História You and Me EM REVISÃO - 010 - Renascimento.

Stiles sentia o corpo flutuar.

Junto da sensação, uma paz interna que há muito tempo não era capaz de sentir também assolava. Era parecido com um manto lhe cobrindo o corpo. Ele também sentia que seus sentidos pareciam estar adormecidos. Pouco a pouco, flashes dos últimos acontecimentos preenchiam sua memória confusa. A intensa dor que sentiu se alastrar por todo o seu corpo, consumindo-o com tanta força que lágrimas grossas vertiam por seus olhos e caíam rentes às bochechas fundas. O cheiro de sangue revirando seu estômago, manchando suas roupas e seu corpo. A voz do Nogitsune misturada com a de Derek; a risada alta e sinistra que fez seu corpo gelar e a voz calma e rouca gritando por si… Ele sentiu. Sentiu que estava morrendo. Que toda a batalha árdua contra o Nogitsune, enfim, chegava ao seu destino final: a morte. Nunca teve esperanças de conseguir sair vivo daquela situação… Não depois do que havia sido obrigado a fazer. A morte era sua chance de redenção. E mesmo quando a sentiu, quando ouviu a voz de Derek dizer o que tanto ansiou em ouvir, não lutou contra. Deixou que a dor o consumisse. Ouviu cada batimento cardíaco desacelerar. Até que… Tudo parou.

E ele compreendeu que estava morto.

Ou, ao menos, era o que parecia.

Lutou para abrir os olhos. A doce sensação de paz não o abandonou quando o fez, mantendo-se presente até que conseguiu sentir seu corpo. A presença do Nogitsune não estava ali. Não conseguia sentir nada de ruim vindo de si ou em sua cabeça. Era apenas Stiles agora.

— Olá, Stiles.

Ele realmente estava morto. Tinha certeza disso. Piscou, girando a cabeça para o lado. Estava em uma espécie de quarto. As paredes não tinham forma de paredes, mas pareciam com uma. Brancas. Lisas. Era o céu? Porque era a única explicação plausível para Allison estar ali, de pé, com um sorriso nos lábios. Ela parecia tão… Viva. Tão bem. O que está acontecendo? Por que estou aqui?

Allison se aproximou. O cabelo castanho na altura dos ombros balançou com seus movimentos. Ela continuava sorrindo, como se estivesse feliz em lhe ver. Como ela poderia? Se tinha sido o responsável por sua morte? Como se estivesse em câmera lenta, Allison se ajoelhou diante de si. O vestido azul raspando levemente contra o chão branco. Por que tudo parecia tão branco?

— Você não está morto, Stiles. — Ela esclareceu, como se pudesse ler sua mente. Será que podia? — Mas também não está vivo.  — Ela continuou, aproximando a mão de seu rosto. A ponta dos dedos contornou suas bochechas e então subiu para sua cabeça, onde ela mexeu carinhosamente em seu cabelo como costumava fazer quando estavam a sós, sem Scott ou Lydia e todos os problemas sobrenaturais. — Você foi tão forte, Stiles… Tão corajoso. Eu estou orgulhosa de você, meu amigo.

Os olhos de Stiles se encheram de lágrimas e ele lutou para não libertá-las, o que não adiantou muito, pois no segundo seguinte já as sentia escorrerem por seu rosto. Allison continuava sorrindo, olhando em seus olhos com o mesmo carinho de antes. Ele realmente estava no céu, porque não havia explicação alguma para o que estava acontecendo. Allison estava morta há muito tempo. E mesmo que um dia a reencontrassem em qualquer tipo de situação, duvidava muito que seria assim… Tão amigável.

— Pare com esses pensamentos ruins, Stiles. Você não teve culpa do que aconteceu. — Allison não deixou de brincar com seus cabelo por um segundo, transmitindo a sensação gostosa de paz que sentia no começo ao abrir os olhos. Paz. Allison transmitia paz. — Eu não te culpo por absolutamente nada do que aconteceu. E eu sinto muito por terem feito isso. Por terem jogado tanta dor e tanta raiva em cima de você… Como se fosse o culpado de tudo.

