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História Girassóis - Jikook - Perdão


Escrita por: ismance

Capítulo 1 - Perdão


"A única diferença entre a loucura e a saúde mental, é que a primeira é muito mais comum." 

Passar trinta dias preso em casa, sem poder sair momento algum, pode acionar uma parte desligada de seu cérebro. Pode ser o ponto de início para uma loucura, o início de algo que tornará a sua vida um inferno.

Lembro-me vagamente do meu primeiro mês em isolamento, foi um tormento

Passar trezentos e sessenta e cinco dias preso dentro de casa, apenas podendo sair quando anoitece, torna tudo monótono e sem cor.

O meu primeiro ano com essa nova rotina, foi uma espécie de filme mudo e em preto e branco. Todos pareciam viver suas vidas normalmente, eles sentiam prazer em sorrir e pareciam tão… livres. Já eu, sentia que sorrir era uma confirmação para os meus pais que eu ainda estava vivo, que não era apenas um boneco.

Eu não saio de casa a luz do dia há treze anos.

Me chamo Park Jimin, tenho dezenove anos e sou alérgico a luz solar, algo bastante incomum. E agora, eu contarei a minha história de romance incomum.

A última vez que eu pude sair de dentro da minha casa e pude sentir o calor do sol, eu não tinha menos que seis anos.

Eu estava sentado na calçada da minha casa, minha mãe estava dentro de casa junto com as suas duas amigas, elas iam todas as manhãs e levavam seus filhos juntos, meus melhores amigos. Hoseok fazia uma pose na nossa frente e, eu e Taehyung tentávamos adivinhar o que era aquilo, estávamos brincando de mímica.

Antes de eles chegarem, eu estava bem e correndo por toda a casa, tudo estava ocorrendo novamente. Mas, o problema foi quando decidimos que seria melhor brincar na rua, como sempre fazíamos.

O sol parecia bem mais quente naquele dia, algo que não era normal, visto que ainda estava muito cedo para estar tão quente. Enquanto brincávamos, eu senti uma enorme ânsia de vômito, o que me fez correr em direção ao banheiro e isso atraiu a atenção de minha mãe, que percebeu que havia algo de errado comigo.

Eu não consegui vomitar e minha mãe resolveu me dar um remédio para dor de barriga, para logo depois, eu correr na direção de meus amigos. Eu aguentei apenas mais alguns minutos junto a eles, porque quando menos esperávamos, eu desmaiei.

Fui diagnosticado com XP nível 5, o pior de todos. Uma pequena quantidade de luz solar poderia ser fatal, e desde então, eu nunca mais pisei na minha rua se não estivesse de noite.

Eu não poderia mais sonhar em caminhar ou brincar de dia, algo completamente engraçado, já que o meu maior sonho era observar o nascer do sol em um campo de girassóis.

Os dias passaram a serem repetitivos, eu não tinha mais nada para fazer além de assistir, comer e torcer para que meus amigos me visitassem. Poderia ser o sonho de qualquer adolescente, mas não era o meu.

A minha vontade de sair por aí de noite, aos poucos fora morrendo. Sair da minha casa a noite, apenas me mostrava o que eu estava perdendo de dia. Eu só podia ser cercado de escuridão, uma escuridão amedrontadora e com poucos resquícios de luz. Esse era o meu futuro desde os seis anos, ser envolto por uma extensa escuridão, sem um sinal de claridade total.

Agora aqui estou eu, deitado no meu sofá, assistindo pela terceira vez o mesmo episódio da minha série favorita. É a única coisa que eu consigo fazer. 

Meus pais são pessoas ocupadas e esforçadas, eles sempre fazem o melhor para eu sentir-me bem, mas, não costumam passar o dia inteiro dentro de casa. Minha mãe é uma médica importante, outro motivo para eu ser tão paparicado e protegido; já meu pai, é um ótimo detetive.

O trabalho costuma ocupar a maior parte do tempo deles, mas isso não faz eu sentir-me deixado de lado ou ignorado. Eu os amo e gosto de vê-los felizes e, se eu tivesse o privilégio de poder sair todo dia de manhã para trabalhar, eu não pensaria duas vezes.

— Levanta! — Ouvi a voz de Taehyung, que havia acabado de entrar em minha casa.

Meus amigos sempre me acharam deprimido demais, e mesmo eles não falando ou tentando não demonstrar, eu sei que isso sempre os encheu de preocupação e medo. Eles não falam de forma alguma, mas eu sinto que eles se acham culpados pelo o que aconteceu comigo.

Não os culpo, eu certamente também me sentiria culpado caso estivesse no lugar deles, mas tanto eu quanto o mundo inteiro, sabemos que eles não tiveram culpa alguma.

Sou uma pessoa que costuma acreditar em destino, e bom, se o destino quer que eu tenha uma vida completamente fodida e nenhum pouco de luz solar, o que posso fazer?

— Iremos sair hoje — Taehyung disse animado, batendo rápidas palmas ainda mais animadas.

— Só se for direto para o meu enterro, não passou das cinco, Tae — informei, verificando o horário na TV.

Taehyung revirou os olhos, como se a minha piada tivesse sido a pior já dita. Até parece, eu aguentei muitas piadas do Hoseok e nunca vi ele revirar os olhos uma única vez, percebemos o quanto a minha vida é injusta em diversos aspectos.

— Não agora, seu idiota. Iremos esperar o Hoseok para nos arrumar, vamos para uma boate hoje — disse com um sorriso enorme, que fechou-se assim que eu fiz uma careta. — Nem vem, você precisa sair Jimin! 

Quer saber o que eu realmente preciso?

Minha língua tremeu com a pergunta entalada na garganta, mas eu obriguei-me a ficar calado.

Eu me acostumei a guardar as coisas para mim, porque sempre senti medo das pessoas que se importavam comigo e que procuravam todos os dias uma forma de me curar e me animar, ficarem tristes. Por isso, seguir o caminho que outras pessoas trilhavam com dedicação e cuidado para mim não me machucar ou morrer no caminho, sempre foi a melhor solução.

— Tudo bem — concordei.

Taehyung abriu novamente aquele sorriso enorme, sorriso este que sempre esquentava o meu peito. Eu sempre gostei de ver a minha família feliz, ainda mais quando eu fazia parte dessa felicidade.

Desde a descoberta da minha doença, todos a minha volta pareciam ter esquecido que tinham as suas próprias vidas. Eu me culpo todos os dias por isso, porque eu roubei a essência da minha mãe, roubei o primeiro amor do meu pai e roubei o melhor amigo saudável, aventureiro e animado de Hoseok e Taehyung.

Eles passaram a me privar e privá-los de coisas que poderiam me machucar, poderiam me entristecer. Hoseok e Taehyung raramente postavam fotos onde evidenciava que estava de dia, ou me falavam qualquer coisa sobre tais momentos assim, eles certamente pensavam que meu coração viraria fragmentos partidos e machucados por não ser eu a viver aquilo.

A minha mãe dobrava o seu horário no hospital três vezes por semana, para acompanhar cada mísero detalhe da pesquisa sobre a cura da minha doença. Ela me tinha na cabeça vinte e quatro horas por dia, e ela se privou de dar passeios com o meu pai para desestressar, algo que eles faziam sempre. Ela parou de fazer isso pois, o filho dela não poderia fazer isso com os amigos.

O meu pai ficava preocupado comigo vinte e quatro horas por dia, e não era por preocupações normais que todo pai de um adolescente de dezenove anos e com os hormônios trabalhando a todo vapor, deveria ter. Ele se preocupava de me encontrar em frente a uma janela aberta, se preocupava de chegar em casa e me ver sem vida próximo a porta, após ter pego um pouco de luz.

Eu me sentia com raiva por tudo isso, raiva por eu ter essa maldita doença. Me sentia triste sempre que via o olhar entristecido do meu pai quando minha mãe se distanciava cada vez mais, sentia o meu coração despedaçar ao ver a minha mãe procurar-me todo dia ao chegar em casa, tentando conter o desespero ao não me achar sentado no sofá. E, principalmente, eu me sentia uma pessoa horrível por fazer com que os meus dois melhores amigos tomassem a minha dor para eles, faltassem aulas importantes para cuidar de mim; um moribundo em seu leito de morte.

É como eu disse, eu sou uma pessoa que acredita em destino. Só que eu também acredito que o destino me olhou no ventre da minha mãe e riu, porque ele foi um completo filho da puta comigo.

Meus pensamentos sobre como o destino é um completo escroto quando quer foram interrompidos por Taehyung, que reclamava sobre uma cena qualquer que passava em um novo episódio da minha série favorita. Ri baixinho pela irritação do meu amigo, e assim que eu iria questionar sobre o horário que o Hoseok chegaria, um barulho alto assustou nós dois.

