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História As Leis do Sol - Venenos e Curas


Escrita por: Tulyan

Notas do Autor


Henlo pessoal! Mais um capítulo lindinho das Leis do Sol, minino tem tanta coisa rolando por baixo dos panos... nem te conto...

Capítulo 20 - Venenos e Curas


Dá uma sensação boa retornar pra casa, digo, pro acampamento. Eu tenho pra mim que o dia de hoje pode acontecer muita coisa legal, princi-

— Franklyn. – Tsaida me chama a atenção com um toque da sua pata no meu pé direito.

— Oi. – até me assusto. – Que foi?

Olho para baixo, para a origem do toque que fez.

— Esqueceu de me dar o ensinamento de hoje.

— Esqueci? Ah, verdade! Bom... achei que ia esperar pro jantar que nem antes?

— Acho que estarei ocupado a noite toda, então.

— Tá bom. – volto os olhos pro teto enquanto cruzo as pernas e apoio os braços no encosto do meu assento. – Deixa eu ver... algo pra hoje... O deserto e super frio a noite porque a areia não retém calor bem como a terra comum, e como pode ter notado, não há muitas nuvens, e elas ajudam a rebater o calor do solo de volta a ele, e como não tem, qualquer calor que havia na areia some com o Sol, a mesma coisa acontece com a atmosfera, mas esse dai eu te conto amanhã.

— Mais cento e sessenta e nove respostas e acabou.

Ouvir isso deve me faz olhar esses olhos cansados com mais preocupação, as vezes eu esqueço que esse contador vai prejudica-lo tanto quando chegar a zero. Gosto de pensar que os seus deuses possam nos agraciar com uma ajudinha, mas como também gosto de pensar, as vezes você mesmo tem que ajudar pra ser ajudado.

— Acredita que algo melhorou enquanto estivemos fora?

— Sou treinado para não gerar esse tipo de esperança. – o guepardo até nega com a cabeça. – Precisamos sempre estar focados no que deve ser feito ou pensado, mas, exercitando a ideia, nossas tropas poderiam ter avançado pelo lado leste e conseguido de volta o Forte Três-Garras, seria boas notícias.

— Forte Três-Garras. Nome curioso.

— Ele foi construído aproveitando de três grandes formações rochosas que fazem quase perfeitamente um triângulo. Por isso o nome.

— Criativo. – brinco.

— Não é?

Quase posso ver um sorriso nele, depois de tanto tempo, os seus lábios negros sobem um pouquinho e os bigodinhos até balançam com o som curto de um “hnf” que faz. É bem mais bonitinho do que eu poderia descrever ou que ele gostaria de mostrar.

— Celeste. Eu vou pedir para que possamos ter mais viagens como essa, mas teria de ter um pouco de paciência.

— Vai ser legal, tomara que não precisemos lutar contra outro Verme da Areia por lá, né?

— Seria bem interessante. – os seus olhos passam para fora, sua atenção também vai para lá e as suas orelhas se levantam um pouco mais. – Jaya, pare aqui.

Ao nosso redor, por depois das janelas posso ver as cabanas se apontando junto a soldados das mais diversas raças, até torno a sorrir um pouco por ver alguns voando ali. Mas esse guepardo mal espera a carruagem cessar seu movimento, ele se abaixa pra calçar suas sandálias e com os dedos rápidos amarra ou aperta as cintas pequenas, não sei como isso seria chamado.

— Tsaida, tá tudo bem?

— Sim, volte para a tenda, te encontro assim que puder. – a sua mão vai até a maçaneta e a abre sem esperar a minha resposta.

— Tá- tá bom.

E o barulho da porta de fechando me interrompe de continuar.

Posso ver o guepardo seguindo com pressa pra algum lugar, mas, as tendas brancas e beges logo o ocultam e seguimos da mesma forma. Deixamos os panos, cordas e madeiras para trás e posso ver depois que me coloco no outro do assento aquela a ponta daquela tenda vermelha entre as outras.

Mal tenho tempo de pensar no que fazer, sinto a carruagem desacelerando e Jaya logo pula do seu lugar e ouço seus passos rápidos até a porta direita, é o mesmo lado que a tenda está e na entrada já posso ver aquele chacal, seus olhos baixos sãos os de sempre, tal como a sua roupa simples de algodão de cor neutra, mas o que me atrai a atenção imediata é esses grilhões que prendem suas patas juntas e por uma argola seguem outra corrente para dentro da tenda levando o cinza escuro do metal sobre o tapete avermelhado.

