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História Incógnito VKook - Taekook - Um boato


Escrita por: BtsNoona

Notas do Autor


Olá leitores-amores <3 Vocês não fazem ideia de como eu estava MORRENDO de saudades suas! E de escrever, e dos meus personagens, e de taekook e de tudo... Enfim, foram meses malucos e - pra quem ainda não sabe porque eu desapareci do nada - vou explicar melhor nas notas finais.
Imagino que agora vocês queiram ler logo o capítulo! Deem play na playlist de Incógnito do Spotify (link nas notas finais) e espero que gostem!

Boa leitura!

Capítulo 26 - Um boato


Fanfic / Fanfiction Incógnito VKook - Taekook - Um boato

Um boato.

Jeongguk nunca tinha parado para refletir muito sobre eles, mas seguia o senso comum de qualquer adolescente: sabia que boatos e verdades nem sempre eram sinônimos. Sabia que espalhavam-se como um vírus pelos corredores do colégio, infectando a qualquer um que lhe cruzasse o caminho, contaminando o ar estudantil em sussurros carregados pela brisa. Boatos como “Han Hyeyeon gosta de garotas” talvez não passassem de burburinhos fúteis pelos corredores da escola, ninguém nunca teria certeza. Jeongguk sabia que boatos podiam espalhar coisas boas ou más. Que podiam ser inventados ou reais. Que podiam machucar – tudo isso Jeongguk já sabia.

Mas não sabia lidar com boatos sobre si, porque nunca estivera envolvido em nenhum antes. Não sabia se o melhor era esclarecer o mal entendido ou ignorar o problema e deixar a verdade para sempre nas sombras.

Teria que descobrir por conta própria, e rápido.

Pois ao chegar no colégio na terça-feira de manhã, ninguém falava em outra coisa.

“Jeongguk e Taehyung se beijaram”

 

Com todos os olhares da sala direcionados para si, sentiu-se pequeno, como naquele sonho antigo em que não conseguia resolver o problema de matemática, e todos riam, com os dedos apontados para o seu rosto e os olhos cheios de malícia. Agora, na vida real, era ainda mais desesperador. O coração angustiado espremeu-se no peito, e Jeongguk sentiu como se tivessem lhe jogado trinta quilos nas costas. Pior do que no sonho, dessa vez sabia que não estava sozinho. O boato era sobre Taehyung também – Taehyung, que havia chorado quando seu poema foi exposto no quadro negro da classe, que já tinha que lidar com implicâncias demais. O medo e a angústia rapidamente se transformaram em raiva.

Merda, quem teria espalhado isso?

E é claro que uma resposta óbvia se formou na mente aturdida: o alma ruim, só podia ser. E essa era sua vingança pelo confronto do dia anterior. Jeongguk bateu com a testa contra a superfície fria da carteira. Como sempre, eu piorei tudo.

Sentiu o celular vibrar no bolso.

Park Jimin:

Você está encrencado, Guk

Geunsuk está dizendo aos quatro ventos que viu vocês dois se beijando

Mas ele não poderia ter visto

Poderia?

Teve que fazer a pergunta a si mesmo, mas era difícil pensar claramente com o estômago revirando dentro de si, o coração agitado lhe batendo na garganta e o sangue quente e raivoso lhe correndo as veias. Mas talvez, sim. Não era impossível.

No dia anterior, havia roubado um beijo de Taehyung na estátua da Virgem Maria. Poderia ser isso? Achava improvável que o alma ruim os tivesse visto debaixo da arquibancada carcomida, enquanto estavam escondidos atrás da cortina da chuva. Não havia motivos para ele estar andando por lá. A não ser que estivesse os seguindo.

Espremeu os olhos ao pensar na possibilidade. A voz do professor não passava de murmúrios sem significado, um som irritante que o oprimia ainda mais. De repente, sua cabeça começou a doer, a latejar feito o diabo e Jeongguk desejou poder dormir e só acordar quando tudo acabasse.

Foi um alívio sair da sala de aula e ir até o corredor no primeiro intervalo, para pegar um livro no armário. O ar parecia menos sufocante do lado de fora, já que dentro da sala os olhares dos outros alunos lhe queimavam as costas, e os cochichos maldosos incomodavam seus ouvidos. Mas assim que Jeongguk fechou a porta metálica de seu armário com um som agudo e irritante, encontrou Cheon Songyi bem ao seu lado, com o ombro displicentemente apoiado em um dos escaninhos em sua típica pose enfadada de braços cruzados.

