyi, desmanchando com o selinho que recebeu dele. — Eu só estou com vergonha.

— Não precisa ficar assim comigo. Você já me contou coisas tão mais vergonhosas...

Para Jingyi, seis meses era muito tempo. Se sentiu muito à vontade com A-Jin desde o início, isso possibilitou que todo tipo de conversa acontecesse entre eles. O anonimato era uma ferramenta muito útil na hora de falar abertamente sobre coisas que o deixavam acanhado, A-Jin sabia segredos sobre Jingyi que ninguém mais sabia. Da mesma forma, o coração de Rulan era um livro aberto para o seu JinJin, e ele já havia contado sobre suas inseguranças com seu corpo.

— Eu sei. — Rulan admitiu num riso sem graça, apertando a camisa de Jingyi sobre os ombros dele. — Eu confio em você, mas... A gente pode deixar as coisas assim só dessa vez?

Jingyi não tinha como negar um pedido daqueles. Já não era de negar as coisas para seu A-Jin, tê-lo tão meigo nos seus braços só aumentava sua vontade de ceder aos desejos dele. Seu rosto estava perto o bastante para sentir a respiração levemente ansiosa de Rulan, suas mãos estavam ao redor dele e ouvia perfeitamente o som da sua voz. Era suficiente.

— Como meu A-Jin quiser. — Jingyi selou os lábios de Rulan, agraciado pelo suspiro aliviado que saiu deles. — Ainda é seu aniversário e hoje o dia é pra agradar você. O que quer que eu faça?

Rulan era um mimado. Jingyi não iria mais usar isso contra ele de forma pejorativa, muito pelo contrário. Era bem capaz de piorar ainda mais o problema fazendo todas as suas vontades. Arbitrário? Sim. Hipocrisia? Talvez um pouco. Não que Jingyi ligasse realmente.

— Me beija.

Procurou pela boca de Rulan, errando por pouco. Não soube dizer se foi a pouca luz ou o álcool que o fez beijar a pontinha do nariz dele, mas os dois riram baixinho em todo caso. Quando Jingyi encontrou o lugar certo e iniciou um novo beijo, dessa vez mais afoito e apressado, os dois tiveram a mesma ideia: trancar a porta e sair de perto dela. Certo que todos estavam dormindo e que aquele era o quarto mais afastado da casa, mas ainda assim a ideia de dar uns amassos com outras pessoas em casa soava quase desrespeitosa. Como também não conseguiriam parar, o mínimo que podiam fazer era serem impecavelmente discretos e os dois sabiam disso.

O clima no quarto mudou, mas a variação foi muito gradativa. Rulan só parou de empurrar Jingyi quando os dois atingiram a parede mais afastada do quarto, usando-a de apoio. Havia pressa, mas não desespero no beijo, que era meigo e instigante na mesma medida. O beijo de Jingyi foi lentamente se transformando em vários selos que contornaram a lateral do rosto de Rulan, experimentando e conhecendo seu gosto.

As mãos de Rulan estavam tremendo. Jingyi havia aprendido a identificar nuances nas palavras de A-Jin, mas ainda não estava familiarizado aos seus sinais físicos. Como ele não sabia fazer nada além de suspirar no seu abraço, Jingyi não sabia dizer se aquele tremor era vontade ou nervosismo. Com muita resignação, se afastou dele.

O rosto quente e ofegante de Rulan estranhou a falta de proximidade. Ele tentou puxar Jingyi de volta, mas foi impedido.

— JinJin... O que foi? O que há de errado?

Se Rulan soubesse o quanto Jingyi gostava de ser chamado de JinJin...

— A gente não tem que... Você sabe.

Jingyi nunca ia com sede demais ao pote com ninguém. Tinha pavor da ideia de pressionar as pessoas porque já havia se sentido pressionado antes, e a sensação era horrível além do que podia descrever. Por mais que o clima com Rulan houvesse surgido sozinho e as coisas estivessem se desenrolando naturalmente, tinha muito medo de assustá-lo, cobrar demais dele. Os dois haviam acabado de se encontrar depois de tanto tempo e A-Jin era um garoto tímido. Nem tanto aparentemente, mas mesmo assim Jingyi quis assegurar que não se tratava disso.

Rulan resmungou num gemido baixo, claramente frustrado, sem nenhuma vontade de ter aquela conversa agora. Se aproximou novamente de Jingyi e o trouxe de volta de qualquer jeito, enrolando as mãos na camisa dele e o puxando para si.

— Não tem que, eu sei. Mas se a gente quer fazer...

Comprovando o que dizia, Rulan roçou levemente seu quadril ao de Jingyi. Os dois já estavam excitados com tão pouco? Isso era emoção ou os hormônios? Talvez um pouco dos dois. Fato era que estar de frente para aquele lado tão desinibido de Rulan fez a timidez do próprio Jingyi aflorar, apesar da vontade.

— V-você prefere, hm... Tipo, ir pra cama?

Se sentiu ridículo por ter gaguejado, mais ainda quando ouviu a risadinha fina de Rulan em seus ouvidos.

— Não, JinJin. Nós estamos suados e com cheiro de bebida. A gente pode só ficar assim, aqui mesmo. — Rulan sugeriu, se roçando de propósito no volume da bermuda de Jingyi. — Eu não me importo.

Jingyi correspondeu ao movimento involuntariamente, não querendo perder a sensação. Enrolou um dos braços na cintura de Rulan e parou de resistir aos seu charme, voltando a cobri-lo de atenção. Assim os dois só pareciam dançar numa pista só deles, sem nenhuma música além dos seus próprios suspiros. Era lento e gostoso, espontâneo demais para soar errado.

— A gente pode só ficar assim... — Jingyi começou, mal conseguindo escolher as palavras adequadamente com Rulan tão ávido pela sua boca. — Ou a gente pode ir pro chuveiro.

Nem Jingyi sabia dizer de onde havia tirado coragem para fazer uma sugestão daquelas. Ele era meio sem-vergonha, mas não tanto assim.

— JinJin... — A voz de Rulan oscilou um pouco, preocupando Jingyi. – Eu quero muito, mas... As luzes. Não dá pra tomar banho no escuro.

De fato, não dava. Era até meio perigoso. Jingyi sabia que aquilo era só as inseguranças de Rulan falando e por mais que quisesse muito acabar com todas elas, vê-lo confortável consigo mesmo e ao seu redor, sabia que ainda era um pouco cedo para isso. E também não pôde se impedir de achar aquela timidez toda uma gracinha.

— São só as luzes que te incomodam? — Jingyi perguntou, recebendo uma confirmação baixinha. — Promete?

Rulan voltou a ficar confortável com mais alguns poucos beijos. A atenção de Jingyi tinha um efeito muito direto sobre como se sentia, era quase como se pudesse estar tão à vontade com ele na vida real como ficava na internet. E por que não estaria, no fim das contas? Jingyi e JinJin, eles eram a mesma pessoa.

