Temari segurou a enorme saia do seu vestido azul e levantou um pouco, tentando não arrastá-lo na lama. Começou a chover e todos corriam para dentro do bar, só ela indo na direção contrária. Sabia que, do jeito que era sossegado, ele estaria entre os últimos a tentar fugir do aguaceiro repentino. As sandálias de salto já estavam escorregadias e seus ombros começavam a tremer de frio quando o viu. Mas sim, lá estava ele, caminhando calmamente em direção à porta.
Suas sobrancelhas arquearam para cima ao vê-la naqueles trajes. De fato, achou-a mais linda que inadequada, em seu vestido cheio de strass, dentro daquele bar de comunistas. Repuxou os lábios para o lado num meio sorriso e riu anasalado, balançando a cabeça. Era mesmo louca sua linda.
Com as mãos nos bolsos, deu dois passos à frente, vendo-a fazer o mesmo, o vestido rodado balançando enquanto ela se movia. Chegaram perto o suficiente para falarem um sobre o rosto do outro, o samba fazendo tanto barulho, a chuva ainda mais. Temari foi a primeira falar:
— Então é verdade?
— Você soube.
— Vai me deixar?
— Você fez isso primeiro.
Ela viu que não havia rancor em suas palavras, apenas uma constatação. Seus lábios tremeram e ninguém saberia se a água sobre seu rosto era lágrimas ou chuva. De todo modo, ele a enxugou com o dorso dos dedos grossos e sorriu, triste.
— Eu volto. — Ela sabia que era uma promessa. Mas Temari não queria saber de promessas.
Não mais.
— Não, não volta.
— Estou dizen–
— Não tem como voltar de um lugar pra onde não se foi.
— Temari, eu… — Seus lábios foram interrompidos pelos dela, desesperados de desejo por ele. Ela o beijou apertado e quando ele a beijou de verdade, aquecendo o frio com todo o seu calor, debaixo da chuva agora torrencial, ela se lembrou em um lampejo de toda a história deles e teve certeza: não o deixaria escapar outra vez.
★★★
— Baseado em quê o senhor acredita que a molécula se modificou por causa das palavras ditas?
— Temari, os estudos foram feitos por físicos como você.
— Onde está este estudo, professor? Publicado em que periódico?
— Temari, você está questionando as fontes que trago pra aula?
— Estou, professor. Sinceramente, me desculpe, nós estamos em 1955. Não dá pra gente se formar aceitando suas opiniões sobre um estudo feito em 1902.
— Você é muito audaciosa, menina. Sabe que se eu te reprovar, você fica presa um ano e meio a mais?
— Não me importo. Pelo menos tenho a chance de ver o senhor se aposentar e pegar um professor que se atualize.
Temari pegou suas coisas e saiu em disparada da sala, ouvindo os comentários dos colegas, certamente falando mal de si. Não era a primeira vez que peitava o senhor Joseki, um velho magro e sério que todos adoravam por ser responsável, mas que, sinceramente, como professor da principal cadeira do seu curso, frustrava-a e deixava muito a desejar.
Saiu em disparada até uma construção antiga que ficava na parte mais alta do terreno da Faculdade de Exatas.
— Espere! — ouviu uma voz que não reconheceu mas que a fez apenas acelerar o passo. Não queria ouvir escárnios ou bobagens de mais um colega cheio de empatia com aquele velho idiota.
Chegou até o muro de azulejos portugueses onde costumava ficar sozinha. Era possível ver o mar e um bonito pôr de sol dali. Olhou para os lados e não havia ninguém. Jogou os cadernos no chão e sentou no muro com as pernas balançando. Por que realizar seus sonhos sempre parecia tão difícil? Não bastava sua família julgando-a por querer estudar? Mas que droga, qual o problema de ser uma mulher cientista?
Expirou se sentindo muito incompreendida. E então viu um rapaz moreno e de cabelos amarrados para cima se aproximar.
— Ei. — Ela olhou em sua direção. — Temari, não é? Er… talvez não se lembre do meu nome…
— Não lembro — respondeu, seca. O rapaz sorriu, ainda assim.
— Meu nome é Shikamaru. Shikamaru Nara. Sou da sua turma de Física III.
— Ah… veio defender o velho decrépito — afirmou taxativa, voltando a olhar o horizonte. O dia estava especialmente azul.
— Não, na verdade… vim dizer que concordo com você.
— Hum?
— Sim. Só não tenho culhão suficiente pra decidir atrasar meu curso por mais um ano. Bem… meus pais me matariam antes disso, então…
— Sei. — Ela o olhou com desdém. — Um filhinho de papai. Aposto que é da Engenharia.
— Bem, na verdade… sim.
— … — Temari voltou a olhar o horizonte. Bosta de menino idiota. Ela queria ficar sozinha.
— O que vim dizer é que… — ele acendeu um cigarro. Ela o olhou de soslaio. Tentava entender o que ele fazia ali. — Sou diretor do centro acadêmico.
— Não sou filiada ao movimento estudantil.
— Não importa. — Soltou a baforada de cigarro para cima. Ofereceu um trago a ela, que negou. — Há maneiras mais inteligentes de mostrar seu descontentamento com o senhor Joseki. Ou com qualquer professor, na verdade.
— Tsc… agora sou burra então?
Shikamaru riu anasalado, soprando mais da fumaça. Aquela loira era mesmo problemática.
E ele adorou isso.
— Não, ao contrário. Acho que é inteligente demais para a média dos alunos. Creio que até para a média dos professores. Não vão te compreender.
— Ah, mas você sim, senhor grande inteligente Nara?
— Modéstia à parte, sim.
