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História Always Somewhere (Aonung x Neteyam) - 4. Colisão


Escrita por: Srta_Michaelis

Notas do Autor


Demorei, mas cá estou com um novo capítulo (enorme por sinal)!

Agora nossa jornada realmente vai começar.

Tem surpresa nas notas finais!!!

Boa leitura!

Capítulo 39 - 4. Colisão


Dust in the wind  (Poeira ao vento)

All we are is dust in the wind (Tudo o que somos é poeira ao vento)

Dust in the wind - Kansas

 

 

Aneya grunhiu baixinho quando, outra vez, não controlou bem a força e danificou mais uma flor que tentava esculpir. Olhou de canto para checar Tai'Ren em um dos galhos ao lado e constatou que ele seguia em sono profundo. Até se sentia um pouco cansado também, apesar de ter dormido na noite anterior, mas procurava se manter sempre ocupado e bem acordado para vigiar.

Na verdade, mesmo que se esforçasse bastante, dormir estava bem complicado desde os eventos na lagoa. Foi inevitável não deixar os olhos gravitarem até o rapaz dormindo novamente. Ele realmente o beijaria se não tivesse sido distraído pelo comunicador?

Só o pensamento o deixava com as bochechas quentes. Não queria nutrir falsas esperanças, mas era impossível. Talvez devesse ter pedido para conversarem naquela noite, mas estava tão chocado que aceitou tranquilamente só escutar Tai'Ren cantar até que pegassem no sono. Desde então, tentavam se manter focados no objetivo e nenhum dos dois tocou no assunto.

Conforme avançavam na floresta, que ficava cada vez menos densa, a temperatura aos poucos caía, o que os fez estar sempre em movimento, para não sentirem frio. Felizmente, não tiveram sustos desde então.

Os olhos azuis analisaram com cuidado a pequena flor de madeira. Não era a pior coisa que tinha feito, mas estava longe de ser a melhor. Mesmo se esforçando para tirar os danificados pelo excesso de força, não era difícil notar que estava assimétrica e arranhada.

Com um suspiro frustrado, Aneya guardou o objeto em sua bolsa e o punhal na cinta. Puxou a blusa que tinha trazido e a vestiu para se proteger dos ventos gelados que começavam a surgir à medida que a noite dava lugar ao dia.

Tai'Ren não demorou a acordar e piscou os olhos, sonolento, acordando de frente para o galho onde Aneya estava sentado, olhando para baixo.

— Parece que alguém perdeu o medo... – Comentou, preguiçoso.

— Ah, você acordou. – Aneya sorriu, tentando não mostrar nervosismo depois de passar mais uma noite pensando no quase beijo. – Eu estou tentando me preparar para as nossas aulas de voo.

O mais novo se levantou, arrumando o cabelo e tremeu um pouco com o frio.

— Então, não vamos perder tempo. – Concluiu, com um sorriso nos lábios.

— Vamos agora? – Aneya pareceu hesitante.

— Mas é claro. – Tai'Ren se divertiu com a expressão medrosa. – Não se preocupe, você está evoluindo muito. Pra quem não aceitava voar, já parou pra pensar que voou por dias?

— De olho fechado... – Resmungou o Metkayina, sem muito ânimo.

— Você sabia que estava voando. Mesmo de olhos fechados, você estava lá. Muito firme. Isso sem contar as coisas que já fez na viagem.

Ele não sabia reagir muito bem aos elogios de Tai'Ren, mesmo que durante todos os anos de amizade, eles tivessem o hábito de sempre se apoiarem. Por isso, foi impossível não desviar o olhar, com as bochechas quentes outra vez.

Por muito tempo, aquelas reações passavam despercebidas pelo mais novo, mas desde que esteve tão perto de Aneya ao ponto de ver com clareza como a tonalidade da sua pele mudava com vergonha, não conseguiu mais deixar de reparar naquilo.

Balançou a cabeça, não querendo voltar a recordar do dia que agiu de forma tão estranha. No entanto, quando puxou as armas e se preparou para descer, escutou:

— O-obrigado...por reconhecer meu esforço.

Fitou os olhos azuis com cuidado, subitamente se sentindo sem graça.

— Não tem que me agradecer por isso... É melhor nós irmos.

Aneya assentiu e se preparou para a parte mais chata da viagem. Por sorte, conseguiu descer sem erros e, por um instante, ficou muito orgulhoso de si mesmo por realmente estar conseguindo fazer coisas que nunca achou que faria.