A ficha de Jingyi caiu bem mais cedo, mas a verdade só pareceu entrar por inteiro na cabeça de Rulan nessa hora.

— E se eu der um jeito? — Jingyi voltou a perguntar. — Da gente ver, mas sem ver?

— ... E como você vai fazer isso?

A voz de Rulan estava instável pela sua recente epifania, mas ele prestava atenção no que estava dizendo. Só estava, mais uma vez, emocionado, embriagado e excitado demais para que sua mente funcionasse em plena capacidade.

— Você confia em mim? — Jingyi rebateu a pergunta.

— Com certeza.

Rulan foi rápido em responder. Jingyi sorriu. Com certeza havia reparado a mudança repentina no jeitinho dele, mas não interpretou isso como um mal sinal. Deixou um último beijo na bochecha quentinha e se afastou com alguns passos.

— Vai na frente e me espere. Eu já vou.

Rulan endireitou sua postura, tentando se lembrar de como deveria usar as pernas para caminhar. Compartilhou um último beijo acanhado com Jingyi antes de ir de vez para o banheiro da suíte, deixando a porta apenas encostada.

Sozinho por um momento, Jingyi sentia que iria explodir de empolgação e ansiedade e excitação e amor. Estava tão deslumbrado pela ideia de estar com A-Jin nos seus braços, e dessa vez na vida real, que se deixou surtar sozinho por um momento antes de respirar fundo, se recompor e pensar no que fazer. Antes de tudo, tirou tudo o que estava nos seus bolsos e guardou na sua mochila, menos o celular quebrado que foi deixado em cima da cama. Também guardou os brincos e começou a se despir, dobrando e guardando as roupas sujas sobre a cômoda. Estava tão nervoso que até se sentia um pouco mais sóbrio, pelo menos o suficiente para fazer as coisas direito.

Não era hora de ferrar com tudo.

Quando ouviu o barulho do chuveiro sendo ligado, pegou o celular sobre a cama e entrou pela porta entreaberta.

Tateou o armário da pia, encontrando sem muita dificuldade. Se ajoelhou e colocou o celular atrás dele, com o flash virado para baixo, só então ligando a lanterna. A luz que iluminava o banheiro era baixa e não saía do chão, sendo suficiente para evitar acidentes sem permitir que eles vissem muito um do outro. Jingyi mesmo só conseguia enxergar a armação do box de vidro e uma silhueta muito pouco nítida, mas visível o suficiente para encher seus olhos.

Rulan estava de costas para Jingyi, com os braços enrolados ao redor do corpo e os cabelos soltos. Jingyi nunca entendeu muito qual era o propósito de Rulan manter cabelos tão longos, até implicou com isso algumas vezes, mas agora só se sentia o maior otário do mundo. Ainda que fosse necessário muito esforço para identificar, Jingyi podia ver um pouco dos fios escuros caídos sobre os ombros e costas de Rulan, chegando até a altura dos seus quadris. Só faltava babar diante da visão.

Se aproximou com cautela e entrou no box. Rulan nem o notou chegando e se o fez, não demonstrou.

— Está com os olhos fechados? — Perguntou num sussurro um pouco menos comedido. Dentro do banheiro, o som era abafado e mais discreto.

— Estou... — Rulan admitiu, todo acanhado, fazendo Jingyi rir baixinho.

Jingyi conferiu a temperatura da água e viu que estava agradavelmente morna. Com cuidado para não assustá-lo, colocou ambas as mãos na cintura nua de Rulan, agora podendo sentir sem nenhum impedimento o arrepio que o seu toque causava nele. O guiou lentamente para debaixo do jato do chuveiro e o choque da água com a pele dele o fez soltar uma pequena exclamação surpresa.

— Abra os olhos, A-Jin. Não há nada tão visível assim, eu prometo.

Apesar do receio, a voz de Jingyi era muito confiável para que Rulan duvidasse dele. Suspirou aliviado quando abriu os olhos e viu que ele tinha razão, a iluminação era apenas suficiente e a única coisa nítida entre eles eram os seus dedos dos pés.

Rulan sentiu seu rosto sorrindo involuntariamente. Seus olhos também se encheram sem que tivesse controle. Como se já não estivesse suficientemente sensível por ter bebido e encontrado o seu primeiro amor na mesma noite, Jingyi também piorava tudo sendo o garoto mais fofo do mundo. Podia parecer pouco, mas aos olhos de Rulan, ter alguém que se dispunha a pensar nele e encontrar formas de se adaptar às suas inseguranças e limitações era consideração demais

— Você é exatamente o que eu sonhei, Jingyi.

Até então, Rulan não havia chamado Jingyi pelo nome nem uma vez. Não que Jingyi estivesse reclamado, havia começado como JinJin e iria adotar o apelido fofo para sempre no que dependesse da sua vontade. Mas é que de alguma forma, ouvir o seu nome na voz emocionada de Rulan consolidou a coisa toda. Mais uma boa parte do álcool pareceu sair da sua cabeça num piscar de olhos e agora Jingyi estava totalmente na mão daquele garoto.

— Você também é meu sonho, Rulan.

Jingyi também chamou por ele, especificamente por ele. Trouxe seu corpo para pertinho e ergueu seu queixo com uma das mãos. Assim como foi no corredor, não podia ver nada além do brilho dos olhinhos de Rulan, refletido pela luz quase nula da janela minúscula do banheiro.

Eles se beijaram outra vez. O conforto da água quente sobre suas cabeças foi um convite para que relaxassem a tensão da noite e dos últimos meses. Envoltos pela cortina de vapor do chuveiro e pela própria bolha de sentimentos, Rulan se sentia feliz como nunca antes e Jingyi estava realizado por finalmente estar apaixonado. A atmosfera de cuidado não se dissipou nem mesmo quando o beijo avançou e se tornou mais urgente. Havia uma inocência quase boba em cada riso e cada suspiro, talvez fosse a sensação gostosa do primeiro amor.

A confiança de Rulan foi retornando aos poucos e ele se deixou ousar mais nos toques. Com passos lentos ele foi empurrando Jingyi até a parede de ladrilhos atrás do chuveiro, se impondo sobre ele de maneira decidida, mas sem agressividade. Seus quadris ainda se moviam como se dançassem juntos, mas isso também deixou de ser suficiente.

— Eu quero tocar você. — Rulan admitiu contra a boca de Jingyi, que sentiu um forte solavanco com suas palavras. — Eu posso?

— Sim. — Jingyi respondeu ansiosamente e um pouco rápido demais, provocando risos nervosos nos dois. — Eu também quero tocar você.

— Por favor.

Apenas ao tocá-la, Jingyi reparou em como a mão de Rulan era mais delicada que a sua. Ele não deveria precisar fazer nenhum tipo de esforço, então seus dedos eram longos e macios, sem uma imperfeição. Acariciou a mão fina e depositou um longo beijo sobre ela.