— Que merda foi essa? — Ele questionou, se levantando e caminhando até uma das janelas da minha casa, abrindo apenas uma fresta da cortina para que nós dois pudéssemos enxergar.

Um garoto de cabelos escuros estava caído junto de seu skate, ele parecia xingar alguém baixinho. Ao se levantar, bateu as mãos levemente em suas coxas — que eram bem fartas, por sinal — e joelhos, que estavam um pouco descobertos pela calça jeans ter alguns rasgos. Ele desamassou o seu moletom e, como se um sexto sentido dele tivesse nos dedurado, ele virou sua cabeça em nossa direção de repente. Isso assustou-nos, fazendo com que Taehyung largasse a cortina quase tão rápido, mas não antes de eu poder ver o rosto daquele garoto.

Lindo, ele era realmente lindo. Nos poucos milésimos de segundos que eu consegui vê-lo, consegui me prender nas orbes tão escuras quanto os cabelos. Por mais que eu já estivesse cheio do escuro na minha vida, aquilo era diferente, parecia carregar algo tão brilhante e incrível disfarçado de algo tedioso e misterioso.

Aquele garoto era, sem dúvida, o garoto mais lindo que já havia visto na minha vida. Eu só não sabia que na época, o destino havia decidido que ele seria bem mais presente na minha vida.

— Que fofo, você se apaixonou — comentou Taehyung, de repente, tirando-me dos meus pensamentos.

— O quê? Ta ficando louco? Primeira vez que eu estou vendo esse garoto — disse indignado, nunca diria em voz alta que havia me apaixonado por um garoto que eu nem sabia o nome.

— Ficou todo bobinho! Já ouviu falar em amor à primeira vista? — perguntou-me ironicamente, me seguindo ao eu andar até o sofá novamente.

Eu iria responder um comentário sem nexo, mas a minha ação foi impedida por um Hoseok feliz e animado, que faltou entrar dentro da minha casa dando pulinhos. Uma típica cena que eu poderia ver todos os sábados.

— Quem está preparado para ir a uma boate? — perguntou com um sorriso sapeca no rosto, que foi prontamente copiado por um Taehyung malicioso.

Eu estava completamente ferrado nas mãos deles.


 XXX


A boate era exatamente como eu pensei, barulhenta e lotada. Inúmeras pessoas chocavam-se em mim tentando atravessar aquela multidão de pessoas, corpos suados e animados. Não que eu nunca tenha pisado em uma boate antes, eu já frequentei algumas. Mas eram pequenas e ficavam em uma cidade pequena, e eu conhecia meus amigos muito bem para saber que eles não me levariam para uma boate pequena.

Luzes coloridas piscavam por toda boate e atrapalhavam parcialmente minha vista, que estava totalmente focada nos meus melhores amigos, que pulavam e se remexiam de acordo com a batida da música. Eu estava sentado em uma das cadeiras do bar, bebericando o meu drink que eu não fazia ideia do que era, mas tinha um gosto adocicado e viciante.

Um homem que estava sentado do outro lado do bar também me olhava, ele parecia confiante e eu tenho certeza que, estava questionando-se mentalmente se eu iria pra cama com ele se ele me pagasse uma tequila.

Ri com meus pensamentos e voltei com o meu olhar para meus amigos, que dançavam animadamente nas laterais da pista de dança, apenas para que eu pudesse me certificar de que eles ainda estavam ali. Eu sempre achei que eles eram perfeitos um para outro, mas por algum motivo, apenas os dois não enxergavam isso, ou pelo menos um dos dois. Uma vez, Hoseok bebeu mais do que esperado e sobrou pra mim tomar conta dele, e não que eu tivesse reclamado, ele já fez tanto por mim que isso era o mínimo de minha parte.

Após um banho frio e uma roupa quentinha, Hoseok deitou-se ao meu lado como um bebê carente e queixou-se do tamanho da frieza do Kim, que parecia não se importar com os sentimentos do Jung. Eu, claro, fiquei perplexo por eles já terem ficado e nunca terem me contado, mas Hoseok deixou claro que foi algo de uma noite e que não deveria acontecer, mas aconteceu.

Desde aquele dia, parecia que todos os seus sentimentos pelo Taehyung haviam ficado claros, mas ele duvidava que isso tinha acontecido da mesma forma para o outro. Eu discordei, porque Taehyung sempre olhou para Hoseok de uma forma diferente, com algo que eu não poderia explicar com outras palavras se não fosse amor. Mas, como os dois resolveram não tocar no assunto e fingir que nada aconteceu, quando a cada dia eles só sentiam mais aperto no coração, resolvi não falar nada. Porque, quem era eu para falar sobre esconder sentimentos? 

Taehyung parou de dançar e caminhou quase saltitando até a minha direção, primeiro eu pensei que ele apenas compraria mais uma bebida, mas só depois eu entendi que ele estava prestes a me puxar para dançar junto deles.

— Vem cá, Minnie — chamou, esticando uma de suas mãos em minha direção.

Sabendo que eu não teria outra alternativa, terminei a minha bebida e segurei em sua mão, que com um forte puxão, me levou até a pista de dança.

A batida era realmente contagiante, porque em poucos segundos eu já conseguia sentir o meu corpo sendo tomado pela deliciosa sensação de dançar. Hoseok colocou as mãos na minha cintura, incentivando a minha ação de rebolar de acordo com o ritmo, e eu não aguentei segurar uma gargalhada ao assimilar aquele momento com uma cena de um filme adolescente.

— Até que isso é divertido — gritei por cima da música, que parecia ficar cada vez mais alta.

Sabe aqueles momentos que você sabe que se sua vida fosse um filme, aquele momento ficaria em câmera lenta? Foi exatamente isso que eu senti ao vê-lo de longe. 

A luz colorida que antes estava verde, ficou intercalando entre roxo e vermelho no mesmo momento que a música Dangerous Woman começou. Eu levantei os meus braços e joguei a cabeça pra trás, Hoseok passava as mãos pelo seu corpo e Taehyung descia até ao chão, e quando eu levantei a cabeça novamente e senti os fios de meu cabelo caírem sobre um pouco dos meus olhos, eu o vi.

Aquele mesmo garoto de mais cedo sentado em uma mesa um pouco perto da pista. Ele não estava me vendo na hora, mas estava rodeado de pessoas e parecia estar entretido naquele círculo, quando a música foi interrompida pelo refrão de outra música, break up with your girlfriend, i'm bored, ele finalmente olhou pra mim.

Talvez estivesse procurando a mesa do DJ, que ficava a poucos metros de onde eu estava e de repente, no meio de mais de uma centena de pessoas, ele me encontrou. Alguns fios negros de seu cabelo estavam colados em sua testa, o que significava que ele estava dançando antes de se sentar. Ele usava uma blusa branca, com uma jaqueta preta e uma calça de couro colada. Talvez o clima erótico que aquela boate dava para qualquer pessoa, tenha transformado ele em uma pessoa mais bonita do que já era, porque eu jurei ter perdido o fôlego com tamanha beleza. Também acho que talvez aquelas luzes coloridas provocavam alucinações realistas, pois eu jurei ter visto ele dando um sorriso ladino que deixaria qualquer pessoa de pernas bambas, e adivinha? Me deixou!

— Taehyung, o garoto de hoje mais cedo está aqui — informei, falando em seu ouvido.

O Kim arregalou os olhos e passou a procurar ele indiscretamente por toda a boate, o acertei um soco ao ele finalmente achar o garoto, e não desviar o olhar ou desmanchar o sorriso sapeca.

Hoseok riu e entrelaçou seus dedos nos do Kim, sendo convidado por este a rodopiar. Eu apenas sorria por ver o dois dançando juntos, nunca iria superar caso no fim, eles não ficassem juntos. Pode ser uma surpresa para muitos, mas eu sou incrivelmente apaixonado por qualquer tipo de romance.

Quando se passa tanto tempo preso em casa sozinho e sem absolutamente nada pra fazer, criamos novos hábitos. E bom, um que eu sempre tive o prazer de experimentar, foi a leitura. Era como se, assim que eu começava uma nova leitura, eu era levado até um mundo onde sou apenas um adolescente normal. Nesse meio tempo, os livros de romance ganharam rapidamente a minha graça, então eu sei reconhecer de longe um bom romance. E o relacionamento dos meus dois melhores amigos, é sem dúvida, um baita de um belo romance.

— Vou pegar uma bebida — disse me afastando dos meus amigos, que assentiram em minha direção.

— Que bom, só assim ele vai ter coragem de chegar em você — Taehyung disse com um tom de voz brincalhão, e assim que eu me aproximei do bar, ele gritou: — Nos filmes sempre acontece assim!

Ri comigo mesmo do quanto ele era louco, logo pedindo mais um daquele drink que eu estava tomando antes. E, por um milagre chamado clichê, Taehyung estava realmente certo. Enquanto eu esperava meu drink ficar pronto, dei uma rápida espiada por cima do meu ombro, conseguindo capturar a imagem daquele garoto caminhando em minha direção.