Ele a olhou direto nos olhos e Temari se surpreendeu com sua placidez e segurança ao falar. Aquele podia ser só mais um dos idiotas da Engenharia mas, tinha que admitir, o garoto tinhas bolas. Não desviava os olhos dela ao falar, o que lhe assegurava que ele tinha um ponto. Também percebeu que a respeitava. Não a olhava de cima para baixo como a maioria dos homens, sempre crendo que as mulheres faziam faculdade à procura de um casamento. Temari resolveu ouvi-lo com interesse desta vez.
— O que sugere?
— Que faça uma ocorrência por escrito ao departamento. Uma solicitação.
— Tipo uma denúncia?
— Não. O velho não comete nenhum crime. Preguiça é apenas um pecado capital, nada mais. Inclusive, não posso julgá-lo.
— É preguiçoso, senhor Nara?
— É o que dizem.
Foi Temari quem riu dessa vez, o que o fez sorrir também e, vendo aquele sorriso discreto abaixo dos olhos amendoados e firmes, Temari compreendeu que tinha acabado de se meter numa grande enrascada.
E ela adorou isso.
★★★
Temari comia um sanduíche correndo ao mesmo tempo que lia um texto, sentada de mau jeito no banco de cimento, quando o viu se aproximar. Sentiu dificuldade de engolir e soube que não era por não ter dinheiro para comprar um suco. Ele se aproximava e isso mexia com ela de um jeito… diferente.
— Oi, Temari.
— Oi.
— Vai à festa da Sakura?
— Ouvi o pessoal comentando.
— E vai? — Ele lhe pareceu gentil em sua insistência.
— Não fui convidada — respondeu, dando de ombros, voltando a ler o texto para a prova do dia seguinte. Não tinha tempo para lamentar a falta de boas relações interpessoais. Precisava trabalhar enquanto estudava, diferente da maioria de seus colegas. E também não podia dizer que era das pessoas mais simpáticas ou que se esforçasse por fazer amigos.
— Pois então eu estou convidando.
Temari olhou para cima. Shikamaru sorria de um jeito discreto, pousando sobre ela seus indecifráveis e preguiçosos olhos. Ela nunca sabia se ele estava sendo galanteador ou apenas comunicativo como um representante de curso deveria ser.
Ela guardou suas coisas. Não conseguiria estudar com a presença dele a inquirindo com aquele olhar intenso, ela sabia. Então desistiu e apenas mordeu seu sanduíche, falando de boca cheia:
— Você não é o dono da festa. Pare de tentar ser legal.
— Não estou sendo legal — ele explicou, se abaixando em direção ao rosto dela. — Você duvidou da minha inteligência. Quero que vá ver que também estou acima da média dos alunos. Como você.
— Ora, seu arrogante — ela disse, se levantando, indignada. — O que você pode fazer de tão inteligente no aniversário de alguém?
Temari se levantou e colocou as mãos na cintura, questionadora. Ele sorriu daquele jeito de lado, um jeito que definitivamente mexia com ela, e respondeu:
— Vou recitar um poema. Quero que você ouça.
— Ah, agora é artista? Não me diga que sua família te obrigou a estudar exatas, seu grande incompreendido.
Shikamaru riu anasalado. A garota era tão desafiadora quanto seu jogo preferido.
— Não, não, não sou nenhum artista. Só acho que juntei boas palavras. Por isso quero que você vá. Diferente da maioria — ele colocou as mãos nos bolsos — sei que não vai aplaudir se estiver ruim.
— Hunf! Aplaudir? Você se acha muito. Eu vou é lhe dizer cada trecho em que você precisa melhorar, idiota.
— Não espero menos de você — ele disse, se afastando. Ele não tirava aquele sorriso do rosto e ela nunca sabia se era de diversão ou sarcasmo; se ele estava continuamente rindo dela ou para ela. Argh, que Nara insuportável!
Nenhum dos seus esforços para afastá-lo ou fazer declinar do convite havia adiantado, então lhe gritou sua condição social mais baixa:
— Não tem ônibus pra eu voltar à noite!
— Eu lhe levo de volta — ele sequer olhou para trás para respondê-la. Céus, que menino riquinho e metido!
— Você não sabe onde eu moro!
Só aí Shikamaru parou de andar e olhou para ela sobre o ombro. Acenou com a cabeça:
— Vou adorar saber.
★★★
A festa estava marcada para começar às 21h, um horário tardíssimo para os padrões de Temari, que fazia faculdade e trabalhava, sempre correndo, sempre apressada. Chamou sua amiga Tenten, com quem tinha uma relação de amor e ódio, e foi, rezando para que a conversa do Nara não fosse nenhum golpe e ele realmente a levasse para casa, já que os ônibus paravam de circular às 23h. Ou confiava nele ou teria que dormir deitada em algum banco de rua.
Quando chegou, Sakura acabava de falar num microfone:
— E agora Shikamaru vai recitar um poema pra mim, de presente.
— Uuuuh!!! — Todos ovacionaram.
— Olha o poeta!
— Fiu fiu!
Ele estendeu os braços para cima, como a silenciar as pessoas, com seu sorriso entre tímido e arrogante que só fez Temari bufar, mas também apressar os passos.
— Calma, amiga, já chegamos — Tenten reclamou, sendo puxada pelo braço.
— Mas eu preciso ver isso de mais perto, mora? Anda logo, criatura!
Ela perdeu os dois ou três primeiros versos, já que ele não aceitou o microfone e falava baixo, lendo um papel. Mas se pôs mais para a lateral, atrás de todos, e conseguiu ouvir boa parte do texto:
— …
O que se deseja de mais um natal?
Afinal
Essa vida é quimera
e quando menos se espera
vem o ponto final.
Vírgula!
É justo nestas festas que ela
se mostra iludida e bem vinda,
feliz e patética,
como palmas ao vento.
O alento
é que faremos pelo caminho,
apesar de toda dor e espinho,
algum canto de amor,
algum ponto de carinho.
Hoje é seu aniversário.
Que pouco lhe seja cobrado
e muito ofertado
na dança da vida
que baila, aberta.
