História We are Better Together - Não estrague tudo

- Você notou alguma coisa de diferente na minha cabeça Chapman? – perguntou Nicky.

As duas estavam em um restaurante esperando por seus pedidos e a mãe de Amelia não conseguia desgrudar os olhos do celular. 

Piper até queria perguntar o que tanto ela estava vendo no aparelho, mas tinha medo da resposta que poderia receber. Só que a curiosidade estava quase ganhando do medo por causa das dezenas de reviradas de olhos e caretas que Nicky havia dado desde que chegaram ao restaurante.

Perdeu alguns segundos de sua vida tentando achar alguma coisa de diferente na cabeça de Nicky. O cabelo liso, com as pontas onduladas, dividido para o lado direito estava da mesma forma que ela se lembrava desde a última vez que as duas se viram. Até o loiro era o mesmo.

- Não me diga que você deixou a Sophia te usar como cobaia para aqueles produtos novos dela? – resolveu que não ia responder a pergunta diretamente. Vai que dava alguma resposta errada e com isso a aberturada para que Nicky começasse com suas intermináveis besteiras? Não que ultimamente ela não estivesse apreciando mais do que o normal as besteiras de Nicky, só que as vezes era difícil de acompanhar. – Ela queria usar uma tinta nova no meu cabelo que eu nunca nem tinha ouvido falar. Eu não deixei. Não acho que eu seria uma pessoa muito bonita careca.

- Você está louca? O cabelo da Polly só não deve ter caído porque ele deve ser tão ruim quanto ela. – Piper a olhou com desaprovação. Como se isso fosse fazer alguma diferença quando o assunto era a Polly ou qualquer outra integrante do clube das ex-presidiárias. – Mas eu não estou falando do meu cabelo! Você não está vendo o tamanho dos meus chifres? – apontou para a cabeça como se Piper pudesse ver realmente alguma coisa. – Acho que eu nem vou conseguir sair do restaurante. Meus chifres estão tão grandes que no Natal desse ano vou poder me fantasiar de rena.

Piper ficou a olhando sem entender. Queria poder fazer comentários condizentes com o momento, mas não sabia o motivo que as levou até aquele momento de coisas sem sentido que só Nicky conseguia dizer. 

Nicky bufou revirando os olhos. Odiava pessoas que não a entendiam. Isso significava que ela odiava o mundo inteiro, mesmo a Amy. 

Quase enfiou o celular nos olhos de Piper quando foi mostrar para ela o motivo de seus chifres darem até para colocar pisca-piscas.

Os segundos olhando para o celular de Nicky dessa vez foram muito bem gastos. Se Piper soubesse que era aquilo que a amiga estava vendo desde o segundo que entraram no restaurante teria perguntado bem antes do que se tratava.

Piper abriu um sorriso discreto. Ainda não podia mostrar descaradamente que ia se divertir com tudo que Nicky ia falar a partir do momento que ela comentasse o que tinha acabado de ver.

- Jelice? Que nome shipper feio é esse?

- Não é? – pegou o celular da mão de Piper. – Você sabia que elas tem um fandom? Que existe página no facebook contando toda a história de amor – fingiu ânsia – das duas?

- Ainda não sei como você não descobriu que ela era a ruiva maldita antes de conseguir com que ela fechasse contrato com a Floresta Encantada.

- Eu não fiquei pesquisando no Google “Alice Campbell e namorada”. Mas agora é só o que aparece quando você pesquisa isso no Google. É só o que aparece nos sites de fofocas. Você sabia que as duas voltaram? – fez uma pausa de segundos enquanto encontrava a notícia no celular. – “Nessa última terça-feira, a escritora Alice Campbell postou uma foto em seu instagram que causou alvoroço em todas as redes sociais. Na foto ela está com sua ex-namorada Jessica Lane. A legenda “Reencontro #Jelice” – que virou trends topics em menos de 10 minutos que a foto foi postada – fez com que os fãs especulassem se as duas reataram o namoro. Alice e Jessica estão separadas há mais de 10 anos e fontes confirmam que elas resolveram dar uma nova chance para o relacionamento”.  – jogou o celular em cima da mesa. Piper estava se divertindo mais do que imaginou com toda a revolta da amiga. Não poderia ter escolhido um dia melhor para sair para almoçar com ela. - Quando ela ia me avisar que nós nos separamos e que ela voltou com a Alice?

- Você sabe que esse é o site que posta toda semana que Brangelina se divorciaram, não sabe? – disse Piper que tinha pegado o celular da amiga em cima da mesa para ver em que site ela estava lendo aquele absurdo. – Se a Jess estivesse te traindo, ela não teria te avisado sobre o almoço com a Alice. – Nicky a encarou com uma expressão de tédio. – Ela não te avisou que ia almoçar com a Alice? – soltou uma gargalhada. – Eu tenho certeza que ela tem uma ótima explicação para isso.