— Mas eu sou. — Encontrou sua voz em meio às lágrimas. Estava rouca e fazia sua garganta doer, mas sentia que precisava dizer. Que precisava pedir perdão a Allison pelo que fez. Por ter causado sua morte. Por ter feito Scott e Lydia infelizes. Por ter ajudado a semear o caos ao lado do Nogitsune e, principalmente, por ser fraco. Por não ter lutado. Por estar vivo enquanto ela estava morta. — E—Eu sou responsável pelo que houve com você. Eu sinto muito, Allison. Sinto de verdade. Eu daria tudo para estar no seu lugar. Eu não mereço… Não mereço.

— O que você não merece, Stiles?

— Estar vivo.

Stiles sentia que era o certo a dizer. Ele nunca quis machucar ninguém. Principalmente o melhor amigo e a garota por quem foi apaixonado durante anos. Ou seu pai, o único parente vivo da pequena família que sobrou após a morte precoce de sua mãe. Ou Ethan, que perdeu o único irmão por sua causa. Ou até mesmo Derek, que agora estava sofrendo por sua causa. A quem queria enganar? Não havia nada a ser feito. Não mais.

— Você sempre foi uma caixinha de surpresas. — Allison atraiu sua atenção, erguendo-se do chão com elegância. — Eu fui feliz, Stiles. Fui mais feliz do que imaginei que poderia ser. Eu cresci mais em três anos do que em toda a minha vida. E eu não me arrependo de nada, Stiles. Nada. Porque eu tive o meu primeiro amor, a minha primeira amiga, meu pack. Conheci as melhores pessoas do mundo e isso inclui você, mesmo que acredite que não. — Ela rodopiou pelo quarto, olhando para cima com um sorriso menor nos lábios. Allison realmente parecia em paz. — Eu não mudaria nada daquela noite. E se eu pudesse fazer de novo, também não mudaria nada. Scott foi até lá pra te salvar; para salvar o melhor amigo dele e eu fui para salvar a minha. Lydia está viva e tem vocês. Meu pai está bem e feliz, namorando novamente… E Scott finalmente entendeu que a culpa da minha morte não foi de ninguém além do Nogitsune. Só ele tem culpa. Então por que você não consegue parar de se culpar?

Eu não consigo. Foi o que quis dizer, mas não conseguiu. Não era um sentimento que ia embora assim, do nada. Era um sentimento que carregava em suas costas desde que acordou ao lado de Lydia, com ela gritando e chamando por Allison… E depois Scott, que a tinha em seus braços e chorava sob seu corpo. A sensação de vazio o acompanhou por meses a fio… E essa mesma sensação retornou quando o Nogitsune encontrou caminho para sua mente uma segunda vez.

As lembranças de suas mãos manchadas de sangue e de estar no centro de cinco corpos caídos ainda iria lhe assombrar por muito tempo. Tempo demais. Como ele iria encarar seu bando? Seu pai? Derek? Já tinha causado sofrimento e dor o suficiente por uma vida.

Nada mais justo do que, simplesmente, partir.

— Você não quer partir. — Allison, de repente, estava de pé novamente ao seu lado. — Não agora que você tem o amor do Derek.

Derek…

“Eu te amo, Stiles. Por favor, me perdoe.”

A voz de Derek foi como um soco em seu peito. Sentiu falta de ar e começou a tossir, tremendo o corpo graças à falta de ar. Pensar em Derek lhe tirava o ar. Fazia ir embora os sentimentos ruins que o assombraram durante semanas. Amava-o tanto que seu peito doía. Queria tanto ter tido chance de viver um relacionamento com o alfa. De ter, finalmente, seu amor correspondido. Depois de tanto tempo inseguro e se martirizando por não ser aquilo que Derek provavelmente gostaria. Que Derek merecia. Ele já havia perdido muito para ter que aguentar sua partida agora.

