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História Alter Ego - Livro I - Faíscas Por Todos Os Lados


Escrita por: CSFukuda

Notas do Autor


Olá, leitores!
Aqui está o novo capítulo, espero que gostem.
Boa leitura.

Capítulo 15 - Faíscas Por Todos Os Lados


Joana congelou quando ouviu o grito de Ethan cortar o silêncio mórbido que assombrava o mini palácio. Ela agiu rápido, puxando uma gaveta com força o suficiente para arrancá-la do balcão. Os talheres tilintaram sob o azulejo escuro e no meio de garfos e colheres prateadas, uma faca reluzente e comprida chamou-lhe a sua atenção. Ela empunhou-a pelo cabo de couro e correu em direção ao saguão da residência irmandade.

Ethan gritou uma outra vez, a sua voz sendo rapidamente abafada pelos corredores sufocantes e quadros espalhados por aqui e por ali. Joana viu-se confrontada pela escada principal que se erguia no meio da escuridão como a língua de um felino feroz, pronta para guiá-la até o seu desenlace doloroso.

— Ethan! – Gritou ela. A sua voz reverberou pelo saguão e morreu ali mesmo, sem receber uma resposta. O seu coração acelerou e a adrenalina nas suas veias fê-la subir os degraus com velocidade, ainda que sentisse o medo consumir cada pedaço do seu peito.

Os sensores de movimento lançaram uma luz tênue ao corredor principal dos dormitórios. Joana empurrou a porta do quarto de Patrick para chamá-lo, mas este encontrava-se vazio, assim como os demais quartos naquele andar. Todos haviam desaparecido, ou melhor, fugidos do massacre que assolava a universidade. Joana viu-se mais uma vez sozinha, encarando a porta do quarto de Ethan.

Teria de fazer aquilo sozinha.

Ela respirou fundo enquanto caminhava até o final do corredor. Pela fresta inferior da porta, sombras desenhavam-se em movimento de um lado para o outro sob o piso de madeira, fazendo ecoar passadas pesadas que provinham do quarto e eram rapidamente abafados pelas batidas descompassadas do seu coração. Joana pôs-se rente a porta, encostando-se silenciosamente sob a superfície de madeira.

Ela rodou a maçaneta e empurrou-a, mas estava trancada. Duas pancadas fizeram-na afastar-se, empunhando a faca em direção ao cômodo selado. Ela puxou do seu bolso o seu celular, e com mãos trêmulas, desbloquear o celular era uma missão impossível. Ela discou o número telefônico que a própria inspetora a havia lhe dado há alguns dias.

Chamando...

Ouviu-se um beep. Ethan gemia e tossia como um enfermo. Outro beep, mas ainda ninguém havia lhe respondido. Joana sentia a impotência e o pavor tomarem conta do seu corpo enquanto o tempo de espera parecia infindável.

— Sim? – A voz da mulher surgiu do outro lado.

Joana fechou os olhos, aliviada.

— Inspetora. – Choramingou ela. — El-Ele... – As lágrimas vieram aos olhos e a sua garganta trancou-se com o pavor.

— Samanta? Desculpe, não consigo entender o que diz.

— Inspetora, sou eu, a Joana. – Gaguejou ela. — Ele está aqui... O assassino está aqui.

Joana escutava uma movimentação do outro lado da linha, a voz ofegante da inspetora dirigia ordens a alguém.

— Onde está? – Perguntou ela.

— No palácio da Shakespeare. – Revelou Joana entre soluços. — Ele está trancado no quarto com Ethan... Eu ouvi gritos e depois...

— Joana! – A inspetora tinha um tom firme. — Preciso que você saia imediatamente do palácio e vá para a rua.

A jovem sentiu um frio no estômago.

— Mas e o Ethan? – Indagou ela, já se afastando-se do quarto.

— Sua segurança em primeiro lugar. Siga as minhas ordens! Estamos a caminho.

A chamada terminou.

Ela não abandonaria o palácio sem o amigo. Não poderia fazê-lo tendo a consciência plena de que Ethan jamais abandonaria o lugar sem ela. Joana enfiou o telefone no bolso e embateu contra a porta do quarto mais uma vez, mas ela recusava-se a abrir. Uma rajada de vento frio fê-la olhar para o seu quarto cuja porta permanecia aberta, assim como a janela. Ambos os quartos dividiam a mesma sacada e talvez a porta da varanda do quarto de Ethan estivesse aberta.