Eu sei que não estava errado, porque ele olhava pra mim quando eu tentei espiá-lo discretamente. Claro, como o garoto ousado e confiante que sou, não aguentei a pressão de olhar por mais de três segundos para aquelas orbes negras hipnotizadoras e voltei a atenção para o barman a minha frente, que havia colocado o meu drink em cima do balcão.

Tomei metade da bebida em só gole, me arrependendo extremamente após o ato. O gosto que antes era adocicado, havia se transformado em algo ardente e amargo, não o bastante para me deixar atordoado ou zonzo; eu não cedia aos encantos de ficar bêbado rápido, mas poderia derrubar alguma pessoa que não estava acostumada.

Voltei a procurar o garoto pela boate, não o encontrando em lugar nenhum. Então, formado em filmes adolescentes e livros de vampiros, eu sabia que ele apareceria extremamente perto de mim, o que me deixaria com o coração a mil por hora.

— Oi. — A voz grave soou atrás de mim, confirmando as minhas teorias. Virei-me, dando de cara com o par de olhos que havia tomado a minha mente nas últimas horas, assim como o dono daquelas beldades.

Ele me olhava com as sobrancelhas arqueadas e os lábios abertos em um sorriso ansioso e sugestivo, e esse foi o motivo do meu desespero. Eu não estava conseguindo falar!

Por que diabos eu não estava falando?

— Você é o garoto de mais cedo, não é? Que estava espiando pela janela? — questionou divertido, obtendo como resposta um sinal positivo com a cabeça e um rosto corado de minha parte. — Sabe, se você tivesse ido me ajudar lá fora, eu teria te dado o meu número.

Se antes eu estava envergonhado, naquela hora eu estava além da capacidade de ter um adjetivo que explicasse o meu estado. Antes, apenas as minhas bochechas estavam avermelhadas, mas após a cantada indiscreta, o meu rosto inteiro ficou avermelhado.

Mas, acho que isso não foi um sinal muito positivo para o garoto, visto que ele logo abaixou o olhar e colocou as mãos nos bolsos da calça, provavelmente por eu tê-lo deixado falando sozinho. Malditas palavras que não saem!

— Q-quer dizer, se você quisesse, é claro. Se bem que nem está falando comigo, é um ótima forma de me mandar ir embora, desculpe pelo incômodo — Ele disse com um sorriso tímido no rosto, passando a começar a se afastar.

"Fala qualquer coisa", eu repetia na minha cabeça, porque se eu não falasse com o moreno ali, eu nunca teria coragem para falar com ele em qualquer outro lugar.

— Jimin — falei de repente, praguejando-me mentalmente por falar isso sem nenhuma explicação. Ao ouvir minha voz, ele parou de andar e virou-se na minha direção, as sobrancelhas arqueadas novamente e um sorriso nascendo no canto de seus lábios. — Meu nome é Park Jimin, e o seu?

— Jeon Jungkook — respondeu, agora bem mais próximo de mim. — Prazer.

— O prazer é meu. E olha, eu não saí porque… estava ocupado. — Tentando não ser banhando e morto pela luz do sol, acrescentei na minha cabeça.

O moreno deu uma pequena risada e direcionou o seu olhar pro chão enquanto assentia, fazendo com que sua cabeça se abaixasse um pouco também. Quando ele resolveu olhar-me novamente, não levantou a cabeça, continuou na mesma posição só que com os olhos erguidos. E sabe aquele momento que você percebe que, o que você acreditava que era a coisa mais sexy do mundo, não é nada comparado ao que o cara que você gosta está fazendo? Foi exatamente isso que eu pensei ao encarar aqueles olhos negros.

— Você costuma vir aqui? — questionou, agora com a postura correta enquanto sentava em uma cadeira do bar, que ficava ao lado da minha.

— Não, só venho quando meus amigos resolvem me arrastar junto — respondi, com um tom de voz brincalhão. — E você? Costuma vir muito aqui?

— Bom, sim. Gosto de vir aqui, sempre tenho uma surpresa nova — Ele disse, tomando um gole de sua bebida, que eu reconheci ser whisky, enquanto seus olhos estavam fixados nos meus.

Sei que aquele momento deveria ser atraente e sensual, e foi, tudo que aquele homem faz se torna atraente e sensual, mas eu não consegui controlar a gargalhada que escapou dos meus lábios. Ele tentou reprimir uma risada ao me ver rindo, mas não aguentou, passando a rir completamente confuso ao meu lado.

— Desculpa, é que foi muito engraçado — falei, enxugando uma lágrima solitária que escapou do meu olho esquerdo. — Você tá tentando ser um homem dominante e bad boy, mas não é. 

— Uh, não sou? — Ele perguntou com um sorriso brincando em seus lábios, atento ao que eu falava.

— Não, eu percebi isso quando você foi super fofo e tímido quando estava indo embora — comentei, recebendo um olhar surpreso dele, que tentou segurar mais uma risada. — Foi mal, eu sou assim, um desvendador de pessoas.

— Nossa! Tudo bem, você me pegou, Park — admitiu, arrancando um olhar convencido de minha parte, que o fez sorrir. — Então, senhor desvendador de pessoas — o tom de voz dele era irônico, isso me fez rir —, quer sair comigo amanhã de tarde?

Travei.

É claro que eu queria sair com ele, queria muito. Fazia muito tempo desde a última vez que eu senti algo dessa forma por uma pessoa, então eu não via motivos para negar um encontro. Eu só precisaria mudar o horário do encontro, a não ser que eu queira morrer na frente dele.

— Não tem como ser a noite? De tarde eu não posso, porque… — Eu o olhei.

Ele me olhava tão… normalmente. Ele não me via como uma pessoa doente e nem me falava coisas que costumam falar para uma pessoa doente. Para ele, eu era apenas mais um garoto em uma boate ou, um garoto que espiava ele da janela. Eu era uma pessoa normal pela primeira vez em treze anos, e eu tinha me esquecido do deleite daquela sensação.

— Porque eu estou ocupado. — Completei a frase. Eu não menti, não é? Apenas omiti que estava ocupado em não entrar em contato com a luz solar.

Assim que terminei de falar, o Jeon assentiu freneticamente, até gaguejando ao concordar em voz alta e marcar o horário do encontro. Talvez ele achasse que eu não ia aceitar, mas se foi isso mesmo, talvez eu deva contratar um psicólogo para ele, já que deixei bem evidente que queria sim, sair com ele.

— Me passa o seu celular — pedi, esticando minha mão em sua direção, o que arrancou uma risada baixinha dele e um olhar confuso em meu rosto.

— Não acredito que esperou eu te convidar pra sair, para só então me roubar — Ele disse brincalhão, me entregando o celular desbloqueado.

Revirei os olhos e fui até o telefone, adicionando o meu número. Senti a respiração quente dele bater contra a pele do meu pescoço, me arrepiando, mas tentei me concentrar no último número que faltava. Acho que ele percebeu isso, porque soltou uma risada pequena que apenas piorou a minha situação embaraçosa.

— Jimin, são duas horas, vamos? — Hoseok me chamou ao chegar perto, só então percebendo Jungkook, que estava perto demais apenas para espiar o celular.

— Tudo bem, estou indo — informei, salvando o meu contato e entregando o celular para Jungkook, que se levantou ao mesmo tempo que eu. — Tchau, Jeon.

Ele sorriu e se aproximou ainda mais, beijando a minha bochecha antes de se despedir e voltar até os amigos, que vibraram de animação indiscretamente. Eu, como não sou burro, não esperei que meus amigos fizessem o mesmo comigo, por isso andei rapidamente até a saída da boate, sendo seguido a todo instante por eles.

— Vou sair com ele — anunciei de forma breve, verificando no meu relógio imaginário quantos segundos passariam até os dois surtarem.

E bom, pelos meus cálculos, eles surtaram em menos de cinco segundos.


XXX


Sabe quando a sua vida está tão boa, que você sabe que algo vai ter que dar errado? Exatamente!

Fazia mais de dois meses que eu estava saindo com Jungkook, e não poderia ser mais perfeito. Ele é incrível e me tratava de uma forma que apenas meus amigos me tratavam. E ele me olhava de uma forma, que fazia o meu âmago se contorcer por amor. Mas eu tenho uma carta na manga que poderia colocar tudo a perder, e o nome dela é XP.

Acredite se quiser, mas nunca saíamos de tarde ou de manhã durante esses dois meses. E caso ele quisesse ficar comigo em um desses horários, ele tinha que vir pra cá e nós pedíamos comida.

Eu sei que deveria falar com ele sobre a minha doença logo, também sabia que adiar só me traria possíveis problemas, mas ele me tratava como uma pessoa normal. Eu tinha me esquecido da sensação de ser alguém normal e, pode apostar, é a melhor sensação do universo.

