Fugindo da lâmina do Hashira do Sol, Yulah mergulhou no lago que era próximo de sua antiga cabana. Seu corpo se recuperou e se sentiu cansada na margem imaginando a luta dele com Muzan - eu nunca vi um caçador desse… Ele nem mesmo tinha medo no olhar.
Olhou para o céu e percebeu o tamanho do erro que cometeu - Kazu não vai me perdoar - o respingo de sangue que lambeu de Yoriichi ficou preso em sua garganta, diferente de todos o gosto lembrava glicínias e deixou sua boca amarga - porque esse gosto ainda tá aqui?
Decidiu ir para mais longe, para a casa da família que Muzan prometeu. Usando seu kekkijutsu, encontrava metais preciosos ao redor do mundo, e usou disso para dominar toda a família desse joalheiro. Ofereceu à ele riqueza e em troca a família lhe presenteava com crianças recém nascidas para se alimentar.
Sabia que ele iria para lá atrás dela, mas não achou que demoraria tanto, Muzan só entrou na grande mansão do Clã Iguro depois de um ano inteiro. Ela estava no pedestal do grande saguão com seus subordinados em volta, que também conheciam Muzan, se retiraram para deixar os demônios a sós.
- Veio me matar, Kazu? Ou pegar mais uma criança para comer?
- Traidora.
Sem mais palavras espancou a demônio como um próprio humano, deixando ela se curar dos ferimentos para de novo ter seus braços e pernas quebrados e sangrar por todo o saguão. Yulah não conseguia se defender dos ataques, eram piores que a espada de Yoriichi, cessaram quando Muzan usou as mãos para arrancar os olhos dela, que cresceram novamente porém com um risco no nome “Superior Um”.
- Só veio por isso? Lhe dá prazer? - perguntou com a voz engasgada - Por que não me mata logo?
- Eu vou deixar que um caçador faça isso, sua vagabunda. Você não faz mais parte dos Doze Kizuki.
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O ano era 1330 e o Xogunato Kamakura se via em forte tensão política com a nova restauração imperial, Ashikaga, líder do Clã Minamoto se voltou contra Kamakura e lutou a favor da corte imperial, transformando-se em novo Xogum e período anos seguintes. Nessa etapa de transição, Muzan não participou diretamente por conta dos fortes ferimentos sofridos pela espada de Yoriichi. Isso lhe deixou revoltado, como também muitos onis espalhados pelo Japão se viram “independentes” e sem um Mestre para lhes controlar, espalharam devastação por todo o país criando mais tensões políticas e indícios de guerras.
E para se recuperar e se tornar forte novamente precisava se alimentar, o melhor alimento para um Oni era criança e o Clã Iguro lhe proporcionava crianças de bom grado e não precisava caçá-las como fazia por puro esporte. No decorrer dos anos, o Clã foi conhecido mundialmente, principalmente na Europa, atraindo a atenção dos Portugueses e espanhóis em busca de metais. Todos se perdiam quando adentravam as índias, Yulah devorava todos os navegantes e tomava seus navios, deixando o Clã ainda mais poderoso, modificando toda a frota para vender suas joias na realeza britânica ou no próprio Japão.
O joalheiro patriarca, teve um total de 7 filhas mulheres e se viu falido por ter que pagar dotes de casamentos por elas, mas quando Yulah passou a trazer os metais preciosos não se importava com mais nada além de acumular riqueza.
Além de ter conforto e comida à vontade, a Oni dominava aquele Clã por sentir saudade da família. Criou uma fantasia na própria mente e dizia que estava fazendo um bem a todas aquelas mulheres e crianças nascidas, tratando como a própria família que não pode ver crescer.
- E quem liga para aqueles lixos? Você nunca mais vai entrar aqui!
- Quem é você para me dizer o que fazer? - Outro tapa - Eu posso destruir você e esse lugar quando eu quiser.
- Você precisa de mim - se levantou rindo - você ainda me deseja!
- Cala a boca!
- Vai me dizer que já se esqueceu das nossas noites? Por que eu não esqueci, você me criou com memórias… - Pega pelos cabelos, foi arremessada na parede - Bata! Eu não ligo! Me matar você não vai.
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No decorrer dos anos, Muzan passou a frequentar ainda mais o Clã e levava consigo suas Luas Superiores, Michikatsu ficou com o posto de Superior Um ganhando mais sangue. Douma desafiou em um duelo o então Superior Dois e tomou seu lugar, depois de transformar dois irmãos na Lua Superior Seis. Douma era o único oni assim como ela - tirando Michikatsu que fingia não se lembrar - que mantinha suas memórias. Ele amava ser um demônio e servir Muzan, um homem que desde a vida humana era um psicopata apaixonado por tortura e sangue.