- Você sabe o que estão falando.

- Eu sei. – Respondeu, impaciente. Por enquanto, o melhor plano parecia ser parar de pensar nisso e esperar que passasse.

- Você provocou isso, Jeongguk. – Songyi sussurrou, a língua arisca. – Passou o mês inteiro andando feito segurança atrás desse garoto, e olha só onde foi se meter.

Expira. Inspira. Calma.

Se concentrou para manter o tom de voz leve e desinteressado.

- Eu não me lembro de ter pedido sua opinião.

- Pelo que eu ouvi, esse Taehyung já tinha fama de ser meio viado.

Jeongguk fechou os punhos ao lado do corpo, refreando a vontade de dar um soco no armário e chamar ainda mais atenção. Precisava se controlar. Cada movimento poderia ser jogado contra si, e as pessoas estavam observando, atentas.

Encarou Songyi, cujos olhos arregalados demonstravam surpresa, preocupação e interesse. Um segundo depois e ela recuperou sua armadura de mau humor, e seu rosto retornou à costumeira expressão aborrecida.

- Ei, calma lá! Eu só estou preocupada com a sua imagem. E também, não quero as pessoas achando que eu vou com um cara gay pro baile de formatura.

Minha imagem?

Aquilo pareceu fútil e sem sentido. O que importava não era a sua imagem, mas o julgamento estúpido que teria de enfrentar. Se tivesse uma imagem péssima, mas fosse deixado em paz, então pouco importava. O que machucava eram os olhos curiosos, os cochichos maldosos pelas costas, a opinião inútil de gente que não devia estar se metendo na sua vida.

E, nesse momento, parando para refletir sobre boatos pela primeira vez, Jeongguk chegou à conclusão de que pouco importava se era mentira ou verdade: de ambos os jeitos, seria igualmente prejudicial. Sabia o que estava dentro de si, e isso bastava. Havia beijado Taehyung, sendo  boato ou não. E – num acesso de raiva e loucura – Jeongguk puxou a amiga pelo pulso, sem se importar se era a maior fofoqueira, ou se o acharia um ser repugnante, ou se perderia sua amizade para sempre.

Precisava tirar isso do peito.

- É verdade, Songyi. O que dizem. – Sussurrou na orelha pequena. – Se Baek viu ou não, eu não sei. Mas eu beijei Taehyung, e não me arrependo. – Afastou o rosto, observando a reação de sua amiga, com os olhos arregalados, alheios e vazios, petrificada de horror. – Então, me desculpe se atrapalhei seus planos para o baile perfeito, mas eu tenho coisas mais importantes pra me preocupar do que a droga da minha imagem, ok? Se estiver insatisfeita, arrume outro par.

Jeongguk virou as costas e caminhou de volta à sala de aula sem esperar resposta. Sentia a adrenalina correr por todo o corpo, o nervosismo por confidenciar seu segredo, medo por expor Taehyung dessa forma – e ira, pura e simples.

Ao entrar, todos os olhos se voltaram para si, outra vez. Que droga. Então assim que o colégio seria a partir de agora? Não mais os olhares de admiração dos outros alunos, os olhares a que já havia se acostumado, que o deixavam vaidoso. Por isso Taehyung vestiu por tanto tempo aquela capa de invisibilidade fantástica. Por isso se camuflava entre os alunos, e passou despercebido por todo esse tempo. Porque, entre os alunos do ensino médio, ser um ninguém era mais seguro.

Respira, Jeongguk. Você não está sozinho, repetia a si mesmo.

Mas sentia-se completamente só.

 

No intervalo, caminhou diretamente até a estátua da Virgem Maria, sem olhar para trás. Só queria se isolar do resto do mundo, buscar alívio nos olhos de Taehyung, na paz aconchegante que ele transmitia. Buscaria nele as forças para seguir com sua rotina, como se aquilo não estivesse acontecendo.

Mesmo sabendo que, naquele exato momento, o beijo que havia trocado com outro garoto era o tema das conversas no refeitório.

Caminhou tranquilo, aproveitando o ar livre para colocar a cabeça em ordem. O medo, a angústia e a raiva, misturados em altas doses, só serviriam para que acabasse fazendo outra bobagem como a do dia anterior. Não, o boato e a advertência já haviam sido castigo suficiente. Não podia correr o risco de surtar na frente de todos, como havia feito mais cedo com Songyi. Ela podia ser fofoqueira e fútil, mas era sua amiga, ainda de agisse de forma rude e ranzinza a maior parte do tempo. Songyi se preocupava consigo, tinha certeza. Esperava que não contasse a ninguém.