Aperta
hoje teus entes queridos
em abraços nada contidos,
em beijos sem qualquer alerta.
Amiga, voa!
Baila intensa na brisa, à toa,
que a qualquer momento
lá vem outra ferida.
Mas não neste dia,
não nesta festa.
Presta
toda atenção quando digo:
hoje é dia de desalinho,
paixão, sorrisos
e ouvidos sinceros.
Parabéns por mais um ano!
Que este seja de encanto e espanto,
cheio de felicidades sem qualquer espera.
Shikamaru Nara
A galera foi ao delírio. Ninguém parecia conhecer aquele lado lírico do Nara. A aniversariante se derreteu num abraço apertado ao amigo. Os outros bagunçaram seus cabelos e puxaram seu braço, dando parabéns entusiasmados.
Temari aguardou toda aquela ovação e chegou perto dele por último.
— Você veio — ele constatou o óbvio com um sorriso no rosto. — Perdeu meu minuto de fama.
— Quem disse? Eu ouvi tudo.
— Oh. — Ele arregalou os olhos, surpreso. — Então quero ouvir as críticas a cada frase, como me prometeu.
— Não vale. Você fez isso enorme de propósito.
— Sim. De propósito pra que você passe o resto da noite só falando das minhas mal traçadas linhas. — E lhe entregou uma folha de papel, antes de se virar e falar com mais dois ou três amigos.
Lá estava o poema que ele recitara, muito bem escrito numa legra organizada e forte. Temari sorriu, emocionada. As palavras dele ressoando em sua mente:
Sim. De propósito pra que você passe o resto da noite só falando das minhas mal traçadas linhas.
“Ele quer passar o resto da noite conversando comigo?”
Sim, ele queria. E ficaram num canto da festa, Shikamaru, Temari e Tenten, até sei lá que momento em que a amiga pediu licença e Temari não a viu mais aquela noite. Continuaram conversando e conversando por horas, sendo sempre interrompidos por pessoas que queriam falar com ele. Temari compreendeu que ele era bastante conhecido. E mais que famoso, querido. Talvez por ser representante estudantil; talvez por sua inteligência e piadas certeiras; talvez porque apenas fosse agradável, não saberia dizer. Quando foi ao banheiro, viu Tenten se beijando com alguém que ela não identificou, vendo apenas que a pessoa possuía uma enorme cabeleira. Seria uma menina? Olhou seu relógio e viu que já era uma da manhã.
Voltou e perguntou, ineditamente tímida:
— Er… Nara? E a carona que você me prometeu? Você… vai mesmo poder me dar?
— Claro. Eu prometi, não foi?
— É que…
— Já quer ir embora?
— Eu queria saber quando você pretende.
— Eu só tinha que recitar o poema. Meu próximo compromisso é ser seu motorista.
Ela riu.
— Então acho que eu gostaria de ir. Se não se importar.
— Pode ser em mais meia hora?
Claro que ela aceitou, ele estava lhe fazendo um favor. Foi mais meia hora de gente solicitando a presença ou a opinião dele. Passados trinta minutos exatos, ele a puxou pela cintura e falou baixo em seu ouvido:
— Me sequestre ou não vamos sair daqui.
Se dirigiram à rua onde os carros estavam estacionados e Temari ficou chocada. O carro dele era o mais caro em que ela já tinha andado. Não que andasse em muitos, mas realmente não conhecia ninguém da idade deles que tivesse um daquele.
Mas nada disse. Não queria parecer minimamente interessada em sua condição social, isso não lhe importava. Estava chocada com a agradabilidade de sua companhia. Ele sempre lhe pareceu tão arrogante e antipático. Naquela noite se mostrava gentil e divertido como ela jamais vira. Ou se permitira ver.
Shikamaru abriu os vidros e dirigiu de maneira cuidadosa. Temari achou que ele andava mais devagar que a maioria das pessoas, mas de novo nada disse. Apenas se abraçou, tremendo com a brisa da madrugada.
Automaticamente ele fechou as janelas.
— Está com frio?
Foi uma pergunta retórica, porque ele já tinha fechado todo o carro e ligado o aquecedor, fazendo tudo que podia para aquecê-la. Ainda assim, ela respondeu:
— É, esfriou um pouco. Acho que eu vim com uma blusa curta demais.
Ele aproveitou um sinal vermelho e puxou um casaco do banco de trás e deu a ela.
Foram conversando sobre a festa e a faculdade. Ao chegar em frente a seu prédio, ela desceu e agradeceu. Quando Temari bateu a porta, Shikamaru olhou para baixo e sorriu. Viu-a voltar correndo antes que ele acelerasse e dizer, com a cara um pouco assustada:
— Espere, seu casaco!
Ele sorriu e disse:
— Depois você me dá. — E arrancou, sem lhe dar tempo de resposta.
Temari fechou mais a roupa sobre o próprio corpo e respirou fundo. Podia sentir o cheiro dele a arrodeando, notas de fumo e madeira. Achou que aquilo tinha sido uma péssima ideia. Teria que vê-lo novamente para devolver o casaco.
★★★
Achou uma oportunidade quando o pessoal marcou de ir no show de um artista que ela adorava. Não tinha dinheiro, mas juntou por mais de um mês, amarrou os cabelos em maria chiquinhas divididas em quatro partes de um jeito que amou, e foi. No horário marcado, lá estava ela, levemente maquiada, com o casaco dele na cintura.
Mas não havia ninguém.
Como assim?
Quando ela bateu o pé no chão bufando de raiva, viu um cabelo de abacaxi se aproximar, no meio da multidão.
Era Shikamaru.
— Oi, Temari. Cadê todo mundo, me atrasei tanto assim? Desculpa, não consegui estacionar logo e tive que…
— Ninguém veio — ela explicou, mais triste do que zangada. — Bom, pelo menos posso te entregar seu casaco.