Quando alcançaram o chão, Tai'Ren chamou seu ikran e virou-se para o mais alto:

— Vamos deixar nossas coisas aqui. Vou voar só onde já passamos.

— Tudo bem.

Com a concordância, Tai'Ren subiu no ikran e estendeu a mão para o Metkayina.

— Não vale fechar os olhos dessa vez. – Sorriu.

Depois de um longo suspiro de coragem, Aneya aceitou a mão e retribuiu o gesto:

— Vamos logo antes que eu me arrependa.

Eles se ajeitaram para partir e quando Aneya segurou suavemente nas linhas de suas costelas, Tai'Ren tremeu, involuntário, mas tentou não demonstrar. Também estava se perguntando se realmente não conversar sobre o ocorrido era a melhor opção. Contudo, suas próprias ações ainda eram estranhas para ele. Afinal, ainda não sabia qual a resposta precisava dar a Aneya.

Então, por que tinha simplesmente tentado beijá-lo?

— Nós... não vamos? – A voz do Metkayina muito perto de seus ouvidos o despertou dos pensamentos conflitantes.

— Vamos! Desculpe.

— Está tudo bem? – Os olhos azuis ficaram preocupados.

— Está sim, não se preocupe.

Antes que pudesse dar mais espaço para Aneya seguir com os questionamentos, enviou um comando ao ikran para que voasse e foi inevitável sentir com clareza através do tsaheylu o coração do animal e suas asas fortes trabalhando.

Ganharam altitude aos poucos e quando ultrapassaram as árvores, Aneya arregalou os olhos diante da imensidão verde. 

Sem pensar, apertou Tai'Ren um pouco mais forte.

— Isso...- Ele sabia que suas mãos estavam tremendo e o frio na barriga era indescritível, mas ver a floresta tão majestosa foi muito intenso. Ele se emocionou quase que instantaneamente. - ...é lindo.

Tai'Ren olhava por cima do ombro e não conseguiu conter um sorriso vendo os olhos azuis tão brilhantes. Fez o ikran voar não muito acima das árvores, para que Aneya pudesse se acostumar com a altura.

— Viu só? – Sussurrou, mantendo um voo lento e contemplativo. – Agora você está voando de verdade.

— Eu ainda tô com medo, mas... - Aneya riu, ainda embasbacado com a vista. -... Isso é muito além do que eu sonhei ver, Tai'Ren. Eu nem sei como vou descrever tudo que estamos descobrindo para os meus pais.

Sentir a emoção nas palavras do rapaz fez Tai'Ren sorrir um pouco mais. Uma empolgação amável surgiu em seu peito, trazendo uma vontade enorme de mostrar mais lugares novos para Aneya, para vê-lo ainda mais feliz e para que ele tivesse ainda mais histórias para contar.

A ansiedade imediatamente refletiu pela ligação e o ikran acelerou o voo, ganhando um pouco mais de altitude. Não demorou mais do que alguns segundos para os braços lhe rodearem com mais força e o rosto de Aneya se esconder em seu ombro.

— Vai mais devagar, eu tô ficando enjoado... – Gemeu ele.

— Desculpa! – Respondeu Tai'Ren, imediatamente ajustando o voo, tocando o braço alheio com as pontas dos dedos. – Está melhor?

— Sim. – Aneya sussurrou, tentando focar outra vez na paisagem.

As árvores eram realmente muito altas e coloridas. De onde estavam às vezes era possível ver a movimentação dos animais em meio a vegetação. Agora que viajavam por regiões menos densas, podiam ver com muito mais clareza o interior da floresta.

Tai'Ren sorriu e tocou outra vez no braço de Aneya, chamando sua atenção para um pequeno grupo de animais que atravessavam um curto campo aberto, dentre eles muitos filhotes. O Metkayina retribuiu o sorriso, muito feliz com a visão e agradeceu a Eywa internamente por viver em um mundo tão bonito. Outra vez, os olhos cinzas se perderam nas reações do rapaz.

O voo continuou tranquilo por mais alguns minutos, até que Tai'Ren, a pedido de Aneya, tentou aumentar a velocidade. Mas logo os olhos azuis se fecharam, atingidos por uma náusea rapidamente.

— Como vou aprender a lutar no ar se mal consigo manter os olhos abertos voando assim?