Jaya se coloca ao lado da porta e tal como uma celebridade sou convidado pra sair e eu o faço exibindo a minha igualdade para com o escravo, as minhas correntes escorrem dentre as minhas pernas e caem para o chão antes que a minha altura os levante. Torno a coloca-la atrás do pescoço pra equilibrar o peso levantando a postura ao lado da gueparda que me auxilia fechando a porta.

— Senhor Celeste, está entregue, deseja que eu o sirva em alguma coisa? Qualquer coisa.

— Claro, Jaya. – aponto para trás dela, para o chacal que se curva e faz cair as orelhas. – Ele não ficava acorrentado antes, eu vou conversar com ele, mas, se possível, poderia falar com os outros soldados quanto ao porque me trazer um pouco de comida e água?

— Imediatamente, senhor, tenho certeza que o sabor das provisões é entediante, não é?

— Por aí, aliás, obrigado pela ajuda, se estiver livre, seria legal conversar contigo hoje a noite. O que acha?

— Não tem problema, Celeste, vou apenas tirar a tarde para descansar e estarei aqui assim que o Sol se pôr. Se... o Dat’al Katish Tsaida permitir também, claro.

— Tá bem.

Aceno a ela um tchau, mas, como seus modos dizem, ela coloca os punhos um contra o outro e baixa a cabeça levemente, até posso ver sua bolsa de coisas variadas escorrer da sua cintura para frente.

— Até mais tarde.

— Até.

A vejo retornar para a carruagem, quase me pego num susto incrível ao tatear o bolso e não sentir o meu celular, mas, tava no outro. A gueparda já estende as mãos e as runas se formam abaixo da sua palma, não sei exatamente como funciona, mas, esse azul brilhante se mistura e gira dando o comando para o veículo andar.

Volto o olhar para o chacal que permanece curvado e silencioso. A primeira coisa que eu adoraria fazer é jogar essas sandálias longe e dar um abraço nele, talvez não dê pra fazer tudo...

Chego perto o bastante e o envolto nos meus braços, sinto e ouço o sustinho, mas, o seu pêlo é tão maciozinho e quentinho que não resisto. Só não demoro pra ele não ficar confuso demais.

— Eae Siqat, como vai?

Seus olhos castanho-escuros como os meus estão totalmente perdidos, mas eu bato nos seus ombros empolgado.

— Pode falar, aliás. – esqueço dessas formalidades.

— O senhor... me permite falar?

— Sim, me diz, como está?

— Este servo está bem, senhor, agradeço a preocupação. C-como o senhor está, e o senhor Tsaida?

— Ele tá bem, e eu estou cansado da viagem, mas. – noto depois que a carruagem se foi o quanto de olhares eu tenho em mim, em nós, na verdade. – Vamos entrar?

— Sim senhor.

Baixando a cabeça de novo, ele caminha para trás, fazendo barulho nas correntes entre as suas patas. Vamos mais pra dentro juntos e eu não me seguro em acompanhar a corrente até o seu fim, que dá na minha Gaiola de Faraday e um cadeado grande de bronze ou latão está ali, trancado também.

— Siqat, me conta. – e falo isso vendo ele seguir até o outro lado, onde o Tsaida dormia pra buscar a chave de fenda azul. – Porque te acorrentaram aqui? O que houve?

Dizer isso é como achar a bagunça de um cachorro, suas orelhas e olhos caem e ele parece ficar lento, como se cada passo fosse um perigo para os seus dedinhos multicores.

— Perdão, senhor. Esse escravo. – ele evita me olhar e falar, leva o rosto pro lado e não parece ter coragem pra continuar.

— Siqat, eu não sou o Tsaida, fale pra mim, eu só quero entender.