O Superior Cinco foi escolhido por Muzan depois de uma visita pelos circos da Europa e com as frequentes refeições do Clã se tornou um viciado em crianças e o Quatro permaneceu em sua posição, mas depois de quase 200 anos presenciando as visitas indesejadas, o novo Superior Três chamou sua atenção.
Akaza ficava no saguão com ela, esperando seu Mestre e companheiros se alimentarem no porão onde era mantida as crianças. Em uma breve conversa - Akaza não falava muito - descobriu que foi concedido pelo próprio Muzan a ser um dos Doze Kizuki, como ele fazia no começo, Akaza não precisou desafiar o antigo Superior e que ele não se alimentava de mulheres e crianças.
Começou a prestar atenção também como Akaza era tratado, Muzan o admirava muito, não mais que Douma ou Michikatsu - que agora detinha o nome de Kokushibo escolhido por Muzan - mas era uma admiração estranhamente curiosa, tanto que Muzan aprendeu seu estilo de luta.
Vendo aqueles onis passeando por sua casa e seu lugar de Superior Um ocupado por um ex caçador lhe deixava enfurecida e com inveja e eles também começaram a ameaçá-la de morte toda vez que provocava Muzan e tentava uma nova discussão. Ela se tornou cega pela luxúria e inveja, agora torturava as crianças antes de comer e se alguém ousasse desobedecer-la ou fugir do Clã, também era morto.
Seus episódios de histeria se intensificaram porque o gosto do sangue de Yoriichi ainda amargurava sua boca. Com a combinação de frustração por não ter mais sua família, o posto de Superior e a atenção de Muzan. Criou ódio e queria vê-lo morto.
O consumo de humanos e crianças só ajudaram a deixar sua aparência ainda mais sombria e horrorosa, seus olhos aumentaram de tamanho e todo seu corpo criou pele de cobra.
Se sentia sozinha com a nova aparência indesejada, pois ainda pensava como mulher e como mãe. Em uma noite não se alimentou, estava em seu pedestal olhando para o nada enquanto a família lhe apresentava os novos bebês de sacrifício, algumas mulheres eram escolhidas para procriar somente para a oni, mas não se importou com nenhum.
Seus pensamentos estavam concentrados em adquirir mais sangue de Muzan, porque acreditava que só assim tiraria o gosto do sangue de Yoriichi. Mas também queria subordinados como ele, tentava transformar os humanos do Clã, mas nenhum lhe obedecia como queria ou se transformavam em criaturas horrendas. E isso acontecia por ter perdido o posto de Superior Um. Consequentemente, tinha que matá-los, para não devorar sua família, então parou com as tentativas.
O sol já iria nascer e avistou no quintal uma cobra píton vasculhando a grama, entediada, usou seu kekkijutsu para trazer a cobra em suas mãos. O bicho começou a se contorcer de dor - você se parece comigo - a beijou e a cobra, para se defender, tentou morde-la. Olhando por alguns minutos e quase a matando por asfixia, decidiu dividir um pouco de seu sangue demoníaco com ela por curiosidade. Queria ver o bicho se contorcer até morrer.
Porém, a cobra ficou totalmente branca e de olhos vermelhos, quando parou de tremer, olhava para Yulah como um cachorro olhava para seu dono. Achou aquilo magnífico e tomou como seu novo bicho de estimação. Essa habilidade só foi possível, porque o sangue abençoado com glicínias e higanbana correndo em suas veias, estava lhe dando uma capacidade de transformação e regeneração superior a de Muzan.
E lentamente com o passar dos anos, seu corpo foi se transformando como um dia foi de uma humana mãe de dois jovens. A fome por humanos ainda continuou, mas agora comia menos que o habitual.
Há pelo menos dez anos antes de Obanai nascer, Muzan adentrou no Clã e dessa vez estava sozinho. Entrando no saguão iria perguntar para a mulher de quimono branco o que estava fazendo no pedestal de Yulah, mas percebeu que era a própria.
- Vejo que conseguiu se controlar… O que tá fazendo? Terapia?
- Estou linda, não estou?
- Vai pro inferno - ele entrou no porão para se alimentar e quando voltou outras provocações começaram.
