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História Where she was - Capítulo 10


Escrita por: ljauregx

Notas do Autor


Me desculpem qualquer erro.

Capítulo 10 - Capítulo 10


Três dias após a Lauren ter sumido
A polícia não iria encontrar Lauren a não ser que alguém quisesse que ela fosse
encontrada. Isso era claro. Tudo o que era verde e marrom havia sido vasculhado: quilômetros do enlameado rio Mississippi, todas as trilhas e pistas de caminhada, nossa triste coleção de bosques esparsos. Se ela estava viva, alguém precisaria devolvê-la. Se
estava morta, a natureza teria de entregá-la. Era uma verdade palpável, como um gosto
azedo na ponta da língua.



Eu tinha dez boas horas sem obrigações com que me ocupar. Meu carro estava sendo devolvido a mim — depois de vasculhado, aspirado e decalcado, suponho —, então peguei uma carona até a delegacia com uma voluntária mais velha, uma daquelas avós
agitadas que pareciam ligeiramente nervosas ao ficarem sozinhas comigo.
— Estou apenas levando a Sra. Cabello à delegacia, mas estarei de volta em menos de meia hora — dissera a uma das amigas. — Não mais de meia hora.
Gilpin não transformara o segundo bilhete de Lauren em evidência; ficara animado
demais com a lingerie para se preocupar. Entrei em meu carro, abri mais a porta e fiquei
sentada enquanto o calor saía, reli a segunda pista de minha esposa: Imagine: estou louca por você. Meu futuro é tudo menos incerto com você. Você me trouxe aqui para que eu ouvisse sua conversa maneira. Sobre suas aventuras de menina: jeans baratos e viseira que se dane todo mundo, deles nós vamos nos livrar. E vamos roubar um beijo... Fingir que acabamos de nos casar.
Era Hannibal, Missouri, terra da infância de Mark Twain, onde eu trabalhara nos verões quando jovem, onde circulara pela cidade vestida como Huck Finn, com um velho chapéu de palha e calças com rasgos artificiais, sorrindo maliciosamente enquanto
convencia as pessoas a visitar a Ice Cream Shoppe. Era uma daquelas histórias que você
pode passar um jantar inteiro contando, pelo menos em Nova York, porque ninguém
consegue superá-la. Ninguém nunca podia dizer: Ah, é, eu também.
O comentário sobre a “viseira” era uma piada interna. Quando eu contara a Lauren pela primeira vez que interpretava Huck, havíamos saído para jantar, estávamos em nossa segunda garrafa de vinho e ela estava adoravelmente embriagada. O grande sorriso e as
bochechas coradas que ganhava quando bebia, inclinando-se sobre a mesa como se eu tivesse um ímã em mim. Ela estava me perguntando se eu ainda tinha a viseira, se eu a colocaria para ela, e quando perguntei por que em nome de tudo o que era mais sagrado ela achava que Huck Finn usava uma viseira, ela engoliu em seco uma vez e disse: “Ah, eu
quis dizer chapéu de palha!” Como se fossem palavras equivalentes. Depois disso, sempre que víamos jogos de tênis, elogiávamos os chapéus de palha esportivos dos jogadores.
Mas Hannibal era uma escolha estranha para Lauren, já que não me lembro de termos passado um momento particularmente bom ou ruim ali, apenas um momento.
Lembro-me de nós dois passeando quase um ano inteiro atrás, apontando para coisas e
lendo cartazes e dizendo “Isso é interessante” e o outro concordava, “É mesmo”. Eu estivera lá desde então sem Lauren (minha veia nostálgica irreprimível) e tive um dia glorioso, um dia de sorriso largo, de bem com a vida. Mas com Lauren fora parado, mecânico. Um pouco constrangedor. Recordo-me de, em dado momento, começar a
contar uma história boba sobre uma viagem de infância até lá, quando a vi revirar os olhos, e fiquei secretamente furiosa, passei dez minutos apenas curtindo minha raiva —
porque àquela altura do nosso casamento eu estava tão acostumada a ficar com raiva dela
que a sensação era quase agradável, como mastigar cutícula: você sabe que deve parar,
que na verdade aquilo não é tão bom quanto você pensa, mas não consegue.
Superficialmente, claro, ela não vira nada. Apenas continuamos a andar, a ler placas e apontar.
Era um lembrete bastante horrível da carência de boas lembranças que tínhamos desde nossa mudança, que minha esposa tivesse sido obrigada a escolher Hannibal para sua caça ao tesouro.
Eu cheguei a Hannibal em vinte minutos, passei pelo glorioso tribunal dos anos dourados, que tinha então apenas um restaurante de asas de frango no porão, e me
desloquei por uma série de negócios fechados — bancos arruinados e salas de cinemas
mortas — na direção do rio. Estacionei em uma vaga bem no Mississippi, bem na frente do
barco fluvial Mark Twain. O estacionamento era gratuito. (Eu nunca deixava de me encantar com a novidade, a generosidade do estacionamento grátis.) Estandartes do homem de juba branca pendiam flácidos de postes de luz, cartazes se enrolavam sob o calor. Era um dia quente do tipo secador de cabelos, mas ainda assim Hannibal parecia
perturbadoramente calma.
Enquanto eu caminhava pelos poucos quarteirões de lojas de suvenir — colchas, antiguidades e caramelos —, vi mais placas de vende-se. A casa de Becky Thatchers estava fechada para reformas, a serem custeadas por dinheiro que ainda tinha de ser arrecadado.