— Não se pressiona. – Tai'Ren diminuiu a velocidade outra vez. – Vamos aos poucos. De qualquer forma, temos que voltar. Ainda preciso começar a te ensinar a usar o arco.

Pousaram no mesmo lugar onde tinham deixado as bolsas e armas, e em seguida Tai'Ren começou a procurar um espaço para treinarem com as flechas. Aneya olhou ao redor, não escutando nada além do som típico da floresta. Estava muito relaxado, mas não podia deixar se sentir ansioso com a calmaria.

— Você não acha que tudo parece muito tranquilo? – Comentou.

Tai'Ren marcava uma árvore para ser o alvo quando foi distraído pelo questionamento.

— Por que pensa isso?

— Não sei. – Aneya deu de ombros. – Achei que depois de tantos dias de viagem, estaríamos vendo mais coisas ruins do que boas.

— Entendo seu ponto. – O menor se aproximou, pegando o arco e as flechas. – Eu achei que teríamos encontrado algum clã na'vi, mas parece que essa parte da floresta é inexplorada mesmo.

— Pois é...

— Isso te preocupa?

— Eu não sei dizer. – O Metkayina tentou compreender sua agitação interna. – Só me parece uma calmaria estranha.

Tai'Ren absorveu as palavras com cuidado, sentindo a ansiedade que elas carregavam e colocou uma das mãos no ombro de Aneya.

— O importante é que estamos bem. – Disse, tentando passar tranquilidade ao rapaz. – Não precisamos encontrar inimigos. Na verdade, temos que passar despercebidos por eles. E isso estamos fazendo muito bem.

O mais alto aceitou a gentileza, agradecido. Esperava do fundo do coração que realmente estivessem apenas sendo discretos e que não fosse algo ruim.

— Você tem razão. – Respondeu, finalmente, com um sorriso tímido. – Sabe no que eu estava pensando?

— No quê?

— Que não deveria ter fugido da sua aula de arco e flecha em Awa'atlu. Com certeza não passaria tanta vergonha agora.

O riso alto que escapou de Tai'Ren fez o clima ficar ameno outra vez.

— Aquele dia foi estranho! – Ele procurou uma posição mais longe da árvore. – Vem, fica aqui.

Aneya obedeceu e manteve os olhos no alvo enquanto Tai'Ren checava se o rapaz estava no ângulo correto. Quando o arco já estava a postos, ele se aproximou para arrumar a postura do outro.

— Respira fundo e com calma, não precisa prender o ar. – Instruiu, tentando manter uma certa distância. – Pode levantar mais o braço de trás.

Aneya não desviou o olhar do alvo distante e tentava absorver os ensinamentos, concentrado. Mas era complicado por saber que era analisado cuidadosamente pelos olhos cinzas.

— Está bom assim? – Perguntou, hesitante.

— Está sim, mas não atira ainda. O importante agora é você se familiarizar com a postura correta. – Ele se aproximou, querendo tocar o braço esticado para a frente, mas mudou de ideia, com a imagem do rosto de Aneya muito próximo borbulhando em sua mente. – O braço que você apoia o arco é onde precisa focar. Tudo tem que estar estável para o tiro ser preciso. Lembra de quando aprendemos a respiração correta para o mergulho?

— Sim, eu lembro.

— Precisa buscar essa mesma tranquilidade para estabilizar o arco. A respiração é importante por isso.

— Entendi. – Os olhos azuis buscaram os cinzas, ansiosos. – Posso atirar?

Tai'Ren tocou os ombros do rapaz com cuidado. Sem perceber nenhum movimento que indicasse pouca estabilidade, ficou surpreso. Era difícil manter o arco esticado por muito tempo sem os ombros protestarem, mas concluiu que Aneya tinha aquela facilidade por todo o treinamento que teve ao lado de seu pai. Ele era um guerreiro, afinal.

— Se a flecha estiver na linha do alvo, pode.

O Metkayina ignorou as mãos gentis em seus ombros e estreitou os olhos, garantindo a maior precisão que conseguia. No momento em que soltou a flecha, ficou muito feliz por vê-la ir em direção a árvore correta. Contudo, ela não acertou o alvo.

Soltou um suspiro frustrado e Tai'Ren riu.

— Não fica assim. Eu fiz um alvo pequeno de propósito, mas se estivéssemos em uma caçada, você teria conseguido a presa. Foi muito bem.

— Você acha mesmo? – Perguntou, não muito convencido.