— Pensando no namorado? — questionou Taehyung, deitando-se do meu lado na cama.

— Ele não é meu namorado — murmurei baixinho, em parte chateado por ele não ser mesmo meu namorado.

Antes que Taehyung pudesse falar mais alguma coisa, meu celular vibrou ao meu lado, notificando algo. Não fiz muito esforço ao pegá-lo e colocá-lo na frente dos meus olhos, para depois sorrir como um bobo ao ver que era uma mensagem do Jungkook.

— Até parece!

Ignorei o comentário dele e desbloqueei meu celular, podendo ver nitidamente as mensagens enviadas pelo Jeon.


Junggie *heart*:

Hoje você vai se surpreender, esteja pronto às 18:30! [16:42]


— Hoje você vai transar? — Taehyung perguntou, espiando a mensagem por sobre o meu ombro.

O olhei com os olhos arregalados e logo senti meu rosto queimar, maldita hora para eu não conseguir controlar o rubor que se alastrava das minhas bochechas até a testa.

— Talvez… — murmurei.

Para quem tinha essa dúvida, durante esses dois meses de encontros, nada passou de beijos quentes e algumas mãos bobas. Não porque eu não queira ou, porque não sentíamos atração um pelo outro, estava bem claro que nós dois desejávamos isso, mas também estava bem óbvio pra vocês porque eu não ia mais fundo.

Em vários momentos da minha vida, eu tive vontade de perder a virgindade. Mas, depois de passar tanto tempo sozinho em casa comendo; assistindo; malhando; comendo mais e não fazendo nada, eu me tornei tedioso. Me olhava no espelho e não gostava do que via, eu pensava que nunca teria um relacionamento, quem namoraria com o garoto "anti-social" que nunca saía de casa? Não me sentia bem comigo mesmo, odiava o meu corpo e mais do que tudo, odiava a minha vida. Por isso, sempre que meus amigos me chamavam para curtir, eu não via forças suficientes em mim para ir até algum lugar, fingir que eu gostava de mim mesmo e aguentar outro garoto tedioso tentando me levar pra cama.

Com o Jungkook foi diferente. Ele me trouxe um misto de sensações e sentimentos ao mesmo tempo, me deixando confuso. Na verdade, tudo naquele garoto me deixava confuso.

Ele fazia brincadeiras que me divertiam, me faziam rir e me sentir envergonhado ao mesmo tempo. Ao abrir um sorriso, ele parecia ser a luz da escuridão que o mundo se afundou, mas ao fechar o rosto, parecia alguém tão sério e que não se dava bem com a vida, algo totalmente oposto dele. Jungkook era otimista e romântico, arrancava coisas de mim que eu nem sabia que existiam e, acima de tudo, ele tentava me reerguer sempre que me via tentando cair, ele montava meus pedacinhos sempre que me via despedaçar e repetia para mim todos os dias, ao ver o que eu pensava sobre toda aquela merda de minha vida: "você não precisa ser dependente de ninguém pra continuar vivendo."

Jungkook era alguém bom e não cuidava de mim, ele me ajudava, me ajudava mesmo não sabendo que eu precisava de bem mais ajuda do que ele me dava.

— Quando você vai contar pra ele? — perguntou, fazendo com que eu sentasse melhor e a voz da minha consciência sibilou como uma cobra, para ecoar por todos os meus pensamentos as seguintes palavras: "você é um mentiroso."

— Próxima semana — respondi sério, desejando dar língua para a minha consciência.

Taehyung ficou alguns segundos em silêncio, e eu realmente me preparei para um discurso de como isso era errado, de que eu estava omitindo algo crucial pro nosso relacionamento; mas não foi isso que ele fez. Taehyung tombou a cabeça para o lado, para depois se queixar com um tom de voz sôfrego. 

— Não acredito que você consegue um namorado mentindo, e eu aqui sozinho — choramingou.

Ele apenas me lembrou do Hoseok com esse comentário, mas senti receio em continuar com o assunto. Uma hora ou outra eles teriam que conversar sobre aquele assunto, afinal, não poderiam ignorar os sentimentos do Hoseok daquela forma, mas tenho certeza que eles iriam preferir conversar sobre isso sozinhos. Mas, ao eu olhar o rosto triste de Taehyung, resolvi continuar com a conversa.

— Eu não ia falar nada, já que não foram vocês que decidiram me contar, mas vou falar sim — comentei, atraindo a atenção do Kim. — E o Hoseok?

— O que tem o Hoseok? — indagou inocente, só então percebeu o que eu estava tentando explicar, passando a me olhar com os olhos arregalados. — C-como você…?

— Ele me contou uma vez, quando estava bêbado — respondi, agora lhe lançando um sorriso meigo. Mas o fechei assim que percebi que ele estava com uma sobrancelha arqueada, esperando que eu continuasse a falar. — Nem tenta, não vou te falar a opinião dele sobre isso.

Ele revirou os olhos, murmurando alguma coisa que eu não consegui escutar, mas tenho certeza que foi algo como: você e o seu jeitinho certo. Depois, mordeu o próprio lábio inferior e olhou pra mim, o mesmo olhar que ele me lançou há treze anos, quando descobriu que eu poderia morrer caso entrasse em contato com a luz solar, aquele olhar carregava medo.

— E-eu gosto dele, quer dizer… não sei! Eu gostei do beijo, isso é óbvio, gostei muito e o Hoseok é tão… — Ele tropeçou nas palavras, confuso com tudo o que sua mente lhe mostrava sobre aquele dia. Porém, eu entendi o que ele quis dizer, entendi perfeitamente. — Sabe, eu sempre brinquei com isso e criei sonhos e expectativas de como deveria ser, como ele e eu deveríamos ser. Só que nada saiu como eu imaginei, então é tudo meio confuso, Jiminnie.

— Não faz bem viver sonhando e se esquecer de viver, lembre-se — comentei, pondo uma de minhas mãos sobre as suas, que estavam juntas em seu colo.

— Por que você tá citando uma frase do Dumbledore? — inquiriu, tentando segurar um sorriso.

— Eu estava lendo o primeiro livro ontem. Mas, enfim — eu suspirei e me aproximei —, o que eu quero dizer é que você entrou em um padrão que não deveria existir.

— Existem coisas que temos que pensar sobre ter ou não em um relacionamento, mas são coisas extremamentes reais e básicas, que podem acontecer. Ou você quer que ele te conquiste enquanto usa uma armadura, recita um poema de sua autoria e está sentado em seu cavalo branco? — Brinquei, arrancando uma risada do Kim, que estava com lágrimas nos olhos. — Com "só que nada saiu como eu imaginei", você não se referiu apenas ao que aconteceu entre vocês dois. Tá falando do seu pai e de quando você começou a sair e beber, não é? Taehyung, você não é como ele!

— De todas as pessoas do mundo, pode ter certeza que eu sou uma das que mais imagina e cria expectativas e surrealidades na minha cabeça, assim como sou a que mais se frusta quando elas não se realizam. E mesmo assim, eu não desisti de continuar vivendo aquilo por causa de minha imaginação fértil, e se eu não desisti, você também consegue não desistir — falei convicto, segurando com mais força as mãos do Kim. — Você não quer tentar? 

Taehyung não disse nada, não disse nada enquanto eu estava falando e, não disse nada quando eu terminei. De seus olhos transbordavam lágrimas grossas e transparentes, que quase passavam despercebidas pelo rosto lindo do Kim. Pensei que talvez ele estivesse digerindo tudo o que eu disse, mas antes que eu pudesse me mover ou falar algo reconfortante, ele me abraçou. Não disse nada, apenas me abraçou.

Ali, eu senti que ele estava dizendo obrigada, eu senti que ele estava me dizendo que eu o havia ajudado da mesma forma que ele me ajudou por treze anos. Eu também não disse nada, apenas o apertei mais contra mim e deixei sua cabeça ser deitada no meu ombro, não me importando se as lágrimas estavam molhando meu moletom preto.

Taehyung era aquele típico garoto que tentava esconder a tudo custo suas dores e fraquezas, mas não era de ferro. Ele sentia e se machucava como qualquer ser humano, mas era difícil para ele admitir isso, não quando passou por tantas coisas em apenas dezenove anos. Hoseok e eu tentávamos ajudar o máximo que podíamos, mas, eu sei que o Jung faria muito mais que isso.

Porque Hoseok sabia ser transparente quando quisesse, ele sabia o que deveria falar e quando deveria falar. Ele era alguém que levava o sol por onde andava, e aquele era o meu sol particular, mas ele também levava esperança. E aquela esperança, aquela esperança faria Taehyung ter mais dela na vida.