Ao se aproximar da conhecida imagem da Virgem, Jeongguk não avisou as três figuras de costume. Reconheceu apenas Han Hyeyeon, com seu corte de cabelo masculino e a câmera fotográfica em mãos, apontando sua lente para o céu azul e suas nuvens brancas e fofas.

- Ei! – Chamou-lhe a atenção.

- Jeongguk! – Hyeyeon virou o rosto imediatamente, como se estivesse surpresa por vê-lo. – Aigoo, sua cara não está muito boa.

- Você já deve imaginar o motivo… – Deu de ombros, tentando esconder o quanto foi afetado. Então, sentou-se ao lado da garota, sobre o cimento gelado. – Onde estão Liz e Taehyung?

Tentou não deixar transparecer sua preocupação, mas talvez não tenha sido muito convincente.

- Ah, não esquenta. Algum professor babaca deve ter segurado eles uns minutinhos, daqui a pouco aparecem… – Disse, num tom casual, que foi capaz de tranquiliza-lo. Jeongguk sabia que, se Taehyung estivesse correndo perigo, Hyeyeon seria a primeira ao resgate. Ela encarou-o com os olhos negros e brilhantes, um sorriso reconfortante nos lábios. – Mas e aí, me conta. Como é que você tá? Não deve estar sendo fácil pra você.

Han Hyeyeon falava assim, sem pudores, sobre o assunto que Jeongguk mais gostaria de evitar. Apesar do tema delicado, seu tom era – como sempre – descontraído e despreocupado. Ao contrário do que pensava, a menção ao boato não o incomodou. Jeongguk soltou o peso dos ombros, a cabeça pendendo para baixo.

Na verdade, estava aliviado em poder conversar tranquilamente sobre aquilo com alguém.

- Estressado. Com medo, com raiva. – Bufou, levantando o olhar para a garota. – Com vontade de jogar a merda toda no ventilador.

Hyeyeon soltou uma risada.

- Eu imagino. Mas se acalma, cara. Deixe que esses imbecis tenham o benefício da dúvida, ninguém tem nada a ver com a sua vida. Eu já passei por isso antes. Tenho certeza que você sabe o que dizem de mim

Han Hyeyeon gosta de garotas.

- Como você consegue aturar essa merda? – Perguntou, sincero. Conversar com Hyeyeon era fácil, mesmo que achasse esse assunto pessoal demais para interferir. Afinal, não eram assim tão próximos ainda.

Mas o semblante dela era tranquilo, receptivo. Passava-lhe segurança.

- Náh, eu me acostumei com o tempo, já nem me importo mais. Percebi que era inútil me importar.  Não tenho vergonha de quem eu sou, mas a verdade só importa pra mim, e pra quem eu quiser. O resto, que pense qualquer merda. – Ela hesitou por um segundo, os olhos escuros e simpáticos grudados em Jeongguk. Um sorriso carinhoso lhe surgiu nos lábios femininos. – É verdade, aliás. Eu gosto de garotas.

Sabia que Hyeyeon era sincera, mas não esperava que pudesse ser tão direta sobre um assunto assim. Com a surpresa de sua revelação, o rosto de Jeongguk tomou uma expressão de espanto, sem permissão. Não queria fazer aquela cara, a mesma cara que vira Songyi fazer apenas algumas horas antes, de horror perante a uma informação chocante, mas não pôde evitar. Também, não soube o que dizer e ficou mudo.

Entretanto, Han Hyeyeon pareceu não se afetar, e seu sorriso carinhoso se espalhou pelo rosto, como se achasse graça daquela reação.

- E você gosta do Taehyung.

Realmente, essa garota não tinha freios na língua.

- A-ah, eu… – Gaguejou debilmente, sentindo o rosto esquentar-se de vergonha. Tinha certeza de que estava vermelho. Sentia o estômago revirar-se, seu segredo cada vez mais exposto. Entretanto, corado e pego sem aviso pela garota, seria impossível negar. Devia estar estampado na sua cara. – Você sabia?

Hyeyeon sorriu e afirmou com a cabeça levemente, como uma mãe compreensiva.

- Dá pra perceber. Você fica o tempo todo fazendo gracinhas pra ele rir. – Disse, fazendo com que Jeongguk escondesse o rosto de tanta vergonha. – Relaxa, eu não vou sair contando por aí. Não é nada demais.

Nada demais?

- Você faz parecer simples. – Respondeu, sem ter coragem de olhar para ela.