- Claro que tem. Não vê esses chifres? – apontou novamente para sua cabeça e Piper se perguntou por que olhou novamente sendo que não tinha nada lá. -  Vai ficar lindo com aquela estrela prateada que a gente sempre coloca no topo da árvore de Natal.

- A Jess não está te traindo. – recebeu um olhar desacreditado de Nicky. - Semana passada também acharam que a Alex era a nova namorada da Alice.

- Ela pode muito bem estar transando com as duas. Quem não ia querer transar com Alice Campbell? – Piper fez uma careta. – Você é uma falsa lésbica, Chapman. Você não conta. – dessa vez a olhou ofendida. Ultimamente ela não estava contando para dar opinião sobre nada. – Espero que a salsicha não a chame de mãe, caso contrário vou ser obrigada a deserdá-la. Valentina deve estar se revirando no caixão nesse momento. Eu fui a outra mãe que ela escolheu para a Amy! Ela odiava a ruiva maldita!

- Você não conheceu a Valentina. – Nicky deu de ombros. Ouviu falar tanto da outra mãe de Amelia que era como se a conhecesse. – Agora vou ser obrigada a ler todos os livros da Alice. Acho que li só uns dois. Preciso descobrir quantas personagens são inspiradas na Jess.

- Vai se foder Chapman. – Piper abriu um sorrisinho. Por mais que Nicky estivesse incomodada sobre os boatos confirmados de sua esposa estar namorando a ex-namorada ruiva maldita, estava gostando de ver que Piper estava se divertindo com aquilo. Fazia muito tempo que não via Piper realmente se divertindo com a desgraça alheia. – Ah pelo amor de Deus! – soltou o celular de novo na mesa. – Tem um monte de twitter dedicado a Jelice – fez uma careta – seguindo o twitter da Floresta Encantada. Vou dar block em todo mundo!

- Vivi para ver a Nicky ciumenta dando as caras. – Piper disse com um sorriso divertido. Ia ganhar um novo “vai se foder” e um dedo do meio, mas a garçonete apareceu bem na hora com seus pedidos. A maioria das vezes em público Nicky fingia que tinha educação. – Descreva a Nicky ciumenta. Quero saber se ela pode ser a melhor amiga da Piper ciumenta.

- A Piper ciumenta precisa de internação. – respondeu com um sorrisinho debochado. – A Nicky ciumenta não existe porque eu não estou com ciúmes. Eu estou irritada o que é completamente diferente. Não é todo dia que você descobre que sua esposa está namorando outra. – sentiu um flash na sua cara. – O que você está fazendo porra?

- Marcando no meu celular esse dia histórico. – mostrou o celular com a foto de Nicky toda emburrada com a legenda “Dia Internacional da Nicky Nichols ciumenta”. – Vai ser até feriado na PoPi a partir do ano que vem.

- Por que nós somos amigas mesmo? Não tem nada que eu suporte em você, Chapman. – Piper deu de ombros rindo. – O almoço é por sua conta hoje. Vou até pedir o vinho mais caro do menu.

- Esse é o vinho mais caro do menu. – apontou para as taças na frente das duas. – Você pediu assim que chegamos e eu deixei porque achei que você ia pagar.

- Parece que o jogo virou, não é mesmo?

- Eu e a Alex vamos jantar juntas hoje. – não sabia exatamente como entrar naquele assunto, mas como tiveram um segundo de silêncio. Nicky só assentiu enquanto colocava mais um pedaço de seu bife na boca. – Não é bem um jantar. Nós vamos comer cachorro-quente e conversar sobre a guarda das crianças.

- Passa o molho para mim. – estendeu a mão e Piper entregou o molho para ela com uma expressão confusa. – O que?

- Você não vai fazer nenhum dos seus comentários?

- Eu não. – tomou um gole do vinho. – Toda vez que eu comento algo você fala que eu escolhi um lado e sempre é o lado da Vause, então é melhor eu ficar quieta. Não quero começar uma discussão com você. Discutir com você cansa mais do que passar a tarde inteira andando de patins com a Amy.

- Me desculpa. – disse sinceramente com o olhar baixo. Não cansava de se envergonhar por causa de tudo que fez as amigas passarem e mesmo assim todas permaneceram lá. – Eu sei que você não escolheu lado nenhum. Que você sempre quis o melhor para nós duas.

- Não, eu escolhi. Aqui é 100% Team Vause. – Piper riu e bateu com o guardanapo de pano em Nicky. Amava como ela sempre achava o momento perfeito para descontrair o ambiente. – Sabia que ela sempre paga meu almoço?

- O cartão de crédito da Floresta Encantada sempre paga o seu almoço você quer dizer?