As mãos unidas dos dois desceram lentamente entre seus corpos, envolvendo ambos juntos. Um suspiro longo foi compartilhado entre eles. Jingyi colou sua testa a de Rulan, querendo estar tão perto quanto possível enquanto movia sua mão junto a dele.

Não havia pressa, mas os beijos eram cada vez mais sôfregos e difíceis de manter. O coração de Jingyi batia tão forte que o atrapalhava a respirar. Sua mão vaga descansava na nuca de Rulan, o impedindo de se afastar demais. Os gemidos discretos dele se misturavam aos seus no que mais parecia ser uma tortura. Eles tentavam ser mais baixos que o som do chuveiro e conseguiam a custo de muito esforço, mas era uma pena que não pudesse ouvir Rulan chamando seu nome direito.

Era difícil que os dois movessem ambas as mãos ao mesmo tempo, então Jingyi permitiu que Rulan fizesse o trabalho sozinho. Com as suas agora livres, se focou em enrolar os dedos nos cabelos longos, afastando-os dos seus ombros para que pudesse cobrir sua pele com selos quentes. O outro braço o mantinha perto com um aperto firme, incentivando Rulan a ir mais depressa. Beijava tudo o que podia com muito cuidado, empenhado em não deixar a excitação se sobrepor ao carinho. A voz de Rulan era tão meiga, alternava entre chamar baixinho por Jingyi e pelo seu JinJin daquela forma manhosa que acabava com seu juízo.

Jingyi assumiu os movimentos outra vez para que Rulan descansasse, sendo bem mais certeiro no que fazia. Podia não ser a pessoa mais experiente do mundo, mas Rulan era desajeitado demais para já ter estado com muitos garotos antes. O coração de Jingyi se encheu com a chance de aquela ser uma primeira vez para ele e isso só dobrou seu empenho em tornar a experiência algo agradável.

Quando liberado do toque, Rulan só pareceu aliviado por poder segurar o rosto de Jingyi com ambas as mãos e atacar sua boca num beijo ainda mais apressado. Seu rosto inteiro estava franzido e ele abafava lamúrias nos lábios de Jingyi, tão próximo quanto ele. Jingyi poderia prolongar as coisas, mas não naquela noite. Estava começando a se sentir cansado de pé no chuveiro e sabia Rulan também precisava de descanso. Quando o orgasmo chegou Jingyi o deixou vir, mas só parou de se mover quando sentiu Rulan cravando as unhas curtas nos seus ombros, abafando o gemido agudo ao se liberar entre eles.

O ápice relaxou os braços tensionados de Jingyi e ele inspirou longamente, aliviado e satisfeito como não ficava há muito tempo. Soltou os membros dos dois, lavando rapidamente a mão no chuveiro e abraçando o corpo igualmente relaxado de Rulan. Beijou a testa dele, sentindo seu coração se acalmando gradativamente. A sensação que ficou era de pura doçura, sem embriaguez ou desejo para nublar seus sentidos. Agora Jingyi só queria cair na cama e dormir.

Por mais que estivesse disposto a outra leva de beijinhos no chuveiro, os dois se lavaram rapidamente depois disso. Não queriam continuar gastando a água da casa de Sizhui no risco de acordar a ele ou ao tio Wangji. Jingyi saiu primeiro para que Rulan tivesse alguma privacidade e terminasse de lavar os cabelos, por mais doloroso que fosse deixá-lo sozinho agora. Fechou a porta para garantir que ele não se sentiria desconfortável e prometeu e estaria de volta em instantes.

Sozinho outra vez, Jingyi teve mais um surto de empolgação no quarto com a toalha enrolada na cintura. Ainda estava descrente do quão bem aquela noite pavorosa havia terminado, agora que estava limpinho e todo relaxado, poderia embalar Rulan nos seus braços e dizer o quanto ele era lindinho até que ele dormisse.

Acendeu a luz do quarto para procurar suas coisas e se olhou no espelho sobre a cama. Estava tão ridículo com o rosto corado e sorridente que mal se reconhecia. Tirou o pijama que havia trago e estava a meio caminho de vesti-lo quando percebeu que Rulan não tinha nada para se cobrir.

E foi assim que Jingyi saiu pela casa de Sizhui: todo molhado, de toalha e batendo o queixo de frio. Entrou sorrateiramente no quarto do amigo, vendo-o roncando sobre a cama com o rosto limpo e uma roupa confortável. Pelo menos ele havia tido a decência de tomar um banho antes de colapsar, se sentiu orgulhoso mais uma vez. Afanou um conjunto leve de dormir no armário dele e saiu no mesmo pé que entrou.

Torceu para que os tios não acordassem no meio da noite também, porque ainda passou na cozinha para pegar duas garrafas de água. Debochando na cara do perigo, sim, mas só porque Rulan poderia sentir sede durante a noite e não queria que ele perdesse seu soninho precioso só pra pegar água. Entrou no quarto às pressas, fechando a porta sem trancá-la dessa vez. Encontrou Rulan sobre a cama, usando o pijama que havia deixado para ele e terminando de pentear os cabelos.

— Eu já volto! — Sussurrou entrando no banheiro antes que cedesse aos charmes dele e esquecesse de se vestir.

Jingyi se vestiu, pendurou as toalhas deles e catou o celular destroçado do chão, se sentindo um gênio pela ideia. Sua vontade de jogá-lo fora pareceu até ingrata diante do momento tão gostosinho que havia tido por causa dele. Quando saiu, Rulan ainda estava sentado sobre a cama, todo acanhado, terminando de ajeitar os fios úmidos de seu cabelo. Jingyi se acomodou timidamente ao seu lado, com o rosto apoiado nas mãos e os olhos brilhando.

— A-Jin tem o cabelo tão lindo. — Murmurou abobado, fazendo uma risada feliz escapar dos lábios de Rulan.

— Pode ser A-Ling? — Rulan pediu. — Acho que eu prefiro assim.

— A-Ling será, então. Mas eu ainda gosto muito de JinJin... A gente pode manter esse? Por favor?

Os dois falavam baixinho, mas o riso de Rulan saiu um pouco mais alto que ele gostaria. Correu para tapar os lábios depressa, recebendo um beijinho desajeitado na testa enquanto concordava.

Jingyi tirou o pente das mãos de Rulan depois que ele terminou de usar. Colocou o objeto sobre a cômoda e apagou as luzes de novo, indo se achegar na cama após colocar ambas as garrafas na mesa de cabeceira ao alcance as mãos deles.

O outro lado da cama também afundou e Jingyi puxou os cobertores grossos sobre eles. Podia até ser verão, mas depois de tanto tempo debaixo d'água quente era inevitável sentir um pouco de frio. Os dois estavam deitados lado a lado, mas só suas mãos se tocavam. Ainda havia muita timidez no ar depois do que houve no chuveiro, mesmo que ambos estivessem a ponto de explodir de felicidade.