Ela encaminhou-se até os seus aposentos e abriu as portas de vidros, o lenço delicado que cobria os seus cabelos negros foi arrancado pelo vento e as cortinas dançaram ante a luz fraca da catedral, como fantasmas enraivecidos. Joana pôs-se para fora, sentindo o frio arrancar-lhe toda a coragem, mas trincando os dentes e segurando o cabo da faca com ainda mais força, ela encaminhou-se até o quarto do amigo.

A outra porta tinha uma fresta entreaberta e o vento gélido corria pela abertura, cantando um assovio que mais se assemelhava a um suplico infernal. Ela tentou espionar pelo vidro, mas o quarto estava entregue às sombras.

Ela respirou fundo e empurrou as portas num solavanco, as duas placas de vidro correram divergentemente e o vento adentrou o recinto derrubando vasos e espalhando cortinas. A silhueta de Joana lançou uma sombra ao quarto e a luz fraca iluminou a cama e alguns móveis.

— Ethan? – Chamou ela.

— Aqui. – Respondeu ele num gemido trêmulo. Arrastando-se pelo chão em sua direção.

Joana agachou-se pousando a cabeça de Ethan sob as suas pernas. Ela tapou a boca com uma das mãos quando viu o sangue escorrer da barriga do amigo, seus olhos encheram-se de lágrimas. Ethan olhou-a nos olhos, respirando pela boca e tremendo de frio.

— Calma, a inspetora já está vindo. – Joana acariciou o seu rosto, tentando parecer o mais serena possível.

O ruivo, levantou o braço ensanguentado e apontou para o canto do cômodo, onde as duas paredes encontravam-se e onde a luz recusava-se a iluminar. Os olhos da garota acompanharam o indicador de Ethan, e Joana então viu, pela primeira vez, aquele que só foi visto por pessoas que agora eram devoradas pela terra.

Ele estava estacado em cima da mesa de Ethan, dali ele parecia gigante e imbatível. A sua máscara laminada reluzia como uma faca, mas o buraco dos seus olhos eram precipícios negros que a encaravam com uma expressão vazia e aterradora. O seu manto, negro camuflava-se na escuridão do quarto e Joana sentia que ele era capaz de farejar o medo que exalava da sua expressão atônita.

A mão de Joana voltou a puxar a faca, tremendo ante o olhar sombrio que penetrava a sua alma. Ela apertou o peito de Ethan contra o seu braço e puxou-o para mais perto da porta por onde entrou. Ele pulou da mesa, aterrando no piso e fazendo-o vibrar.

Joana estendeu a faca.

— Não se aproxime mais. – Avisou ela, quase gritando. O seu suor era frio e escorria pela sua testa e o seu coração estava prestes a sair pela boca.

O assassino deteve-se, esticando a sua mão em direção a porta. Destrancou a fechadura e rodou a maçaneta delicadamente. A porta abriu-se num ranger. Em seguida, voltou-se para o canto escuro, abrindo caminho para Joana.

Ela abaixou a guarda, tentando compreender o que ele pretendia. Só poderia ser um bluff. A esmola era tão alta que São Jorge arqueou uma sobrancelha. Joana levantou-se e ajudou Ethan a sentar-se na cama, a luz da catedral reluziu e os cortes mostravam-se menos agressivos do que ela pensava, mas ainda assim, manchavam o seu tórax e calças com vermelho.

Desconfiada, Joana revezava o seu olhar entre o amigo e o assassino. Ethan cobriu a sua barriga com os braços, gemendo de dor.

— Vamos sair daqui. – Sussurrou ela no seu ouvido, encarando o mascarado ao longe. — Se apoia em mim.

O ruivo passou um braço ao redor do ombro de Joana. Ethan exalava um cheiro de álcool que se misturava com o doce do seu perfume. Joana fez força e Ethan fincou os pés no assoalho escuro. Caminharam aos tropeções em direção a porta do quarto, passando pelo assassino como um cão malcriado que passa pelo seu dono.

