-Dina? Estou em casa...
O chão de madeira velho rangeu quando o alpendre foi pisado naquela tarde de outono. Nada se mexia. A erva seca no quinta estava alta e abanava lentamente com a brisa suave. As folhas castanhas, amarelas e vermelhas cobriam todo o terreno ao lado do antigo corral de ovelhas, que naquele momento, apenas abrigava fardos de feno velho.
Havia pó pelo chão, pelas mesas, cómodas e escadaria. Uma casa que outrora abrigou sorrisos, beijos e abraços, agora estava vazia e melancólica. Uma casa tinha o papel como todas as casas: abrigar uma família feliz. Naquele momento, já não tinha nada. As paredes brancas eram tristes e tudo estava apodrecendo gradualmente.
Ellie a garota imune que perdeu tudo. O seu pai adotivo, a sua namorada e o seu pequeno filho adotivo a quem via como um irmão mais novo, estava sentada numa dessas cadeiras com pó, num desses quartos abraçados pela solidão. Ela acariciava os seus cotos da mão. Tinham sido arrancados pela mandíbula forte e feroz de Abby na luta final entre as duas. O talento de tocar violão, agora não passava de um sonho.
Na verdade, agora tudo não passava de um sonho...
Ellie sabia que tinha feito merda, sabia que tantas vezes Dina lhe havia pedido para ficar. Foi injusta com a pessoa que mais a amava e lhe deu apoio...foi injusta com o pequeno menino, a quem um dia jurou educar e proteger de todos os perigos do mundo.
E porquê? Porque tinha sede de vingança. Uma sede que não conseguia saciar por nada. O sangue fervia sempre que lembrava o rosto daquela que massacrou a sua vida....porém, Abby também a perdoou e a luta terminou sem mais mortes. Todavia tarde demais.
Não foi por falta de aviso, e agora, Ellie tinha alcançado aquele que um dia era o seu maior medo: ficar sozinha...
Um suspiro ecoou entre as paredes do velho quarto. Quarto que possuia lembranças. Pinturas e desenhos por todo o lado feitas com grande amor, não eram mais que memórias dolorosas no seu olhar e no seu coração.
Não havia mais nada a fazer senão levantar e seguir em frente, mas não era isso que Ellie queria. Na verdade, ela não queria mais nada. Ela não tinha mais um caminho por onde seguir.
Sabia que tinha feito merda da grande, e o seu coração já não indicava nenhum ponto cardeal na rosa dos ventos. As únicas forças que lhe restavam eram aquelas que fizeram com que ela se levantasse daquela cadeira e saísse da casa velha. E foi isso que aconteceu....
Ellie desceu as escadas lentamente, deslizando a mão pelo corrimão empoeirado, como se essa poeira trouxesse os últimos raios de luz à sua lembrança. Os raios de luz que um dia Dina lhe proporcionou. Afinal, a morena era sem dúvida o sol no meio de tanta escuridão. O sol que Ellie desperdiçou ...
Foi aí que a última lágrima escorreu pelo rosto sardento triste e sozinho. Ellie saiu pela porta e sentiu a brisa de outono secar essa mesma lágrima. Fechou levemente os olhos e soltou um suspiro profundo. Seria a última vez que respiraria o ar daquele campo e daquela casa. Tinha de encontrar um caminho, fosse ele qual fosse.
Decidiu partir...não para Jackson. Não queria rever Tommy ou outro alguém que lhe pudesse trazer lembranças. Também não queria voltar a ver Dina. Em primeiro lugar, sabia que nao merecia. Já a tinha magoado muito e talvez neste momento, ela já tivesse encontrado alguém melhor e a quem JJ pudesse de chamar pai/mãe.
Vestiu o casaco e carregou o violão nas costas. Não o iria deixar por muito que trouxesse recordações de Joel e dos poucos mas felizes dias que passaram juntos. Era um objeto importante e que aquecia o coração gelado de Ellie por muito que ela se recusasse a aceitar.
As horas foram passando e ela continuou a caminhar e caminhar. Os passos iam ficando mais lentos por causa da fraqueza. Já não comia há algumas horas e isso estava a deixá-la louca. Com a respiração ofegante, apenas conseguiu abrigar a sua cabeça e o resto do seu corpo de baixo de uma barraca abandonada que ali tinha no meio da floresta.
O apocalipse não tinha terminado...havia infectados, mas mesmo sabendo isso ela não quis saber. Estava tão perdida em si mesma e no mundo que mesmo que um monstro lhe aparecesse, mão saberia se conseguiria reagir.
A visão começou a ficar turva devido à fome e ao cansaço. As pálpebras estavam pesadas. Ela ainda estava exausta depois da perseguição de Abby e da luta final com ela. Sempre seriam rivais...mas não era nada disso que preocupava Ellie naquele momento. Queria esquecer tudo para trás e se algum dia voltasse a ver Dina ou outro qualquer, era culpa de Deus (na sua cabeça, ela pensava assim).
Encostou a cabeça a uma lateral da barraca e tentou acalmar a respiração. Talvez fosse melhor dormir até amanhecer de novo. Era perigoso andar de noite numa floresta densa, ainda por cima cansada daquela maneira e com fome.
Foi aí, que ao erguer o olhar para um local aleatório, conseguiu ver uma pequena luz.
-Nao me digam que é o anjo da morte - Ellie sussurou para si mesma num riso irónico - boa, agora estou a falar sozinha e a ver coisas. São os primeiros sinais de loucura...
Mas aquela luz era intensa demais para ser uma fantasia. Num impulso involuntário, Ellie levantou se e decidiu se aproximar. Com a visãk turva daquela maneira, não dava para ver nada de longe.
Caminhou e semicerrou os olhos tentando desvendar o que era aquele feche de luz amarela. Foi então que viu um pequeno vilarejo bem na sua frente. Seria Jackson? Não, era impossivel. Ela sabia que Jackson ficava do lado oposto. Por muito que estivesse cansada, ainda não tinha perdido o sentido de orientação. Era uma patrulheira profissional, não tinha como isso acontecer.
Aquela luz nao era do vilarejo em totalidade, mas sim de uma mansão. Ela olhou de cima a baixo e abriu o olhar.
Era uma casa grande com dois andares e imensas janelas onde todas elas iluminavam um pouco da paisagem. Não tinha portões mas sim um jardim grande com estátuas de mulheres nuas. Ellie não fazia ideia de que ali havia um vilarejo.
-Devem ser construções antigas...têm coragem de construir algo tão desprotegido no meio da floresta....burros de merda...- ela sussurrou ao se aproximar da casa - talvez sejam otários bons. Quer dizer, é melhor não me iludir já....
A fome de Ellie não deixava que ela pensasse de outra forma. Se pelo menos aqueles ricos tivessem compaixão de uma pobre jovem esfomeada e cansada, dariam com certeza alguma comida e uma cama para ela passar a noite...
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