Ser jovem era tão complicado, mas ao mesmo tempo tão gostoso.

— Eu usei do seu perfume. — Rulan sussurrou, cortando o silêncio. — Peguei na sua bolsa. Espero que não se importe.

— É claro que não. — Jingyi assegurou, vencendo o próprio acanhamento e indo se aconchegar junto de Rulan, enfiando o nariz no pescoço dele para sentir seu cheiro lá.

Um monte de risadinhas emergiu do edredom por causa das cócegas, mas também porque havia uma alegria muito simples ali, pronta para dormir junto deles.

— Ainda não acredito que estou te vendo usar o meu pijama e o meu perfume. Justo você, de todas as pessoas. — Jingyi comentou, já devidamente abraçado a Rulan num nível de conforto que jamais havia experimentado.

— E pensar que há horas atrás eu não queria nem te ver... — Rulan também comentou. — Isso está mesmo acontecendo? Você é mesmo o meu JinJin, e está mesmo aqui cuidando tão bem de mim?

— Parece um sonho, mas é real. — Jingyi respondeu após deixar um beijo estalado na bochecha de Rulan. — E mesmo que fosse, eu mataria quem tentasse me acordar.

Rulan roçou seu nariz ao de Jingyi em meio ao riso baixinho e emotivo.

— Acho que eu ainda estou meio bêbado...

A declaração de Rulan foi bruscamente interrompida por ele mesmo, que começou a fungar. Jingyi intensificou o seu abraço, preocupado com a atitude repentina do outro. Tateou no escuro até encontrar o rosto aflito do seu A-Ling, agora assustado e com os olhos rasos de novo.

— O que foi, meu amor?

— JinJin, e se eu não me lembrar de você?! — Rulan perguntou, segurando o rosto se Jingyi bem pertinho, quase esmagando suas bochechas. — E se eu acordar e não conseguir lembrar de hoje, de nós dois?

Jingyi caiu na risada, retirando delicadamente as mãos de Rulan do seu rosto. Ele não ficou nada feliz por estar sendo o alvo da risada de Jingyi e se virou contra ele na cama, cruzando os braços de forma muito madura. Havia um bico grande entre suas bochechas inchadas e os olhos dele estavam começando a transbordar de novo.

Mimado.

Mimado e chorão.

Mimado e chorão e bonitinho demais.

— Não faz assim, A-Ling... Vamos. Olhe pra mim. — Jingyi pediu entre o riso que não conseguia conter. — Vem cá deitar comigo, vem?

— Eu não! Você está caçoando de mim!

— Não estou, eu prometo...

Jingyi começou a dobrá-lo com puxões levinhos em seu braço, derretendo sua marra sem demora e o trazendo para se deitar nos seus braços de novo.

— Desculpa, A-Ling. Eu não quis rir de você, eu juro. Eu só acho difícil você se esquecer de mim durante a noite.

Houve um momentinho de silêncio e Rulan suspirou, terminando de desfazer sua marra por não ter mais condições de ficar sem Jingyi. Se aconchegou todo a ele de novo, passando uma das mãos rudemente pelo rosto.

— Como você pode ter tanta certeza?

Jingyi selou o que restou do bico nos seus lábios.

— Porque amanhã, quando você acordar, eu vou ser o primeiro rosto que você vai ver. E quando você estranhar a falta das mensagens de JinJin no seu celular, você vai se lembrar que é por minha causa. Vai chegar um dia em que você vai estar tão acostumado a me ter perto de você que você vai querer me esquecer um pouco, mas não vai conseguir.

Rulan acabou rindo baixinho.

— Agora é você quem soa um metido.

— Que seja. Eu sou um metido, então, mas não estou falando nenhuma mentira. Você vai lembrar de mim, quando for assoprar suas velas mais tarde você vai pedir por mim, e vai se perguntar o tempo todo onde está o seu JinJin, que ainda não chegou pra te pegar no colo. — Os afagos de Jingyi encheram Rulan de cócegas outra vez e ele voltou a rir. — E sabe como eu sei de todas essas coisas? Porque eu vou estar do mesmo jeitinho.

Rulan estava a meio caminho de beijar Jingyi novamente, todo emocionado com as palavras bobas e estranhamente convincentes dele, mas um bocejo o impediu de prosseguir. Estava cansado. Além da festa em si, os dias que passou no planejamento dela o haviam deixado esgotado. E Jingyi era tão confortável, o carinho dele era tão convidativo. Rulan fechou os olhos e se aconchegou ao lado dele, pronto pra dormir.

— Jingyi.

— Hm?

— Eu estou feliz que seja você.

Rulan apagou antes de poder ouvir uma resposta.

Não se lembrava da última vez em que estivera tão cansado, talvez depois da única semana esportiva de que havia participado na escola, mas isso já fazia muito tempo. Era uma pessoa agitada demais para adormecer e sustentar o sono, mas conseguiu dormir bem naquela noite. Talvez pelo cansaço físico e emocional, talvez porque era pego por afagos e palavras doces sempre que ameaçava acordar.

Jingyi seria um ótimo namorado se continuasse assim, lhe fazendo cafuné e se atentando às suas necessidades. Ele era tão quentinho, também. Talvez Rulan só estivesse todo deslumbrado por essa parte porque nunca havia dormido com ninguém além dos pais e do primo, e gostava de se sentir assistido. Um dos maiores medos de Rulan, inclusive, era arranjar alguém que não fosse tão repulsivamente pegajoso quanto ele.

Mas Jingyi era. Em tudo o que ele fazia, ele tinha a medida certa para Rulan, havia sido feito pra ele. Sonhou com o sorriso dele, com as vezes em que fora babaca com ele na escola e em como estava contente em poder fazer diferente. Na única vez em que realmente despertou durante a noite, pedindo um pouco de água por causa da ressaca eminente, mal abriu os olhos e a garrafa já estava em sua boca. Tão atencioso, seu JinJin era. E agora ele tinha um rosto bonito, braços aconchegantes e uma voz gentil que não parava de lhe dizer o quanto era querido para ele.

Rulan estava no céu. Quando acordou no dia seguinte, já dando de cara com os olhos apertadinhos de sono de Jingyi o encarando como se fosse inteiro feito de ouro, teve a certeza de que era ele. Toda a espera angustiante havia valido a pena e estava tão feliz que não se importava de pagar língua pelo resto da vida.

Jingyi havia mencionado algo sobre ficar junto dele na escola. Rulan só queria ver a cara das pessoas. Ele e Jingyi nunca haviam brigado de verdade e nem discutiam em público, a inimizade dos dois era bem velada, mas era conhecida. Agora eles estavam juntos e todos iriam saber no que dependesse de Rulan. Não queria mais ninguém em cima Jingyi e se ele fosse mesmo querer passar o intervalo por perto, iria fazer valer a pena. Compraria a cantina toda se ele quisesse, todos os dias, até ele enjoar.

