História Close Your Eyes • Sterek (reescrevendo) - O Sol, a Lua e a Verdade

Derek respirava com dificuldade enquanto desferia golpes brutos e ágeis contra o saco de boxe. Sua mente estava anestesiada e anuviada pela dor, o sangue escorrendo pelos dedos das mãos e tingindo de escarlate as ataduras. Ele ignorou os machucados que surgiam e logo se curavam na mesma velocidade, os lábios contraídos em plena concentração.

A lembrança da noite anterior o agrediu com mais força do que a usada para descontar sua frustração no saco de boxe. Era como mergulhar em um sonho desbotado e confuso, onde não sabia como despertar.

Aquilo realmente tinha acontecido?

— Vejo que está com muito vigor hoje, querido sobrinho. — Peter surgiu do meio das árvore feito um fantasma, batendo os pés nas escadas de madeira da varanda. O verde da floresta refletia em seus óculos escuros. 

— Você voltou. — Derek tentou esconder a surpresa presente em suas palavras, cujas saíram de forma grossa. Fazia algum tempo que seu tio não aparecia pela cidade e muito menos ligava para dar notícias, o que era bem típico desde o incêndio...

— Eu ouvi falar que as coisas estão meio estranhas em Beacon Hills. — Peter começou, entrando no chalé sem cerimônias e sendo seguido por Derek. — Quero saber como meu sobrinho está.

— Estou bem. — Derek removeu as faixas ensangüentadas, revelando suas mãos completamente intactas e curadas devido à  regeneração acelerada de um alfa. Sorriu satisfeito.

— Você é um lobisomem, Derek. Sempre estará saudável fisicamente... bem, na maior parte do tempo. — Peter torceu o nariz ao sentir o cheiro forte de bebida e wolfsbane, revirando os olhos com o estado em que a sala se encontrava. Garrafas de vidro vazias jaziam na mesa de centro, algumas quebradas, os estilhaços esquecidos no chão de madeira. Uma verdadeira bagunça. 

— Onde você quer chegar? — O alfa questionou com a voz arrastada e os braços cruzados. Ele não esperava que seu tio fosse aparecer do nada, sentia-se exposto e não entendia aquela preocupação repentina.

— No motivo de tudo isso. — Peter murmurou com um quê de preocupação em sua voz, percebendo rapidamente a alteração de humor se seu sobrinho. 

— Mesmo se houvesse um, não seria da sua conta. — Suas palavras eram como lâminas extremamente afiadas, frias feito gelo, deixando Peter sem reação e boquiaberto. Ele não sabia por que estava agindo daquela forma, algo ruim se revirava dentro de si e suas mãos tremiam.

— Por quanto tempo você acha que vai conseguir manter isso escondido dele? Ele precisa saber que é seu...

— Não ouse terminar essa frase. — Os olhos verdes de Derek tornaram-se um rubi intenso e suas feições mudaram subitamente, toda a angústia e medo ameaçando transbordar pelos seus poros. Mas então hesitou. — C-como você sabe? Eu nem ao menos entendo o que isso significa...

— Querendo ou não, eu sou o seu tio, sangue do seu sangue. — Peter se aproximou lentamente, pousando a mão no ombro de Derek e brilhando seus olhos azuis em resposta. — E consigo ver que está confuso. Seu lobo interior está agitado nos últimos tempos, não está? 

Era incrível como seu tio sempre sabia o que ele estava sentindo, desmanchando qualquer barreira que ele construísse ao seu redor para se isolar com seus próprios sentimentos. Algo que se tornara comum desde o que aconteceu com Paige...

Afinal, era mais fácil assim. 

— Não é apenas a proximidade da lua cheia que está causando isso. É o seu lobo, sua essência mais pura e genuína, reagindo quando ele está por perto. — Peter continuou, observando os olhos do alfa voltarem ao normal assim como a sua respiração. 

Nos últimos dias, tudo aquilo que ele havia mantido guardado dentro de si por muito tempo estava vindo à tona de uma só vez. Mas sempre que ele estava perto do garoto hiperativo e desajeitado, essa sensação de incerteza e angústia desaparecia, e tudo parecia se encaixar. 

O seu cheiro adocicado e forte, os seus olhos castanhos e curiosos, os fios de cabelo rebeldes e as pintinhas espalhadas pela pele macia e alva, o calor de seu corpo próximo ao seu...

A batida na porta o acordou de seus pensamentos irrefreáveis, o ruído extremamente irritante se repetindo até Peter abri-la. Derek se perguntou quem poderia ser, já que não estava esperando ninguém. 

— Acho que você errou a casa, não estamos interessados em comprar cookies, ou seja lá o que você esteja vendendo. — A típica arrogância era presente na voz de Peter, ele estava prestes a fechar a porta novamente quando a mulher o impediu com o pé na soleira.

— Estou procurando Derek Hale, e não vendendo cookies, senhor. — A mulher empurrou a porta, lançando um olhar fixo e desafiador para Peter, com os cabelos presos em um coque volumoso e improvisado.