- Mas é simples. Olha, tem gosto pra tudo nesse mundo. Eu gosto de fotografia, você gosta de lutar e o Tae ama aqueles livros velhos, sabe-se lá por quê… é a mesma coisa. As pessoas podem não entender, mas a gente não é anormal nem nada disso.

- É como gostar de fotografia ou de lutas? – Jeongguk repetiu, irônico. Aquela comparação era muito fantasiosa. – Fácil, assim?

Por que pra mim parece tão difícil?

Hyeyeon deu uma risada espontânea e juvenil.

- Fácil não é… é uma merda. Eu tive que escutar todo tipo de lixo, e chorava todos os dias. Me senti uma aberração da natureza, e pensei que nunca ia me encaixar em lugar nenhum. – Jeongguk levantou o rosto, encarando-a outra vez, ainda que suas bochechas continuassem a queimar de vergonha. Por um instante, os olhos alegres de Hyeyeon foram tomados por uma sombra escura, que se foi tão rápido quanto surgiu e ela continuou a falar, em seu tom descontraído. – No primeiro ano eu era da sala do Tae, e a gente andava ainda mais grudados do que hoje. Em agosto, uma garota nova entrou na nossa turma, e eu sempre fui assim, de fazer amizade logo… em poucos dias ela grudou na gente, e era simpática, bonita e divertida. Foi inevitável começar a gostar dela. E eu gostava muito, nossa... pra caramba! Nunca tinha gostado assim de alguém, e fiquei com medo. Mesmo insegura, eu continuei a me aproximar, sem pensar muito. Ela não dizia nada, sabe? Ela só me deixava, e eu pensei que pudesse gostar de mim também. Até que um dia eu não aguentei mais e acabei me confessando.

- E ela? – Jeongguk perguntou, sem conseguir conter a curiosidade.

- Ela só se aproximou de mim porque estava interessada no Tae.

- Ah…

- Náh, tudo bem. Eu devia ter sido menos iludida. Acho que ela deve ter contado pra umas pessoas, e esse boato começou a me atazanar depois disso. Passei uns meses sofrendo pra caramba, e depois resolvi mandar tudo à merda. Eu pensei: já que vão continuar falando de mim, que pelo menos eu possa fazer o que eu quiser da minha vida. Aí, cortei o cabelo. No segundo ano eu parei de usar as malditas saias do colégio, e foi a melhor coisa que já fiz. Eu sempre detestei saias!

Não soube o que dizer. Inevitavelmente, pensou que a situação de Hyeyeon havia sido muito pior que a sua. Não conseguia imaginar qual teria sido sua reação se Taehyung negasse seus sentimentos naquela noite, no terraço. Não fazia ideia de como ia se sentir ao ser rejeitado e, pior ainda, saber que a pessoa que você gosta foi responsável por espalhar os boatos maldosos.

Click.

Ouviu Hyeyeon bater uma foto, e foi bruscamente retirado de seus devaneios. Olhou para ela, o rosto parcialmente escondido atrás da câmera enorme, a lente apontada para si. Quando abaixou o aparelho, ainda sorria. Não tinha mágoas.

- Fica tranquilo, Jeongguk, não adianta se descabelar. – Hyeyeon deu-lhe tapinhas nas costas. – Nós somos um bando de esquisitos.

Ao longe, Jeongguk enxergou duas figuras se aproximando. Céus, eles tinham demorado. Havia ficado tão distraído com a história de Hyeyeon que não viu o tempo passar.

Mas lhe fez bem. Quando Taehyung os alcançou, já não sentia mais medo, ou angústia, ou raiva. Sentia-se ainda injustiçado, é verdade, mas pensou que não estava tão no fundo do poço quanto tinha imaginado ao chegar no colégio aquela manhã. Parou um segundo para observá-lo mais uma vez – Taehyung de pé, alto, aquele garoto que lhe despertara tantos sentimentos desconhecidos. Usava os tênis brancos. Os olhos dele se arregalaram ao encontrar os seus, hesitantes, mas tão hipnóticos como de costume. Apesar de ainda ter as bochechas vermelhas, Jeongguk sustentou seu olhar por uns segundos e abriu um sorriso. Viu a expressão dele se suavizar no mesmo instante.

- Você veio. – Taehyung disse, como naquela primeira vez em que haviam marcado de se encontrar, como se esperasse que Jeongguk pudesse evaporar a qualquer momento.

Mas não iria a lugar nenhum.

- Por que não viria?