— Esse escravo estava trabalhando nas paliçadas com outros. Juro que estava na cabana nossa e estava me preparando pra dormir, mas, um dos soldados me disse que precisava dos meus serviços, em troca, ele me daria um pouco de água. – as suas patas nervosas até arrastam uma contra a outra fazendo o metal ranger primeiro. – E-eu não tinha bebido nada nesse dia e... eu não posso negar, meu senhor. Então ele me disse pra levar um saco para longe e enterrar na areia, e-eu fiz isso, ele disse que ia me recompensar, mas... um guarda me viu e achou que estava tentando fugir, eu disse que estava fazendo um trabalho para um soldado, mas ele não me ouviu.

— O que havia no saco?

— Moedas. – e ele engole seco. – E alguns frascos, senhor.

— O que havia nos frascos?

— Me disseram que era um tipo de... – ele hesita em falar, mas, quanto o seu olhar medroso alcança os meus, encontra um aliado, ao menos é o que eu tento mostrar. – Era veneno, senhor.

— Vire-se. – e ele obedece na hora. – Levante a sua blusa.

Suas mãos deixam a chave sobre a mesa ao lado e logo vão até os ombros, seus dedos catam o tecido e levantam como pedi, mas, entre o pêlo eu consigo ver as marcas e como o sangue seco mancha o seu pêlo curto. Uma aranha de gelo sobe nas minhas costas com um arrepio que faz o ar sumir do meu peito.

Haviam tantas marcas de chicotadas ali que me nego a contar todas, as minhas mãos tentam impedir a minha voz de sair pois colam sobre a minha boca.

— Desculpa eu te abracei! Tá doendo? Desculpa cara.

— Não tem problema, senhor, este escravo está acostumado e aceita sua punição. Eu serei melhor na próxima.

O meu estômago parece cair e ser preenchido por uma sensação vertiginosa de ira.

— Não é questão de ser melhor ou não, Siqat, você foi enganado, me fala como era esse soldado.

— Meu senhor. – ele sequer vira o rosto, só faz cair suas orelhas ovais. – Por favor, está tudo bem, não desejo trazer problemas para o senhor, ou para o senhor Tsaida.

— Siqat, você é propriedade do Tsaida e... – e como isso arranha a minha garganta pra falar. – E ninguém pode fazer isso com você e sair impune, não importa se você é escravo ou o rei desse reino, eu não posso ignorar isso.

— Senhor, por favor. Esse escravo te implora. – ele até se vira soltando sua blusa e logo cai de joelhos pra poder baixar a cabeça quase na altura das minhas canelas. – Me deixe ser punido dessa forma, se... se o senhor tentar procurar o culpado, temo que possa trazer ainda mais problemas.

— Acho que você tava lá quando eu disse, a minha raça é resumida em Obstinação. Fica tranquilo, eu não vou deixar nada te afetar nisso.

— Senhor, por favor, me permita apenas se punido, eu lhe imploro.

— Porque caralho quer isso?

— Siqat é um escravo, se não for punido direito como antes e pelo seu senhor, ele vai valer menos. E se eu não puder ser útil ao senhor e ao senhor Tsaida, eu serei vendido pra outro e... eu não quero ir embora.

Eu sinto o choro que ele segura pra si mesmo, dá pra ouvir entre as suas palavras que me são traduzidas quase imediatamente pela magia. Odeio sentir assim, impotente, mas ele conhecer esse mundo melhor que eu, não há como eu garantir nada no final, não vai ser o meu temperamento que vai ajudar aqui hoje, talvez a minha calma.

— Siqat, pega um balde de água e um pano limpo, eu vou limpar essas feridas direito.

— Senhor.

— Não estou pedindo.

— Sim senhor.

O chacal logo se coloca de pé e não ousa me olhar, não até estar quase de saída quando dá uma breve espiada de canto de olho, só pra poder me ver como um homem segurando um trem pra não cair num precipício. Mesmo que eu segure bem e aceite, desço os olhos pro chão, pra onde os meus pés chamuscaram a sandália.

Tiro as correntes detrás do pescoço e já procuro uma cadeira para mim e pra ele, coloco uma contra a outra de forma que possa se sentar e ter as costas expostas pra mim. Até me pego vendo a corrente esticada, parece ter chegado no limite, mas, pouco depois ela torna a perder tensão e voltar ao tapete, não demora, Siqat é bem barulhento com esses grilhões.

— Senhor. – seu olhar desce ao balde de madeira que traz ao lado.