Nosso abraço foi cessado ao ouvirmos a porta ser aberta. Taehyung enxugou seu rosto com a manga da camisa e eu o observei, enrolando seus fios sedosos nos meus dedos. Meu pai entrou no nosso campo de visão com um sorriso no rosto e várias sacolas do supermercado nas mãos, parecia bastante animado.

— Chegou cedo, pai — comentei, deixando o cabelo de Taehyung de lado para caminhar até o meu pai, que estava na cozinha.

— Sim, sua mãe vai chegar logo também. Hoje é o nosso aniversário de casamento — falou animado, passando a lavar os legumes. — Vai jantar aqui, Tae?

— Não, eu vou me encontrar  com o Hoseok — respondeu-o, trocando olhares comigo, que sorri feito um bobo.

— E eu vou sair com o Jungkook, obrigada por perguntar e se preocupar — falei brincando, apenas para ver um sorriso brotar nos lábios do meu pai. 

Quando eu era criança, sempre falava para quem quisesse ouvir que meu pai encontrava pessoas e completava famílias. Sempre fui muito apegado a ele, era o meu herói favorito depois do Homem de ferro. E sabe aquela história que a relação perde a força com o passar do tempo? Tudo mentira! Meu pai ainda é o meu herói favorito — tirando o Homem de ferro.

— Inclusive, já passou das cinco da tarde. Você não precisa se arrumar? — Taehyung questionou, verificando o horário no celular.

Assenti desesperadamente e corri em direção às escadas, para parar no terceiro degrau e me virar para o meu amigo, com um sorriso amarelo no rosto.

— Antes de sair, vem me ajudar — informei, voltando a subir as escadas, só que com Taehyung me seguindo agora.

— Eu já não ia te ajudar? — murmurou confuso.

Não demorou para que eu ficasse pronto e nem para Taehyung sair de minha casa, nervoso. Lhe assegurei que tudo correria bem e que Hoseok lhe escutaria, mesmo que não conseguisse entender na hora, ele faria o seu máximo para compreender os sentimentos e pensamentos do Kim.

Assim que escureceu, ouvi uma batida na porta e corri pro primeiro andar, dando de cara com minha mãe que estava subindo os degraus da escada.

— Vai sair com o Jungkook? — Ela questionou, obtendo uma resposta afirmativa minha. — Se cuida, te amo.

Depositei um simples selinho na testa da mais velha e desci correndo os outros degraus, para abrir a porta de casa e ver Jungkook com uma das mãos na calça jeans e outra erguida para dar uma nova batida.

Tenho certeza que muitos achavam que minha mãe seria aquele tipo de mãe tóxica, que precisa saber todos os passos do filho e que controla tudo, mas não é bem assim. Quando eu fui diagnosticado, foi como se minha mãe estivesse em choque, ela mal saía do quarto quando estava em casa e dobrava seus plantões. Eu estava assustado, e mesmo com meu pai cuidando de mim e meus amigos, eu assistia de longe a minha mãe morrendo aos poucos, talvez bem mais rápido do que eu.

Um dia, antes de ela sair de casa para o trabalho, eu fui até o quarto dela e a vi segurando a roupa que eu usaria para ir na praia dois dias depois. Me senti triste, então por isso eu caminhei até ela e a abracei, claramente surpreendendo-a. Ela não retribuiu, pelo menos não no primeiro minuto, por isso falei suavemente: — Vai tudo ficar bem, mamãe, não precisa ter medo.

Acho que aquele foi o momento que a ficha dela caiu, porque ela me abraçou com muita força e começou a chorar.

Claro que ela tem medo, mas ela também sabe que eu já tenho restrições demais na vida para se dar ao luxo de colocar ainda mais.

— Oi — Ele disse, me puxando para um beijo ali mesmo. 

Passei as mãos por trás de sua cabeça e o aproximei mais de mim, poderíamos ter ficado daquela forma a noite inteira, se meu pai não tivesse nos interrompido com uma tosse falsa e incomodativa, se aproximando por trás de mim.

— Boa noite, senhor Park — Jungkook cumprimentou calmamente, mas eu sabia que ele estava nervoso, pois segurou minha mão com tanta força que eu tive que me esforçar muito para não fazer uma careta.

— Boa noite, Jeon. Para onde irão hoje? — Papai carregava um tom de voz mais grosso e duro do que o costume, era engraçado. 

Mamãe que já estava descendo as escadas, percebeu o que ele estava tentando fazer e se aproximou de nós três, passando suas mãos pelo pescoço de meu pai e as deixando descansando em seu peito.

— Não importune os garotos! Boa noite querido — cumprimentou Jungkook, que lhe lançou um belo sorriso. — Vão logo.

— Até logo — despedi-me acenando, vendo meu pai devolver o aceno antes de minha mãe bater a porta.

Virei para o meu "namorado" e ergui nossas mãos que estavam entrelaçadas, indicando que ele já poderia soltar minha mão. Ele não fez nada além de me puxar até o seu carro, me dando um último beijo antes de abrir a porta para eu entrar.

Observei ele dar a volta no carro e se sentar no banco do motorista, com um sorriso sapeca estampado no rosto enquanto colocava o cinto de segurança e começava a dirigir. Ele estava aprontando alguma! 

— E então, para onde vamos essa noite? — perguntei animado, eu não parava de pensar nisso desde que recebi aquela mensagem dele.

Ele sorriu mais uma vez, dando uma rápida olhadela na minha direção, para depois falar baixinho: — Daegu.

Arregalei os olhos em sua direção, esperando que ele falasse que não passava de uma piada. Mas isso não aconteceu, aos invés disso, ele ligou o GPS e o caminho até Daegu começara a ser ditado pela máquina, me deixando em ainda mais choque.

— Isso é sério?

— Por que não seria? Você sempre quis ir, não é? — Ele questionou com um tom divertido, deixando que sua mão direita descansasse na minha coxa.

— Você é inacreditável — murmurei encantado.

O caminho até Daegu fora rápido e divertido, chegamos em menos de uma hora devido a velocidade de Jungkook, que alegava estar indo rápido para não perder tanto tempo. Chegando lá, tudo que antes estava mágico, melhorou duas vezes mais.

A praça deles era tão movimentada e animada quanto a de Busan, talvez até mais. Mímicos nos puxaram para um ato, e Jungkook que se dizia tão bom em mímica, acabou arrancando muitas risadas de todos por não fazer ideia do que estava fazendo.

Passamos mais de meia hora brincando com as pessoas, antes de Jungkook achar uma cabine fotográfica e me arrastar até lá. Não que eu não quisesse ir, era uma coisa linda e memorável, apenas teria uma discussão sobre quem ficaria com as fotos tiradas depois.

Tiramos fotos engraçadas e divertidas, até Jungkook se encostar na lateral da cabine e passar a me olhar, continuando a fazer isso mesmo depois de eu pegá-lo me olhando. Por isso, me aproximei de si e passei as mãos ao redor de seu pescoço, sentindo suas mãos não tardarem a tomarem minha cintura. Aproximei nossos rostos, podendo sentir o hálito de menta bater contra minha bochecha.

— Essa sim vai dar uma boa foto — comentou, arrancando um sorriso meu antes de eu lhe tomar seus lábios em um ósculo intenso.

Quando saímos dali fomos direto até um círculo cheio de gente no centro da praça, eles estavam cantando Grenade, do Bruno Mars. Comecei a cantarolar baixinho, e Jungkook que estava me ouvindo, me abraçou por trás e me acompanhou.

Não sei por quanto tempo ficamos lá, mas saímos apenas de madrugada e quando chegamos em Busan, Jungkook não me levou para casa. Fomos em direção ao porto da cidade, onde Jungkook nos levou até um barco de madeira que dizia ser seu.

— Desde quando tem ele? — perguntei ao sentarmos no barco, sentindo ele se remexer constantemente por conta das pequenas ondas.

— Meu pai me deu quando eu fiz quinze anos, cuido dele até então — respondeu, dando leves batidas na lateral do barco.

Me levantei o olhando, começando a retirar o meu moletom. Ele arregalou os olhos e se levantou de maneira súbita, quase nos derrubando do barco por esse ato repentino.

— Jimin… e-eu quero que aconteça, mas não aqui no meu b-barco — disse envergonhado, me vendo começar a desabotoar a minha calça.

— Eu não tô tirando a roupa porque quero transar contigo, Junggie — informei rindo, finalmente conseguindo tirar minha calça.

Eu estava querendo transar com ele, mas não naquele momento.

— Tô tirando porque vou dar um mergulho — disse calmo, colocando uma das pernas para fora do barco, sendo atentamente vigiado pelos olhos de ébano do moreno. — Vem?

Eu não esperei uma resposta, apenas pulei do barco e senti um arrepio passar pela minha espinha ao meu corpo quente entrar em contato com a água gelada. Jungkook não se demorou em retirar suas roupas e se juntar a mim na água, reclamando da frieza da água daquele lago.