— E aí, se lembra de mim? — Jingyi brincou, sem conseguir conter o riso ridículo dentro da boca. — Ou ainda me odeia e vai tentar me matar com o travesseiro?

Rulan queria rir da piada, mas àquela hora da manhã seu coração ainda estava muito mole para que achasse graça nas coisas. Retornou o sorriso de Jingyi sem querer, mesmo sentindo um pouco de vergonha dele após ter quase surtado na cama na noite anterior.

— Eu me lembro. — Sussurrou, coçando os olhos. — E eu não te odeio, eu gosto muito de você.

— Hm, é mesmo? — A voz de Jingyi oscilava entre a diversão e aquela sua felicidade explosiva. — Eu duvido. Como você me garante que não vai me sufocar assim que eu fechar os olhos?

— Se eu quisesse te sufocar, eu já teria feito isso. E não é como se você tivesse ficado acordado a noite toda.

Jingyi bocejou longamente, se afastando só o suficiente para se espreguiçar.

— Bem, não a noite toda, mas uma boa parte dela.

— ... O que houve? — Perguntou, levemente preocupado pelo cansaço visível no rosto de JinJin.

Jingyi tornou a se virar na direção dele na cama.

— Não se preocupa, não. Eu só não conseguia parar de te olhar. E você tem o sono agitado, né? Teria se revirado a noite toda se eu não tivesse ficado te colocando pra dormir.

— Por que você fez isso...? — Rulan soava comovido agora.

— Ah, ainda é seu aniversário. Imaginei que quisesse estar descansado pra passar o dia com a sua família.

Emotivo e instável como era, Rulan quis bater em Jingyi só para beijar todos os seus soquinhos depois. Como ele conseguia, como se atrevia a ser tão amável? Engatinhou para cima dele com mais rapidez do que deveria levando em conta que havia acabado de acordar. O plano era afogar Jingyi com um monte de beijinhos de bom-dia, mas Rulan acabou deitado sobre o peito dele, com a testa enrugada e um resmungo longo pela dor de cabeça.

— ‘Tá de ressaca, né, meu amor? — Jingyi riu.

— Eu ‘tô...

— Mas a gente deveria levantar e fazer alguma coisa da vida.

— Não quero...

— Vai querer desperdiçar o seu dia especial na cama comigo?

— Eu vou...

Aquele monte de frases curtas e com tom de pirraça deixaram Jingyi tocado, em vez de irritado. Passou os braços pelo corpo sonolento sobre o seu, olhando para o teto e tentando acalmar o leve tremor em seu coração, ciente de que Rulan o estava ouvindo.

— Você gosta de mim? — Perguntou, cheio de expectativas.

— Eu gosto.

— Tanto quanto eu gosto de você?

— Mais.

— E não quer ficar com mais ninguém?

— Não quero.

Rulan se ergueu lentamente do abraço confortável de Jingyi só para olhá-lo nos olhos, transbordando a sinceridade de suas palavras. Jingyi se impressionou mais uma vez com o quão bonito A-Ling podia ser, já se sentia incapaz de tirar as mãos dele. Só queria passar o resto do dia olhando para ele, enchendo seu rosto de carinhos e dizendo o quanto gostava dele.

— Quer namorar comigo?

— Achei que não fosse mais perguntar...

Rulan estava a meio caminho de confirmar a sua resposta com um beijo quando a porta foi aberta. Se assustou e caiu rolando do lado vazio da cama, com os olhos arregalados de susto e o coração acelerado. Não queria que seus tios lhe vissem em cima de Jingyi, mesmo que os dois não estivessem fazendo nada demais.

Por sorte era só Sizhui, que coçava os olhos de sono e os olhava julgando só um pouquinho.

— Você não sabe bater, não? — Jingyi perguntou exasperado, já se virando para checar se Rulan estava bem. – ‘Tá tudo bem, meu amor? Machucou?

Amor?! — Sizhui questionou se fazendo enojado, entrando e fechando a porta. — É sério que já está assim?

— Está bem pior se você quer saber. Não me obrigue a contar os detalhes. — Rulan respondeu, cínico.

Sizhui choramingou e se jogou na cama entre os dois amigos, levando as mãos à cabeça.

— Jingyi... Como você faz pra curar ressaca? — Ele perguntou.

— Bebe bastante água, toma um comprimido pra dor... E faça uma refeição bem gordurosa. Isso deve ser difícil aqui na sua casa, eu sugiro você pedir um lanche.

Sizhui confirmou com a cabeça. Seus olhos ainda estavam fechados e ele puxou as cobertas, se enrolando nelas.

— Hm, agora vocês estão juntos. Estou feliz que aquela tortura finalmente acabou, agora vocês vão parar de me perturbar.

Duvidar da capacidade dos amigos de encher sua paciência foi um erro que Sizhui não se viu cometendo. Quando percebeu, já estava sendo abraçado de ambos os lados pelo primo e pelo melhor amigo, que o prendiam numa bagunça de braços e pernas em meio a um monte de risadinhas insolentes.

— Você que se engana de pensar isso. — Jingyi cantarolou.

— Agora nós vamos te perturbar duas vezes mais. — Rulan completou.

— Ah, parem com isso! — Sizhui tentou se desvencilhar dos dois. — Não façam eu me arrepender de ter juntado vocês!

— Não se arrependa, não. — Rulan falou com um pouco mais de seriedade. — Se não fosse por você, não teria JinJin no meu aniversário. Você me deu o melhor presente que eu já ganhei. Obrigado, Sizhui.

— É, muito obrigado, Sizhui. — Jingyi concordou.

Como se houvessem combinado, os dois deixaram um beijo em cada bochecha de Sizhui, que corou, mas não se irritou verdadeiramente com o gesto.

— Não tem de quê... Agora, vocês me larguem porque eu tenho mais o que fazer e uma aspirina pra tomar!

— Não! — Os dois disseram juntos, voltando a amassar Sizhui na cama só pelo prazer de ouvi-lo reclamar.

Por mais que a sensação de ser enganado não fosse nada agradável, Jingyi estava tão contente que iria relevar tudo. Não existiam segredos entre ele e Sizhui, mas podia entender que aquele havia sido um segredo do bem, por assim dizer. Rulan não parecia nada incomodado também, então presumiu que estava tudo bem. Enquanto ainda se amassavam num abraço triplo que Sizhui simplesmente desistiu de negar, uma vibração baixa começou a ecoar pelo quarto. Olhando rapidamente para a mesa de cabeceira, Rulan percebeu que era seu celular. Ele pegou o aparelho e deu uma olhada na tela com um suspiro baixo.

— É o meu pai. Vou ali fora atender, me esperem.

Ele se levantou, indo até a pequena varanda do quarto. Fechou a porta de vidro atrás de si para ter alguma privacidade e Sizhui respirou fundo, parecendo reganhar a coragem necessária para se virar para Jingyi com um olhar um pouco mais sério.