— Deixe aqui. – aponto a minha esquerda, pra onde ele vem. – Onde tem um pano limpo aqui?

— Limpo? Senhor, poderia não sujar um pano comigo? E-

— Onde?

— Aqui, senhor.

Ele aponta até um pequeno bauzinho de madeira que nunca tinha visto lá da gaiola, na real nem teria ângulo pra notar isso. De dentro, ele me mostra panos como os de secar pratos e tira um.

— Dois. – dessa vez, ele não questiona, saca dois panos brancos lá de dentro e me entrega. – Pegue uma tigela. – e é feito. – Tire a blusa e se sente ali. – aponto a cadeira que fica de costas a mesa e a entrada dessa tenda. – Eu vou limpar como eu puder, me avise se começar a doer, entendeu?

— Sim senhor.

Seu tamanho é de um adolescente, se tiver dezesseis é muito, eu acho. Talvez seja a dieta ruim também, enfim. A sua blusa é deixada no chão ao lado e ele abraça o encosto da cadeira logo depois que consegue ajeitar as correntes sobre a cadeira, é uma luta pois elas não o permitem ficar com as patas no chão e sim com elas penduradas de cada lado. Mas, com a mão eu toco numa com a gentileza que consigo juntar e ele reage como todo Nanci devia, um susto, seus dedinhos de almofadas marrons apertam, só que permitem que eu continue e o faça cruzar os tornozelos sobre esse assento e ficar um pouco melhor.

Já eu, também acorrentado não quero que a minha corrente bata nas suas costas sem querer e por isso enrolo um pouco no braço esquerdo depois de colocar os panos sobre a coxa esquerda. Pego a tigela pra colher um pouco de água, esse povo sofre com a seca, não vou desperdiçar. Molho o pano um pouco e já imagino a tigela ficando avermelhada.

— Lembra, se doer é pra me avisar, eu só quero limpar, tá bom?

— Sim senhor.

— Tá bom.

Talvez isso seja mais pra mim, eu queria estar dormindo um pouco agora, mas acho que isso é muito mais importante. Sangue seco contra o pêlo deve ser bem difícil, por isso, dar um tempo pra amolecer depois de molhar é o que penso agora, mas, como o pano muda de cor rápido...

— Fizeram isso em você quando?

— Anteontem, senhor.

— Jogaram algo aqui?

— Não senhor, esse escravo não merecia sal. – e suas orelhas caem um pouco enquanto deixa apoiar o queixo nos braços que usa pra amaciar o topo do encosto duro da madeira.

— Pode infeccionar. – falo como se ele pudesse ter feito algo. – Eu vou molhar um pouco mais pra ajudar, depois vou limpar melhor, tá bem?

— Faça como desejar senhor, só posso agradecer tanta gentileza comigo.

— Jaya virá mais tarde, ela poderá te ajudar bem mais que eu.

Arrumo as pernas no chão pra juntar um pouco de coragem. Eu nunca tive que fazer algo assim na vida, na verdade, eu tenho um misto de vertigem por mexer em uma ferida assim. Por esse motivo principalmente eu não fui pra área veterinária ou similar, talvez se fosse pra dissecar algo eu fizesse tranquilamente, mas, algo vivo é um problema.

Com suavidade, passo o pano no seu pêlo curto e sinto o sangue seco dissolvendo e se misturando ao pano e a pouca água que mantenho na tigela sobre a mesa. Me concentro o máximo que posso, mas, essas algemas atrapalham tanto, não tenho como ir rápido como gostaria, muito menos com a precisão necessária.

Por isso dou tempo pra acontecer, as suas orelhas caídas mantêm a cabeça mais baixa e as suas omoplatas mais aparentes, e a cauda que se mantém sobre as suas patas cruzadas, parecem querer escondê-las como pode. Ele é um rapaz forte, deve ter sentido dor tantas vezes que isso deve ser brincadeira, ou é o que eu gostaria de pensar, por isso eu presto atenção nos pequenos sinais que ele dá, é um movimento sutil da sua cauda, um apertar dos dedos das suas patas ou um ganidinho sutil e muito baixo pra notar facilmente.