— Mas é claro. Eu nunca mentiria pra você, skxawng! Agora, que tal irmos caçar?

— Vamos. – Aneya lhe ofereceu o arco, mas Tai'Ren apenas gargalhou.

— É você quem vai fazer isso! Não me olhe assim, eu te ensinei.

— Mas eu acabei de aprender e foi só um tiro...

— É o suficiente. – O mais novo soou convicto, pegando as bolsas, o fuzil e a lança. – Vamos.

Inseguro, Aneya tentou se lembrar de tudo o que vinha observando nos últimos dias quando adentrou a floresta. Tai'Ren seguiu ao seu lado, bem atento e pronto para ajudá-lo, mesmo que não admitisse. Só então reparou que Aneya estava com blusa e se perguntou se ele era pouco resistente ao frio.

Por estarem em uma floresta mais aberta, precisavam ser muito discretos ao caçar e Tai'Ren não conseguiu esconder o olhar de aprovação ao ver que o rapaz realmente tinha aprendido conforme passavam os dias juntos. Apuraram a audição e no primeiro sinal de companhia, as orelhas de ambos de animaram.

Trocaram um olhar antes de se embrenharem em um arbusto mais corpulento. Os olhos azuis logo captaram a movimentação de um pequeno grupo de animais que pastava em um local mais aberto, cheirando a grama alta. Aneya ajeitou a postura e mordeu o lábio para estabilizar corretamente seus músculos, alheio ao olhar de aprovação do mais novo.

Lembrando de manter a respiração tranquila, soltou o ar uma última vez antes de deixar a flecha seguir seu caminho, atingindo um dos animais enquanto os outros corriam de volta para a floresta. Aneya não perdeu tempo e aliviou o sofrimento da presa, ainda sem acreditar que realmente tinha conseguido.

— Pra quem achava que nunca ia ir bem com um arco, você foi bem rápido em aprender. – Tai'Ren se aproximou, orgulhoso.

— Obrigado. – Sorriu, feliz. – Eu sei que durante uma luta é totalmente diferente, mas, estou feliz que ao menos eu consigo te ajudar a caçar.

— Seja paciente. Uma coisa de cada vez.

Eles tiraram um momento para prepararem a refeição e quando terminaram voltaram a caminhar.

— Quanto tempo você acha que vamos demorar? – Tai'Ren perguntou, distraído.

— Não faço ideia. Será que estamos indo na direção certa?

— Meu tio mostrou que só tínhamos que andar para o norte. Se encontrarmos alguma vila na'vi podemos perguntar se sabem de alguma coisa.

— Como você acha que vai ser quando chegarmos no Santuário dos Ossos? – Questionou Aneya, sem conter a curiosidade.

Tai'Ren assumiu um semblante pensativo.

— Eu penso nisso todos os dias quando me deito para dormir. – Seus ombros baixaram ligeiramente. – Eu gosto de ter esperança, mas as vezes eu imagino que vai estar tudo vazio.

— Não acho que esteja. – Discordou Aneya, chamando a atenção do outro.

— E por que não?

— Qual o motivo do Povo do Céu ter bases na região ao redor e não diretamente nas planícies, se realmente estiver vazio? Talvez tenha algo os impedindo de dominar a região completamente.

O pensamento fez todo o sentido para Tai'Ren e ele se viu dando um pequeno sorriso esperançoso, o que automaticamente fez Aneya sorrir também.

— É, você está certo. Nem tudo deve estar perdido.

Com os ânimos um pouco mais renovados, eles continuaram andando e, a medida que os dias avançavam, repetiam a rotina de voar, treinar com o arco e caçarem juntos. Contudo, o clima ameno da floresta de onde vieram, de calor e chuvas refrescantes, deu lugar aos ventos gelados e a neblina hostil de uma terra que nunca viram.

O novo ambiente em que estavam ainda era uma floresta, porém, com árvores mais finas e espaçadas, além de fria e de vegetação menos diversificada. Os rios rasos começaram a se tornar comuns no novo território, mas era um verdadeiro sufoco para os garotos aproveitarem, já que as águas eram gélidas e ambos estavam acostumados com os amenos recifes ao sul.

No entanto, mesmo que o clima estivesse piorando a cada dia, eles permaneciam firmes em não fazer fogueiras a menos que fosse estritamente necessário. Geralmente, usavam o fogo apenas para preparar as refeições, mas os animais também começavam a ficar mais difíceis de encontrar, o que os obrigava a sair cada vez mais da rota original. Felizmente, o comunicador seguia funcionando corretamente e Lo'ak sempre os incentivava.