Eu ri, me aproximando e zombando dele, de maneira que o fez corar fortemente. No decorrer desse tempo de brincadeiras, eu me aproximei tanto que nossos narizes quase se encostavam. Jungkook levou um de seus dedos até o meu rosto, dedilhando o contorno dos meus lábios.

Beijei suavemente seu dedo quando este terminou de dedilhar. Mas logo o seu dedo foi substituído por seus lábios finos, e suas dedos foram parar na minha cintura, me puxando para mais perto. Por mais que eu flutuasse na água, era como seu estivesse sentado em cima do colo de Jungkook. Meus dedos foram de encontro com os fios negros molhados e macios dele, enquanto nossas línguas exploravam nossas bocas, muitas vezes elas se enroscavam, fazendo com que eu arfasse durante o beijo.

— Você devia me deixar em casa, não é? — perguntei, quando separamos nossos lábios e ele começou a distribuir selinhos pelo meu pescoço, me fazendo ter que morder meu lábio inferior para segurar um gemido que teimava em tentar sair.

— É, eu tenho — disse ofegante, interrompendo os beijos no meu pescoço. — Vem, depois a gente termina isso.

Nadamos de volta para o barco, onde nos vestimos e depois seguimos até terra firme. O clima estava leve e caloroso, eu não me importaria de passar a noite sentado no meio das pernas de Jungkook, enquanto ele contava uma de suas histórias que me deixavam animado. 

Eu estava indo em direção ao carro quando Jungkook me puxou pelo braço, fazendo com que nossos corpos se chocassem. Ele estava com um sorriso manhoso no rosto e os cabelos caindo sobre sua testa, ele não poderia estar mais bonito, eu dizia pra mim mesmo.

— Espera, vamos ficar um pouquinho mais. Estamos prestes a assistir um lindo nascer do sol — informou, verificando as horas no seu celular e me puxando para mais perto.

A brisa da madrugada estava tão fria que eu me aproximei bem mais do que pensávamos que dava, deitando minha cabeça em seu ombro. Mas foi só então que eu raciocinei a sua fala, como assim nascer do sol?

— Nascer do sol? Que horas são? — perguntei assustado, já sentindo cada pedaço do meu corpo começar a suar.

— Falta quinze minutos para ás cinco, por quê? — Ele respondeu e eu senti que o meu mundo estava começando a desabar.

Corri em disparada até o carro, gritando para Jungkook me acompanhar rapidamente porque eu precisava ir pra casa naquele momento. Ele veio atrás de mim desesperado, provavelmente pensando que havia feito ou falado algo de errado, mas eu não estava calmo o suficiente para pensar em acalmá-lo.

— Jimin, o que foi? — Ele questionou mais uma vez quando entrou dentro do carro, me olhando.

— Só dirige! — gritei.

Ele obedeceu e começou a dirigir até minha casa, pisando no acelarador e indo o mais rápido que podia no momento. Eu sabia que não daria tempo, pois o sol começou a nascer enquanto estávamos a quatro quadras da minha casa, que nunca pareceu ficar tão longe.

Quando ele estacionou o carro na calçada da minha casa e eu abri a porta, todo o sangue que estava no meu rosto fora drenado. O sol já estava iluminando tudo, por isso, coloquei o capuz do moletom e corri em direção a minha casa, batendo loucamente na porta enquanto sentia o sol queimando aos poucos a pele dos meus dedos e rosto.

Meus pais abriram um pouco depois, completamente desesperados. Nem Hoseok ou Taehyung falaram comigo, eles foram direto até Jungkook que assistia assustado do outro lado da rua. Taehyung tentava segurar Hoseok, que xingava em voz alta Jungkook, que era o mais confuso dali.

Acabei caindo dentro de casa em frente aos pés de minha mãe, que me levantou com lágrimas nos olhos e correu até a cozinha, para me trazer um copo d'água e um comprimido.

— Você queria matá-lo — gritou Hoseok, tentando partir pra cima de Jungkook, mas estava sendo impedido por Taehyung.

— O quê? Do que você tá falando? — Jungkook questionou ainda mais confuso.

— Não se faz de idiota pra cima de mim, não se faz! Ele tá doente, por que fez isso? — Ele perguntava desesperado, tentando socar Jungkook.

— Hoseok ele não sabe! — Taehyung gritou, segurando o rosto de Hoseok com as duas mãos, que parou de se debater e gritar com Jungkook. — Ele não contou pra ele, o Jimin não contou.

Hoseok murmurou algo que nenhum dos dois ouviram, mas Jungkook não se importava com isso e sim com o que estava acontecendo comigo.

— Alguém vai me contar o que está rolando, e vai ser agora!


XXX


Quando eu era criança, uma enfermeira perguntou se eu estava com medo de morrer; eu disse que não e ela sorriu, me chamando de corajoso. Mas eu não era corajoso porque não tinha medo de morrer, eu não tinha medo de morrer porque eu sabia que eu não iria morrer. Eu não iria morrer porque no dia que eu vi minha mãe chorando por culpa dessa maldita doença, eu mesmo prometi que não morreria.

Durante toda a minha vida, eu desejei viver um romance escrito por Shakespeare, talvez Hamlet ou Romeu e Julieta. Eu só não esperava que iria morrer como num romance escrito por ele, morrer apaixonado.

Depois daquele dia, eu não permiti que meus pais deixassem Jungkook falar comigo. Não, eu não estava com raiva dele ou colocando a culpa nele pelo o que aconteceu comigo, na verdade, eu estava grato por ele ter tentando me ajudar mesmo sem saber o que estava acontecendo.

Eu estava com raiva e colocando a culpa em mim, porque eu sei que se eu não tivesse omitido algo tão grave e importante, ele teria me levado para casa mais cedo e nada disso aconteceria; eu não estaria fazendo uma radioterapia agora.

Tenho certeza que não conseguiria mais encará-lo, não quando eu mal conseguia encarar quem esteve comigo durante toda a minha batalha contra essa maldita doença. E tudo isso porque eu sou um mentiroso, um idiota mentiroso.

Acho que eu estava com tantas saudades de me sentir normal, eu ansiava tanto a definição "normal" que eu não percebi que estava afundando cada vez mais, e dessa vez levando junto todos ao meu redor.

No final, eu mesmo não entendia o que era o normal. Porque o normal pode ser uma das coisas mais relativas que existem e, infelizmente, eu só fui perceber isso quando detectaram mais quantidade de luz solar no meu corpo do que eu poderia aguentar.

Eu estava morrendo, de novo, e dessa vez eu sabia que eu não iria aguentar.

Na primeira noite após eu ser diagnosticado, sonhei com um campo de girassóis. Era esplêndido, as flores amarelas eram a única coisa que podia se ver longe. A luz do sol batendo nas pétalas e iluminando a grama verdinha, aquilo fez meu coração bater loucamente em meu peito. Quando eu acordei, disse para minha que seria um girassol na minha outra vida.

Na segunda noite após eu ser diagnosticado, sonhei comigo vestido completamente de amarelo, sentado em frente a uma janela enquanto a luz do sol batia contra o meu rosto e iluminava o meu cabelo, aquilo fez meus olhos marejarem. Quando eu acordei, disse para o meu pai que queria o meu quarto pintado de amarelo.

Na terceira noite após eu ser diagnosticado, sonhei correndo pela minha rua em plena luz do dia. Os meus tênis brancos eram o que mais me chamavam a atenção, eles me levavam para onde eu quisesse ir e as pessoas nas portas riam e acenavam, falando o quanto estavam com saudades de me verem brincando. Quando eu acordei, disse para Taehyung que amava tênis brancos.

Na quarta noite após eu ser diagnosticado, sonhei que estava fazendo uma peça escrita por Shakespeare, onde ele falava que eu estava dando minha vida pelo personagem que eu estava interpretando. Ele dizia que eu conseguia sentir como era estar solitário, como era perder a coisa que fazia o seu corpo transbordar de ansiedade e alegria. Para Romeu, era Julieta e para mim, era a liberdade. Quando eu acordei, disse para Hoseok que se eu tivesse que escolher uma forma de morrer, não seria de XP e sim de amor, como em um livro de romance escrito por Shakespeare.

Hoseok negou prontamente, deixando bem claro que um amor verdadeiro não mataria alguém, apenas ajudaria. Na época, eu não soube o que responder.

Hoje eu posso dizer que, sim, um amor verdadeiro pode matar alguém. Talvez não propositalmente, mas pode matar.

Na quinta noite após eu ser diagnosticado, eu não sonhei.

E tudo parecia se repetir com tanta clareza em minha mente agora, como se a vida estivesse passando um filme de tudo que eu passei, onde eu poderia reviver alguns momentos que eu jurei ter esquecido. Era quase como uma despedida dessas lembranças.