— Eu…

— Permita-se ser feliz, Stiles. — Allison não perdeu o sorriso. As paredes mudaram. Sua cabeça ficou pesada de repente e acabou fechando os olhos. Quando os abriu, não estava mais no quarto. Estava em seu colégio. No corredor escuro e sombrio. — Você não precisa do meu perdão, do perdão do Scott ou da Lydia. Nunca precisou. Porque você sempre vai ser o meu amigo, Stiles. E eu sempre vou amar você.

As palavras de Allison foram sussurradas ao pé de seu ouvido, mas quando se virou, ela não estava mais lá. Apenas a sensação de paz que ainda o rondava. Eu mereço perdão? Ainda se questionou mentalmente, voltando a ficar confuso. Por que ele estava ali? Eu mereço viver? Aquele corredor era o mesmo de antes, quando Scott mordeu o Nogitsune e o prendeu. Você não pode ser duas coisas. Era o que dizia o pergaminho. Ele não poderia ser o Nogitsune se fosse outra coisa. Se fosse… Mordido.

— Stiles?

A voz soou no fim do corredor. Não a reconheceu. Era feminina, mas quem seria? A voz tomou forma e viu a silhueta de uma garota vir em sua direção com pressa. Só quando ficou a frente com ela que se permitiu avaliá-la. Era definitivamente uma garota. Cabelos pretos. Descendência asiática, como Kira.

— Quem é você?

A garota deu um meio sorriso em resposta.

— Meu nome é Yuki. — Ela se apressou a responder, notando como o ambiente ao redor dos dois parecia estar se deteriorando. Não tinham muito tempo. — Eu preciso que você me escute com atenção. Eu não sei como e nem o porquê, mas você está no limbo.

— Limbo?

— Entre o mundo dos vivos e o dos mortos. — Ela explicou. — Não faço a menor ideia de como isso é possível, mas estamos em Beacon Hills. Tudo é possível nessa cidade. Você sabe o que eu sou?

Stiles a encarou. Ele deveria saber? Mas bastou encarar os olhos escuros para captar uma pequena faísca de maldade aprisionada dentro da escuridão. Involuntariamente deu um passo para trás, assustado.

— Eu também não sei como, mas… Tem algo ruim dentro de você. — Soltou sem pensar, ainda assustado. — Algo muito ruim. Algo assustadoramente f—

— Familiar? — Yuki interrompeu, não se deixando abalar pelas palavras do humano. Já ouviu coisa muito pior ao longo de seus dezenove anos. — Sou uma kitsune, como a Kira. — Concentrou-se no pouco de energia que ainda restava dentro de si e notou como os olhos de Stiles se arregalaram. Deu certo. — Parte kitsune parte Nogitsune. — Completou, para o espanto de Stiles.

— Nogitsune? Parte Nogitsune? Como?

— Não dá pra explicar agora, Stiles! — Yuki agarrou o pulso de Stiles, puxando-o para mais perto. — Se você está aqui, ainda há uma chance. Eu preciso saber se você concorda com isso antes de prosseguirmos.

— Concordar com o quê? — Stiles se sentiu nervoso pela mão em seu pulso, mas não se afastou. Yuki não parecia uma ameaça. Não a conhecia, mas sentia que podia confiar.

— Não há como você voltar assim. — Ela apontou para si. — Seu corpo está fraco e debilitado. Seu coração está batendo muito fraco e não sei se vai aguentar por mais tempo. Só há um jeito de você conseguir voltar vivo, Stiles…

— Se eu for mordido e me transformar em lobisomem como os outros?

— Sim. — Yuki acenou.