Encontro cada marca do chicote e passo o pano da forma mais gentil que consigo, eu vejo não só sangue, como areia e pêlo solto vindo junto. Como um escravo, ele não toma banho e o mau cheiro é sutil, só que, quando o pano traz fluidos mais esbranquiçados de pus, não é surpresa que algumas partes iriam infeccionar, mas eu até me sinto melhor por como lido com isso, achei que teria refluxos, só que a ideia de ajudar esse rapaz já me sustenta.

— Senhor Celeste, lhe trou...xe. O-o que o senhor está fazendo?

Jaya aponta na entrada da tenda, nas suas mãos uma jarra e uma tigela de madeira com comida dentro, mas, além disso, o seu rosto assustado passa os olhos para mim e para o chacal mais de três vezes antes de dar o primeiro passo pra dentro daqui.

— Você sabe alguma magia curativa? Estou limpando aqui, mas, alguns cortes já estão infeccionando, você pode ajudar?

— Não posso gastar minha magia com um escravo. – ela responde automaticamente. – Me desculpe, senhor Celeste.

— Não é um escravo apenas, é propriedade do Tsaida, me ajude a mantê-lo saudável. – levo os olhos para os dela, uma situação que os Nanci odeiam ter, eu entendi como isso funciona.

O jogo da encarada é de quem tem uma vontade mais forte, quem obedece quem, quem se submete a quem. Os olhos amarelos cor de mel dela se fixam nos meus, mas, depois de dois segundos ela desvia para baixo como o seu focinho que desce um pouco.

— Entendido, senhor. Posso conjurar nele algumas magias para evitar a infecção e ajudar a acelerar sua cura.

— Muito obrigado. – jogo o pano na tigela com água mais vermelha que transparente. – E sobre o caso dele? – aponto ao chacal com o queixo.

— O escravo tentou fugir com algum dinheiro e foi impedido de usar o veneno que tinha para acabar com a sua vida caso fosse pego. Ele recebeu vinte chibatadas como punição e foi acorrentado aqui, pelas patas.

— Acreditou nisso?

— Como?

— Eu ouvi outra coisa. A conveniência é de não acreditar no escravo, eu entendo isso. – e as minha palavras o incomodam, ele parece esconder o rosto entre os braços cruzados que usa de apoio nas costas da cadeira. – Mas, Jaya, acha mesmo que ele iria ser pego se fosse fugir? Acredita que ele iria precisar de veneno pra acabar com a sua vida?

Aponto até para a mesa, onde alguns papéis estão e um pequeno prato raso mantém um garfo de três pontas e uma faca de cabo de madeira e metal.

— Realmente a situação é controversa, mas. – a gueparda coloca tudo que trouxe na mesa e deixa a luz da tarde para trás. – Que outra explicação pode fornecer? Qual explicação?

— Ele. – aponto ao Siqat retomando o mesmo pano ensanguentado a água avermelhada. – Me falou sobre o seu lado.

E continuo a limpar um pouco melhor as suas feridas que já estão fechadas, por isso, não insisto. Boto a mesma força de se cumprimentar um neném.

— O que ele disse?

— Um soldado mandou que ele levasse um saco de moedas e com esses frascos, e que o enterrasse na areia. – levo o pano de volta a água e torço algumas vezes. – Acha que ele conseguiria essas coisas? Aliás, porque ele levaria moedas e veneno se queria fugir? Não iria levar suprimentos e água ao invés?

Colocar esse pensamento na mente dela é o bastante pra fazer as suas sobrancelhas se levantarem e a dúvida brotar na sua mente.

— Então, porque diabos alguém mandaria um escravo fazer isso?

— Pra se proteger, talvez? – até dou de ombros. – Se desse errado. – aponto ao rapaz outra vez com o queixo enquanto dobro o pano e passo a limpar as feridas mais perto da sua lombar, por isso a sua cauda tremelica. – Ele ficaria seguro e outro tomaria a culpa, o que me preocupa é a questão de haver veneno no meio, isso pode significar uma coisa.

— Um espião. Um traidor.

— Uhum. E nesse caso, ele despistou bem, ninguém vai acreditar no Siqat.

— Siqat?

— É o nome dele. – torno a apontar ao chacal com o dedo, dessa vez.

— Chamar o escravo pelo nome... condiz com uma intimidade, Celeste.