Ele pegou a roupa, ainda processando a informação. Estava chocado:
— Como assim ninguém?
— Assim. Só temos você e eu.
— Mas eram quase vinte pessoas!
Ela levantou os ombros e abriu as mãos, fazendo uma careta. O que podia dizer? Sabia tanto quanto ele sobre aquilo.
— Que saco — disse, passando a mão nos cabelos. Olhou ao redor, apertou o casaco e olhou para Temari. — Mas que negócio de lascar o cano! Bom, eles que marcaram touca. Nós viemos ver o show e é isso que vamos fazer.
Ele a puxou suavemente pela cintura, apenas para que andasse em sua frente. O lugar era em formato de arena e, enquanto eles subiam os degraus da arquibancada, Shikamaru falou com umas dez pessoas.
Temari ficou muito sem jeito.
— Olha, não precisa curtir o show comigo. Eu posso ficar sozinha numa boa, não tem problema nenhum. Vejo que tem muitos amigos seus aqui e… pô, fica à vontade, pode ir ficar com eles.
— Eu sei que posso — ele respondeu pegando em sua mão e a girando num passo de dança. — Mas não quero.
— Uh! — A música havia começado e Temari se viu apertada no meio dos braços dele. Sentiu aquele cheiro delicioso de fumo e madeira que havia no casaco subir às suas narinas, porém com muito mais intensidade.
E por Deus, era delicioso!
A música era agitada e, ainda assim, ela se encolheu em seu peito. Riu quando ele a girou novamente e também quando ele lhe segredou ao ouvido:
— Por que eu escolheria ficar com esses idiotas se posso ouvir todas as críticas que você tem a fazer sobre cada verso de outra pessoa?
Ela o olhou nos olhos, agora tão próximos, e abriu um sorriso imenso, que nem se lembrava quando havia dado.
Umas dez músicas depois, eles compartilhavam um copo de cerveja quando ouviram alguém gritar:
— O que fazem aqui sozinhos? Estão namorando?
Temari enrubesceu. Shikamaru fechou o cenho. Quem vinha invadir assim sua privacidade?
— Oe, Naruto.
Só podia ser o sem noção do seu amigo, que já chegou rindo e cutucando-o nas costelas. Colocou a mão na boca, como se falasse um segredo, mas sua voz era tão alta que é claro que Temari ouviu:
— Mas que bafafá, o silencioso diretor de finanças do D.A. e a nerd reclamona e antipática. A patota não vai acreditar quando souber disso.
Shikamaru perdeu a paciência e encarou Naruto bem de perto. Era mais alto que ele e fechou uma cara horrorosa, o que intimidou o loiro:
— Que foi, Naruto, tá querendo encrenca? Que espaço te dei pra falar de minha vida pra ninguém, porra?
— Calma aê, Shika, uou, qual é? Falei de brincadeira, acha que vou sair espalhando fofoca assim?
— Acho, idiota. Isso é bem a sua cara.
— Oe, Shikamaruuu! — Naruto levantou os braços em rendição e se encolheu, vendo o amigo realmente zangado. Deu um passo para o lado e fingiu contar um segredo novamente, desta vez para Temari, mais uma vez sabendo que o amigo ouvia: — Ele está mesmo caidinho na sua, broto. Nunca vi o Shikamaru se zangar assim por nada, hahaha! Ah, e não me leve a mal, eu… até me simpatizo com você. Gosto de garotas brabas.
— Naruto-kuuun! — eles ouviram uma voz feminina o procurando. Foi sua deixa.
— Minha namorada está me procurando. Deixa eu correr. — Foi se afastando e gritando: — E vocês aproveitem aí, eu não vou dizer nada a ninguém, tô certo!
Quando o rapaz se afastou, eles ainda estavam do mesmo jeito: ela envergonhada, ele raivoso. Ela sorriu e baixou a cabeça. Ficou um pouco triste. Então as pessoas saberem (ou acharem) que ela era sua namorada dava-lhe tanta raiva assim?
— Ei — ele a chamou para que o olhasse, levantando seu queixo com um dedo —, o Naruto não vai falar nada. Não se preocupe. Ele é meio lelé mas é um bom amigo.
— Achei ele engraçado.
— Sim, ele é. — Shikamaru ficou alguns segundos em silêncio então observou. — Mas você não está rindo. Ao contrário, parece triste.
— Não, não é nada, é só que… eu…
Ah, se ele soubesse quantas inseguranças emergiram naquele momento! Aquela velha e terrível sensação de que ninguém jamais a aguentaria. Era o que seu pai vivia lhe dizendo antes de morrer e seus irmãos, depois dele. Porque era cabeça quente demais, inteligente demais, questionadora demais. Que homem gostaria de uma mulher como ela, briguenta e sem paciência? Ela nunca se casaria.
Por isso permitiram que ela fosse estudar. Era isso ou não teria futuro.
Viu Shikamaru puxá-la pelos ombros e abraçá-la, mas não havia música agora, era o intervalo. Estranhou. Mas ele logo se explicou em seu ouvido:
— Sei que você não se importa nem se interessa, mas que fique registrado que eu não fiquei zangado porque as pessoas saberiam que sou seu namorado. Eu me zanguei porque é uma mentira. — Temari o olhou nos olhos. Não entendeu se ele queria que aquilo fosse verdade ou se apenas queria dizer que não gostava de mentiras em geral. Ficou confusa e piscou várias vezes. Ele a apertou mais no abraço. — Posso te levar pra casa de novo?
— Ah, hoje não precisa, o show acaba cedo e eu consigo…
— Não perguntei se precisa. Eu pedi pra te levar, é diferente. Hum? — Ele levantou seu queixo com um dedo mais uma vez e desta vez estava tão perto. E tão cheiroso. E tão… bonito!
— Pode — ela sussurrou, tão baixinho e olhando tão fixamente para a sua boca, que Shikamaru teve dúvidas se ela falava da carona ou do beijo que ele claramente queria lhe dar. Lambeu os lábios, um pouco nervoso. Por via das dúvidas, escolheu se afastar.