- Vai me dizer que não sente falta - ele revirou os olhos - aquela sua Superior Seis está dando conta? Faz tempo que não a vejo aqui…
- Não fale dos meus Superiores - voltou os olhos para ela e reparou na cobra que rastejava pela poltrona - você é maluca.
- Foi você que me criou.
Muzan iria partir como um vento, mas Yulah foi mais rápida e parou diante dele o segurando pelo terno inglês.
- Diga! Diga que sente minha falta! É por isso que você não me mata. E agora - soltou ele mostrando o corpo de humana novamente - eu estou mais viva do que nunca, não sente nenhum desejo?
- Eu tenho nojo de você. E se quer tanto morrer é só se banhar no sol, não me toque mais! - Com um tapa ela voou para longe da mansão.
O ódio aumentou ainda mais, a aparência de mulher não foi suficiente para ter de novo o desejo de Muzan e sua língua voltou a ser como de cobra. Estava cansada, 600 anos vivia como demônio e a dor de estar sozinha e indesejada aumentou naquela noite. Se lembrou dos filhos e de quando encontrou o mais velho já soldado, ele tentou matá-la porque aquele demônio com língua de cobra não era mais a sua mãe.
Chorando em seus aposentos pensando na sua incapacidade, aceitou aquele destino e esperou o sol nascer, mas os raios que tocaram a sua mão pela pequena fresta que abriu na cortina nada fizeram. Ela então se deu conta de que o gosto de Yoriichi já havia saído de sua boca, tantos anos convivendo com ele que nem mesmo percebeu quando isso aconteceu.
Mas não conseguia entender porquê aquele sol não lhe fez mal - Kazu não pode saber disso - pensou também que usaria disso para chantageá-lo - mas como? - Olhou para a cobra que a seguia em todo lugar - você também consegue, não é? - a cobra balançou a cabeça, ela entendia tudo como um humano e era extremamente inteligente.
Agora tinha outro empecilho impedindo sua morte, o tão temido sol. Muzan voltava com as Luas Superiores sempre em silencio, para ele quanto mais ela demorasse para se matar era melhor, assim poderia comer sem preocupações. E mesmo ainda querendo tirar a própria vida, achou divertido esconder aquele segredo que seu antigo Mestre almejava e continuou “vivendo” nas sombras para não levantar suspeitas.
**
Então, em 1892, Obanai nasceu depois de quase cem anos sem homens nascidos no Clã. Tanto que foi muito bajulado pela mãe, irmãs e tias sendo muito bem alimentado e levado com um ano de idade para ser alimento de Yulah. Mas ela se apaixonou pelo bebê. Não só por ser um menino, mas sim pelos olhos. O direito castanho e o esquerdo azul, assim como Isao, seu filho caçula morto pelos samurais.
Ela então decidiu que ele seria somente dela e não aceitou comer mais nenhuma outra criança, queria que Obanai crescesse mais um pouco, então seus familiares obedeceram e o trataram como verdadeiro príncipe, porém preso em uma cela.
Levavam muita comida para ele todos os dias e como não havia ventilação, o cheiro apodrecia o local deixando ele enjoado. Quando Muzan visitava o Clã, mandava sua serpente vigiar a cela para que nenhum Oni comesse o garotinho, mas Muzan desdenhou do garoto crescendo ali e consequentemente, seus súditos fizeram o mesmos, pois os recém nascidos eram mais apetitosos.
Yulah rondava sua cela toda noite observando ele dormir, mas acabou fazendo com que o garotinho não dormisse por medo. Ele sentia a presença, mas nunca olhava para ver quem estava lhe observando e fazendo aquele som absurdo de cobra.
Quando fez 8 anos, permitiram que Obanai saísse de sua jaula pela primeira vez, mas ele foi levado até ela para ser devorado. Ela optou de novo por deixá-lo crescer mais, e foi nessa noite que Obanai ganhou suas cicatrizes no rosto. Ela mandou cortar a boca do menino até a altura da orelha, para que ele se parecesse como uma cobra, por pura maldade e tomou o sangue dele escorrido em uma taça. Nessa noite ele também se deu conta de que era ela que o visitava.
Na mesma noite, Muzan visitou o Clã e passou pela cela de Obanai que estava com uma faixa ensanguentada na boca acompanhado da serpente. Ele ficou observando o garoto acuado com medo, Obanai sabia o que Muzan fazia.