— Deixe ela falar, Peter. — Derek murmurou e seu tio cedeu.  — Eu lhe conheço? 

— Provavelmente não, eu sou nova na escola. — O sorriso nos lábios dela era extremamente branco e forçado, ressaltando sua pele jovial e impecável. — Estou aqui para falar sobre a sua inscrição para assistente de treinador da escola Beacon Hills High School, você foi o primeiro colocado na prova! 

— Você vai ser treinador? Essa é nova. — Foi Peter quem falou primeiro, as sobrancelhas arqueadas encarando seu sobrinho, que também estava surpreso.

— Assistente de treinador, tio. — Derek ressaltou, ele havia se esquecido completamente da inscrição e de tudo o que aquilo significava. Afinal, pensava que fosse demorar para sair o resultado e que ficaria em qualquer colocação, menos em primeiro. — E com quem eu falo?

— O senhor deveria usar o celular com mais frequência. Meu nome é Jennifer Blake, a mais nova secretária e professora da escola. 

—

STILES

— Ela o quê? — Eu perguntei, minha voz subindo algumas oitavas enquanto passava a mão livre pelo rosto e apertava o celular com mais força contra o mesmo, sem conseguir acreditar no que havia escutado. 

— Na última reunião da pack, eu ouvi Erica e Boyd conversando sobre esconder as varetas. Tentei impedí-los, mas ela me chantageou... — A voz de Scott vacilava do outro lado da linha. Então as peças das barracas não haviam desaparecido do nada, e sim sido furtadas...

— Mas por que ela faria isso? — Perguntei, mesmo que meu subconsciente acelerado já soubesse de uma possível resposta. Uma resposta nada animadora.

— Para que você e Derek dormissem juntos na barraca. — O efeito daquela simples frase foi inacreditável em mim. 

Meu corpo inteiro se arrepiou com a memória do dia anterior, como se eu estivesse de volta naquela barraca pequena e aconchegante e com um Derek tão próximo de mim, o calor emanado pelo seu corpo me aquecendo na noite fria.

— Isso quer dizer que ela fez Malia escolher as duplas?! E a corrida no lago... — Acordei do torpor ao perceber que Erica havia planejado tudo aquilo com o pessoal. Ao mesmo tempo que achava genial por sem um plano bem arquitetado, eu senti algo quente se remexer dentro de mim.

Puta que pariu.

— Você realmente não percebe? — Scott perguntou com cuidado. — Sempre que você está por perto, Derek age de uma forma diferente, seu humor muda completamente e ele deixa a carranca de lado. Erica argumentou que ele estava insuportável no tempo que você ficou fora da pack, descontando nos treinos e sendo um babaca. E agora... bem, você sabe. 

E foi quando eu lembrei. Durante a última noite, no acampamento, eu tive pesadelos horríveis com a criatura sem rosto que havia encontrado no quarto de Derek, as vozes ainda rondavam a minha mente. Mas algo pareceu sumir com os pesadelos e a agonia, acalmando-me de imediato, algo como o conforto de um abraço quente.

O abraço de Derek. 

Como isso havia acontecido? Ele disse que dormiríamos um para cada lado, a expressão de vergonha foi impagável em seu rosto. Eu até mesmo construira uma barreira de travesseiros entre nós, a qual foi destruída após uma guerra de muitas penas e gargalhadas descontroladas.

— E-Eu não sei do que você está falando. — Agradeci por estarmos conversando por ligação, assim Scott não podia ver o quão corado meu rosto estava. Mas ainda assim, ele percebeu a alteração na minha voz e soltou um riso baixo. 

— Vou fingir que acredito. — Por que Scott tinha que ser tão... Scott? Mas então me dei conta de que algo não estava encaixando e abri um sorriso malicioso. 

— O que ela usou para te chantagear? — Questionei e percebi que acertei nas minhas suspeitas quando o McCall arfou.

— Isaac está prestes a quebrar a minha janela, preciso desligar. — Scott tentou me enrolar e eu ouvi pelo celular quando ele gritou algum xingamento para o Lahey.

Soltei uma gargalhada alta que logo se tornou muda, pensar em tudo aquilo me fazia sentir culpa. Afinal, Scott havia sentido remorso por não me contar algo que nem ao menos tinha feito. Eu devia falar sobre aquilo que aconteceu no chalé e senti que era o momento para isso. 

— Eu também preciso te contar algo... — Fui interrompido por um longo estalo, o som medonho parecia vir do hall de entrada da casa. Soltei o celular em cima da cama rapidamente e caminhei com passos rápidos até o corredor escuro, o medo paralisando cada nervo de meu corpo.

As vozes sussurrantes retornaram, dessa vez mais numerosas, consistentes, um coro de ritmo macabro que me atraía até o andar inferior. A cada passo, minhas mãos tremiam ao redor do taco de baseball e a temperatura ambiente despencava absurdamente rápido, minha respiração se condensando em névoa.