Logo antes de sentar ao seu lado, o incógnito abriu um sorriso que transmitia, acima de qualquer outra coisa, alívio. Pelo canto do olho, Jeongguk pôde ver a garota de cabelos curtos e escuros o espiando, com um olhar cúmplice e um sorriso contente nos lábios.

Tiraria algo bom daquela situação de merda, por pior que parecesse. Hyeyeon ganhou a coragem para se livrar do cabelo longo e das saias. Jeongguk ganhou Taehyung.

~x~

A segunda metade do dia passou de forma bem mais suportável que a primeira. Não podia negar: os olhares incomodavam, muito, mas pelo menos ninguém teve coragem de lhe perguntar nada – além de Songyi. A ruiva, aliás, continuou a assistir a aula normalmente, como se nem se conhecessem. Jeongguk esperava que ela só precisasse de tempo para digerir a informação, mas pensou que, talvez, tivesse mesmo perdido sua amiga.

Já era costume ver Taehyung o esperando no fim do corredor, para irem juntos ao ponto de ônibus. Jeongguk gostava de ficar lá, sentado ao seu lado, fazendo-lhe companhia até que o transporte chegasse.

Entretanto, neste dia Taehyung não estava lá. Ao invés disso, ele enviou uma mensagem.

Taehyung hyung:

Acho melhor você não me levar no ponto mais

Não é que eu não queira! Mas pelo menos até a poeira baixar…

Você entende, né?

Entendia, apesar de não estar particularmente feliz. Além de um poema para lidar, agora Taehyung também tinha o boato de um beijo. Ao contrário de si, que só precisava aturar as fofocas e olhares pelas costas, Jeongguk tinha certeza que ele precisava ouvir provocações, e sentiu um enjoo no estômago.

Não podia protegê-lo. Não podia fazer nada. Da última vez, só servira pra arranjar problemas, e sua promessa de cuidar dele fora outra vez em vão. Agora, a melhor forma de cuidar de Taehyung era se manter distante.

“Tudo bem, hyung… eu entendo”, respondeu.

E, conformado, Jeongguk foi direto para casa.

 

Tinha suas próprias questões para resolver. Ainda que a conversa com Hyeyeon tenha o dado esperanças de que não era o fim do mundo, Jeongguk carregava a advertência pelo seu confronto com Baek Geunsuk no dia anterior dentro da mochila. Precisava aproveitar durante a tarde, enquanto seu pai não estava em casa, e convencer sua mãe a não delatá-lo.

Mentalmente exausto, jogou a mochila em cima da cama e retirou o papel da orientadora, já meio amassado. Desceu os degraus até a cozinha, sabendo que o melhor a fazer era resolver isso logo ao invés de ficar empurrando com a barriga. Com o rabo entre as pernas, calado, entregou o bilhete à mãe.

Imponente, Jeon Soomin fechou a cara numa expressão dura. Alternava os olhos diversas vezes, entre o filho e o papel, cumprindo seu dever de mãe.

- Eu posso saber o que significa isso? – Perguntou, seca, e Jeongguk pensou que nessas horas todas as mães do mundo são mesmo bem parecidas.

- É uma advertência. Você tem que assinar. – Fez-se de desentendido e viu o rosto da sua mãe ficar ainda mais severo. Merda, estava ferrado. Só lhe restava implorar. – Por favor, não conta pro meu pai… eu não fiz nada de errado, eu juro, e você sabe muito bem como ele vai reagir. Ele não vai me escutar! Foi uma injustiça!

Ela jogou o papel em cima da mesa de granito, sem sua assinatura.

- Mas eu sou toda ouvidos. – Cruzou os braços, impaciente. – Anda, desembucha.

Jeongguk bufou, incomodado. Nos últimos dias, andava expondo sua vida pessoal demais pro próprio gosto. Tentou contornar a situação, como havia feito com a orientadora.

- Estavam implicando com meu amigo e eu fiquei bravo. Mãe, por favor, eu tô dizendo que não foi nada. Só assina e tá resolvido.

- É uma pena que você mal tenha acabado de se livrar de um castigo e já fez questão de se arranjar outro!

- Não! – Retrucou, indignado. Não podia ficar de castigo outra vez! Agora era ainda pior, já que precisaria tomar cuidado no colégio, e já não podia ficar tão próximo de Taehyung. Se ficasse de castigo de novo, preso durante as tardes e o fim de semana, aí quando poderia passar tempo com ele? Não, não. Ficar de castigo não era uma opção. Preferia levar uma das broncas severas de seu pai e acabar logo com aquilo do que ficar em casa por mais uma semana. – Por favor, mãe…

- Então conta direito, peste! Estou esperando.