- Como se você não usasse o cartão de crédito da PoPi para pagar os nossos almoços também. Tarde demais Chapman, eu já escolhi o meu lado.

- Será que vão nascer ruivos os filhos que a Jess vai ter com a Alice também? Será que elas vão apelidá-los de salsicha também?

- Vai se foder Chapman. – pegou o celular em cima da mesa e Piper ficou a observando sem entender o que tanto ela mexia no celular. – Vai se foder Chapman.

Piper entendeu menos ainda quando a amiga mandou ela ir se foder novamente sendo que ela nem havia dito nada. Ia contestar aquele vai se foder quando Nicky pousou o celular novamente na mesa e deu play. 

A loira fez uma careta quando ouviu que a amiga havia ajustado o celular para ficar repetindo o vai se foder que ela gravou.

- Assim eu posso comer sem ter que parar de mastigar para mandar você ir se foder. – disse com um sorrisinho cínico. – Por que eu nunca pensei nisso antes?

- Por que nós somos amigas mesmo? Não tem nada que eu suporte em você, Nichlos. – repetiu em tom debochado o que a amiga havia lhe dito minutos atrás.

Nicky só apontou para seu celular com o olhar enquanto comia mais um pedaço de seu bife.

Piper soltou uma gargalhada fazendo um negativo com a cabeça. Por que tinha se isolado esses meses todos mesmo quando podia ter momentos como esse sempre?

***

- Você precisa publicar esse livro! – exclamou Flaca entrando no escritório de Alex segurando o original da Carol.

A expressão de Alex era de duvida sobre qual original Flaca estava falando. Passou rapidamente pela sua cabeça um único original que a latina poderia estar se referindo, mas tinha certeza absoluta que não era ele. Abriu a gaveta de sua mesa só para ter certeza absoluta que o original que veio em sua cabeça não havia sido roubado de sua sala. No entanto, encontrou a gaveta vazia.

- Você roubou esse livro da minha sala?

- Eu? – se fez de desentendida. – Claro que não! Ele estava em cima da minha mesa, lá no meu escritório. Você acha mesmo que eu tenho cara de quem sai por ai roubando originais da gaveta da minha chefe? – a expressão de Alex a encarando era de completo tédio. Para que se dar ao trabalho de inventar uma desculpa quando ela sabia que Flaca estava mentindo? – Alex é sério! Esse livro é tudo que estávamos conversando semanas atrás sobre conquistar as mulheres que tem mais de 40.

- Eu tenho mais de 40 e jamais compraria um livro desses.

- Eu estou falando as mulheres com mais de 40 conservadoras. Nós tentamos fazer com que elas lessem nossos livros para as mulheres com mais de 40 e elas preferiram os livros da concorrência. Só falta elas, Alex!

- Desde quando você deixou de fazer parte da criação e virou editora também? – Flaca deu de ombros. Desde quando ela só fazia a sua função naquela editora? – Você terminou de ler o livro? Ele é horrível!

- Não... – Alex cruzou os braços, com um olhar superior de quem dizia que isso era uma justificava para não publicar o livro. – Mas eu vou terminar! É que eu fiquei um pouco enjoada no capítulo 6 com toda aquela narração de procedimentos médicos quando a Elisabeth resolve fazer o parto da mulher bem no meio da rua. Eu não sabia quea Carol era médica.

- Por que ela não é! – tomou o original das mãos de Flaca. – Vocês parem de roubar esse livro da minha sala. Nem eu terminei de ler ainda.

- Se você não publicar eu vou pedir para a Pâmela publicar. Ela está louco para ver o livro mesmo.

- Pâmela é editora do público teen. – mandou um sorrisinho debochado para Flaca. – Ninguém vai publicar esse livro enquanto eu não terminar de ler.

- Então ele tem chances de ser público? – a animação de Flaca era fora do comum. Será que Carol tinha jogado algum feitiço no livro que fazia todas as pessoas que liam continuar lendo mesmo o livro sendo horrível? – Já vou começar a pensar nas capas.

- Tem multa se quebrarmos o contrato com a Alice? – foi a pergunta que Nicky fez assim que entrou no escritório de Alex. Pelo jeito aquele era o dia que a morena teria que lidar com a loucura de todos os seus funcionários. – Por que não importa quanto seja. Eu tiro do meu bolso e pago, mas nós temos que demiti-la. – Alex ia abrir a boca para contestar e citar todos os motivos que ela não iria demitir a Alice, mas Nicky foi mais rápida. – Isso não é ciúmes, tudo bem? Só que eu não vou viver com essa humilhação dele ter assinado com a nossa editora e ter roubado a minha esposa nesse processo. Ela usou a Floresta Encantada para chegar até a Jess. Eu tenho certeza!