Coçou a garganta e se afastou quando os primeiros acordes voltaram a ser ouvidos. Sentindo falta dos braços quentes a arrodeando, Temari percebeu que o desejava naquele minuto. Droga, por que se sentia atraída pelo arrogante, rico, prepotente e idiota Shikamaru Nara? Como? Por quê?
E o incrivel era que só havia se dado conta disso por causa da pergunta do loiro idiota.
Merda, Naruto.
★★★
— Prontinho. Está entregue — ele disse, parando seu possante Cadillac em frente ao humilde predinho de três andares.
Temari tentou abrir a porta e sair. Estava nervosa. Não conseguia fazer aquela simples ação. Sentia-se atrapalhada.
Vendo que ela não saía, Shikamaru ousou perguntar:
— O que acha de sairmos qualquer dia desses? — Ela o olhou intrigada. — Eu quero dizer, sozinhos. Digo — Shikamaru não estava diferente. Se atrapalhava também, porém com as palavras. —, sozinhos de propósito. Sei lá, já que somos vizinhos, que tal ir naquela cantina italiana na esquina? Sempre tive curiosidade de ir lá e nunca fui.
— Hum… pode ser — Temari respondeu, sorrindo sem graça. Viu ele se direcionar a ela e aproximar os rostos. "Ah, meu Deus, ele vai me beijar", foi o que pensou, mas ele apenas sorriu aquele seu sorriso de lado e ela ouviu um "clic".
— O pino. Acho que você se esqueceu de levantar.
— Oh. Er… é, tem razão — ela respondeu, corada, abrindo a maçaneta e saindo em disparada de dentro do carro.
Shikamaru balançou a cabeça e riu. Não era bobo. Sabia o que estava acontecendo ali.
E gostou muito de saber.
★★★
No dia da pizza, se beijaram com sabor de alho.
E se beijaram muitos outros dias mais, até a faculdade inteira saber que eles estavam juntos e nenhum dos dois minimamente se importar.
Um dia pegaram um cinema que terminou meia noite e Shikamaru perguntou:
— Sua avó sempre encrenca quando você chega tarde, né?
— É. Você sabe… ela fica preocupada com o falatório.
— Por que não dorme lá em casa?
Andando de mãos dadas até o carro estacionado, Temari arregalou os olhos e perguntou:
— Tá lelé? Eu não conheço sua família.
— Ótima oportunidade. Amanhã é sábado, estarão todos em casa.
— Papo firme, Shikamaru. Vou acordar e dizer: bom dia, senhora Nara, como vai? Meu nome é Temari e acabei de dar para o seu filho.
Ele deu uma enorme gargalhada e sussurrou no ouvido dela:
— Você não diria isso…
— Claro que não!
— … porque se trata de uma mentira.
O rosto dela ficou completamente vermelho.
Perto do carro ele a abraçou e beijou, fazendo um carinho nos seus cabelos.
— Não tem problema, Tema. Estou só te perturbando. Não quero que sua avó ache que não lhe respeito. Isso é um saco, mas realmente meia noite não é hora de uma moça chegar em casa
Ele estava falando sério com aquela coisa de um conhecer a família do outro?
— Ela vai reclamar de qualquer jeito.
Assim que ele estacionou em frente a seu prédio, Temari ficou parada, olhando-o em silêncio.
— Que foi? Está atrapalhada com o pino de novo?
— Me leva pra sua casa — ela pediu.
— Linda, eu estava só brincando. Não precisa…
— Eu quero.
Ele sorriu e pegou na sua mão. Com os dedos entrelaçados, fez com que os dois passassem a marcha. Beijou sua mão e colocou em cima da coxa.
Shikamaru morava numa rua fechada e chique, no mesmo bairro. Havia uma portaria belíssima, que Temari já tinha visto mil vezes, mas jamais adentrado, tudo silencioso e iluminado de maneira discreta. Ele estacionou seu carro ao lado de outros ainda mais caros, dando vista a um belo e delicado jardim. Caminharam até a última casa. Shikamaru abriu a porta e Temari viu uma enorme sala.
Percorreram mais duas até alcançar um corredor, dobrar mais outro e então alcançar o último quarto. Ele abriu a porta e lhe deu passagem.
Temari tinha tirado os sapatos na primeira sala, tentando não fazer barulho. Assim que entrou no quarto escuro, percebeu que também tinha parado de respirar desde então. Riu para ele e se encostou na porta assim que ele passou.
— Pode ficar à vontade, ninguém vai nos ouvir agora.
Ela olhou ao redor e viu seu quarto, tão organizado quanto um imóvel de revista. Sabia que era mesmo o dele pelo monte de geringonças, fios elétricos e experimentos espalhados pelas estantes.
— Quer uma roupa? — Sua pergunta a fez parar de olhar a decoração e mirar diretamente aqueles olhos amendoados e lindos. Temari sentiu um raio percorrer seu corpo ao ver sua mão esticada com o que parecia ser uma camiseta branca, seu rosto tranquilo num sorriso calmo. Ela estava apaixonada e não podia mais negar.
— Se eu puder tomar um banho.
Era uma suíte e Temari achou incrível ele ter um banheiro particular. Era imenso, com chuveiro e banheira, as louças da marca mais cara, o piso mais branco e reluzente que Temari já vira. Pensou em seu humilde quarto dividido com os dois irmãos e se perguntou se sua origem seria um problema. Teve certeza que não quando saiu com os cabelos soltos e uma camisa dele, que virou quase um vestido sobre si. Corou quando viu seus olhos brilharem mais que a ponta do cigarro que ele fumava à janela. E corou ainda mais quando ele disse:
— Você está linda, Tema.