— E então. Está sendo como você esperava?

Jingyi sorriu, rolando para longe dele na cama.

— Está sendo bem melhor. — Suspirou, todo apaixonado. — A-Ling é tão fofo, tão doce... Eu não sei como nunca reparei nele antes. E ele é tão bonito! E você tinha que ver como ele fica todo manhoso depois de...

— Tá, me poupa das coisas mais íntimas, por favor. — Sizhui o interrompeu, se sentando adequadamente na cama e trazendo Jingyi pra fazer o mesmo. — Olha, eu tenho que falar algumas coisas com você agora que Rulan é seu namorado. Eu quero que me ouça com atenção.

Jingyi começou a rir.

— Ah, fala sério? Nós vamos ter "a conversa"? Não é o pai dele que deveria estar me fazendo exigências?

Sizhui revirou os olhos, coçando a testa nervosamente e tentando arrumar paciência pra aguentar o amigo num momento tão constrangedor.

— Me acompanha aqui, Jingyi. Me leva a sério só uma vez, por favor? — Com algum custo Jingyi acabou concordando, endireitando sua postura e lhe dando alguma atenção. — Olha só, Rulan nunca teve um namorado na vida, nem uma namorada, nem nada. Na verdade, foi uma surpresa pra mim descobrir que ele gosta de pessoas. A questão é que eu acho que ele não tem preparação nenhuma para estar num relacionamento.

O sorriso de Jingyi se desfez na hora.

— O que você quer dizer com isso? Que o meu namoro ‘tá fadado ao fracasso, mesmo tendo acabado de começar?

— Quero dizer que agora já era. — Sizhui deu de ombros. — E eu acho que você pode fazer bem pra ele nesse sentido, mas eu o conheço melhor do que você. Sei que independente da natureza do relacionamento, estar com ele vai ser um desafio...

Sizhui deu uma boa olhada em Jingyi, talvez para ver se ele estava mesmo prestando atenção. Se surpreendeu com o comprometimento instantâneo dele, aparentemente alguém queria mesmo levar aquele rolo para a frente.

— Estou ouvindo.

— Eu sei que quando quer, ele é uma gracinha. Mas Rulan também sabe ser um desgraçado. Se mimar ele demais, você vai estragar ele de fora pra dentro.

— Mas eu não estou mimando ele.

Sizhui o olhou com uma expressão muito pouco convencida.

— Talvez eu esteja... — Jingyi admitiu. — Mas não demais, eu juro.

— Eu não faria isso se eu fosse você. Agora eu não vou te encher muito o saco com isso porque vocês acabaram de se encontrar e tal, mas se você continuar dizendo "sim" para tudo o que ele quiser e colocando a vontade dele acima da sua, quando você precisar dizer "não", ele não vai dar a mínima.

Jingyi teve que reconhecer que Sizhui tinha razão. O fato de Rulan ser um mimado era o que mais detestava sobre ele antes, continuar alimentando os maus hábitos do seu novo namorado só porque ele era adorável podia transformá-lo num monstrinho.

— Entenda, Rulan cresceu numa redoma. — Sizhui continuou. — Ele sempre teve tudo o que quis, menos as pessoas. Essa é uma das razões pelas quais ele não tem tantos amigos, como todo mundo se aproxima dele por interesse, ele começou a fazer o mesmo. Isso quer dizer que às vezes ele tem uma visão de posse sobre as pessoas de quem ele gosta... Isso vai ser uma dor de cabeça pra você e eu quero saber se está disposto a lidar com ela.

Jingyi parecia um pouco receoso agora. Aquele monte de informações negativas jogadas no seu colo assim, sem mais nem menos, era meio assustador. Mas ele desviou os olhos rapidamente para a varanda de fora e deu uma olhada em Rulan, que ria enquanto falava ao telefone. Seu coração tremeu quando ele percebeu que era observado e acenou na sua direção.

— Eu estou. — Jingyi acabou dizendo com firmeza. — Sei que posso ajudar ele com isso.

— Não é sua obrigação. — Sizhui relembrou. — Não adianta assumir isso agora e depois largar de mão.

— Mas eu quero. Vai funcionar. — Garantiu. — Ele tem os defeitos dele, mas sei que não é uma pessoa ruim.

— Eu sei também... E eu não quero que ache que estou te dizendo tudo isso com intenção de assustar você nem nada, eu só não quero que vocês se machuquem. Rulan é complicado, mas você também é, e vocês são muito diferentes. Mesmo que já se conheçam pela internet e tudo isso, na vida real é outra coisa. Demanda muito mais esforço e paciência.

— Você parece mais assustado que eu.

Jingyi acusou, dando um soquinho amigável no ombro de Sizhui, mas ele não parecia exatamente tranquilo. Suspirou tristemente.

— Você se arrependeu, não foi?

— Não. De verdade. — Sizhui confessou. — Eu só estou preocupado. Quer dizer, eu não espero que vocês entendam o quanto essa operação cupido toda foi complicada pra mim. Foi uma decisão muito difícil de tomar, vocês são meus melhores amigos. Se vocês brigarem e terminaram se odiando, eu não vou poder tomar lados. Eu posso acabar perdendo vocês dois.

Jingyi realmente não havia pensado nisso. Sizhui era um bom garoto, tinha um coração de ouro e muito mais maturidade que todos os meninos da idade deles que Jingyi conhecia. Ele também era muito sensível e responsável com seus amigos mais próximos, essas coisas que ele dizia para tomar conta deles faziam Jingyi ter a certeza de que tinha o melhor amigo no mundo.

Rulan encerrou a ligação e voltou para o quarto, se sentando ao lado de Jingyi na cama. Ele logo percebeu o silêncio ao redor deles e as caras sérias, franzindo o rosto em preocupação. Balançou levemente o braço de Jingyi, chamando por ele com o apelidinho manhoso para conseguir sua atenção.

— JinJin... ‘tá tudo bem? Aconteceu alguma?

Jingyi trouxe Rulan para pertinho. Abraçou a cintura dele e beijou seu rosto, lhe devolvendo seu sorriso apesar do nojo que Sizhui fingia ao lado deles.

— Está tudo bem, amor. Nós só estávamos conversando. E falando em conversa, o que o seu pai queria?

— Ele queria saber onde eu estou. — Rulan respondeu, virando-se brevemente para o primo. — Pensa nele chegando em casa e vendo tudo de pernas pro ar, e o pior, não me achando lá?

— Coitado do tio... — Sizhui comentou por alto.

— Ah, eles vão superar. E meu pai está feliz também, eu disse que gostei muito do meu presente.

Rulan só faltava ronronar contra o rosto de Jingyi, que estava amassado ao seu num afago exagerado.

— Hm, de qual dos presentes você estava falando? — Sizhui perguntou.