Num único movimento rápido, Joana empurrou o corpo de Ethan para a porta do quarto ao lado e fechou a porta atrás de si, trancando-a. Ethan foi levado até a cama às pressas e num passo ligeiro ela encaminhou-se até a porta da varanda para selar as portas.

Estavam protegidos, pelo menos por agora. A jovem aproximou-se da cama e colocou um travesseiro debaixo da cabeça do amigo.

— Aguenta só mais um pouco. – Sussurrou ela. — A inspetora deve chegar em breve.

Ethan assentiu, cerrando os dentes e contendo a lancinante dor dos cortes. Joana ainda tinha a faca em mãos, tentava ouvir o som de passos ou qualquer indicação sonora, mas o mini palácio descansava em plenitude num silêncio desconfortante.

Ele estava ali, poderia tê-la matado se quisesse, mas não o fez. A voz da inspetora ecoou nos seus pensamentos. – Só tem matado pessoas relacionadas com estupros ou outro crime de viés sexual. Joana fitou o rosto de Ethan, intrigada e ainda tremendo.

— O que você fez? – Indagou-se ela, tão baixo que o ruivo nem fora capaz de ouvir.

[Uma hora depois]

Uma hora depois.

Samanta caiu de joelhos em frente ao vaso sanitário, vomitando até o que não tinha comido. A bílis queimava a sua garganta e os seus olhos lacrimejavam, o que depois evoluiu para um choro descontrolado. Ela recostou-se no azulejo do seu banheiro, tremendo de frio.

A sua mente era como uma guerra no qual ela estava constantemente perdendo, e por mais que ela se esforçasse para estar bem, aquele terrível sentimento cruel e gélido se apossavam ainda mais do seu âmago. Ela só queria voltar para casa e estar com os seus avós, esquecer daquela máscara e de todos aqueles assassinatos grotescos. O sorriso da sua avó era mais forte do que qualquer antidepressivo que Samanta alguma vez antes tomara.

Caroline adentrou o banheiro do dormitório de Samanta. A porta estava trancada e ao redor do seu dedo indicador, ela girava a chave reserva a qual mais ninguém além de Samanta deveria usar, mas era a Caroline.

A vizinha sentou-se no piso frio ao seu lado e passou um braço ao redor do ombro de Samanta. Ficaram em silêncio, ou melhor, Caroline ficou em silêncio e Samanta soluçava baixinho enquanto mergulhava o seu rosto no ombro da amiga.

— Quem eu preciso matar? – Perguntou Caroline, enxugando as lágrimas de Samanta.

— Não brinque com isso.

Samanta colocou-se de pé, alisando a sua testa. Ela sentia como se a sua cabeça fosse explodir e os olhos fossem saltar do seu rosto. Ela fitou o seu reflexo no espelho, o seu cabelo castanho estava mais emaranhado do que os seus pensamentos e os seus olhos eram vermelhos como chamas incandescentes. Ela estava um caos.

Você pode me fazer um favor? – Perguntou Samanta, recostando-se na pia do banheiro.

A vizinha assentiu.

— Eu preciso dos meus remédios, esqueci de tomá-los mais cedo. – Explicou ela. — Estão no meu guarda-roupas.

Caroline puxou a gaveta e pescou um frasco cilíndrico de Ultramolexina. Caroline lembrou-se daquele nome quando teve cadeiras de farmacologia com os alunos de farmácia e medicina, não que ela se lembrasse das prescrições do remédio, mas lembrou-se de como o professor apelidou a medicação. Derrubador de gorilas.

Samanta engoliu a capsula com a ferocidade de um lobo e esvaziou a sua garrafa de água. As suas mãos aos poucos deixavam de tremer, mas um rubor havia tomado conta do seu rosto e por mais que a medicação acalmasse o seu corpo, ela não era capaz de se livrar daquela sopa de sentimentos que estavam a levando a loucura.

Quando recebeu o e-mail da Universidade Das Santas Luzes, pensou ter recebido a chance dourada de mudar a sua vida, de finalmente esquecer o que havia vivido em Birmingham e de como toda aquela maldita cidade lembrava-a da trágica noite em que fugiu para a casa dos avós.