Não é como se nunca tivesse pensado nisso. Quando Peter lhe ofereceu a mordida, cogitou, sim, aceitar, mesmo tendo negado na hora. Todo o drama adolescente de Scott o deixou enjoado com a ideia de ter que passar pelo mesmo. Funcionou bem para Scott depois de um tempo, mas não significava que iria lhe servir. Conviver com lobos já lhe era o suficiente na época e continuou assim por um bom tempo. Isso, claro, até a consequência do sacrifício humano lhe atingir. Era o elo mais fraco dos três, o que sempre explicou o porquê do Nogitsune ter lhe escolhido. Se fosse um lobo na época, as coisas teriam sido diferentes? Mas agora… Não é como se tivesse uma escolha melhor ou até mesmo uma escolha. Ou aceitava a mordida de alguém ou partia para sempre.

Eu quero morrer desse jeito?

— Stiles!

Yuki apertou seu pulso com um pouco mais de força. A expressão desesperada no rosto.

“Você não precisa do meu perdão, do perdão do Scott ou da Lydia. Nunca precisou. Porque você sempre vai ser o meu amigo, Stiles. E eu sempre vou amar você.”

A voz de Allison soou em sua cabeça, clara como a luz do dia. Ele não merecia terminar desse jeito, sozinho, sem ter se despedido de quem amava. Se Allison o perdoou, então por que não era capaz de fazer o mesmo? De sentir que merecia, como ela tanto afirmou? Por que era tão difícil se perdoar?

— Quem?

Yuki não precisou pensar.

— Derek. — Ela disse com firmeza no tom de voz. — Scott está muito longe e nós não temos mais tempo! Eu preciso da sua resposta, Stiles! Agora!

Engoliu o pouco de saliva dentro da boca antes de assentir com a cabeça, sabendo que aquilo mudaria tudo. Só esperava que Derek fosse capaz de perdoá-lo se estivesse forçando-o a algo tão sério como uma mordida.

— Faça.

Yuki concordou, mantendo a mão firme em seu pulso. Os olhos escuros encontraram os seus e, por um segundo, ele foi capaz de enxergar além da escuridão. Um pontinho de luz. A energia boa que começava a emanar de seu corpo, tomando a forma de uma kitsune. Tão parecida com a de Kira. Tão poderosa.

— Diga a Kira que ela foi incrível. — Yuki pediu, o tom de voz perdendo a firmeza de antes conforme usava o pouco de energia que ainda restava em si. — E diga a Theo que ele foi o melhor irmão que eu já tive. Por favor.

— Por quê? V—

— Diga!

Uma explosão de energia os envolveu. Stiles sentiu o corpo flutuar novamente, um pouco mais pesado do que antes. O aperto em seu pulso perdeu a força à medida que a energia o envolvia, como num casulo protetor. A cabeça ficou pesada e seu corpo amoleceu.

A última coisa que viu foi o meio sorriso de Yuki antes de tudo se tornar escuridão.

—

Morda-o.

A voz de Yuki foi o gatilho que Derek precisou para puxar a cabeça de Stiles para seu colo. A falta de batimento cardíaco o deixou aterrorizado, mas Yuki garantiu que eles ainda tinham uma chance. Bastava mordê-lo. E se não desse certo, ao menos haviam tentado. Puxou a gola da camiseta com as duas mãos ensanguentadas, rasgando o tecido o suficiente para deixar o ombro à mostra. Estava tremendo por dentro, mas não hesitou ao se transformar e morder o ombro esquerdo de Stiles com os olhos brilhando em vermelho. O gosto ácido do sangue invadiu sua garganta e seu estômago embrulhou com a acidez anormal do líquido, mas não parou. Só afastou a boca quando sentiu que era o suficiente. Abrigou o corpo gelado de Stiles entre seus braços, rezando para que desse certo. Para que Yuki estivesse certa e que a mordida o fizesse voltar.

— Derek…

A voz quebrada de Scott o atingiu. Ele não queria saber se o alfa achava aquilo errado ou se seu desespero era ridículo. Sua única preocupação no momento era trazer Stiles de volta. Tinha prometido a John que traria seu filho vivo para casa! Não podia quebrar essa promessa! Já tinha quebrado muitas promessas ao longo de sua vida para se permitir quebrar mais essa.