Jeongguk engoliu em seco. Ela não deixou escapatória. Sua mãe era muito curiosa e enxerida, e dessa vez teria que ceder aos seus caprichos.

- Tudo bem, olha… foi o Taehyung. Tem um cara na sala dele que é o maior bastardo e imbecil que já pisou na face terrestre, e que vive enchendo a droga do saco dele. E ele fica aturando esse babaca todos os dias, sem reagir. Na semana passada o idiota leu uma coisa no caderno do Tae, sem ele saber, e espalhou pra escola toda. Aí ontem esse cara foi provocar ele na minha frente, disse um bando de coisas horríveis, e você sabe como eu posso ser meio esquentado às vezes… mas eu te juro que não encostei um dedo sequer nele. É só que me irrita ver ele fazendo meu amigo de palhaço enquanto a sala inteira ri dele. Eu não pensei, eu… só fiz o que achava certo.

- Tá bem! Nossa, eu ouvi mais a sua voz no último minuto do que no mês inteiro. – Ela suspirou e sorriu. Então, curvou-se sobre o papel na mesa e o assinou. – Eu fico feliz que você queira ajudar seus amigos, mas trate de não trazer mais advertências pra casa.

Jeongguk confirmou, movendo a cabeça.

- Você promete que não vai me delatar?

Viu um sorriso arisco surgir nos lábios de sua mãe, um desses sorrisos traiçoeiros que conhecia tão bem.

- Com uma condição. – Ela disse, os olhos brilhando de curiosidade. – O que era? Que estava escrito no caderno de Taehyung?

- Um poema. – Disse, baixo, e sentiu suas bochechas corando ao se lembrar das palavras bonitas de Taehyung. – Ele escreve poemas.

Jeongguk pegou a advertência da mesa, querendo sair logo dali, sabendo que estava caindo em uma das armadilhas de sua mãe. Ouviu-a dar uma risada divertida.

- Ah… e era bom?

- O melhor que eu já li – Respondeu sem pensar, um segundo antes de virar as costas e voltar à segurança do seu quarto trancado.

Que merda você pensa que está fazendo?

Estava sendo óbvio até em frente à própria mãe, e não era de se admirar que Hyeyeon tivesse percebido logo. E se ela sabia, Liz Lutterback com certeza sabia também. E Songyi sabia. Jimin sabia.

Baek Geunsuk sabia – ou pelo menos, fingia que sim.

Jogou-se no colchão, confuso e impotente. As coisas haviam saído completamente de seu controle.

 

No dia seguinte, os olhares e comentários dos colegas já machucavam menos que no dia anterior. Jeongguk sabia, graças à sua conversa com Han Hyeyeon, que seria sempre assim: dia após dia, o incômodo diminuiria. Até que, um dia, não se incomodaria mais. Deixaria de se importar, como ela.

Só esperava que fosse rápido.

Songyi continuava a evitá-lo e, mesmo que não pensasse muito sobre o assunto, aquilo magoou Jeongguk. Estava envergonhado demais para ir atrás dela, apesar de ter sido rude em sua última conversa e ter vontade de se desculpar. Mas não aguentaria ver aquela expressão no rosto da amiga outra vez, a pele pálida, os olhos arregalados e vazios, os lábios pequenos entreabertos – com medo e horror. Não queria ver isso.

Ao invés de ir direto para a estátua da Virgem Maria no intervalo, Jeongguk resolveu passar de uma vez na secretaria e entregar a advertência assinada, antes que se esquecesse. Atravessou correndo o pátio coberto, determinado a terminar logo aquela tarefa enfadonha e encontrar-se com Taehyung, mas assim que alcançou a porta de madeira e a abriu, precisou parar. De lado, com os cotovelos apoiados na escrivaninha da secretária, estavam não apenas um maldito Baek – mas dois.

O Baek mau, e o Baek bom. Geunsuk e Geunwon.

À primeira vista eram tão idênticos que Jeongguk pensou que, graças à raiva, estava enxergando o alma ruim em dobro. Mas, apenas alguns segundos depois, pareciam duas pessoas completamente diferentes. O olhar de Geunwon era medroso, enquanto o de Geunsuk era entretido. No lugar do sorriso traiçoeiro de Geunsuk, Geunwon mantinha os lábios crispados. O gêmeo nerd devia ser um ou dois centímetros mais alto que o irmão, mas não se notava – ele andava o tempo todo curvado, com os ombros espremidos. Também, parecia um pouco mais magro que o alma ruim, que andava sempre com o peito estufado até demais.