- Desde quando você acredita em fofoca Nicky? A Jess te avisou sobre o almoço. – Nicky fez uma expressão de tédio. Por que todo mundo achava que a Jess se deu ao trabalho de avisá-la sobre o almoço? Se tivesse avisado o chifre não estaria pesando tanto. – Ela não te avisou que ia almoçar com a Alice? – soltou uma gargalhada. – Eu tenho certeza que ela tem uma ótima explicação para isso.

- Espero que os enfeites de Natal estejam baratos esse ano porque não vou querer enfeitar meus chifres com enfeites velhos.

- Até que elas fazem um casal bonitinho. – disse Flaca olhando para o celular. Se olhares matassem com toda certeza Flaca teria virado pó naquele momento. – Desculpa, mas o twitter inteiro acha.

- Seus funcionários não trabalham mais não? – disse Nicky olhando para Flaca para ver se assim ela entendia a indireta enquanto sentava na cadeira de frente para Alex.

- Aparentemente não. – respondeu olhando para Nicky para ver se assim ela entendia a indireta.

- Por que você não disse que ia jantar com a Chapman?

- Vocês vão voltar? – Flaca perguntou animada enquanto se sentava ao lado de Nicky.

- Desde quando você se tornou essa pessoa feliz? – perguntou Nicky. Flaca ergueu os ombros. Também não sabia a resposta para aquela pergunta. – Você continua falhando com os góticos. Então...

- Como você sabe que eu vou jantar com a Piper?

- Esqueceu que eu sou 100% Team Chapman? – Alex franziu o cenho, descrente. Desde quando ela tinha escolhido um lado? – Vause mantenha as expectativas lá no chão. Não estrague tudo.

- Que expectativas? Nós vamos conversar sobre a guarda das crianças.

- Exatamente! – Flaca tomou a frente dessa vez. – Só porque tem tipo uma semana que vocês não brigam não significa que está tudo bem com Vauseman. – Nicky assentiu concordando com o que a amiga dizia. – Nós somos Team Vauseman, mas né...

- Nós só vamos conversar sobre a guarda das crianças. Você e a Jess deveriam fazer o mesmo Nicky. Daqui a pouco Amy vai começar a chamar a Alice de mãe, ainda mais que elas tem a mesma cor de cabelo.

Com a cara emburra, Nicky levantou da cadeira e se encaminhou até a porta do escritório de Alex. O sorriso de quem estava se divertindo com tudo aquilo de Alex era extremamente irritante. Só ela que tinha o direito de se divertir assim com a desgraça dos outros. Mas, antes de deixar o escritório, Nicky deu play em seu celular.

- Vai se foder Chapman!

Teve que lidar com a expressão confusa tanto de Alex quanto de Flaca pelo áudio.

- Não se preocupem, eu vou gravar um sem o nome para usar com todas vocês. – e deixou a sala.

***

- Por que você está sorrindo? – Polly perguntou com estranheza assim que entrou na sala de Piper. – Me coloca na conversa também se você estiver enchendo o saco da Nicky por causa das matérias de que Jelice voltaram.

- Era a Alex perguntando se eu vou mesmo querer purê no meu cachorro-quente. – pousou o celular em cima da mesa. – Se ela tivesse provado aquele cachorro-quente que eu comi em São Paulo quando fui na Comic Con com o Devon ela não ficaria mandando emoji com cara de nojo sempre que eu falo que quero cachorro-quente com purê.

- Se eu estivesse grávida com toda certeza teria vomitado em você agora. – sentou na cadeira de frente para a mesa de Piper. – Por favor, comporte-se nesse jantar. – Piper cruzou os braços encarando a amiga com uma expressão de tédio. Desde quando ela não sabia mais como ser civilizada a ponto de pedirem para ela se comportar em um jantar com sua futura ex-esposa?. – Eu só não quero ver vocês duas brigadas. Eu já estou cansada de ver vocês duas brigadas. Não ligo para essa porra de divórcio, mas eu quero o meu clube das ex-presidiárias unido.

- Seu clube? – perguntou em tom divertido. – Não se preocupe, eu não vou mais acabar com a união do seu clube, tudo bem? – Polly assentiu muito agradecida por isso. – Vou criar um grupo para mandarmos prints de todas as notícias que saem de Jelice. Maritza já me mandou vários links.

- Cria logo e adiciona o Devon também. Se não fosse por ele eu ainda estaria trabalhando em relatórios chatíssimos ao invés de ler todas as notícias e comentários do twitter.

***

- Não me diga que você está fazendo o jantar. – disse Jess com falsa surpresa ao encontrar Nicky na cozinha trajando um avental. Deu um beijo na esposa. – O que foi que você fez?