Ele abriu a cela e entrou fazendo o menino se molhar por medo e começar a chorar. Ele fez sinal de silêncio e segurou a cobra com seu kekkijtusu que ia saindo da cela para chamar a dona. Nem mesmo o choro de Obanai dava para ouvir porque sua língua também foi cortada e o sangramento não cessava, e nessa época, Muzan já estava mais experiente com a medicina e reparou nos olhos do menino.
- Ah é por isso que ela te adora... Deixe-me ver isso - ainda com a criança chorando tirou a faixa e viu o tamanho do corte - Nakime, minha maleta - Estendeu as mãos para a parede e uma pequena janela foi aberta com uma maleta preta.
Ele pegou e pediu para Obanai se deitar no futon. Tirou uma seringa e sugou um líquido amarelado de um frasco - vai doer só um pouco - Obanai gemeu e logo parou de sentir dor enquanto Muzan, que ele achava ser só mais um demônio comedor de crianças, mexia em uma agulha, pinças e fios.
Muzan limpou toda sua boca e começou a suturar sua língua com delicadeza enquanto tentava acalmá-lo.
- Existe uma história… De um casal de irmãos que eram muito apaixonados um pelo outro, os nomes deles eram Céu e Terra. Eles viviam sempre juntos, um amor proibido por serem irmãos… Até que Deus, o criador deles decidiu separá-los criando o mundo e acabar com aquela união proibida - passou a última volta na língua e começou a suturar a face do garoto - mas eles já esperavam o primeiro filho e Deus, enfurecido decidiu por matar a criança e acabar de vez com aquele romance. Céu e Terra se separaram, mas antes deixaram pequenos pedaços deles vivendo conosco para um dia se encontrarem. E eles se encontram sempre que uma criança escolhida nasce carregando parte deles - apontou para os olhos do menino - metade Terra, metade Céu - tirou uma garrafa de barro da maleta e preparou um líquido rosa - tome um gole disso por noite, depois vai ficar bem.
Mesmo com apenas 8 anos Obanai já era muito inteligente. Junto da heterocromia, nasceu com hipertimesia, a incapacidade de esquecer o passado a partir de uma determinada idade. E ele se lembrava de tudo e de todos desde os 3 anos de idade, desde olhares a diálogos. Foi esse um importante fator para depois conseguir fugir daquela cela. Muzan saiu em silêncio, mas antes limpou o menino que ficou agarrado na garrafa e soltou a cobra que por ter sido transformada por Yulah detinha o mesmo ódio por ele.
Chegando no saguão, queria dar outra surra na demônio.
- Se vai devorar aquele menino faça isso logo. Se eu voltar aqui e ver ele machucado de novo, aí sim te mato como tanto quer.
- Por acaso pegou amor a crianças? - desdenhou - Já sei, foi Akaza que alimentou isso, não é? Eu sei que ele teve uma filha recentemente… - Suas palavras cessaram por um novo espancamento.
- Cale a boca, já disse que odeio você e agora mais do que nunca quero que morra. Mas sabe porquê não faço isso? - A cobra tentou atacá-lo e ele a mutilou jogando na parede - diferente dos outros, você não me venera e não tem graça nenhuma ver alguém não suplicar pela vida… Espero que morra nas mãos de um caçador como quase morreu pelo Tsugikuni.
- Assim como você… - engasgava com as mãos no rosto.
- Nakime!
A Fortaleza foi aberta em seus pés e desapareceu. A cobra Oni se regenerou e foi abraçar a dona que fez o mesmo jogando ela nas paredes, decidiu então voltar para a cela de Obanai. Como Yulah criou um amor doentio por ele, acabou absorvendo isso também. Mas diferente, Obanai gostava da sua companhia, conversava e brincava inocentemente com a cobra, quando cansava ela o colocava para dormir e saia. Mesmo sendo torturada por Muzan naquela noite, lembrava o garotinho de tomar o líquido da garrafa.
**
Depois de alguns dias, ela resolveu mais uma noite visitar Obanai, porém desta vez iria comê-lo. Mas chegando na cela, ela estava totalmente aberta, e parte da parede raspada com um grampo de cabelo jogado na cela. Ele havia fugido.
Quando foi levado de volta para a cela, com a adrenalina de conter o sangramento, sua irmã nem percebeu que o grampo de cabelo havia caído. Ele escondeu o grampo embaixo do futon e sempre quando estava sozinho arranhava entre a parede e a grade. Fugiu pelos fundos, estava recuperado do corte e com uma nova faixa no rosto.