Lembrei de quando eu era criança e estava sentado no chão do hospital, pintando um desenho que Taehyung e Hoseok haviam trazido. Mas, a minha atenção foi toda para os meus pais que estavam no corredor gritando com o meu médico sobre algo como… morte, isso, lembrei. E agora isso acontecia novamente, só que eu não estava pintando nenhum desenho dos meus amigos.

Eles gritavam bem mais alto e com um pouco mais de clareza. Diziam que eu não poderia estar morrendo, que era um erro do hospital e que eles queriam novos exames. Doía tanto ver o que eu causei com os meus pais, porque a minha doença os tornou daquela forma, eu fiz eles acabarem com as suas vidas para cuidar de mim.

Eu me levantei da cadeira que estava sentado na recepção e fui até eles, agarrando o braço do meu pai ao dizer: — Eu quero ir pra casa.

Ele assentiu, fazendo um sinal com a cabeça para a minha mãe levar-me até o carro. Ela colocou uma das mãos nas minhas costas, me guiando até o carro estacionado na frente do hospital.

A primeira coisa que eu notei ao sair do hospital, foi o céu escuro e estrelado. Antes eu odiava tanto aquele momento, revirava os olhos apenas por escutar a palavra noite. Eu vivi rodiado da noite e da escuridão, mas sempre tentei conter um pouco de luz em mim, por mais que ela não fosse tão grande.

Agora, eu só queria poder ver aquele céu lindo e brilhante por vários anos, ao lado de minha família e Jungkook. Eu sempre disse que o céu era escuro e sem nenhum pouco de luz, nada que substituísse a falta do sol na minha vida; só agora eu vejo o quanto fui tolo. A noite tinha sim uma luz tão especial que eu era cego demais para poder enxergar, as estrelas agora mexiam tanto com meu coração que eu me assustava. Nunca achei que aquele velho ditado fosse real, mas parece que só damos valor quando perdemos.

Quando menos percebi, meu pai já estava colocando o carro escuro dentro de nossa garagem. Acho que minha mãe queria falar algo, pois abriu a boca só que nenhum som saiu, de qualquer forma, eu não iria escutar visto que saí do carro rapidamente para ir até a sala.

Sentei-me na sofá e liguei a TV, colocando em qualquer série que eu ainda não tinha visto. Não falei uma palavra, mas notei o olhar sem vida de minha mãe e o rosto cansado de meu pai, talvez de tanto gritar. Eu estava os detruindo cada vez mais, e nem sabia como fazer isso parar. Eu sei que deveria sentar e conversar com eles, tentar pelo menos explicar o motivo de eu ter omitido minha doença de Jungkook, mas eu não conseguia; não conseguia porque eu mesmo achava um motivo banal.

Alguns minutos depois de todos sentarmos lado a lado no sofá, ouvimos leves batidas na porta. Hoseok e Taehyung, eu pensei, mas não me levantei e torci para que meus pais também não se levantassem, assim eu não teria que encarar mais dois rostos tristes e sentir vontade de me enterrar. Mas, para o meu azar, mamãe se levantou e abriu a porta pra quem quer que estivesse do outro lado, e para a minha surpresa, era Jungkook.

Ele já havia vindo muitas vezes aqui, é claro, eu o espiava por uma fresta da janela. Mas ele nunca batia na porta, apenas a encarava por alguns minutos e ia embora, algo assustador. Mas eu acho que o entendo, é provável que ele esteja com medo de nos encarar assim como eu estava com medo de encará-lo, ele se sentia culpado.

Acho que o mesmo conhecimento que se apossou dos meus pensamentos para me fazer perceber o quanto a noite era linda, também se apossou dos pensamentos dele para fazê-lo entender que não tinha culpa de nada.

— Jungkook, querido… — A voz de minha estava por um fio, demonstrando o quanto estava abalada.

Jungkook lhe lançou um sorriso choroso, para depois desviar o seu olhar em minha direção, que me levantei assim que o vi na porta. Puxei as mangas do meu moletom mais para a frente e assumi o posto da minha mãe na porta, esta que ficou um pouco atrás de mim caso eu precisasse de ajuda.

Jungkook não disse nada, apenas me olhou enquanto eu também o olhava. E por alguma razão que não fora explicada na época, eu consegui ter coragem para falar com ele ao ver aquele lindo par de olhos escuros e tristes — diferente do habitual, já que os olhos dele sempre estavam brilhantes e calorosos.

— Vem pro meu quarto — chamei, me virando e passando a caminhar em direção ao segundo andar.

Não precisei me virar para saber que Jungkook estava vindo, eu conseguia ouvir seus passos hesitantes e fracos. Eu não fazia ideia de como ele havia passado aqueles dias sem mim, mas parecia que eu também deveria incluí-lo na lista das pessoas que estavam se destruindo por minha culpa.

Entramos dentro do meu quarto e fechamos a porta, para passarmos dois minutos em completo silêncio. Quando seus olhos inchados e vermelhos miraram os meus olhos inchados e vermelhos, eu não consegui me segurar e corri até o seu encontro, sendo prontamente apertado em um abraço ao eu passar meus braços pelo seu pescoço.

— E-eu… — Ele começou a falar, mas um soluço o impediu, sendo logo seguido por outros.

— Shhh, ta tudo bem. Me desculpa, me desculpa — pedi, segurando seu rosto com as minhas duas mãos, enquanto via as lágrimas grossas deslizando por aquela pele tão macia e que me encantava tanto. 

Nos encaramos por alguns segundos, apenas ouvindo os soluços de Jungkook que aos poucos desapareciam. Quando ele finalmente se acalmou, colocou uma de suas mãos na minha nuca e impulsonou meu rosto para a frente, acabando com o espaço que existia entre nossos lábios.

— Eu deveria ter contado, m-me desculpa mesmo — pedi, enconstando nossas testas, mas fui surpreendido quando Jungkook nos afastou subitamente apenas para me olhar nos olhos.

— Eu te amo — declarou, me deixando perplexo e estático. — Eu te amo e não vou conseguir viver sem você Jimin, não sabendo que eu fui culpado por você morrer. Não me importo de você não ter me contado, não me importo mesmo, eu só…

— Eu só queria estar ao seu lado de novo. Não suportava dormir sem saber se você estava ou não respirando, se ainda estava sorrindo ou eu havia tirado isso de você — confessou, fazendo com que lágrimas surgissem em meus olhos. — Porque eu amo tanto o seu sorriso e como tudo a sua volta ganha um pouco mais de vida ao você sorrir, na verdade, eu amo cada parte do seu corpo e eu não conseguiria sobreviver sem você aqui, não tem como.

— Eu também te amo, te amo tanto que doi. Doi saber que eu posso morrer a qualquer momento e não vou mais poder sair com você, não vou mais poder amarrar o seu cabelo ou tentar te convencer a me mostrar todas as suas tatuagens — falei, passando minhas mãos pelas suas bochechas molhadas por conta das lágrimas. — Doi saber que eu não vou poder dizer o quanto te amo todos os dias.

Agora era o meu rosto que estava sendo molhado pelas minhas lágrimas que caíam em abundância, mas eu não dava a mínima importância. Jungkook me encarava com tanta dor e pesar nos olhos que eu senti vontade de morrer naquele momento, apenas por fazê-lo se sentir daquela forma.

— O que eu posso fazer por você? Eu faço qualquer coisa — Ele afirmou, tentando secar minhas lágrimas que continuavam a cair.

— Jimin, Hoseok e Taehyung chegaram — gritou minha mãe do primeiro andar.

Foi então que o meu maior sonho lampejou na minha mente, e eu percebi como eu deveria morrer. Segurei a mão de Jungkook, impedido-o de continuar a enxugar as minhas lágrimas, para lhe lançar um sorriso gentil e fraco.

— Eu tenho um pedido, vem comigo — falei, puxando-o até o andar de baixo e retomando a fala antes que qualquer um dos cinco abrissem as bocas. — Preciso falar com vocês, mas peço que me escutem e entedam tudo antes de qualquer coisa.

Soltei a mão de Jungkook e respirei fundo antes de começar a falar, era tão difícil para mim pedir, quanto seria para eles aceitarem.


XXX


A palavra idiota foi a primeira coisa que passou pela minha cabeça quando eu olhei para os meus pais, que haviam descido do carro de mãos dadas e se olhavam com lágrimas nos olhos.

Quando todos se sentaram no sofá para me escutar, eu tive que me esforçar bastante para fazê-los escutar tudo antes de um ataque de raiva. Os contei o meu maior sonho, assistir o nascer do sol em um lindo campo de girassóis e eu queria que aquilo se realizasse naquela noite.