Tai'Ren caminhava pela grama alaranjada e fria com os dentes trincados. Estava faminto e muito preocupado. 

Rodeados pela neblina, ele nem precisava olhar para Aneya para saber que ele estava tremendo muito. Mesmo que estivesse vestido com uma blusa, era inegável o quanto ele estava fragilizado pela queda súbita de temperatura.

Portanto, Tai'Ren puxou o único pano que levavam, que usou para improvisar uma blusa e caminhou até Aneya, colocando-o em volta dele, ignorando os ventos gelados em seu próprio peito desnudo.

— O que está fazendo!? – Os olhos azuis lhe encaravam arregalados. – Se cobre, está frio!

— Eu não estou com tanto frio assim. – Retrucou, ajeitando o pano sobre o os ombros de Aneya. Pegou a lança da mão alheia para que os braços ficassem livres para apertar mais o pano.

— Espera, Tai'Ren. Não posso ficar desarmado!

— Não se preocupe, vou ficar do seu lado. – Respondeu, guardando o arco em um dos ombros, enquanto se equipava com a lança. – Vamos andando.

Aneya queria retrucar e não deixar Tai'Ren tão desprotegido do frio, mas não conseguia falar sem tremer, então apenas o seguiu em silêncio, sentindo os pés e joelhos adormecidos. Abraçou o próprio corpo e puxou o pano para o rosto, tentando manter algum calor. 

Há muito tempo não se sentia tão frágil dessa maneira. Não sabia se estava doente ou somente desacostumado com o frio intenso. Pensou no mar dos recifes e além dele, que tinham temperaturas bem mais amenas e sentiu saudade de casa.

Não gostava de demonstrar muito isso porque não queria que Tai'Ren pensasse que estava arrependido, mas ultimamente, vinha se tornando mais frequente seus momentos de angústia.

Sentindo suas juntas doerem pelo frio, Aneya parou.

— Podemos descansar um pouco?

— Se ficarmos parados, vai ser pior. Vamos congelar. – Respondeu Tai'Ren, se aproximando, preocupado. Ele tremia também. – Está muito ruim?

— Só queria parar um pouco. Meu corpo dói.

— Tudo bem, mas eu vou procurar um lugar mais seguro pra ficarmos. Fica aqui, vou ser rápido.

O Metkayina baixou o olhar vendo o outro se afastar, se sentindo outra vez culpado por não ser de grande ajuda. 

Se sentou no chão e ajeitou o pano para que pudesse cobrir suas pernas, mantendo a cabeça deitada sobre os joelhos dobrados. Nem se preocupou em tirar as bolsas das costas. Como estavam quase vazias, já que a maior parte do peso eram os tecidos, agora mal fazia diferença carregá-las.

Aneya contraiu diversas vezes os dedos dos pés para tentar senti-los direito e fechou os olhos, mas mantendo a audição bem afiada. A floresta onde estavam era bem quieta. Além do vento, havia somente o som das águas suaves dos inúmeros rios frios.

Estava quase cochilando quando Tai'Ren voltou.

— Achei um lugar. – Disse rapidamente, o ajudando a se levantar. – Vamos.

Aneya agradeceu a ajuda e gemeu quando precisou esticar as pernas que esfriaram em uma posição dobrada.

— Que lugar? – Sussurrou para o menor.

— Um tipo de caverna.

— É seguro?

— É sim, vem. – Apoiou um dos braços em torno da cintura do Metkayina, mas ambos estavam com tanta pressa para chegarem que nem repararam na proximidade.

No momento em que viu a pequena caverna rochosa, aparentemente formada pelo desabamento parcial de um pequeno monte de rochas claras, Aneya hesitou.

— Tem certeza de que é seguro?

— Sim, é antiga. – Tai'Ren o puxou, sem mostrar dúvidas. – Tem muitas raízes fortalecendo a estrutura.

Eles entraram na pequena abertura escura e o menor permitiu que o Metkayina se deitasse. Felizmente, o vento ruidoso não entrava totalmente ali, o que tornava o ambiente muito menos hostil do que na floresta.

Contudo, os olhos azuis se estreitaram, urgentes quando viu Tai'Ren puxar uma pequena pilha de madeira, trabalhando para acender uma fogueira.