- Olha lá, Won, quem está aqui! – Geunsuk disse, cutucando o irmão com o cotovelo. – O da luta. Você já conhece? Ele e o Taehyung são bem próximos.

Mesmo na frente da secretária, ao lado da sala da diretora, o alma ruim não hesitou antes de derramar seu veneno através palavras. Jeongguk não estava nem um pouco surpreso pela rebeldia.

- Já fomos apresentados. – Jeongguk respondeu, olhando diretamente para Geunwon, que desviou o rosto para a secretária outra vez.

- Claro, imaginei que sim. Quem no colégio não sabe sobre Jeon Jeongguk? Todos só falam de você esses dias...

Mordeu com força, apertando o maxilar e rangendo os dentes. Não podia cair de novo nas artimanhas tolas daquele problemático. Ignorando o último comentário, Jeongguk forçou-se até a mesa da secretária, ficando bem ao lado do alma ruim. A mulher magra de meia idade e cabelos presos o olhou com tédio, esperando que dissesse o que precisava.

- Gostaria de falar com a orientadora Jang.

A secretária afirmou com a cabeça e colocou o telefone no ouvido.

- Olha lá, hein Romeu? – Ouviu Geunsuk sibilar, baixinho, bem perto de sua orelha. – Se comporte direitinho. Eu ainda tenho algumas cartas na manga.

Ele acha que eu estou indo delatar o que ele fez. Que imbecil egocêntrico.

- Nem tudo é sobre você, Baek. – Respondeu simplesmente, numa voz seca e neutra. Não se permitiria ficar com raiva outra vez.

Baek Geunsuk soltou uma risada de deboche.

- Jeon Jeongguk? – Ouviu a voz familiar da orientadora, e viu que ela o esperava com a porta aberta. – Pode entrar.

 

Sua intenção era clara e simples: entrar, deixar o papel, agradecer e ir embora. Mas é claro que a orientadora Jang Hwayung não tinha as mesmas intenções. Ela abriu outro sorriso quente e reconfortante, como da primeira vez em que estivera lá, e disse numa voz suave e macia:

- Sente-se.

- Não vai precisar. – Jeongguk respondeu, decidido, e deixou o papel em cima da mesa de carvalho. – Está aí o que pediu.

- Senhor Jeon. – Ela o olhou, firme, e perdeu o sorriso. – Sente-se.

Não teve outra opção senão sentar, mas não tentou disfarçar sua impaciência.

- Eu vou perder todo o meu tempo de intervalo. Ainda não comi.

- Queria mesmo te ver. – Ela ignorou a reclamação, e um sorriso voltou a lhe surgir no rosto. – Pode parecer que não, mas os professores também ficam sabendo das fofocas dos alunos. Decerto, você já deve ter percebido que grande parte dos adolescentes não tem pudor nenhum em espalhar boatos num tom mais alto. Os professores escutam e, se acham que é relevante, contam para mim. Afinal, é meu trabalho resolver esse tipo de problema.

- Interessante.

Droga! Jeongguk sabia exatamente do que ela estava falando, é claro. O vírus do boato havia se espalhado ainda mais rápido do que previra, e contaminado até os funcionários do colégio. A orientadora até que não era ruim, tinha amenizado seu problema da última vez, colocando aquela observação sobre “proteger um colega”. Se não fosse por isso, com certeza estaria de castigo, não importa a desculpa que desse à sua mãe.

Mesmo assim, não queria falar sobre esse assunto com ela. Não agora. Não com um adulto. Não com uma desconhecida, merda!

- Ontem um boato chegou até mim. Um boato em que o senhor está envolvido.

- É mesmo? Eu acho que não ouvi falar de nada… – Fez-se de desentendido. –  Talvez tenha sido sobre a discussão que eu tive, na segunda-feira?

- Não. Mas envolve Kim Taehyung, outra vez.

A pernas de Jeongguk tremeram embaixo da cadeira, e seus pés começaram a agitar-se, batendo inconscientemente no chão. A orientadora não deixou passar despercebido, e arqueou as sobrancelhas.

- Você está nervoso, senhor Jeon?

- Só não quero passar todo o meu intervalo aqui, senhorita Jang.

A orientadora suspirou, resignada.

- Olha, senhor Jeon, eu vou ser bem sincera. Acho que esse boato tem a ver com a discussão que você teve na segunda-feira, e acho que sei quem o espalhou.