- Eu não fiz nada! – retrucou ofendida com a acusação. Se tinha alguém que havia feito alguma coisa errada esse alguém não era ela. – Você sabe como eu amo me sentir uma chefe de cozinha quando estou fazendo meu cereal pré-jantar. – colocou o leite na tigela com cereal. – E você me obriga a usar avental sempre que vou lavar a louça.

- Cadê a Amy?

- Está brincando na vizinha. Espero que ela não quebre nada dessa vez porque acho que a mãe da Emily está nos extorquindo. Nunca vi querer 50 dólares em um vaso que eu encontrei por 20 dólares. Mas me conte... – trouxe Jess para mais perto de si. – Como foi o seu dia?

- Normal. – deu de ombros se desvencilhando de Nicky e caminhando até a geladeira. – Até a cirurgia que eu ia fazer hoje foi desmarcada porque meu paciente resolveu ir para o Caribe. – pegou a jarra de suco. – E o seu dia. Como foi?

- Ótimo! – abriu um sorriso forçado. – Eu almocei com a Piper, mas eu te contei que ia almoçar com ela, não contei? – Jess assentiu. – E você? Teve algum almoço que eu precise saber...?

- Nicky por que você não pergunta logo sobre o meu almoço com a Alice?

- Por que eu não deveria perguntar, você deveria ter me dito! Só que ao invés disso eu fiquei sabendo desse almoço através de todos os sites de fofocas existentes. Fizeram um grupo só para ficarem mandando print das notícias que saiam, sabia? Acho que em algum desses prints tem até o dia do casamento Jelice. – fez uma careta. Pensou que melhoria, mas com o passar do dia só ficou pior dizer o nome do ship. – Por que você não me disse que ia almoçar com a Alice?

- Ela apareceu no consultório me chamando para almoçar. Eu ia te contar quando eu voltasse do almoço, mas os paparazzis fizeram isso antes de mim. Me desculpa.

- Afinal, qual é a de vocês duas, Jessica? Para alguém que você mandou ir se foder, vocês estão muito amigas. Amigas não, acho até que eu cheguei a ler a frase “O casal mais lindo da última década”. Você ainda gosta da Alice é isso?

A resposta de Nicky, seja lá qual fosse, teria que esperar, pois Jess foi salva por Amelia entrando no apartamento segurando um gato.

- Pelo amor de Deus, Amy! – exclamou Jessica com uma cara de nojo. – O Gambá não!

- Mamãe, ele não tem uma casa para morar, então por que ele não pode morar com a gente?

- Ele tem uma casa para morar sim. A Jane precisa parar de querer dar esse gato podre para todas as crianças que ela encontra no prédio só porque ela não aguenta com o cheiro. – guiou a filha pelos ombros até a porta do apartamento. – Você vai precisar de uns 5 banhos para sair o cheiro desse gato.

- Por que eu não posso ter um gato de estimação?

- Nós podemos ir na loja e comprar um se você quiser.

- Não, eu quero o Gambá.

- Amy... – balançou a cabeça em negativo apertando o botão do elevador. A filha ainda estava querendo chamar a atenção por causa de toda a descoberta da adoção. Pelas contas de Jess esse era o último dia. – Você quer um cachorro? Mamãe compra um cachorro para você.

- Eu não quero um cachorro. Todo mundo tem um cachorro e eu não sou todo mundo. – Jess assentiu. Pelo menos isso não precisaria ensinar para Amy. – Eu quero um jacaré.

- Onde que nós vamos colocar um jacaré no nosso apartamento?

- Ele pode morar na piscina.

Nicky observou as duas entrando no elevador da porta do apartamento enquanto comida sua tigela de cereal. Até queria rir por causa de toda a discussão infinita que Jess e Amelia teriam até que a filha desistisse de querer ter um jacaré ou qualquer outro animal de estimação que ela não poderia ter, mas ela estava preocupa com o motivo de Jess estar fugindo do assunto “Jelice”. 

Sim... O que tinha acabado de acontecer ali era Jessica Lane fugindo de um assunto e, dessa vez, ela não fazia ideia do motivo. A não ser que toda a sua conversa sobre chifres tivessem fundamento.

***

- Então a cada 3 dias da semana eles mudam de mãe? – disse Alex com o cronograma quase pronto que tinha em suas mãos. Piper assentiu. – Um mês e meio de férias para cada uma. – outra assentida. 

Piper estava muito ocupada para falar já que estava sujando toda a bancada de Alex com cachorro-quente. A cada mordida que ela dava era um sorriso que Alex abria. A loira conseguia ser pior do que as crianças quando estava comendo algo que gostava. Tinha quase certeza que ela herdou isso de sua estadia em Litchfield.

Como muitos dizem: Por incrível que pudesse parecer, até o momento, o jantar estava correndo tranquilamente. 