— O que está fazendo? – Perguntou Aneya, trêmulo.

— Uma fogueira.

— Mas, por quê? Não podemos chamar atenção.

— Você está congelando, precisa se aquecer. – Respondeu, sério. – Não tem nenhum perigo aqui.

— Como pode saber, Tai'Ren?

— Confia em mim, tá bom?

Aneya sabia que não tinham como ter certeza daquilo, mas não tinha energia para discutir naquele momento e quando o fogo começou a aquecê-lo, esqueceu completamente das preocupações e se encolheu um pouco mais no pano. Mas seu momento de paz foi interrompido, quando Tai'Ren se levantou, pegando apenas o arco e as flechas.

— Vou caçar, você fica.

— O quê? – O Metkayina se sentou rapidamente. – Não pode me deixar aqui!

— Não foi um pedido, Aneya. – Sua voz soou séria outra vez e a expressão não mostrava qualquer traço de hesitação. – Vou deixar a arma e a lança aqui. Nada de ir atrás de mim. Você precisa se recuperar.

— Mas...

— Eu volto logo. – Tai'Ren o interrompeu, chegando mais perto e amenizando o tom protetor. – Confia em mim. Pode fazer isso?

— Eu sempre confio em você. – Aneya sussurrou, baixando os olhos, sem gostar daquela ideia de se separarem.

Foi arrancado de suas preocupações quando se viu envolvido em um abraço terno e sentiu os dedos de Tai'Ren em seus cachos. Ficou com medo, mas continuaria confiando nele.

— Vou estar esperando...- Deixou escapar.

— Eu sei que vai. Continue perto do fogo. Logo vai estar melhor. – Ele se afastou um pouco para tirar as peças do comunicador. – Fica com isso. Ainda não está tarde, mas não sei quando tempo vou demorar e não quero correr o risco de ir para algum lugar sem sinal.

Ajudou Aneya a equipá-lo corretamente e se levantou para sair.

— Sei que nunca usou uma arma dessa. – Apontou para o fuzil. – Mas não tem segredo, é só puxar o gatilho na direção do inimigo. Eu a deixei carregada e destravada, não mexa a menos que precise.

— Tudo bem. – O maior concordou, ainda se mantendo perto do fogo e muito encolhido. – Tai'Ren, só uma coisa.

— O quê?

Aneya removeu o pano e de cima dos ombros e tirou a blusa, jogando-a em direção ao outro.

— Você precisa se manter aquecido lá fora. Sei que usamos as suas com a tinta.

— É você quem precisa disso... – Começou ele, mas Aneya foi mais rápido.

— Eu estou com o pano e o fogo. Vou melhorar. Por favor, me escuta só dessa vez.

Os olhos azuis pareciam implorar e Tai'Ren não viu outra alternativa além de ceder, vestindo a blusa um pouco grande para ele. Com uma breve despedida, voltou para a floresta fria.

Ele sabia que não havia animais na região, então não se preocupou em andar muito devagar. Marcou as árvores no caminho com o punhal da mesma maneira que tinha aprendido com Neteyam ao longo dos anos que treinaram juntos e tomou a decisão de seguir pelas árvores perto de um rio, sabendo que em algum momento encontraria um animal se hidratando, ou pelo menos algum peixe mais farto.

O frio ficava ainda pior perto da água, mas ele seguiu se movimentando, ignorando o vento que levava as tranças, que soltavam do coque. Manteve o arco sempre pronto, com os olhos firmes na margem do rio.

E assim continuou por pelo menos 1 hora inteira.

Já estava preocupado com a distância que estava de Aneya, porém, não superava o desespero pela ausência de caça. Se perguntou se o clima hostil expulsava os animais e para onde poderiam ter ido, mas não chegava a lugar algum em seus questionamentos.

Todo aquele lugar, por mais bonito que fosse, estava abandonado.

Parou por alguns segundos para descansar e cogitou alterar o plano de seguir o curso do rio e o quão difícil seria encontrar o caminho para a caverna se o fizesse. Mas decidiu não arriscar e continuou com os planos. Se aproximou da água com olhos atentos para peixes, mas só viu plantas coloridas, que não pareciam amigáveis.

Desanimado, Tai'Ren continuou em frente, mas depois de longos minutos exposto ao vento frio, ele parou e estreitou os olhos ao ver uma marca no céu.