— Não vou chama-lo de escravo, nem chamo você de soldado, chamo vocês pelo nome. – e coloco o pano de volta na tigela de sangue e um pouco de água. – Terminei de limpar, poderia?

Me levanto pra dar espaço, a gueparda assente e com passos rápidos passa a minha frente e toma o meu lugar na cadeira. Seus olhos procuram algo ali atrás, mas, param bem quando veem suas patas sobre o assento que o chacal usa, ou talvez seja para as correntes em seus tornozelos que caem um pouco mais para as panturrilhas.

— Hm. – ela limpa a garganta. – Fez um bom trabalho aqui, Celeste.

— Sério? Foi a minha primeira vez nisso, valeu.

Na verdade, gosto ainda mais de pensar que não causei mais dor no rapaz, sei que ele foi treinado para não demonstrar isso, mas, posso ficar com um pouco de soberba.

— Muito bem. Eu vou conjurar uma magia de cura nele, ela vai acelerar a regeneração e aliviar a dor e anular essa infecção, porém, vou pedir que não deem serviços pesados pra ele, pois as feridas podem abrir.

— Tá bem.

— Certo, pode se afastar um pouco, Celeste?

— Claro! – até dou uns quatro passos para trás.

A gueparda então estende as mãos como se quisesse levar mais sangue aos dedos e suas palmas amarronzadas logo começam a emitir um sutil tom esverdeado, um verde lima bem claro e gentil.

— Lux Órus requiescat in anima tua et carnem tuam tueatur.

Aquela luz esverdeada circula as suas mãos, e runas nas suas letras tão elegantes se formam dentre e sobre ela numa mescla perfeita de geometria e desenhos. Quase imediatamente posso ver vapor sair das costas do chacal que aperta os olhos e as mãos sobre o encosto da cadeira, ele morde os dentes, mas não ousa soltar um pio.

Como se abrisse uma janela, Jaya afasta as mãos e faz aqueles desenhos circularem dentro de círculos concêntricos que tocam a pele do rapaz e faz a sua expressão de agonia simples e instantaneamente desaparecer junto com esse belo verde brilhante que se mistura à sua pelagem molhada e multicor.

Dá pra ver como os seus músculos em tensão simplesmente relaxam de uma vez, as suas patas até se largam e penduram de cada lado pelos grilhões que escorrem para o fim da cadeira e deixam seus dedos e o metal tocarem o tapete com suavidade, pois a gueparda o segura antes que bata com força.

— Ele vai ficar bem?

— Sim, Celeste, creio que doeu na hora de tirar a infecção e fechar as feridas direito, mas, eu garanto que não ficará cicatrizes se ninguém fuçar mais. E, eu lhe dei um alívio pelas próximas horas, poderíamos deitá-lo?

— Algumas bandagens não ajudariam ali?

— Usar magia em um escravo já seria impensável, senhor. Colocar bandagens, talvez não seja a melhor forma de prosseguir. – e os meus olhos cerram, só pra fazer Jaya soltar um suspiro alegre. – Tudo bem, Celeste, coloco um pouco de bandagens nele, tudo bem?

— Agradeceria, e muito. – assentindo, a gueparda até se levanta.

— Vou conseguir um pouco mais na minha tenda, volto em breve.

Antes que ela nos deixe, eu toco seu ombro com dois dedos, Jaya para logo que sente e me traz o seu olhar tranquilo como sempre, meio ensolarado pelo Sol tardio e meio sombreado.

— Te devo uma, pela ajuda.

Acho que a constrangi, pois ela olha pra baixo, para as suas patas e arruma suas vestes tão bem feitas e apresentadas. Quase vejo uma garota tímida nessa gueparda, mas esses seus olhos amarelos parecem querer dizer algo que ela não ousa.

— Eu nunca tive alguém me “devendo uma”, Celeste, mas, acho que isso significa que eu tenho um pedido futuro, seria isso?

— É bem por aí.

— Ora, agradeço a sua confiança em mim, senhor. Garanto que usarei bem esse pedido.

Assentindo pra mim outra vez com a sua cabeça, ela até a abaixa um pouco já próxima da porta. Com o gesto deles que juntar os punhos um no outro, parece se despedir.

— Então até logo.


Notas Finais


Já sabem o esquema U..U

Se comentar ganha petpet! E se não comentar, ganha tmbn UwU


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