— Da festa. Não que eu tenho gostado especialmente dela, mas todo mundo está falando muito bem na rede social e eu prefiro que ele pense que eu amei cada segundo. Vocês tinham que ver como ele ficou alegre quando eu disse que queria chamar tanta gente... — Rulan sorriu um pouquinho. Sua relação com seu pai era cheia de altos e baixos, mas gostava muito dele e sentia muita vontade de agradá-lo. — E eu não falei sobre o meu outro presente. Eu ainda não sei como ele vai reagir ao saber que, bem... Eu meio que saí do armário ontem.

Nessa hora, uma voz escandalosa se fez ouvir do outro lado da porta ainda fechada.

— Ai dele se fizer qualquer coisa contra o meu mais novo sobrinho corta-manga precioso! — Foi o tio Wuxian quem falou.

Minutos depois estavam os três sentados em frente à ilha da cozinha, um do ladinho do outro, diante de três copos de água gelada. O tio Wangji passou por eles com a sua cara severa de decepção, jogando aspirinas efervescentes em cada um dos copos como se estivesse afogando os próprios garotos neles.

— Vocês estão de castigo. — Disse o tio Wangji.

Uma exclamação indignada saiu dos três adolescentes, e do jovem tardio que era seu marido.

— Ah, por quê?! — Rulan exclamou irritado. — A gente não fez nada de errado.

— Vocês deram bebida pro Sizhui. — Ele respondeu, ainda sério. — E ele aceitou.

Bebendo do seu próprio copinho efervescente, Sizhui ergueu as sobrancelhas e desviou os olhos do pai.

— Como se você não soubesse que ele bebe escondido com o tio Wuxian desde que ele tinha 16! — Rulan tornou a retrucar. — Além do que o senhor está aí falando de bebida, mas não tem noção do que ele fez na festa e...

— Cala a boca, pelo amor de deus... — Sizhui choramingou junto ao tio Wuxian.

Primeiro, o tio Wangji respirou fundo, apertando bem os olhos com os dedos numa tentativa de se controlar. Depois, ele olhou para o tio Wuxian, que tentava se esconder atrás da geladeira.

— Você também está de castigo.

— A-ah?! — O tio Wuxian voltou, irritado e com as mãos na cintura. — Você não pode fazer isso! O nosso bebezinho só queria sair pra se divertir com os coleguinhas dele e agora você vai encrencar? Quer que eu te lembre das coisas que você fazia na idade deles, Lan Wangji? — Ele se virou para os garotos com a mão na cintura. — Não, porque quando ele ficava bêbado, esse aqui roubava galinhas no quintal dos outros! Uma vez ele escreveu o nome dele na mesa de jantar da dona de uma festa em que a gente foi, e fez isso usando uma moedinha! Eu preciso falar mais?!

A ameaça bastou para que o tio Wangji desistisse, olhando para o filho com as orelhas vermelhas. Sizhui acabou rindo um pouquinho, por pouco não se engasgando com o conteúdo do seu copo.

— Qual é, amor... Não pega tão pesado. — A voz do tio Wuxian era menos estressada agora, ele só parecia fazer manha para convencer o marido. — A gente tem um menino que acabou de se descobrir e um casal de pombinhos aqui. Vamos passar um paninho só dessa vez...

Não havia nada que o tio Wuxian pedisse que o tio Wangji pudesse lhe negar. Com um último olhar irritado para os quatro, ele jogou a toalha.

— Só dessa vez. — Concordou, ganhando sorriso do marido.

— Hm, muito obrigado, pai. — Sizhui agradeceu baixinho.

— Valeu, tio! — Jingyi concordou.

— Tá, que seja. — Rulan deu de ombros, malcriado como sempre.

Jingyi virou seu copo inteiro da aspirina, odiando o sabor, mas já se sentindo consideravelmente melhor. Vendo que os tios ainda estavam discutindo em sussurros furiosos há alguns metros dele, segurou uma das pernas do banco em que Rulan estava sentado e o puxou para mais pertinho. Pegou o copo dele, ainda cheio sobre o balcão, e lhe estendeu.

— Você deveria beber. – Sugeriu e colocou o copo nas mãos de Rulan.

— Mas o gosto é horrível, JinJin...

— Mas é para você se sentir melhor. — Jingyi garantiu, tentando não se abalar pelo charme dele. — Vai aos pouquinhos que acaba logo, eu prometo.

Rulan tinha o paladar chatinho de um moleque de seis anos, sua dieta não era nada balanceada e ele preferia sempre comer porcaria. Fazê-lo tomar um remédio ainda era um sacrifício, mas Jingyi descobriu bem rápido que era fácil dobrá-lo com meia dúzia de palavras doces. Segurou o copo nos lábios dele, virando com cuidado para não ir muito depressa, mas sem deixar que ele parasse de beber.

— Isso é nojento! — Reclamou Rulan, finalmente esvaziando o copo e o largando sobre o balcão.

— Mas já passou. Agora você vai ficar bonzinho a tempo de ir almoçar na casa dos seus pais e...

Jingyi viu as sobrancelhas de Sizhui curvadas com ironia ao seu lado. Não mimar Rulan ia ser uma tarefa dos internos. Pigarreou, tentando dispersar um pouco o clima entre os dois.

— Bom, eu deveria ir para casa também. Meus avós devem estar querendo me matar, eu não liguei pra eles nem uma vez desde ontem.

Jingyi pulou do banco, dando um beijinho rápido em Rulan antes de se espreguiçar longamente.

— Eu espero que você tenha curtido bastante a sua primeira festa. — Jingyi deu um tapinha amigável em Sizhui. — Já tem outra pra gente ir na semana que vem.

— A gente ainda nem se recuperou dessa e você já está planejando a próxima? — Sizhui perguntou, impressionado.

— É assim que as coisas funcionam, meu bem. Não perde tempo.

Jingyi abriu seu próprio celular na intenção de ligar para os avós, tentando não cortar o dedo na tela trincada. Os grupos de mensagens da escola estavam chovendo fotos da noite anterior, inclusive algumas de Sizhui naquele seu mar particular de garotas apaixonadas. Também havia uma de Jingyi e Rulan juntos, apenas meio abraçados, provavelmente da hora em que eles foram embora. Ninguém estava entendendo nada.

— As pessoas já estão sabendo de nós. — Murmurou para Rulan, ganhando um carinho dele em seu rosto. — Você se incomoda?

Rulan sorriu, fazendo que não.

— É melhor que eles saibam que você é só meu agora.

— Ah, eu sou só seu, então? — Jingyi provocou. — Vai falar pra todo mundo que o seu JinJin finalmente chegou e...

Um pigarro de Sizhui os cortou novamente e Jingyi se deu por vencido, resistindo ao desejo de só jogar tudo pro alto, pegar Rulan no colo e continuar cedendo a todas as vontades dele.