— Fogueira? – Sussurrou.

Subitamente empolgado com a possibilidade de encontrar outros na'vis, mas sempre em alerta para se defender caso não fossem benevolentes, se aproximou do rastro de fumaça cinza e decidiu ir para o meio das árvores, camuflando ao máximo sua chegada.

Contudo, depois de apressar o passo e começar a ver os contornos de algumas construções de madeira destruídas e incendiadas, Tai'Ren arregalou os olhos, se abaixando para se esconder entre os raros arbustos.

Os olhos cinzas buscaram qualquer movimentação, mas aparentemente não havia. Como o fogo era recente, se aproximou com cautela e as orelhas seguiam muito espertas. Do ângulo em que estava, a fumaça cinza atrapalhava a visão, então ele se afastou um pouco mais do rio, indo mais fundo na floresta.

Ganhando mais confiança por não escutar nenhuma movimentação estranha, Tai'Ren saiu de trás dos arbustos e caminhou lentamente pelo que agora entendia que era um pequeno complexo de construções de madeira, desenhados com símbolos e gravuras na'vi, porém, o fogo havia se alastrado por ali, consumindo rapidamente as madeiras finas. Viu também em torno de seus pés, tigelas quebradas e outros utensílios estranhos.

Usou uma das mãos para proteger o rosto da fumaça densa e se preparou para chamar quem quer que morasse ali, começando a se preocupar com o silêncio e imaginando que o incêndio tivesse ferido os moradores da pequena vila.

Entretanto, quando contornou uma das construções que tinha ficado mais inteira, ele paralisou, deixando a mão que tampava o nariz e boca, ir lentamente em direção ao arco outra vez.

Havia uma fileira de corpos na'vi, de diferentes tamanhos e idades, dispostos no gramado chamuscado. Alguns parcialmente queimados, mas todos feridos por projéteis que Tai'Ren não precisou de um segundo a mais para entender de quem era e o que tinha acontecido.

Seus olhos encheram de lágrimas e ele desviou o olhar da cena horrível, chorando o mais silenciosamente possível. Não queria acreditar que uma vila tivesse sido completamente massacrada daquela maneira tão cruel, e foi inevitável pensar que poderia encontrar a família de seu pai da mesma forma.

Suspirou com muita força para conter um soluço que ameaçava escapar e se aproximou dos corpos desfalecidos de seus irmãos. Rezou baixinho a Eywa para que os recebesse com carinho e mordeu o lábio, sabendo que não poderiam ficar por ali.

Pensou em Aneya e na fogueira que ele tinha mantido acesa. Seu coração disparava à medida que imaginava qualquer coisa de ruim acontecendo com o rapaz sozinho na caverna. 

Imediatamente se virou para retornar, mas sentiu o chão vibrar abaixo de seus pés.

Quando a fumaça dissipou um pouco mais, ele entendeu a origem das vibrações. Duas máquinas dotadas de braços e pernas de metal caminhavam em sua direção, armadas. No momento em que os olhos cinzas focaram nas figuras minúsculas dos humanos hostis que as controlavam, fazendo-as correr, ele sabia que não poderia os levar na direção que veio.

Foi como se o tempo parasse. Tai'Ren passou por tantos treinamentos nos últimos anos, que achou que, no instante em que visse o Povo do Céu e suas máquinas, reagiria sem pensar, lutando sem piedade. 

Contudo, quando as armas dispararam, ele continuou paralisado.

— Cuidado! – Ele tentou se virar na direção da voz fina, mas seu corpo foi empurrado para o chão.

O som dos disparos foi ensurdecedor e Tai'Ren ficou desnorteado. Quando tentou respirar com tranquilidade para organizar os pensamentos, um garoto apareceu em seu campo de visão. 

E teria ficado aliviado, se ele não fosse do Povo do Céu.

— Ei! – Ele gritou. – Temos que correr! Você vai morrer! Tá me ouvindo!?

A figura minúscula e quase submersa em uma grossa camada de roupas, puxava sua blusa, insistente. Ele falava na'vi.

— Anda! Eu instalei uma bomba, esse lugar vai voar!

Com um aceno rápido, Tai'Ren pegou o arco e tentou seguir o rapaz que mal chegava na metade de seu corpo, mas uma sombra se colocou sobre eles e quando virou, conseguiu os proteger de uma pilha de madeira arremessada. 

Mais disparos eram feitos, mas com a fumaça e os escombros, ambos conseguiram se esconder.

