Have you no idea that you're in deep?
I've dreamt about you nearly every night this week
How many secrets can you keep?
Cause there's this tune I found
That makes me think of you somehow
And I play it on repeat
Until I fall asleep
Spilling drinks on my settee
(Do I wanna know?)
If this feeling flows both ways?
(Sad to see you go)
Was sort a hoping that you’d stay
(Baby, we both know)
That the nights were mainly made
For saying things that you can’t say tomorrow day
Inspirei fundo, soltando a fumaça do narguilé aos poucos. Aquela música tocando realmente expressava um pouco do que sentia no momento. Minha cabeça estava um terremoto, daqueles de magnitude 8,0 na escala Richter. Mais uma vez a pergunta ecoava pela minha cabeça, me intimidando, convidando a ter uma crise existencial, conforme as curvas e desenhos da fumaça lentamente começavam a se dispersar.
- Gosto dessa música. Qual é o nome da banda, mesmo? – perguntou Ana distraidamente, pegando a mangueira da minha mão.
- Arctic Monkeys. – balbuciei, inclinando a cabeça para trás, no sofá.
Ouvi a porta bater e logo Alice entrou serelepe pela sala. Jogou a bolsa e algumas sacolas no sofá ao meu lado, nos observando com um ar repreensivo.
- Ah não! Vão ficar aí moscando no sofá, com esse maldito cigarrinho de Saci enquanto tá um dia lindo lá fora?! – exclamou ela, arregalando os grandes olhos de jabuticaba em nossa direção.
- Eu estou comemorando o feriado, Miss Sunshine... – resmungou Ana, esticando os pés em cima da mesinha e escondendo os olhos com uma almofada enquanto passava a mangueira para mim.
Ri notoriamente do “miss Sunshine”, pegando a mangueira. Alice virou-se para mim, encarando-me descaradamente. Traguei o narguilé, soltando a fumaça pelo nariz. Ana enrugou a testa enquanto me olhava, rindo bestialmente.
- Estou comemorando o feriado dela... – resmunguei debilmente, iniciando um longo ataque de riso conforme percebia o nível de idiotice a que aquela erva havia levado nossas mentes juvenis.
- Vocês são lastimáveis! – riu Alice, pegando suas coisas e indo para o quarto.
Ana revirou-se rindo no sofá alguns instantes e logo estava babando, provavelmente já sonhando. Meu celular apitou algumas vezes e tinha certeza que eram mensagens de grupo. Por que diabos as pessoas arrumam tanto assunto para ficar conversando em grupo? Grupo de família, grupo de faculdade, grupo de vizinhos, grupo de festa-surpresa, são tantos grupos que às vezes me sinto até um pouco perdida. Me estiquei o máximo que consegui para pegar o celular no canto da mesinha, inutilmente. Caí magnificamente de face no chão, como uma banana madura. Vamos ser sinceros, caí que nem bosta. E o pior, do jeito que caí, fiquei. Rindo, sozinha, bestialmente, com um coque bagunçado no alto da cabeça e um camisetão do Tame Impala. Depois de alguns minutos me recompondo, peguei o celular e percebi que não eram mensagens de grupo. Eram do Charles.
- Liv, tá tudo bem? – perguntou Grazi saindo de seu quarto com um olhar preocupado, visualizando a cômica cena de uma garota jogada no chão, toda torta, encarando o celular.
Apenas ri um pouco sem graça e joguei o celular na mesinha, tentando me levantar. É, eu não tinha forças o suficiente, nem para levantar, nem para ler as mensagens dele. Depois de muito esforço, consegui me arrastar de volta para o sofá, enquanto Grazi remexia alguma coisa comestível no fogão.
- Cris mandou uma mensagem avisando que finalmente encontrou o vestido! Acredita nisso? – comentou Grazi com empolgação, ainda de costas, mexendo no fogão - Eu mal posso esperar para vê-la vestida de noiva... Parece tão surreal uma amiga nossa estar casando, sabe, eu acho tão lindo e...- para ser sincera, nem ouvi o resto.
Minha concentração estava toda focada em um passarinho que havia pousado na nossa janela, do outro lado do vidro. Suas cores eram tão intensas naquele bater de asas afobado, que tomou toda a minha atenção. Na realidade, eu sabia que estava tentando me distrair com qualquer coisa que não lembrasse o Charles. Quando o visitante partiu, pude finalmente focar no que Grazi dizia.
- Ela já marcou a data? – perguntei, fitando a ponta das minhas unhas. Cacete, o esmalte está começando a descascar, preciso refazer.