Por dez pratas você podia escrever seu nome na cerca caiada de Tom Sawyer, mas havia poucos interessados.
Sentei-me no degrau da frente de uma loja vazia. Ocorreu-me então que eu havia trazido Lauren para o fim de tudo.
Estávamos literalmente experimentando o fim de um modo de vida, expressão que eu aplicara apenas a tribos da Nova Guiné e a sopradores de vidro dos Apalaches. A recessão fora o fim do shopping. Computadores foram o fim da fábrica Blue Book.
Carthage falira; sua cidade-irmã, Hannibal, perdia espaço para atrações turísticas mais
brilhantes, barulhentas e animadas. Meu amado rio Mississippi estava sendo comido de trás para a frente por carpas asiáticas que abriam caminho rio acima até o lago Michigan.
Filha Exemplar chegara ao fim. Era o fim da minha carreira, da carreira dela, o fim do meu pai, o fim da minha mãe. O fim do nosso casamento. O fim de Lauren.
O chiado fantasma da buzina do navio a vapor soou, vindo do rio. As costas da minha camisa estavam molhadas de suor.
Obriguei-me a levantar. Obriguei-me a comprar o ingresso para o passeio.
Caminhei pela rota que Lauren e eu havíamos seguido, minha esposa ainda ao meu lado em
minha mente. Também estivera quente naquele dia. Você é BRILHANTE. Em minha
imaginação, ela caminhava ao meu lado, e dessa vez sorria. Meu estômago revirou.
Caminhei mentalmente com minha esposa, seguindo o principal roteiro turístico.
Um casal grisalho parou para espiar dentro da casa de Huckleberry Finn, mas não se deu o trabalho de entrar. No final do quarteirão, um homem vestido como Mark Twain — cabelos brancos, terno branco — saiu de um Ford Focus, se espreguiçou, olhou para a rua vazia e entrou em uma pizzaria. E então lá estávamos nós, no prédio de tábuas que fora o escritório do pai de Samuel Clemens. A placa na frente dizia: J.M. Clemens, Juiz de Paz.
Vamos roubar um beijo... Fingir que acabamos de nos casar.
Você está fazendo pistas tão legais e fáceis, Lauren. Como se realmente quisesse que
eu as encontrasse, para poder me orgulhar de mim mesmo. Continue assim e vou quebrar meu recorde.
Não havia ninguém lá dentro. Fiquei de joelhos nas tábuas empoeiradas do piso e olhei sob o primeiro branco. Quando Lauren deixava uma pista em um local público, sempre a prendia com fita embaixo das coisas, entre o chiclete grudado e a poeira, e sempre se justificava, porque ninguém gosta de olhar debaixo das coisas. Não havia nada sob o
primeiro banco, mas uma ponta de papel pendia do banco atrás desse. Fui até lá e peguei o envelope azul-Lauren, um pedaço de fita adesiva grudado nele.
Oi, querida esposa,Você encontrou! Mulher brilhante. Talvez ajude que eu tenha decidido não transformar a caça ao tesouro deste ano em uma torturante marcha forçada
por minhas misteriosas lembranças pessoais. Peguei uma dica com seu amado Mark
Twain:“O que deveria ser feito ao homem que inventou a celebração de aniversários de casamento? Só assassinato seria leve demais.”Finalmente saquei o que você disse ano após ano, que esta caça ao tesouro deveria ser um momento para celebrarmos um ao outro, não um teste para saber se você se lembra de cada coisa que eu penso ou digo ao longo
do ano. Parece algo que uma mulher adulta compreenderia sozinha, mas... Acho que as esposas estão aí para isso. Para apontar o que não conseguimos ver sozinhas, mesmo que
demore cinco anos. Então eu queria aproveitar o momento agora, no local onde Mark
Twain passou a maior parte da infância, e agradecer a você pelo seu HUMOR. Você realmente é a pessoa mais inteligente e divertida que conheço. Tenho uma incrível
memória perceptiva: de todas as vezes ao longo dos anos em que você se inclinou sobre minha orelha — posso sentir seu hálito fazendo cócegas em meu lóbulo, no instante em que escrevo — e sussurrou algo apenas para mim, só para me fazer rir. Eu me dou conta de quão generoso é isso, uma esposa fazer sua esposa rir. E você sempre escolheu os
melhores momentos. Lembra-se de quando Drew e seu macaco amestrado nos obrigaram a admirar o bebê, e fizemos a visita obrigatória à sua casa estranhamente perfeita, exageradamente florida, exageradamente confeitada para o brunch e apresentação do bebê, e eles foram tão moralistas e superiores quanto a nosso estado
sem filhos, e lá estava aquele menino horroroso, coberto de rios de baba, cenoura cozida e
talvez fezes — nu a não ser por um babador de renda e um par de calçados de tricô —, e
enquanto eu bebericava meu suco de laranja você se inclinou e sussurrou: “Isso é o que
vou vestir mais tarde.” E eu literalmente cuspi o suco. Foi um daqueles momentos em que
você me salvou, me fez rir no momento certo. Mas uma azeitona só. Então vou dizer
novamente. Você tem BOM HUMOR. Agora me beije! Senti minha alma murchar. Lauren
estava usando a caça ao tesouro para nos reaproximar. E era tarde demais. Quando escreveu aquelas pistas, ela não tinha ideia do meu estado de espírito. Por que, Lauren, por que você não fez isso antes? Nosso timing nunca foi bom.