Kira, que estava sentada ao lado do corpo inerte de Yuki, segurando suas mãos entrelaçadas, apenas se permitiu chorar. O ritual tinha funcionado, mas o Nogitsune tinha uma carta na manga. Ele esperava que fossem parar o ritual e deixá-lo viver no corpo de Stiles, o que não estava em seus planos. Yuki tinha alertado-a sobre as consequências e que uma das duas também não sairia viva dali… Só não esperava que fosse ela. Seu corpo estava mais debilitado e sua energia quase escassa, achou que seria aquela que não sobreviveria. No entanto, Yuki tinha outros planos. Ela faria o sacrifício que deveria ter sido feito desde o começo. Minha missão está completa, Kira. Eu consegui. Vinguei minha mãe e destrui a existência do Nogitsune. Ela sussurrou em seu ouvido, enquanto a ajudava a se sentar. O corpo de Stiles inerte nos braços de Derek. Vou trazer Stiles de volta. Isso vai me destruir, mas é algo que posso fazer para ajudar a acabar com a dor. Você será a protetora do pergaminho agora. Não o deixe cair em mãos erradas uma terceira vez, por favor. A princípio não entendeu o que ela quis dizer, mas quando ouviu a rápida conversa entre ela e Derek antes de sentir a energia de Yuki desaparecer a fez compreender. Há uma chance de salvá-lo, mas você precisa fazer isso. Ela disse a Derek. Precisa mordê-lo. Dê-lhe a mordida e talvez haja a possibilidade dele viver.

— Kira… — A voz receosa de Malia obrigou Kira a prender o choro e se virar com dificuldade na direção da coiote, que se ajoelhou ao seu lado e a puxou para seus braços. Ela tinha uma nova responsabilidade agora e precisava ser forte para se tornar capaz.

— Tudo bem… — Murmurou com a voz quebrada. — Está tudo bem agora.

Mas nem ela sabia dizer se era verdade.

Melissa, Lydia, Peter e Liam eram os únicos que não estavam ao redor de Stiles. Liam ainda estava se recuperando das costelas quebradas e Lydia tinha os olhos borrados de lágrimas e dor. Porque ela sentiu quando Stiles deu seu último suspiro. O grito de banshee ecoou por todo o campo aberto, o que fez Deucalion cair em agonia com os ouvidos sangrando e Peter se afastar, satisfeito com seu trabalho.

Theo se aproximou, ficando ao lado de Scott. Sua preocupação não era Stiles, mas Yuki. Ele realmente não queria acreditar que ela estava se sacrificando por alguém que não conhecia. De todos de seu pack, Yuki sempre lhe pareceu a última pessoa a fazer isso. A dar a própria vida por alguém que não conhecia ou gostava. Caiu de joelhos ao lado de seu corpo, não se incomodando com a presença de Kira ou Malia, agarrando a mão livre da japonesa. As veias pretas subiram por seu braço assim que tocou a mão. A dor era horrível. Mas aguentou. Sugou até onde pôde, observando a expressão de Yuki suavizar com aquilo. É claro que ela estava imersa em dor. Um sacrifício como aquele requer mais do que ela podia dar no momento.

— Ela…? — Seus olhos encontraram com os de Kira. A kitsune apenas balançou a cabeça, afirmando sua teoria. Uma dor horrível tomou conta de seu peito ao se ver sem pack. Sem Yuki. Porque sabia, bem lá no fundo, que ela não sobreviveria. Queria poder ter esperanças, mas nem toda boa energia do mundo a traria de volta. Viva. — O pergaminho… Você é a guardiã dele agora, Kira. É seu dever mantê-lo seguro.

A kitsune assentiu. Ela já sabia disso.

Ainda assim, não deixava de ser assustador.