— Você tem mesmo que ir? — Rulan perguntou, meio acanhado, enquanto acompanhava Jingyi até o quarto para arrumar suas coisas. Sizhui havia ficado na cozinha para tentar apaziguar os pais, que ainda estavam discutindo. — Você não quer ir lá pra casa? Não vai ter nada demais, só um almoço com meus avós.

— Eu adoraria, A-Ling... Mas eu devo uma satisfação lá em casa.

Jingyi se aproximou do menino cabisbaixo à sua frente, enlaçando sua cintura. As mãos de Rulan se agarraram ao seu pijama, não querendo deixá-lo ir.

— Mas eu queria tanto você lá... O que vai ser desse aniversário se o meu melhor presente não estiver comigo?

O tom desiludido de Rulan quebrou o coração de Jingyi, mas pôde reconhecer alguns pontos da sua conversa com Sizhui na fala dele. Sorriu um pouquinho preocupado, apertando a bochecha fofinha de Rulan entre os dedos.

— Eu não vou poder, meu amor. Infelizmente. Eu sei que você iria me querer lá, mas eu ainda sou um estranho pra sua família, eles nem sabem que eu existo. Iria ser estranho que eu simplesmente aparecesse lá, não é?

— Mas é meu aniversário! — Rulan protestou. — Eles iriam ter que entender...

— Não é assim que eu quero fazer as coisas, A-Ling. — Jingyi corrigiu na sua infinita paciência. — Eu quero me apresentar apropriadamente para os seus pais, porque quero que nós tenhamos algo sério. Ir atropelando etapas assim não é a maneira certa.

Rulan se enfureceu e se afastou, claramente descontente com a sua resposta. Jingyi suspirou, entendendo perfeitamente os avisos de seu melhor amigo.

— Não faz assim, vai. — Foi se aproximando de vagar, usando sua lábia carinhosa para tentar ganhar a atenção de Rulan, que só fugia dele.

— Você está tentando me enrolar! Você não quer ficar comigo. — Acusou ele, cruzando os braços com irritação. — Você não vai mais ligar pra mim depois que for embora.

— Não diga isso nem de brincadeira.

Jingyi enfatizou o pedido, um pouco mais sério. Ergueu o rosto irritado de Rulan para encará-lo, mesmo com a resistência dele.

— Se não quiser acreditar nos meus sentimentos por você, vá em frente e não acredite. Mas você tem que reconhecer que eu não sou tão burro quanto eu pareço e não teria passado a noite toda empenhado em te agradar se não quisesse nada com você.

Rulan realmente agia como um pirralho às vezes, mas como tal tudo que ele precisava era de pulso firme. A convicção de Jingyi ao lhe falar todas aquelas coisas desfez a sua marra e ele agora só parecia genuinamente arrependido.

— Me desculpa, JinJin... Não briga comigo.

Ele olhava encabulado para o chão com a barra do pijama apertada entre os dedos. Jingyi não tinha coração para continuar sendo tão duro com ele, então o envolveu no seu abraço e afagou seus cabelos.

— Não estou brigando. Eu só quero que você entenda que, só porque eu não vou estar no almoço do seu aniversário, não significa que eu não queira te ver mais. Eu só quero separar as duas coisas por enquanto, esse é o seu momento com a sua família, o nosso momento juntos foi ontem. E foi incrível, não é?

A simples lembrança fez o coração de Jingyi bater mais depressa. Puxou Rulan para mais perto e encheu os pulmões com o perfume no pescoço dele, deixando alguns beijos na pele macia e observando-o relaxar nos seus braços.

— Agora, por mais que me doa... — Resmungou, falsamente choroso, arrancando um risinho de Rulan. — Nós precisamos nos despedir. Eu vou dar conta da minha família e você vai dar conta da sua. E mais tarde, se você quiser fazer alguma coisa, é só mandar uma mensagem. Seu JinJin larga tudo e vem correndo só pra te ver.

Em segundos, Rulan já estava sorridente outra vez, selando seu rosto e se jogando no seu abraço.

— Está bem, JinJin. — Ele concordou, por fim. — A gente pode se ver mais tarde, então.

— Isso mesmo. — Jingyi concordou, só se afastando para terminar de arrumar sua mochila. — Hoje mais tarde e amanhã a na escola também, todo dia. Você não vai se livrar de mim tão cedo.

Rulan não queria deixa-lo ir. Se dependesse apenas da sua vontade, Jingyi nunca mais iria a lugar nenhum onde também não pudesse estar. Se sentou na cama com um suspiro contrariado, mas conformado, pegando o celular para se atualizar. Os grupos de conversa não sabiam falar de outra coisa, ele e Jingyi não sairiam da boca dos colegas da escola por um bom tempo. Ainda no aplicativo de conversas, Rulan se deu conta de que aquela era a primeira manhã em meses em que não recebia uma mensagem de bom-dia de Jinjin. O contato dele ainda estava parado no último textão que havia recebido. Perdeu muito tempo relendo suas conversas, imerso na dor sutil de saber que aquela fase da sua vida havia terminado. Mudou o nome do contato com um peso especial no coração, mas um sorriso no rosto.

Erguendo os olhos para Jingyi outra vez, viu que ele também o estava olhando com aquele sorriso brilhante que só ele tinha. Ele tinha a camisa na mão e o peito ainda nu, e a visão encheu Rulan de timidez. Agora que não estava bêbado, a achava sua situação ainda mais vergonhosa, porém ainda mais doce.

Jingyi se sentou ao seu lado, convencido a ceder só mais um pouquinho. Foi trazendo Rulan para seu colo com pequenos beijos e cócegas, só sossegando quando finalmente conseguiu. O abraçou apertado, cheio de carinho.

— Agora sou eu quem não quer ir. — Admitiu.

— Mas você deve ir. — Mesmo sem vontade, Rulan entendeu que era sua hora de ser firme, o que encheu Jingyi de orgulho dele. — Me deixa só te devolver o seu pijama. Vou me trocar rapidinho, me espera...

— Não se preocupe. Pode ficar com ele. — Garantiu Jingyi, dando uma boa olhada no corpo acanhado de Rulan sobre o seu. — Eu sei que você não gosta, mas azul te cai muito bem.


Notas Finais


Olha só! Você chegou até aqui 💛

Escrever essa história foi uma delícia, mas organizar as mensagens foi uma tristeza! De qualquer forma, eu fiz com carinho 💛

Falando em carinho, essa fanfic também está no wattpad! E o mais legal é que lá, eu pude acrescentar vários conteúdos gráficos que a plataforma do Spirit não permite :( e também um capítulo bônus! Então eu recomendo fortemente que vocês dêem uma passada lá ;) encurtador.com.br/jovzG

E o que você achou? 💛 Gostou, odiou? Me conta! O seu comentário é muito importante nessa série de conteúdos experimentais e ele me deixa muito feliz! Faz um agradinho pra essa autora que tanto te ama 💛

Muito obrigada por ler! Um beijão pra ti!!!


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