A cobra não viu os planos da fuga estando cega de amores pela criança e sem tempo de avisar a dona no dia da fuga, apenas o seguiu.
Enfurecida, chamou todos do Clã Iguro - VOCÊS SÃO OS CULPADOS POR TER TIRADO MEU FILHO DE MIM - corpo por corpo foi devorado e mutilado, o Kekkijutsu de areia movediça impediu que escapassem daquele massacre. Quando terminou sua carnificina foi atrás de Obanai pela floresta, sem antes verificar na cidade e pelos barcos.
E quando finalmente o encontrou sua aparência estava de novo horrenda e cheia de escamas de cobra. Pronta para devorá-lo, o garotinho de novo se molhou e caiu chorando no chão com medo da morte. Mas antes, uma lâmina vermelha cortou a cabeça da Oni, fazendo ela rolar para longe de boca aberta.
O corpo foi virando pó em instantes e sua última visão foi Obanai sendo pego no colo pelo Hashira Shinjuro Rengoku que estava na baía próxima ao Clã Iguro, vasculhando seus vestígios - cuide bem dele - pensou chorando antes de desaparecer.
Ninguém duvidou do Clã por muitos anos, mas quando pessoas importantes e ricas de outras Nações começaram a morrer assim que visitavam a cidade para negociar com eles, o Esquadrão de Caçadores começou a investigar a família.
Shinjuro chegou a tempo de evitar a morte de Obanai, mas não de toda sua família. Perguntando seu nome ele respondeu tímido, por conta do corte na língua o som de sua voz ficou áspero e enrolado. viu a cobra aparecer em seus pés subindo no corpo do menino, ele a abraçou como um animal de estimação. A primeira reação que o Hashira teve foi de sacar a espada para matar aquele bicho, mas viu que a criança estava familiarizada com ela.
Na mansão, não havia ninguém vivo exceto por uma jovem adolecente que havia saído naquela noite, era a prima de Obanai.
- TODOS MORRERAM POR SUA CULPA! VOCÊ ERA SÓ UM SACRIFÍCIO! VOCÊ DEVIA TER FICADO QUIETO E DEIXADO ELA TE COMER!
- Então é verdade? Vocês cultuavam um Oni em troca de riqueza? - Ela nem percebeu a presença do Hashira.
O menino começou a chorar, aquelas palavras o machucaram e se sentiu verdadeiramente culpado pela morte da família, mesmo sendo maltratado por ela.
- Vai me prender? Que eu saiba o imperador nem imagina que os Kisatsutai existem.
- Mas ainda existem leis! Suma daqui, nada aqui lhe pertence mais!
Shinjuro resolveu levar o garotinho consigo e cuidar de toda a sua herança. Por ser o único homem vivo do Clã Iguro, herdou toda a mansão, jóias e navios da família. E quando entrou na maioridade, vendeu todas as suas riquezas destinando a reforma do Templo dos Caçadores e ao Mestre Ubuyashiki.
No caminho, fazia carinho na cobra no colo do Hashira, o sol já iria nascer.
- Qual o nome?
- Não sei ainda, não sei se é macho ou fêmea - seu choro cessou, mas a feição triste continuou.
Shinjuro encarou com nojo a cobra. Esperava o sol nascer para ela se decompor.
- É fêmea.
- Fêmea? Mas ela não gostou de nenhum nome de menina.
- Como sabe?
- Ela disse.
- Ela fala com você?
- Sim, não é? - A cobra confirmou o que não espantou o Hashira, afinal sabia que aquilo era um Oni.
O sol nasceu e Shinjuro ficou esperando os raios tocarem nela, mas mesmo antes disso acontecer, Obanai prosseguiu.
- Ela não se machuca com a luz…
- O QUE?
- Ela… - Acariciou a cabeça da cobra - Não se machuca com a luz.
Ficou se perguntando como aquilo era possível e teve a prova quando os raios tocaram a cobra.
- Você não tem medo?
- Ela nunca me machucou… Deixa ela ir comigo?
Para evitar outra choradeira, concedeu que fosse com a cobra até sua casa, mas tomaria providências depois. Ruka cuidou e alimentou o garoto e deixou o marido tranquilizado perante a cobra. Ela realmente não fazia mal a ninguém. Sem mais o controle de Yulah, a cobra passou a exalar a única devoção que tinha por alguém além da dona e esse alguém era Obanai.