Nenhum dos cinco concordaram, obviamente. Me amavam e sabiam que eu poderia morrer a qualquer momento, mas queriam que isso acontecesse o mais tarde possível, pois ainda tinham esperança de uma inexistente recuperação. Por isso, deixei bem claro que eu iria fazer aquilo sozinho então, mas ficaria muito mais feliz se estivesse com as pessoas que me amavam ao meu lado.

E lá estávamos nós, alguns minutos antes de começar o que eu estava tão ansioso para ver. O campo estava escuro e cheio das minhas flores mais amadas, mas no momento, a minha atenção era totalmente focada na minha família que estava em prantos.

Caminhei até meus pais e abracei cada um, para depois me separar e falar em alto e bom som:

— Perdão por ser alguém tão egoísta esses últimos dias, não pensando em seus sentimentos. Eu os amo mais do que a minha própria vida, e se eu estou aqui hoje em dia, devo tudo a vocês — falei, sentindo minhas lágrimas frias serem levadas pela brisa gelada da madrugada.

— Se você está aqui hoje, é porque lutou e mereceu — Minha mãe argumentou, me apertando mais uma vez em seus braços, por pouco não me soltando, mas eu realmente não queria que me soltasse. — Você sempre vai ser o meu pequeno bebê, que eu trouxe ao mundo e fui recompensada por um garoto tão lindo e responsável; você me da tanto orgulho e eu te amo, te amo mais do que tudo.

— Você é alguém que merece tudo o que conseguiu, meu filho, e eu não poderia estar mais orgulhoso de você. Muitas vezes eu me peguei pensando por qual motivo eu não brincava mais com você, não me aproximava mais de você ou conversava, sei que sentiu falta — Meu pai disse, tentando controlar as lágrimas que teimavam em sair. — Mas, saiba que era porque eu sabia que não estaria preparado para esse dia, eu não estou preparado para esse dia. Você sempre me dizia que eu era o seu herói favorito, mas eu te digo agora, você é o meu herói favorito! 

Sorri triste, para depois sentir o choro cortar a minha garganta e fazer o meu estômago se revirar. Meus ombros tremiam e eu me balançava minimamente, enquanto abraçava meus pais que estavam em uma situação pior.

Me separei deles alguns minutos depois, para olhar para os meus amigos que já estavam chorando. Hoseok soluçava tanto que se engasgou e foi preciso Jungkook lhe ajudar a voltar a respirar, já Taehyung estava com o rosto tão vermelho que eu faria uma piada de pimenta, caso as circunstâncias que estávamos fossem diferentes.

— Eu não consigo achar palavras o suficiente para dizer o quão eu sou grato por vocês ficarem ao meu lado, tentando levantar o meu astral todos os dias, mesmo vocês estando tão pra baixos quanto eu. Vocês são os meus melhores amigos para a vida inteira, e quando eu disse que os amaria até a última batida do meu coração, não estava mentindo — falei, vendo os dois chorarem muito mais. — Quero que saibam que não tiveram culpa de nada e que, eu amo vocês mais do que amo Grey's Anatomy.

— Você me fez entender porque eu deveria sorrir todos os dias, eu sabia que sorrisos salvam vidas e eu acredito que, salvou a sua por muito tempo. E s-se você é grato a q-qualquer coisa que fiz a você, eu não consigo dizer o quanto eu sou grato por você e-existir — Hoseok disse com a voz embargada, mordendo fortemente seu lábio inferior para não deixar mais um soluço escapar. — E mesmo que você não tenha visto o sol por mais de treze anos, você sempre foi a estrela mais brilhante e calorosa da minha vida.

— Você, Park Jimin, não tinha o direito de ter roubado o meu coração quando nasceu, não tinha mesmo. Também não tinha o direito de não ter me preparado para esse momento. Pode ser loucura, mas eu me esforçava todos os dias para tentar esquecer que sua doença existia apenas para fantasiar um futuro juntos, você se formando com louvor na faculdade e chamando nós para comemorarmos com um dia no shopping — Ele contou, me fazendo rir em meio ás lágrimas. — E eu nunca poderia imaginar que amaria tanto alguém como amei você. Sei que sou meio problemático e avoado, também sei que me coloquei em muitos padrões e vivi no mundo da minha imaginação para esconder a minha dor, mas eu não precisava fazer isso quando estava com você, Jimin. Porque você fazia eu me sentir bem comigo mesmo e eu sentia prazer em te ajudar e estar com você, porque eu te amo, amo mais do que tudo.

Sorri e puxei cada um dos dois para um abraço apertado, sussurando frases reconfortantes para eles antes de me afastar e andar até Jungkook, que parecia estar prestes a desabar. Antes mesmo de eu começar a falar, ele negou com a cabeça, afirmando que não se controlaria ao se despedir de mim, mas eu o ignorei.

— Você, garoto, me mostrou uma coisa tão mágica e única que eu nunca pensei que iria viver, você me proporcionou o amor e eu não tenho palavras pra te descrever o que é amar você, Jeon Jungkook. Mas eu sei que, amar você tem a ver com te encher de beijos depois de uma briga, porque você não aguenta ficar muito tempo sem estar junto a mim. Também sei que tem a ver com posar para suas fotos, porque senão, você me encheria de elogios até eu me irritar. E, eu também sei que tem a ver com ser eu mesmo, porque você me amou do meu jeitinho e sempre me respeitou assim. Eu sei, porque eu te amo demais — disse, depositado minha mão na bochecha dele, que soluçava descontroladamente. — Não quero que se culpe, pois você não tem culpa de nada além de roubar o meu coração, meu amor.

— E-eu nunca vou esquecer a sensação de te ter em meus braços Jimin, ou de finalmente perceber que te amava. Nem mesmo a sensação de te ver dançando naquela boate ou a sensação de ter o seu olhar para mim, quando espiava a minha queda da janela. Você me fez passar por momentos tão incríveis e especiais que eu poderia passar um dia inteiro apenas falando com você, não ligando para mais nada. E eu, posso sim descrever a sensação que é te amar, só não posso assegurar que todos vão entender. Te amar é como ter uma ferida aberta em seu corpo, é ardente e pode machucar, mas você sempre sabe que no final tudo vai se curar. Te amar é como passear nas nuvens, é tão macio e fofo que alguém pode querer fazer sentir aquela sensação por toda a vida. Te amar é como flutuar pelo mundo, você se sente tão leve e livre que quer repetir todos os dias, vira a sua coisa favorita. Te amar é como comer algo doce, é uma doçura sem tamanho e ninguém se sente saciado, podendo se viciar na experiência — explicou com metáforas, beijando as costas das minhas mãos. — Eu te amo, Jimin, te amo e sou grato por você me amar.

Eu lhe dei um beijo de despedida, um beijo ardente e ainda assim, doce. Um beijo que doía e ainda assim, curava e preenchia o vazio que estávamos sentindo. Um beijo cheio de fofura e leveza, permitindo que uma sensação de paz se instalasse no coração dele. Um beijo tão doce e viciante, que me fez querer desistir de tudo para continuar ali, mas não foi isso que eu fiz.

Quando a luz do sol começou a iluminar lentamente o campo, eu olhei uma última vez para as pessoas que eu mais amava na vida e caminhei para dentro daquela beldade feita pelo universo. As flores tocavam o meu corpo e eu sentia vontade de levá-las comigo para onde quer que eu fosse depois.

Mas, tudo realmente parou de ter tanta importância quando o sol iluminou tudo ao meu redor, inclusive a mim. Fazia tanto tempo que eu havia sentido aquilo, que foi uma novidade assustadora e emocionante. Senti todo o meu corpo esquentar de uma forma boa, enquanto o sol ilumiava cada pedaço descoberto do meu corpo. Sorri alegremente, dando um grito que para mim, simbolizou a liberdade.

Antes, eu mesmo não entendia o que era o normal. Porque o normal pode ser uma das coisas mais relativas que existem e, infelizmente, eu só fui perceber isso quando detectaram mais quantidade de luz solar no meu corpo do que eu poderia aguentar. Mas agora, eu entendia o que o normal significava.

Ele significava nada para alguns e tudo para outros. Ele era algo que todos tinham de diferente, mas que sempre andava confundido suas cabeças. Para minha mãe, era trabalhar vinte horas por dia; para meu pai, era solucionar casos que muitos consideravam insolucionáveis; para Hoseok, era sorrir para qualquer pessoa que visse atravessando seu caminho; para Taehyung, era imaginar mil e uma fantasias engraçadas de sua vida; para Jungkook, era viver um dia de cada vez; e para mim, era poder obsevar a forma como o sol nascia em um campo lindo de girassóis.


Notas Finais


Depois de trinta anos escrevendo, eu finalmente terminei essa fanfic. Ela foi muito maior do que eu esperei, então... é nós. Se tiver algum erro, ignorem, eu acabei revisando e postando na pressa.
Quero agradecer a @Twilight-Park pela paciência e pela capa maravilhosa, eu amei demais e obrigada pelo trabalho duro.


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