Foram muitas discussões até chegarem a um acordo sobre a divisão de dias das semanas que ficariam com os filhos, mas todas as discussões que tiveram lembravam quando elas iam as compras e discutiam sobre o que os filhos poderiam ou não poderiam levar. 

As discussões lembravam quando elas não concordavam sobre qual restaurante pedir comida ou a que restaurante ir quando nenhuma das duas estava a fim de cozinhar. As discussões lembravam quando elas estavam assistindo a alguma série e uma concordava com a atitude do personagem e a outra não. Típicas discussões de quando elas eram casadas e felizes. Em nenhum momento as discussões passaram disso e elas se sentiram bem. A nuvem cinza continuava bem longe da cabeça das duas e isso era muito bom.

Elas até riram – o maior motivo eram as notícias sobre Jelice e a cara emburrada de Nicky. Mas as risadas eram sinceras, como fazia um bom tempo que elas não riam quando estavam juntas. 

Por alguns instantes Alex pôde ver aquela Piper que existia antes da morte de Christopher. Mas, como jurou para si mesma que não ia fazer daquele jantar mais do que era, resolveu guardar todos os seus sentimentos para si mesma. Se aquilo era um começo para que elas voltassem a se encontrar, usaria ele mais para frente, quando não estivessem conversando sobre o futuro das crianças enquanto Piper estivesse com toda a besteira de divórcio.

- Agora precisamos resolver sobre os feriados. – colocou o cronograma em cima do balcão e, no mesmo instante, Piper derrubou purê em cima dele. – Piper! – exclamou segurando uma risada.

- Desculpa! – pegou um guardanapo para limpar o purê que estava escorrendo de sua boca. – Você deveria experimentar. – estendeu a metade do cachorro-quente que segurava para Alex. A morena fez uma careta. Não comeria aquela marmota nem se pagassem. – Não sabe o que está perdendo. – deu de ombros. – Acho que podemos alternar os feriados. Um ano de cada uma.

Como se elas fossem ficar separadas por mais um ano.

- Ou podemos passar o feriado juntos. Eles amaram o passeio ao zoológico. – percebeu um olhar receoso de Piper quando sugeriu aquilo. – O que foi? Também estou expulsa dos Natais de família? Eu sei que no momento a Macarena está suspensa por causa de nós duas, mas...

- Não! É claro que você não está expulsa dos Natais. Mas... – fez uma pausa. Dizer aquilo seria mais difícil do que imaginou. Seu estômago chega embrulhou só de imaginar o que iria colocar em palavras. – Acho que no dia que você arrumar uma namorada nova ela não vai querer passar o Natal com toda a família.

- A Michelle e o Larry passam o Natal com a gente, então não vejo problema nenhum. E eu não vou arrumar namorada nenhuma Piper.

- Eu só estou dizendo...

- Oh meu Deus! – Alex praticamente murchou no banco do balcão. – Quem é a pessoa, Piper?

- Que pessoa? – perguntou realmente sem entender. Alex não precisou responder a pergunta, sua expressão fez com que Piper entendesse perfeitamente ao que ela estava se referindo. – Pelo amor de Deus, Alex! – a expressão que Piper fez era como se tivesse lido um dos piores pensamentos que Alex já teve na vida. – Não tem ninguém! Jesus! Eu só estou dizendo que pode acontecer.

- Da minha parte não pode, então por mim podemos continuar passando o feriado juntos, caso venha a acontecer da sua parte nós sentamos novamente e conversamos sobre isso, tudo bem?

- Tudo bem. – era melhor concordar porque a última coisa que queria era estragar um jantar que estava tão bom. Mesmo porque nem tinha nada para discordar referente aquilo. – As reuniões de pais óbvio que vamos continuar indo juntas e você que não arrume desculpa para não ir em alguma.

- Arranjar desculpas? Eu amo reuniões de pais, você sabe disso. Amo do jeito que algumas mães nos olham “como duas lésbicas podem criar crianças tão adoráveis enquanto eu, no meu lindo casamento hetero, criei essa peste que só me faz passar vergonha nas reuniões?”. É minha parte favorita de todas as reuniões de pais.

- Amo saber que o desempenho dos seus filhos na escola vem sempre em segundo lugar. – disse em tom debochado arrancando risos de Alex. – Acho que terminamos. – Alex assentiu com sua atenção voltada para o cronograma. No fundo ela não estava feliz por ter que fazer aquilo, mas continuaria sendo paciente até o momento de poder rasgar aquela porcaria. – Se quiser os 3 dias podem começar com você.

- Tem certeza? – Piper fez um positivo com a cabeça. Era o mínimo que podia fazer depois de tudo. – Tudo bem. – pegou o cronograma em cima do balcão e o grudou na geladeira com um imã. – Eu disse que não precisávamos de advogados para isso.