Ruka tratou Obanai como seu próprio filho, e brincava com ele dizendo que tinham o cabelo parecido e que ele demorou de chegar porque Deus não sabia que olhos colocar nele. Por conta da vida infeliz no Clã, criou uma repulsa com mulheres, mas Ruka venceu essa barreira fazendo ele querer dormir com ela abraçado todos os dias. Foi um ano muito proveitoso daquele carinho maternal, mas não pôde aproveitar muito porque numa manhã Ruka não acordou.
**
Os anos se passaram e Obanai se tornou caçador treinado por Shinjuro, mas não usava a Respiração das Chamas. Como filho de um Hashira, conheceu o Templo dos Caçadores antes da Seleção Final e consequentemente, os treinamentos da Respiração do Inverno. Uma respiração um tanto incomum que utiliza katanas mais curtas, era uma adaptação da Respiração do Vento.
O tempo também foi determinante para sua relação com Kaburamaru, nome da cobra escolhido por Shinjuro, uma junção de feminino e masculino. Ela lhe ensinou seu kekkijutsu e adaptou a sua Respiração do Inverno criando uma própria, a Respiração da Serpente utilizando a katana comum. Ela também falava com ele via pensamentos, uma voz feminina parecida com Yulah quando era humana. Cuidava dele como uma verdadeira mãe e não desgrudava de seu ombro.
Uma noite, na casa Rengoku, ela saiu para caçar. Obanai com 13 anos estranhou a demora e saiu para procurá-la. Kyojuro estava com a espada na mão apontada para uma mulher alta de costas e cabelos longos e brancos. Ela se virou, tinha olhos vermelhos e sua pele era tão branca quanto a neve. Sorriu para o jovem caçador.
- Respiração das Chamas - NÃÃO! - Obanai empurrou Kyojuro e Kaburamaru voltou a ser uma cobra.
- ISSO É UM DEMÔNIO OBANAI! ONDE TÁ? CADÊ? TAVA NA MINHA FRENTE!
- É a Kaburamaru! Não machuca ela! - A cobra subiu seu corpo e se enrolou no pescoço.
- Ta de brincadeira? Meu pai sabe disso?
- Sim. Ela só foi caçar…
- E precisa virar um bicho desse? Quem garante que não vai devorar a gente?
Obanai apontou para um gambá morto perto de um arbusto.
- Ela não come gente.
Com relutância, os dois entraram e Kyojuro ficou encarando a cobra que parecia sorrir para ele.
- Bicho horroroso!
**
Mestre Kagaya concedeu que Kaburamaru vivesse entre os caçadores principalmente por ter passado informações sobre Muzan. Em seu julgamento com o Mestre assim que passou pela Seleção Final, Kaburamaru controlou pela primeira vez a fala de Obanai e deu detalhes sobre a aparência das Luas Superiores. Primordial para Shinobu e Mira que agora, sabiam como era o Oni Superior Dois que devorou suas famílias.
Detalhou que Muzan aprimorou os conhecimentos de medicina - sempre ocultando a parte que foi ele que cuidou de Obanai, sabia que o caçador tinha uma ótima memória e ficaria furioso, pois cultuou ódio pelos onis depois do incidente em seu Clã.
Além disso, naquela noite que cuidou de Obanai, foi o dia que descobriu sobre a Fortaleza Dimensional. Um relatório extremamente difícil de solucionar - na opinião do Mestre - além de mudar de aparência e se infiltrar por todos os lugares como um humano, viver sobre inúmeros Onis prontos para lhe protegerem seria uma batalha arriscada.
Quando Kyojuro enfrentou Akaza, já sabia que o poder da Lua Superior Três era luta corporal, então não foi pego de surpresa quando ele apareceu e por seu Kekkijutsu.
Ele perdeu a vida no dia do aniversário de 25 anos de Obanai e mesmo na situação triste que seu novo dono se encontrava, torceu para que fosse Akaza quando perguntou a Tanjiro. Por ser a única que conhecia a fraqueza dele de não devorar mulheres, enviou as caçadoras pela sua intuição bastante assertiva. Queria mostrar ser útil para Obanai se elas encontrassem Muzan.
**
O relatório foi passado ao Mestre por Shinobu depois do funeral.
- Envie novamente as Kunoichi para essa mansão. Se infiltrem. Descubra tudo sobre a família e o que ele tanto procura. O que me tranquiliza é que o feitiço funciona perfeitamente e ele nunca conseguiu nos encontrar… Mas ainda assim, devemos ter cuidado, elas não podem levantar suspeitas.
- Sim Mestre.
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