— Birmingham é assim tão mal? – Perguntou Caroline, recostada na pia de mármore.

Samanta passou a mão pelo rosto e suspirou impacientemente.

— É uma merda e eu... – Ela hesitou, encarando Caroline, indecisa sobre abrir a boca ou permanecer calada. — Tudo naquela cidade me lembra dos meus pais.

— Eu já entendi. – Disse Caroline. — Você não se dá muito bem com eles, não é?

Samanta fitou-a fundo na alma.

— Não. Minha mãe foi assassinada e nunca encontraram o culpado.

Caroline pôs uma mão sob a boca e arregalou os olhos.

— Samanta... Eu não sabia. – A vizinha não era capaz de articular as suas perguntas. — E o seu pai? Como ele reagiu a tudo isso?

— Eu já disse que o culpado nunca foi encontrado. Ele matou a minha mãe.

Caroline prometeu nunca mais fazer perguntas. Ela não sabia onde enfiar a cara e muito menos como reconfortar Samanta, afinal, o que ela poderia dizer? – "Ah, vai ficar tudo bem" – Não vai ficar bem, não tem como ficar.

— E agora, com toda essa violência e a constante sensação de pisar em ovos pois, a qualquer momento, um louco pode pular de um arbusto e te esfaquear faz me sentir em casa mais do que nunca. – Continuou Samanta.

Caroline permanecia em silêncio. As recentes revelações de Samanta haviam devorado todas as suas palavras e assistir a amiga contar tudo aquilo, encolhida como uma criança, fez o coração de Caroline encher-se de pena.

— E é para isso que aquilo serve. – Samanta apontou para o frasco de Ultramolexina sob a bancada. — Desde que cheguei aqui, parei de tomar a medicação, porque, por algum motivo, a minha cabeça idiota pensou que a minha doença estava em Birmingham, mas ela vive dentro de mim e o preço para ter uma sanidade mental mínima é viver a base dos remédios que fazem você agir como um zumbi, ou como você diz... Uma protagonista sem emoção de filme de terror.

Caroline sentiu-se trincar como vidro.

— Samanta, eu não fazia ideia. – Desculpou-se ela. — Mas em minha defesa, você é a minha final girl favorita.

Vozes e passos pesados ecoaram pelos corredores, cortando o clima que se instaurou no banheiro de Samanta. As duas amigas entreolharam-se intrigadas e puxaram, quase que em sincronia, um canivete dos seus bolsos. Estavam cientes que poderiam ser atacadas, mas não queria dizer que também não iriam atacar. As vozes eram dos alunos que estavam sendo expulsos dos seus dormitórios pelos agentes da polícia de Tommenham.

Um brutamontes de quase dois metros de altura e fardado tapou a visão do corredor.

— Senhoritas, precisam abandonar o dormitório imediatamente. – Ordenou ele, cruzando os braços.

— Mas por quê? – Indagou Caroline. — E nós vamos para onde?

— São ordens da inspetora. – Ripostou ele com um tom impaciente. — Liguem para os seus pais e busquem um abrigo seguro até amanhã. – Disse ele por fim, deixando-as a sós.

Samanta e Caroline levaram alguns minutos até processarem tudo o que haviam escutado e o que deveriam fazer. A princípio não tinham para onde ir, Birmingham ficava a três horas de Tommenham e não havia como chegar até lá, não sem um carro, entretanto, mesmo se Samanta tivesse um, iria para qualquer parte do Reino Unido, menos Birmingham.

Passados alguns minutos, Caroline bateu á porta do dormitório, ela trazia algumas mochilas e estava vestindo um moletom escuro. Samanta terminava de fechar o zíper de uma bolsa grande e preta com as suas roupas, não poderia levar tudo, não por agora.

Que desgraça. Ali estava ela, mais uma vez desfazendo o lugar onde pensou que seria a sua casa, Samanta estava abandonando mais um lar e, desta vez, não sabia para onde ir. Ela sentou-se sob a cama, sentindo-se desabar aos poucos, as lágrimas voltavam aos olhos e o medo apoderava-se do seu coração.

Maldito assassino. 


Notas Finais


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XoXo


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