— Tem dois sinais de calor ao norte. – A voz metálica de uma das máquinas surgiu quando os tiros pararam e Tai'Ren agradeceu seu pai por tê-lo ensinado a língua do Povo do Céu.

— Não acredito que vou morrer aqui... – O garoto se escolheu, gemendo em sua língua de nascimento. Mesmo com o agasalho pesado, era possível ver uma poça de sangue em seu ombro esquerdo. – Por que eu só não corri e deixei o na'vi ser metralhado? Que merda!

Os olhos cinzas se estreitaram, notando a vibração no solo aumentar mais. Inspirou e expirou lentamente, ajeitando a postura do arco. Pensar que as máquinas pisavam sobre os corpos de seus irmãos lhe encheu de uma fúria que nunca sentiu antes.

— Eu não vou ser morto aqui. – Sussurrou para si mesmo, mas chamou a atenção do humano encolhido.

— Está brincando? Você não ouviu quando eu disse que plantei uma bomba!? Vamos ser feitos em pedaços! Temos que correr para longe daqui, agora!

Sem se deixar levar pela pressa, Tai'Ren se aproveitou da fumaça e saiu de trás dos escombros rapidamente. Com um rosnado feroz, ele guardou o arco e pulou sobre uma das máquinas usando toda a sua força para socar repetidas vezes a arma enorme, tomando o cuidado de não ficar na frente dela.

— Tira ele de cima de mim! – Gritou o humano que pilotava, clamando para a outra máquina.

— Ele tá te usando de escudo!

Quando conseguiu arrancar a arma de fogo dos braços metálicos, Tai'Ren puxou a criatura maior do que ele e empurrou em direção a segunda, usando-a para se proteger da outra arma de fogo. Rapidamente puxou o punhal e golpeou repetidas vezes o vidro até que pudesse acertar o humano que a controlava.

Ofegante pela ação, Tai'Ren empurrou a máquina já sem vida sobre a outra, derrubando ambas no chão em meio a fumaça. Puxou seu arco instintivamente e não precisou de um segundo para estabilizar a visão no alvo que se levantava, prestes a apontar a arma em sua direção. Mas sequer teve tempo. A flecha o atingiu no mesmo instante.

Ainda assim, ele não relaxou. Suas orelhas se atentavam a qualquer nova vibração.

— Ei, cara na'vi!!! – O menino gritou, balançando os braços perto do rio. – Corre! Temos 1 minuto!

Sem pensar duas vezes, Tai'Ren o seguiu, sem pensar se poderia se arrepender daquilo. Eles correram na direção de onde tinha vindo anteriormente. O humano era terrivelmente mais lento por sua estatura e pela camada de roupas.

Quando a luz intensa surgiu atrás deles, nenhum dos dois parou para admirá-la. Contudo, em um impulso frenético, o menino empurrou as pernas de Tai'Ren, o fazendo cair no rio gelado. O garoto pretendia fazer a mesma coisa e segui-lo para dentro do rio. Mas a onda de choque foi tão intensa que os olhos cinzas se arregalaram a ver o corpo pequeno ser arremessado para longe, sumindo da sua visão.

Mesmo submerso no rio gelado, Tai'Ren foi empurrado violentamente dentro da água devido a força da explosão, tendo o corpo chacoalhado e se enganchando nas longas fileiras de plantas esbranquiçadas, que pareciam querer prendê-lo ali.

Naquele momento, tudo parecia fora do lugar. Seu coração acelerado diante de tudo o que tinha feito e presenciado o fez perceber que de alguma forma, agora estava na hora de encarar a realidade e a verdadeira face do mundo em que vivia.

E Tai'Ren não sabia se realmente estava pronto para fazer isso.


Notas Finais


Agora vamos começar os dramas na nossa jornada! Preparem o coração!

Para fecharmos o capítulo de uma forma lindíssima, trouxe uma fanart pra vocês! O anjo @FatGum nos presenteou com uma lindeza de ar do nosso anjinho Tai'Ren!

Como aqui dá muito problema para compartilhar artes, vou deixar o link do capítulo no wattpad, que já fica visível! https://www.wattpad.com/1333387408-always-somewhere-aonung-x-neteyam-4-colis%C3%A3o

Muito obrigado por nos proporcionar esse desenho tão lindooo 😭💕

Um beijo gente! Me contem o que acharam!


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