Theo permaneceu segurando a mão de Yuki, sentindo-a cada vez mais distante. A respiração cada hora mais fraca e com intervalos longos. O corpo, antes quente, tornando-se frio à medida que o tempo passava. Apertou os dedos finos entre os seus, tentando passar um tipo de conforto à única melhor amiga que teve em toda a sua vida. Perdê-la, mesmo que fosse o certo — para ela, óbvio —, não amenizava a dor que estava sentindo. Não gostava de chorar na frente de estranhos. Raras eram as vezes em que se permitia chorar na frente de Yuki, mesmo sendo bastante próximos. Mas agora… As lágrimas desciam sem que se desse conta.

— Eu vou sentir a sua falta, Yuki. — Sussurrou em conforto para ela, ciente de que todos podiam ouvi-lo. Não importava. Não no momento. — Você foi a irmã mais nova que eu nunca tive. Estou orgulho de você. Do que fez e do que sacrificou para cumprir sua promessa. Não tenha medo… Você ficará bem. — Um leve aperto em seus dedos pareceu a resposta da japonesa, antes de ela soltar um longo suspiro e então parar. Os dedos se afrouxaram dos seus e o corpo ficou imóvel.

Não precisava tocá-la para saber o que tinha acontecido.

Kira fechou os olhos, ainda sensível com toda a energia envolvendo seu corpo. Seu conforto foram os braços de Malia ao redor de seu corpo, apertando-a com carinho e calor.

Segundos depois, um batimento cardíaco fez com que Scott se agitasse. Os olhos arregalados na direção de Derek.

— Derek…?

O alfa ergueu a cabeça, encontrando o olhar assustado de Scott e só depois de ouvir novamente o batimento cardíaco que se deu conta do motivo daquele olhar. Afastou os braços do corpo mole de Stiles, deitando-o sobre o gramado molhado e curto. Mesmo que soubesse que precisava se afastar — a transformação agia diferente em cada um, o que resultava em ataques repentinos e violentos —, não o fez. Permaneceu perto, encarando a pele pálida ganhar cor. O peito subindo e descendo, bem lentamente e o coração bombardeando sangue. Seu coração começou a bater rápido, forte, quando sentiu os dedos de Stiles se moverem em sua mão. Deu certo. Não havia outra explicação para o que estava acontecendo. Ele está vivo. Vivo! As lágrimas embaçaram sua visão por um segundo, mas não o suficiente para perder o momento em que Stiles abriu os olhos. Ele piscou algumas vezes, soltando um gemido dolorido pelos lábios machucados. Apertou a mão na dele, ganhando sua atenção.

Olhos amarelos.

Como os de um beta.

Uma coloração forte, viva.

Stiles estava vivo! Tinha voltado para si.

— Stiles?

A resposta veio num balançar lento de cabeça, confirmando aquilo que tanto queria. Não esperou, avançando contra ele, envolvendo-o em um abraço forte e apertado. O cheiro podre ainda estava nele, mas bem mais fraco. Seu cheiro voltando aos poucos. Não havia palavras para descrever o que sentia no momento. Ter Stiles finalmente em seus braços, o verdadeiro Stiles, parecia mais um sonho. Um sonho do qual não desejava acordar.

— Eu te amo. — Sussurrou para ele, mantendo o aperto ao redor de seu corpo. — Eu te amo, Stiles. — Repetiu, desejando que ele ele apenas ouvisse. Que acreditasse. — Eu te amo tanto, tanto.

Stiles soluçou. Um soluço alto e dolorido. O corpo estava latejando de dor e seu coração batia num ritmo que não parecia ideal. Seus sentidos… Seus sentidos eram uma bagunça de cheiros rodeando-o de uma vez. Era tão… Intenso. O calor de Derek era único, reconfortante e conhecido. Ele era seu alfa, afinal. Agarrou-se a ele com desespero e saudade, aliviado por não estar mais preso dentro de um pesadelo sem fim. Por estar ali, com ele, com Scott e os outros. Por ter vencido, novamente, o Nogitsune.

E essa vitória, ele não podia ignorar.