Mudanças... Nem sempre são ruins; as vezes são boas e outras ótimas, igual a que eu espero. Mudança de vida, de objetivo, de país e, principalmente, de casa. Sei que é cedo, tenho apenas dezessete anos e sou emancipada, o que graças a Deus é um presente para mim e meus progenitores aos quais me recuso a chamar de pais.
Antes de eu começar a explicar essa estória, deixem-me me apresentar. Sou Jessica Batiuk, uma estudante do terceiro ano, 1,68 de altura, cabelos e olhos castanhos e um peso enormemente grande com 42 kg. Yeah, eu sei. Eu sou deprimente; uma obesa nojenta, que precisa da ajuda da Ana. Você deve estar se perguntando quem é Ana. Bom, ela se chama Anorexia, mas prefere o apelido Ana; ela é minha única e melhor amiga, a única que me vê como sou e que esta disposta a me ajudar a conquistar a perfeição.
Mas voltando à estória dos meus progenitores. Glaucia nunca foi uma mãe carinhosa, sempre me humilhou e me pôs pra baixo me dizendo o quão gorda sou em comparação à Amanda, a vadia da minha irmã, que dá pra todos os caras do colégio e ainda é considerada a filha exemplo. Já Alex não foi mais presente que Glaucia, ao contrario, me evitava como se eu tivesse alguma doença contagiosa, preferindo fechar os olhos perante a atitude da filha mais nova.
Nunca contei com eles para nada, não sou o tipo de pessoa que fica pedindo as coisas. Assim que pude começar a trabalhar e ter meu próprio dinheiro foi um alivio; além de não precisar ficar naquele inferno de casa, ganhava um salário legal. O que me permitiu juntar dinheiro para sair de lá e comprar minhas coisinhas. Comecei como atendente de lanchonete até juntar dinheiro para comprar uma maquina fotográfica profissional, então troquei para fotografa free lancer, o que faço até hoje. Vez ou outra acabo fazendo alguns "bicos" como modelo comercial de algumas marcas de roupas - que até me dão algumas peças, enchendo meu guarda-roupa e fazendo minha irmã ter inveja - , mas que ainda assim me deixam desconfortáveis já que prefiro estar atrás de uma câmera do que na frente dela. Até hoje trabalhei e juntei cada centavo para ir embora daqui. Mesmo à distancia, comprei um apartamento mobiliado à alguns meses atrás e tenho pago para mantê-lo meu. Estou indo para o aeroporto, sozinha e de taxi, mas tudo bem, eu já não esperava abraços e beijos de despedida.
Pego o celular e abro meu whatsapp, entrando no grupo pro-ana (n.a. grupo que apoia a anorexia) onde tenho algumas poucas amigas, e digito:
Meninas estou entrando no aeroporto, me desejem sorte nesse novo começo. Assim que eu puder falo com vocês. Qualquer coisa estarei no tumblr. Bjs e até mais
Recebo respostas do tipo:
Boa viajem Jessie. Assim que chegar avise.
Não esqueça da gente e entre em contato logo. Bjs.
Desligo o celular depois de ver as respostas, pelo menos elas se importam comigo.
Olho o relógio em meu pulso, tampando algumas marcas de cortes; quinze para as sete da manhã. Tenho apenas alguns minutos para despachar a única mala de roupa que permaneceu comigo e ser revistada antes de embarcar. Sem contar que terei que parar em São Paulo e de lá seguir para Londres. Clichê? É, eu sei. Mas é um sonho que estou realizando.
– Chegamos. - o taxista para o carro na entrada do saguão do aeroporto.
– Quanto deu? - minha voz saí baixa graças a garganta machucada por vomitar ontem a noite, depois de comer uma maça com 80 kcal.
– Trinta e cinco. - ele abre a porta e vai abrir o porta-malas. Separo o dinheiro, entrego para ele, pego a mala e saio andando apresada para o local de despacho.
– Bom dia. - Uma mulher está no balcão, ela não sorri e mal me olha duas vezes.
– Bom dia. - suspiro. Pelo menos eu espero que hoje seja um bom dia.
– Só essa mala? - ela etiqueta a mala.
– Sim. - ela estende um papel para mim, o papel que retirarei a mala no outro aeroporto; pego-o calmamente, vendo-a olhar para meus dedos finos e tatuados. Surpresa? Yeah, eu tenho tatuagens e são quinze, talvez dezesseis. - Obrigada.
Sem esperar uma resposta dela,viro-lhe as costas e ando rápido até um outro portal, no qual o segurança está vendo as passagens e indicando o portão de embarque. Abro a bolsa para pegar os documentos necessários como a identidade e o passaporte, que será carimbado depois, e entrego a ele junto com a passagem já em mãos. Um vento gelado passa por nós, me fazendo tremer ainda mais já que estou de NF (n.a. No Foods, ou seja, sem comida) a nove horas e já me sinto fraca.
– Bom dia. - o segurança me cumprimenta serio. - Portão oito, assim que passar pelo detector de metal siga para a direita, o voo saí em quinze minutos.
– Obrigada. - pego os documentos.
Mesmo sendo sete horas, o aeroporto está cheio de pessoas; mas por boa vontade de Deus a fila do detector está quase vazia, com somente dois homens em minha frente. De repente uma voz feminina metalizada ecoa por todo o lugar:
– Atenção passageiros do voo três, zero, oito, meia com destino a Londres e parada em São Paulo. O embarque está sendo feito no portão oito.
– Droga...! - sussurro roucamente.
– É seu voo? - um dos homens me pergunta enquanto esvazia os bolsos e deixa as coisas numa bandeja branca, a qual eu faço o mesmo.
– Sim.
– Pode passar na frente se quiser. - ele sorri. É um homem magro, olhos avelã, cabelos grisalhos e um sorriso cansado.
– Obrigada. - passo em sua frente e atravesso a porta de alarmes sem fazê-la apitar.
Juntos minhas coisas rapidamente, sorrio para o homem que me deixou passar em sua frente e sigo para o local onde ha dois seguranças ao lado do portão oito.
– Olá. - chamo a atenção da balconista; uma garota um pouco mais velha que eu.
– Passaporte? - ela estende a mão e eu entrego-o; ela pressionou o carimbo e conferindo a identidade, me entregou.
Guardo os documentos enquanto, finalmente, entro no avião. Procuro por minha poltrona, guardo minha bolsa de mão e estou pronta para decolar.
– Senhores passageiros, eu sou o comandante James e vou levá-los a seu destino. Obrigado por escolherem voar conosco...
E ele falou tudo o blá, blá, blá que se fala quando você vai viajar de avião, primeiro em português e depois em inglês. Aperto o cinto, coloco os óculos de sol e o fone de ouvido enquanto olho pela janela minúscula do avião, se afastando do chão e do meu inferno particular.
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