Shikamaru puxou-a pela cintura, lhe dando um beijo lento e intenso. Explorava sua boca com desejo, paciência e gosto de fumaça, apertando-a com carinho em seus braços.
— Você cheira a sabonete — ela observou.
— Tomei banho no quarto de hóspedes. Você pode ficar aqui à vontade. — Ele bateu a mão sobre o colchão. — Vou ficar no outro quarto. Vamos dormir, já é tarde.
Temari se anhinhou no peito dele e perguntou:
— Está com sono?
Shikamaru riu pelo nariz. O que sua loira estava aprontando? Apenas para deixá-la à vontade, pela primeira vez se fez de bobo:
— Está com fome? Posso fazer algo pra você.
Temari forçou-o a se sentar sobre a cama, enquanto ele jogava o resto do fumo pela janela. Sem pudor algum se sentou em seu colo, uma perna de cada lado. Então se abaixou, sussurrando sobre seus lábios:
— Você pode fazer algo pra mim? — Rebolou sobre o pênis dele, que começou a despertar.
— Tema… — Shikamaru gemeu. — Posso. Posso fazer o que você quiser, minha princesa.
— Então me ama, Shikamaru Nara.
Ele a abraçou apertado e sussurrou em seu ouvido. Estava excitado mas foi firme e verdadeiro:
— Não preciso fazer isso pra te amar pra sempre, Tema.
— Mas eu quero.
Ele nunca perguntou e Temari nunca disse. Mas aquela foi sua primeira vez e não poderia ter sido mais cuidadosa e feliz.
★★★
Passaram dois anos juntos, se amando e se divertindo. E brigando muito também.
Viajavam bastante. Dona Chyo, a avó que criara Temari e seus irmãos desde a morte de seu pai, não reclamava, ao contrário, estimulava aquele namoro. Quem sabe a neta destrambelhada e briguenta casasse? Shikamaru sempre pagava tudo. Temari ficava tímida com isso, mas ele não se importava. Com quem gastaria dinheiro senão com sua namorada?
Temari brigava por tudo, porém. Porque o preço das coisas era um absurdo ou porque Shikamaru dormiu e eles perderam um passeio. Mas principalmente por ciúmes. O jeito quieto e educado de Shikamaru parecia um mel — “todas as abelhas queriam provar”, segundo ela. Ele ria, abraçava-a e dizia:
— Se todas me enxergassem como você, eu seria galã de filme.
Tranquilo e pacífico, ele não dava muita atenção para as intermináveis brigas dela.
Mas um dia lhe foi impossível.
Coincidentemente, foi em um outro show em que marcaram com o pessoal que, desta vez, compareceu em peso. A prima de Naruto tocava na banda, uma flautista de solos lindos e melodiosos que, por um acaso dos deuses ou dos demônios, se sentou ao lado de Shikamaru no bar e pegou um bom tempo de sua atenção numa conversa interessantíssima sobre ondas sonoras:
— …e na área de telefonia, na qual tenho me especializado, trabalhamos também com a frequência das ondas, sabe? — ele dizia, empolgado.
— Oh, sim? Mas que interessante. Tenho estudado o assunto porque a flauta é muito aguda e não tem sido gravada nos estúdios como eu gostaria. Aí ontem eu fui…
"Hunf!", Temari se levantou da mesa, irritada. Shikamaru virado o tempo inteiro para o outro lado, enquanto ela ficava sozinha, olhando para o nada. Desta vez estavam apenas entre os amigos dele e se sentia deslocada.
— Bora pegar uma cerveja, Tema? — Choji, o melhor amigo de Shikamaru, convidou-a.
— Ufa, vamos.
Ele até tentou distrai-la, passou um tempo conversando bobagens e fazendo Temari rir no balcão do bar.
— Você gosta mesmo de filme italiano? Poxa, vamos ver algum juntos? Nunca arrumo companhia. Ninguém gosta.
— Pode ser — ela respondeu, distraída, sem tirar os olhos do namorado, tão entretido com a tal Tayuya que sequer percebeu sua ausência (assim ela cria). Aproveitou quando ele veio ao banheiro, cuja porta ficava ao lado de onde estava e, pedindo licença a Choji, foi falar com ele:
— É fogo, hein, Shikamaru? Não vai parar de conversar com essa ruiva boko-moko aí não?
— Linda, onde estava? Estou conversando com ela porque você sumiu.
— Ah, Nara, francamente! Não subestime a minha inteligência.
— Temari, não comece com essas coisas, por favor. Estamos num bar.
— …com a sua patota!
— Que é sua também, ora. Não estava aí de melhor amiga com o Choji? Chama a Ino pra conversar, você gosta tanto dela.
— Shika, eu quero ficar com o meu namorado!
— Poxa, não posso conversar com ninguém, Temari! Bastou ser mulher que estou dando em cima? “Francamente” digo eu, não seja problemática!
— O quê?! Putzgrila, cara!
— É isso mesmo, você está muito problemática!
— Problemática?! Ah, vá se fuder, Shikamaru! Você e sua corja de amigos ricos!
— Quê?! Temari! Não seja desrespeitosa, eu nunca falei assim com você!
— Como se me chamar de problemática fosse muito respeitoso, hein, Shikamaru? Passar bem!
— Tema! Aonde você vai?
— Pra puta que me pariu!
Shikamaru deixou-a ir desta vez. Era sempre assim: uma briga, Temari explodindo, ele indo atrás dela e implorando para que fizessem as pazes. Desta vez apenas ficou parado, vendo-a se afastar a passos duros. Estava cansado de correr atrás e implorar pelo amor daquela teimosa.
Tão teimosa que não o recebeu no dia seguinte. Nem no dia seguinte àquele. Estava com raiva e de orgulho ferido. "Problemática"?! A verdade é que Shikamaru era o único que nunca havia dito isso sobre ela, desde sua infância, por isso ficaram juntos tanto tempo. No dia em que ele disse, para Temari foi o fim.