- Já, ela estava alucinada por um salão super elegante que nós fomos visitar outro dia... Lembra, aquele do lustre? Já reservou a data, contratou um cerimonialista também... Você o conheceu? – meneei negativamente com a cabeça – É um gentleman, adorei ele. Precisaremos encontrar vestidos! 2 meses parecem longe, mas passam tão rápido... – balbuciou ela, colocando a gororoba não identificada (que diga-se de passagem, tinha um cheiro ótimo) em um prato.
- Vestidos... – resmunguei com a cabeça em outra dimensão, uma daquelas bem psicodélicas.
- Quem precisa de vestidos? – perguntou curiosamente Alice adentrando a sala, ainda passando o braço pela manga de sua camiseta de gatinhos.
Conversamos despreocupadamente durante algum tempo, assistindo Dirty Dancing na tv, até que Ana acordou. Resmungou coisas sem nexo por uns 2 ou 3 minutos e logo foi para o quarto, se arrastando. O celular apitou outra vez, mudei para o silencioso. Não queria ter que lidar com isso agora, o que tinha com Charles era tão perfeito... Eu realmente tinha que descobrir a verdade? Começava a achar que teria sido melhor se nunca soubesse. Como seriam as coisas agora? Discutimos feio, nos afastamos, discutimos de novo e depois transamos apaixonadamente. Não fazia a mínima ideia de como reagir a tudo isso e minha mão ainda doía um pouco por conta do corte da semana passada. Grazi levantou para lavar a louça e Alice sentou ao meu lado, com uma cara que conheço bem. Ah não, por favor não, tudo menos interrogatório!
- Baby girl, me fala logo... O que tá acontecendo? – perguntou ela com uma sobrancelha arqueada e os lábios em linha fina.
- Ué, não tá acontecendo nada... Por quê? - me esquivei rapidamente pegando o controle, fingindo procurar um canal.
- Olívia Vieira Lebon, eu conheço você! Não sei o que houve entre você e o Charles no domingo passado, mas eu bem que ouvi uns gemidinhos! – fiz cara de afetada e ela fez uma careta, me repreendendo – Você passou a semana toda nessa bad vibe aí, trancada em casa e só encarando a tela do celular! Não foi pra faculdade, não quis comer tacos comigo na quarta, não quis ir ao cinema com as meninas ontem e hoje – ela fez uma pausa dramática para enfatizar a “importância do dia” – que é feriado dormiu até meio-dia, para depois acordar e ficar soltando mais fumaça que chaminé! O que tá acontecendo com você? – exclamou ela inquisitivamente em um tom baixo, para Grazi não ouvir.
- Alice...
- Desliga essa tv e vamos para o quarto, você vai me contar agora o que tá acontecendo! – ordenou ela, desligando a tv e me empurrando para o quarto antes mesmo que pudesse responder algo.
Tropecei no meu próprio pé algumas vezes, mas cheguei viva ao recinto. Alice fechou a porta e sentou na cama, me encarando. Só agora percebia o quanto seus cabelos haviam crescido, os cachos estavam volumosos, emoldurando perfeitamente seu rosto suave – que no momento não aparentavam um semblante tão suave assim.
- Eu to preocupada, Olívia... Me conta vai, por que está agindo assim? O que aconteceu entre vocês dois? Precisa de um tempo pra você? – perguntou ela desmanchando a feição raivosa e despertando o olhar compreensivo.
- Eu... – corri os olhos pelo quarto, procurando uma forma decente de explicar o que acontecia, mas sem contar tudo o que acontecia. Alice era minha melhor amiga, queria muito deitar em seu colo e abrir meu coração... Mas não sabia até que ponto aquele assunto poderia repercutir em nossas vidas, não queria enfiá-la nessa confusão.
- Charles me mandou uma mensagem na quarta-feira, perguntando sobre você... Parecia preocupado, Liv. Vocês não estão juntos mais? – perguntou Alice lentamente, fitando minhas mãos trêmulas. Puta que pariu, eu to tremendo?!
- É complicado baby girl... Descobrir segredos da outra pessoa é difícil, as vezes não sabemos como lidar... E é isso que estou enfrentando agora, um segredo dele. Eu sou apaixonada pelo Charles, mas... Não quero ter que lidar com isso agora. Não sei se consigo... – respondi um pouco encabulada, tentando controlar o movimento repetitivo das mãos.
Alice levantou um pouco receosa, segurando meus dedos. Abriu um sorriso terno, puxando-me para um abraço.
- Eu espero que isso tudo passe, baby girl... Estarei sempre aqui para apoiar você, ok? – sussurrou ela, acariciando minhas costas. Oh céus, como eu precisava disso! Me agarrei ao abraço de Alice e chorei compulsivamente, me libertando de toda a angústia acumulada naquela semana. Às vezes não precisamos desabafar, precisamos desse abraço, carinho, o apoio que te deixa se abrir sem medo de perder os alicerces.
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.