O medo esvaziou a minha mente no momento em que as luzes se apagaram de supetão e me dei por conta que não era o meu pai que estava chegando. Ele estava de plantão na delegacia e não voltaria tão cedo. 

As vozes cessaram subitamente.

A escuridão consumia todo o espaço, somente a luz proveniente da rua entrava pela janela ao lado da porta. Respirando fundo, espiei rapidamente pelo olho mágico e quase soltei uma risada histérica. Uma mariposa voava tranquilamente por ali. 

Destranquei a porta, sem saber porque o estava fazendo, meu corpo se deixando levar por algo que eu não era capaz de explicar. Quando finalmente a escancarei, um gemido surpreso escapou pela minha garganta. 

Agora a rua estava em breu total, apenas alguns postes de luz piscavam vagamente. O único brilho, além da lua, vinha da mariposa que voava ao meu redor. E em questão de segundos, várias outras surgiram para acompanhá-la em um misto de luzes douradas.

Eu estava tão distraído e desnorteado com a cena, que cambaleei quando as vozes voltaram com mais intensidade do que antes. E, junto com elas, a criatura surgiu em minha frente. Ela inteira parecia feita de preto, mesclada e perfeitamente inserida na escuridão  noturna, mas agora seu rosto horrendo e repleto de cicatrizes estava nitidamente visível.

Eu não ousei me mexer.

— Darach. — Foi tudo o que eu disse antes de sentir um impacto forte em minha cabeça, o taco de baseball deslizando pelas mãos enquanto tudo se tornava um imenso borrão de sombras. E então apaguei.

— 

Derek corria pela floresta em sua forma completa de lobo, a penugem negra reluzindo diante a luz da lua e as patas deixando marcas por onde passava com extrema velocidade. Estava indo em direção ao centro da cidade com a sensação de perigo entalada em seu peito, de maneira que sentia que algo ruim estava prestes a acontecer com ele.

Stiles.

A palavra soava tão estranha e ao mesmo tempo tão familiar para si, era surreal esse sentimento repentino, esse dever que ele sentia de proteger o Stilinski com tudo o que estivesse em seu alcance.

Derek não fazia a menor ideia de como sabia que algo estava errado, era como se experienciasse em cada pedaço de sua pele toda a angústia e o medo sentido pelo menor. Assim como ocorrera no dia que o encontrou completamente aterrorizado em seu quarto, a aura de pavor o vestindo feito um manto. 

A avenida estava silenciosa, sem nenhum morador perambulando por ali devido ao horário. Derek correu com urgência até a fachada da casa de Stiles, ele tinha medo do que poderia encontrar atrás da porta entreaberta. 

Com a visão ampliada e os sentidos extremamente aguçados, logo percebeu o taco de baseball sobre a grama e o cheiro pútrido que fez seus olhos lacrimejarem. O coração pareceu querer sair pela boca, ele sentia em seu âmago que Stiles havia sido sequestrado e uma dor lancinante tomou conta de seu corpo, a ponto de ele precisar voltar à sua forma humana.

— Você precisa se acalmar. — Deaton surgiu carregando um imenso roupão, o qual envolveu o corpo desnudo de Derek.

— Eu preciso saber onde ele está. — Derek berrou e afastou a mão do veterinário de seu ombro, a raiva assumindo o controle de suas ações e impedindo que ele raciocinasse com clareza. 

— Derek Hale. — A voz de Peter se fez presente e ele correu até o seu sobrinho, segurando os pulsos dele com firmeza e impelindo seu corpo ao chão. 

— Você tem que me soltar! — Derek estava prestes a se desvencilhar dos punhos de Peter quando Erica e Boyd surgiram ao lado do Hale mais velho, ajudando a contê-lo.

— Quais são as três coisas que não podem ser escondidas?! — Mesmo arquejando com os cortes provocados pelas garras afiadas de Derek, Peter manteve sua voz firme e brilhou seus olhos intensamente. — Repita comigo: O Sol, a Lua e a Verdade. Vamos, Derek!

— O Sol, a Lua... e a Verdade. — Derek murmurou repetidas vezes, as sílabas se embolando na língua e o mantra antigo viajando pela sua mente, o qual ele não usava há muito, muito tempo. 

Algo que Peter costumava usar para acalmá-lo em sua adolescência, quando ele tinha ataques de raiva e se descontrolava na escola em suas primeiras transformações, na lua cheia. 

Ele encarou os rostos chocados e cansados ao seu redor e caiu de joelhos, as lágrimas silenciosas escorrendo pelo rosto e a feições voltando ao normal conforme a raiva se dissipava. Até mesmo Erica estava com um semblante chocado e atônito.

— Vamos iniciar uma busca assim que você se acalmar e nos reagruparmos no chalé. — Peter estendeu a mão para Derek, que demorou alguns segundos para aceitar e se levantar. — Nós iremos encontrar Stiles.