Quando tinham três semanas sem se falar, Choji a convidou para um cinema, que ela aceitou de pronto. O orgulho começava a arrefecer, mas ela nem sabia como chegar novamente em Shikamaru depois de lhe negar contato por tanto tempo. Talvez seu melhor amigo pudesse ajudar.
Ao final do filme, decidiram tomar um café.
— Como você está, Tema?
— Estou bem, Choji.
— Ah, que bom. Fico feliz que vocês dois tenham seguido em frente.
— “Seguido em frente”?
— A família dele deu um empurrão, é claro. Compreensível, ninguém gostava de você, você sabe.
— Hã? Do que está falando, Choji?
— Ah, a questão financeira, né, Temari. Agora eles devem estar mais aliviados, já que os Nara e os Yamanaka trabalham juntos há anos. Inclusive eles construíram juntos nosso restaurante, sabia?
— Choji! De que droga você está falando?!
— Shikamaru e Ino estão namorando. Não sabia?
★★★
Quatro meses se passaram e tanta coisa aconteceu no período. Sua avó adoeceu, ela teve que largar a faculdade e foi trabalhar para ajudar a familia — o dinheiro do estágio não estava sendo suficiente.
Tentou transar com um cara. Nem poderia dizer que foi terrível, o cara era um pão, mas ela simplesmente não conseguiu. Não enquanto sua cabeça e seu coração só pensavam no maldito moreno de cabelo de abacaxi. Droga. Quanto tempo ainda demoraria para esquecê-lo?
Mesmo com o curso trancado, não foi com tristeza que Temari compareceu à formatura dos seus colegas de turma. Estava feliz por eles terem conseguido finalizar o curso. Sabia que sua amada Física a esperaria e um dia ela poderia voltar. Enquanto isso, se sentia orgulhosa de todos, especialmente de Tenten e Hinata. Ser mulher fazendo ciência não era nada fácil.
Foi quando chegou na mesa da família desta última que ouviu comentarem:
— Viram o filho de Shikaku? Foi convidado para trabalhar nos Estados Unidos.
— Quem diria, sempre foi tão preguiçoso.
— Os Nara sempre produzem gênios. É a sorte deles.
O coração de Temari acelerou dentro do peito, enquanto ouvia a família Hyuga rir. As famílias eram amigas de longa data e, se eles diziam, a informação era verídica.
Uma coisa era ele a achar problemática e arrumar outra namorada. Outra totalmente diferente era ir morar do outro lado do mundo! Como poderia haver uma vida em que ele nunca mais estaria, em que nem seria possível se trombarem pelas ruas? O coração de Temari não pôde conceber isso.
— Hinata — puxou a amiga de canto, assim que a encontrou na pista de dança. — Seus pais estavam falando que o Shikamaru vai para os Estados Unidos?
— Desculpe, Tema. Pensei que soubesse.
— Então você também sabe? Por que não me disse? Como eu poderia saber? Tem quatro meses que não falo com ele! Me explique agora, pelo amor de Deus!
Chegaram mais para o canto, num lugar em que o som não estava tão alto.
— Ele vai por esses dias, tenho certeza, porque hoje é a despedida dele. Infelizmente ele marcou no dia de nossa formatura, então não pudemos ir. Mas o Naruto até deu uma passadinha lá antes.
— Hina, pelo amor de Deus, me diga onde vai ser.
— Ora, Temari, é num bar pé de chinelo desses que o Shikamaru costuma frequentar com os colegas de diretório acadêmico. Não seja louca de ir lá, você está de longo.
Um trovão explodiu no céu ao mesmo tempo em que Temari apertou o braço de Hinata, o que a fez se assustar em dobro:
— Por favor, Hinata! Não interessa o que eu vou fazer, me diga onde vai ser essa despedida e me diga agora!
Hinata sabia que não adiantava discutir com Temari em seu modo "teimosia"— ela faria o que quisesse. Por inacreditável sorte do destino, o bar ficava quase na esquina do palacete onde a formatura se dava e Temari pôde ir andando até lá.
Ou correndo.
★★★
Depois de se perder em tantas memórias, a mente de Temari voltou ao presente. Viu Shikamaru colar a testa na sua depois do beijo intenso, sob a chuva forte que caía. Ouviu-o gritar:
— Tema, não tem como…
— Shika, por favor. Estados Unidos? É longe demais!
— Em que importa o país onde eu more? Nós já estávamos distantes de qualquer maneira.
— Mas eu podia lhe ver a qualquer momento!
— E mesmo assim não viu.
— … — Temari ficou em silêncio. Não tinha resposta para dar, era uma verdade. Poderia tê-lo visto a qualquer momento, mas o orgulho a fez ficar em silêncio por tanto tempo. O que poderia dizer agora? Foi ele quem quebrou o gelo:
— Nunca vi alguém tão bem vestida para tomar uma cerveja criticando os capitalistas.
Ela riu. Lá estava seu sarcástico e bobo namorado — esqueça isso — namorado de alguém, fazendo piadas inteligentes em momentos imbecis.
— Como vou viver sem suas piadas infames?
— E eu sem suas críticas ácidas?
Olhou no fundo daqueles olhos. Ele não a havia esquecido. Deixou o orgulho e a moral de lado e, de todo seu coração, pediu:
— Pelo menos não vá embora sem me amar uma última vez.
Shikamaru sentiu o pau latejar e as palavras de Temari, como sempre, lhe viraram uma ordem:
— Vamos sair daqui.
E foi assim que a despedida de Shikamaru foi bonita e emocionante, além de muito cheia de pessoas.
Só não contou com a presença do próprio.
★★★
Abriram a porta do quarto de motel feito loucos esfomeados, beijando-se sem controle, necessitados da língua e do corpo um do outro para viver. Tiraram as roupas quase sem raciocínio, o vestido bufante escorrendo pelos ombros, os seios fartos aparecendo desnudos, convocando a boca de Shikamaru até eles.