- Falando nisso...

- Terremotos... – não, ela não ia entrar no assunto divórcio naquela noite, não ia mesmo. – Como está a nossa paisagem?

- Não conseguimos terminar o lago ainda. – Diane soltou um suspiro. – Você disse que ia ajudar a gente.

- A mamãe pode ajudar também. – estendeu uma das peças do quebra-cabeças para a Piper. – Você sabe como monta um quebra-cabeças, não sabe?

- Claro que eu sei. – ajoelhou ao lado de Lucas. – E essa peça vai aqui. – encaixou a peça que Luc havia lhe dado terminando de montar um dos pássaros da paisagem.

- Eu não falei que ela era boa em montar quebra-cabeças? – disse Alex com um sorriso ao ver a felicidade dos filhos. – Uma hora de quebra-cabeça antes de vocês irem dormir.

- Nós vamos dormir aqui? – os dois perguntaram juntos recebendo em resposta um positivo das duas mães. – Licth e Lolita também? – perguntou Lucas. Os cachorros latiram em resposta.

- Vamos montar logo então. – disse Diane pegando mais uma peça do quebra-cabeças. 

***

O quarto das duas nunca esteve tão silencioso como naquela noite. A noite inteira Jess fugiu do assunto sobre o seu almoço com Alice. Nicky não era uma pessoa paranoica. Poderia vir com umas histórias ou birras doidas uma vez ou outra, mas paranoica era algo que ela não era. Confiava na esposa. Sabia que ela nunca a trairia, mas todo aquele silêncio de Jess estava fazendo com que ela pensasse o contrário. E isso estava a irritando. Normalmente quem tinha que adivinhar pensamentos naquela casa era Jessica, não ela. 

- Eu não estava te traindo. – Jess finalmente disse. Já tinha passado o dia inteiro mal por causa daquela confusão e imaginava a bagunça que deveria estar a cabeça de Nicky por causa disso, portanto não era justo fazer a esposa ir dormir com toda essa confusão. – Eu só não sabia como te dizer isso porque eu vi como você ficou quando descobriu que a Alice é a ruiva maldita.

- Eu não ia fazer um escarcéu por causa desse almoço. Nós vivemos em um círculo de amizade que você virou até irmã da esposa da sua ex-namorada, quero dizer...

- Não é sobre o almoço que eu estou me referindo, Nicky. – se ajeitou na cama. Nunca pensou que chegaria o dia que teria que contar aquela história. – Eu não mandei a Alice ir se foder. – Nicky fez uma expressão de “sério mesmo?”. – Não com essas palavras e muito menos no dia que ela me chamou para jantar e pediu desculpas por ter terminado comigo por eu ter sido presa. No dia do jantar nós transamos. – obviamente que Nicky ficou surpresa com o que ouviu e isso ficou visível em sua expressão. – Eu pensei que ela tinha mudado. Me deixei encantar por aqueles olhos e todas as palavras bonitas. – soltou um riso de nervoso. – Ela é uma escritora, claro que vai saber todas as palavras lindas do mundo para conquistar alguém. Ela lembrou das nossas conversas sobre casamento e filhos, como eu poderia não levar isso a sério? – seus olhos baixaram por um segundo e, naquele momento, Nicky estava se sentindo a pior pessoa do mundo por ter pensado que Jess estava a traindo. Isso porque ela nem tinha chegado na pior parte da história ainda.  – Só que uma semana depois lá estava a notícia de que nós duas tínhamos voltado e a divulgação do seu mais novo livro. Eu sempre odiei como ela usava nosso namoro para divulgar seus livros. Às vezes eu acho que ela só se assumiu publicamente por saber que isso faria diferença nas vendas dos livros. Então eu terminei com ela e disse que não queria mais vê-la. Eu não usei as palavras “vai se foder”, mas tenho certeza que ela entendeu o recado. Só que ela sempre foi uma pessoa que eu gostei, sabe? Eu só tenho ótimas lembranças dela, tirando o fato dela ter me largado na prisão porque isso causaria publicidade ruim a ela, mas... Eu não sei. Quando eu a vi na Floresta Encantada eu não tinha raiva, então quando ela me chamou para almoçar, eu pensei: “Por que não? Já tem 10 anos”. Me desculpa, eu sei que deve ter sido horrível ler o dia inteiro que nós duas voltamos, mas nós não voltamos. Nunca vamos voltar. Por que eu sou muito bem casada e eu tenho certeza que se eu estivesse com a Alice no dia que eu te encontrei no hospital, eu largaria ela para ficar com você porque você já tinha mexido comigo com todas aquelas cantadas de pedreiro online.