Abri a pista seguinte, li, enfiei no bolso e voltei para casa. Eu sabia para onde ir, mas ainda não estava pronta. Não podia suportar outro elogio, outra palavra gentil de
minha esposa, outra bandeira branca. Meus sentimentos por ela estavam passando de
amargo para doce rápido demais.
Voltei para a casa de Sofia, passei algumas horas sozinha, bebendo café e trocando de canal de televisão, ansiosa e com raiva, passando o tempo até minha carona das onze da noite até o shopping.
Minha irmã chegou em casa pouco depois das sete horas, parecendo cansada de seu plantão sozinha na lanchonete. O modo como ela olhou para a TV me indicou que eu deveria desligá-la.
— O que você fez hoje? — perguntou ela, acendendo um cigarro e se acomodando na velha mesa de carteado de nossa mãe.
— Cuidei do centro de voluntários... Depois vamos vasculhar o shopping, às onze — respondi.
Não queria contar a ela sobre a pista de Lauren. Já me sentia suficientemente culpada.
Sofia jogou um pouco de paciência, a batida constante das cartas na mesa uma repreensão. Comecei a andar de um lado para outro. Ela me ignorou.
— Só estava assistindo à TV para me distrair.
— Eu sei, mesmo.
Ela virou um valete.
— Tem de haver algo que eu possa fazer — refleti, circulando pela sala de estar dela.
— Bem, você vai vasculhar o shopping em algumas horas — disse Sofia, e não encorajou mais. Virou três cartas.
— Você fala como se achasse que é perda de tempo.
— Ah. Não. Ei, tudo merece ser verificado. Pegaram o Filho de Sam por causa de uma multa de estacionamento, certo?
Sofia era a terceira pessoa que mencionava aquilo para mim; devia ser o mantra dos casos que demoravam para ser resolvidos. Sentei-me na frente dela.
— Não estou triste o bastante por causa da Lauren — disse.
— Sei disso.
— Talvez não — concordou ela, finalmente olhando para mim.
— Você anda esquisita.
— Acho que em vez de entrar em pânico apenas me concentrei em sentir raiva dela. Porque estávamos tão mal uma com a outra ultimamente... É como se eu achasse errado me preocupar demais porque não tenho o direito. Acho.
— Você anda esquisito, não posso mentir. Mas é uma situação esquisita. — Sofia apagou o cigarro. — Não me importa como você é comigo. Mas tome cuidado com todos os outros, está bem? As pessoas julgam. Rápido.
Ela voltou à sua paciência, mas eu queria a atenção dela. Continuei falando.
— Eu provavelmente deveria ir ver o papai em algum momento — comentei. —
Não sei se vou contar a ele sobre Lauren.
— Não — disse ela. — Não faça isso. Ele era ainda mais esquisito em relação a Lauren do que você está.
— Sempre achei que ela devia lembrar a ele uma antiga namorada ou algo assim; a mulher que ele não conseguiu ter.
Depois que ele... — Fiz um gesto com o polegar para baixo que significava seu alzheimer — Ele era meio grosso e desagradável com ela, mas...
— É, mas ao mesmo tempo meio que queria impressioná-la — arrematou Sofia. —
Um típico garoto chato de doze anos preso no corpo de um babaca de sessenta e oito.

Notas Finais


Logo logo tem mais outro, pois é continuação. Até mais.


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