— Linda.
Chupou e mordeu os biquinhos marrons, vendo Temari arfar e jogar a cabeça para trás. Enquanto descia seu vestido, ela lhe soltava os cabelos. Ah, como o amava daquele jeito, as madeixas livres só para ela.
Puxou-o para cima, beijando-o ainda mais, sôfrega. Shikamaru correspondia, passando as mãos grandes por todo o seu corpo: costas, peitos, cintura. Carregou-a de pé e a deitou sobre a cama. Viu-a com uma calcinha de renda da qual não se lembrava. Estava também de cueca.
Roçou o pênis já duro sobre sua boceta, os tecidos ajudando e atrapalhando a fricção. Ambos já estavam tão molhados, apertados, suados. Tiraram juntos as peças íntimas de um jeito que nem saberiam descrever. Ele apenas conduziu o pau para a pequena abertura e se empurrou para dentro dela lentamente.
— Ooh, Shika…
— Gostosa.
Fizeram um papai e mamãe delicioso, gostoso, romântico, cheio de beijos, saudades e sussurros:
— Senti sua falta, linda.
— Eu muito mais.
Temari achou que devia se sentir culpada, vagabunda ou perdida por transar com o namorado de alguém, mas o sentimento era totalmente avesso. “Ele é meu”, dizia seu coração. Ver sua cara se contorcendo de prazer só realçava a certeza:
— Olha o que você faz comigo, maldita. Oh, vou gozar!
— Hunf! — A pressão aumentava, o pau entrando e saindo com velocidade de sua xota. Deus, como morria de tesão naquele insuportável. Por que tão lindo? Por que fodia tão bem?
Puxou os cabelos dele pra trás e sussurrou, babando seu pescoço:
— Goza, filho da puta. Mostra pra minha xana quem é o dono dela, vai.
Caralho de Temari bandida! Aquela carinha de santa, os cabelos amarrados em inocentes maria chiquinhas, estudando pra ser professora, e o que? Aquela boca suja maldita, de quem ele sentia ódio e paixão; a quem o tesão nunca havia diminuído um milímetro; causa de tantas de suas noites insones; homenageada em tantas solidões do seu quarto. "Porra, Temari, linda, minha linda. Toma cacete, sua puta, vou te rasgar no meio por ser tão gostosa e ter me abandonado, sua orgulhosa idiota!"
— Caralho, linda… oh!
— Goza, Shika. Vem ser meu.
— Oh! — Temari sorriu. Não havia ninguém que gozasse mais lindo que ele, os cabelos suados balançando e grudando no rosto, o peito magro porém definido, aqueles braços fortes se segurando para não cair sobre ela e ah, aquela carinha de desespero, de quem vai morrer, a razão sempre tão presente em sua personalidade, simplesmente perdida naquele instante. Deus, se fosse um sonho ninguém deveria acordá-la. — Eu sou seu.
Tensionou o corpo inteiro e então um relaxamento absurdo. O pau latejando dentro da vagina quente. Os dois sem ar. Temari sussurrou.
— Ino não vai gostar de saber disso.
— Hum?
— De que você é meu.
— Nunca deixei de ser, Tema. Não tem como voltar de onde não se foi, certo?
— Quê?
Ele se virou para o outro lado, se jogando sobre a cama. Esticou o braço até alcançar a calça pelo chão, procurou o cigarro e o esqueiro nos bolsos e pediu autorização para fumar ali mesmo. Temari não se importou.
— Sim, nos envolvemos. — Temari ficou calada, vendo a fumaça subir. Sentiu os olhos marejarem. — Mas foi rápido. Eu… Era visível que eu não te esquecia.
Para deixar tudo em pratos limpos, quis saber:
— Quanto tempo?
— Duas vezes — ele respondeu rapidamente. Em ambas eu falando de você pra ela.
— “Chorando”, você quer dizer — Temari entendeu e se levantou já rindo.
— Chorando não. Já te disse que homem não chora.
— É, não chora. Só se for o meu bebê chorão.
★★★
Ueeen! Ueeen!
— Ele não para de chorar, Temari! O que eu faço?
— Anda com ele até a sala e volta.
— Você disse que era só dar o leite.
— Vê-se que precisa de outra estratégia. E o gênio aqui é você.
Temari virou para o outro lado. Era sua vez de dormir aquela noite.
Muitos minutos depois ouviu o silêncio. Chegou perto do marido, por trás, olhando o anjinho ressonando no berço.
— Olhando assim ninguém diz que é uma peste — comentou.
— Posso dizer o mesmo sobre a mãe dele.
Temari beliscou Shikamaru enquanto saíam do quarto infantil de fininho.
— Se arrepende, Shika? — ela perguntou ao se sentarem na cama.
— Do Shikadai? Claro que não, isso é só uma fase.
— Não. De ter negado o convite estadunidense, de ter ficado aqui. São os melhores em telefonia, a área que você tanto ama. E agora aqui está você, construindo prédios em Brasília, uma cidade no meio do nada, sabe lá Deus se alguém vai acreditar numa capital longe do mar.
— Meus pais não estavam felizes com a minha viagem, sabe? Deixariam eu ir, claro, era uma grande oportunidade. Mas preferiam que eu investisse meu tempo nas nossas empresas. Você voltar para a faculdade me fez ficar, eu não te deixaria aqui. E essa cidade pode até não dar em nada, mas ganhamos muito dinheiro com esse projeto, você sabe. Acho que pela primeira vez agradeceram o fato de eu namorar você.
— Então não gostavam mesmo de mim? Era verdade?
— Difícil gostar de alguém que vivia brigando com seu filho, né, Tema? Tente entender.
— E agora? Eu não brigo mais, mas… eles sabem que eu te bato?
— Bate. Bate é a boceta na minha cara todo dia, sua louca.
— Sou. Louca por você.
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