- Não eram cantadas de pedreiro online! – exclamou ofendida. – Aquelas cantadas, se eu divulgasse em algum site de cantadas, iriam fazer muitas pessoas deixarem de ser encalhadas. – Jess riu. – Não acredito que minha amizade com a Alice acabou. Você e seus relacionamentos complicados.

- Você não precisa parar de trocar memes com a Alice só por causa da nossa história. E, dessa vez, ela disse que não teve nada a ver com essa confusão. O assessor dela que vazou a nota. Ela queria até te pedir desculpas pessoalmente.

- E você acreditou? – Jess ergueu os ombros. – Não, eu não posso ser amiga de alguém que deixa Jessica Lane escapar duas vezes. Posso trocar memes com outra escritora.

- Eu te amo. – Nicky abriu um sorriso e a beijou. Depois de tudo que ouviu a esposa não precisava nem ter dito as três palavras. Confiava no amor de Jess desde sempre e, no fundo, estava envergonhada pelos minutos em que desconfiou. – Sério mesmo que fizeram um grupo só para ficarem te mandando print?

- A Piper criou o grupo. – Jess a encarou descrente. – É sério. Ela está mais ridícula que o normal, também não posso mais continuar sendo amiga dela.

- Aham... – o sorriso divertido que Jess abriu era um dos mais adoráveis que Nicky já tinha visto na vida. – Claro. – beijou a esposa.

- Mamãe. – o tom de Amelia era manhoso. 

As duas imediatamente pararam de se beijar. Felizes elas não ficaram porque tinham outros planos, mas sabiam que a frustração ia passar em questão de segundos.

- Que animal você veio pedir agora? – perguntou Jess.

- Nenhum. – deitou entre as duas na cama. – Eu acho que eu ainda to com o cheiro do Gambá. - as duas riram da careta que Amelia fez enquanto cheirava seus braços. Ela teve que tomar muito mais do que cinco banhos para que o cheiro do gato saísse dela. – Eu quero saber quando que o meu irmãozinho vai chegar.

- Pergunta para a sua mãe. – Jess olhou para a Nicky que desviou o olhar. Novamente ela fugiria do assunto. – Ela que é a responsável pela encomenda.

- Ainda não tem previsão. – voltou seu olhar para a Jess. No final das contas a resposta era mais para a esposa do que para a filha. - Por enquanto vai continuar sendo só você. 

Começou a fazer cócegas na garota e Jess juntou-se a ela, arrancando as gargalhadas mais gostosas da filha.

Pelo visto a árvore de Natal seria enfeitada normalmente esse ano.

***

- Você ameaçou as crianças? – Alex perguntou em tom divertido. - Por que fazia tempo que elas não dormiam tão rápido.

- Eu não preciso ameaçá-las. Minha presença já é o suficiente. – respondeu no mesmo tom. – Me desculpa. – continuou enquanto levantava do sofá. Esse era o dia que ela estava esperando segundos de silêncio para dizer tudo que precisava dizer. – Já tínhamos passado da fase em que eu não deixava você passar algum tempo com eles e mesmo assim, depois que eu te expulsei de casa... – ela encolheu os ombros. – Eu só...

- Não queria me ver. – Piper assentiu um pouco surpresa. A conexão continuava lá. – Eu sei. Eu só não entendo o que mudou.

- Eu não sei. Pode ter sido os xingamentos da sua amiga Polly, mas naquele dia no zoológico eu sabia que nós podíamos fazer isso, depois teve a reunião do clube... Eu só sabia que nós íamos ficar bem.

Essa não era necessariamente a definição de bem que Alex queria, mas no momento aceitaria sem problema nenhuma. Ainda não estava fazendo daquele jantar mais do que realmente era.

- Bom... Eu fico feliz que agora você quer me ver. – o tom era descontraído. 

Piper queria saber como ela conseguia ser assim mesmo depois de tudo. Assim ficava difícil seguir firme com a decisão que tinham tomado.

- Eu pego eles na escola amanhã, certo? – perguntou enquanto abriu a porta do apartamento. Alex fez um positivo com a cabeça. – Até amanhã, então.

- Obrigada. – Piper ficou a encarando sem entender o motivo do agradecimento. – Por ter feito isso. Pelo jantar. Eu não sei... Só obrigada.

- Eu não fiz nenhum deles sozinha. – abriu um pequeno sorriso. – A sua sala também merece ser bagunçada.

Mais nenhuma palavra foi dita. Na verdade, nenhuma palavra precisava realmente ser dita. Os sorrisos tímidos que elas trocaram até Piper chegar ao elevador já diziam mais do que qualquer coisa.

Claro que elas conseguiam fazer aquilo. 

Claro que elas estavam bem.

Sempre era assim quando elas estavam começando a encontrar realmente o caminho de volta de uma para a outra.