- Se você fizer alguma coisa, só vai piorar a situação. – Disparou, com medo que a mulher interferisse e colocasse Taehyung ainda mais em risco. – É sério, eu tentei.

- Tudo bem. – Ela afirmou com a cabeça. – Eu entendo. Mas quero que saiba que eu prezo muito Kim Taehyung. É um menino bom, e muito inteligente. Se ele estiver precisando de ajuda, ou o senhor, quero deixar claro que estou à disposição.

Como previsto, ela não era de todo mal. Mas, mesmo com a melhor das intenções, nada podia ser feito. Sim, Taehyung estava precisando de ajuda. Mas não haviam meios de ajudá-lo.

Jeongguk se levantou da cadeira e curvou-se levemente em direção à orientadora. Murmurou um rápido “obrigado” antes de sair da sala.

 

Foi direto até a Virgem Maria, onde encontrou o trio, sentados de pernas cruzadas como de costume. Todos usavam grandes casacos de neve, e a cada dia a temperatura caía mais, anunciando a chegada do inverno, já bem próxima.

Taehyung, calçado com os tênis brancos e envolto por seu ar etéreo, evitou o assunto do boato. Gostava de observá-lo, sua pele dourada e reluzente, seus olhos cintilantes e sinceros. Sentia-se melhor, só por vê-lo, e ganhava forças para aturar os boatos e olhares enviesados por mais um dia. Para Jeongguk, ele agiu como naquele primeiro dia, quando foram a biblioteca. Cedeu sorrisos espontâneos e verdadeiros todas as vezes que um assunto despertava seu interesse. Demonstrou entusiasmo por temas banais, os olhos brilhando de excitação. Dividiu suas curiosidades excêntricas. Mas, como da primeira vez em que conversara com ele, estava distante. Por vezes se perdia, como se sua mente tivesse fugido dali por um momento, ido para longe, para dentro de suas constelações e nebulosas.

Talvez Vênus.

Na quinta-feira, a mesma coisa se repetiu. O intervalo foi o único momento que Jeongguk desfrutou ao lado do garoto incógnito, já que estava disposto a fazer sua vontade: seria discreto, até que o assunto morresse. “Só até a poeira baixar”, nas próprias palavras de Taehyung. Estava determinado a não interferir mais, a não fazer outra besteira como a de segunda-feira. Eventualmente, outro boato apareceria, e os dois poderiam voltar a ser como eram antes, a buscar conforto um no outro, sem a ameaça constante de uma nova pegadinha do alma ruim. Como um tolo, Jeongguk o observou se distanciar, impotente. Pensou que pudessem ter voltado à estaca zero, que o boato arruinara todos os seus esforços para desvendar os mistérios do Incógnito. Pensou que Taehyung havia desistido.

Outra vez, ele não estava o esperando no fim do corredor.

À tarde, sozinho em seu quarto, Jeongguk abriu a gaveta de meias. Procurava seu objeto proibido, o início de tudo, as palavras encantadoras dele, sua letra bonita, o cheiro de suas páginas velhas. Mais do que só um diário, buscava Taehyung. Um pedaço dele, incógnito a qualquer outra pessoa, um pedaço só seu. Como a pintinha castanha no lábio inferior, ou o gosto doce de baunilha da sua língua. Uma parte dele que apenas Jeongguk conhecia, e que lhe faltava. Céus, estava sentindo a sua falta.

Encarou a capa de couro preta em suas mãos. Por um lado, sentiu-se ainda mais distante, de volta ao princípio. Como se o houvesse encontrado ainda hoje. Por outro lado, deu-lhe alívio. O diário não era mais o peso da culpa, nem o medo de ser descoberto. Era o próprio Taehyung que conhecera, próximo como o inverno.

Abriu um sorriso triste e compreensivo. Não leria, apesar de querer. Ia só mantê-lo por perto, olhá-lo, sentir a textura macia e familiar do couro, o cheiro do papel, da tinta.

Era uma forma boba de ter o Incógnito ao seu lado, quando não podia ter Taehyung.

~x~

Acordou coberto de cadernos, folhas soltas e canetas, espalhados sobre o edredom. Porcaria, tinha dormido enquanto estudava. Ao seu lado, viu o diário do Incógnito – tinha dormido em cima dele também. Tratou de guardar logo o objeto de volta na gaveta de meias, antes que o colocasse por engano na mochila e um desastre ainda maior acontecesse. Depois de ter certeza que o diário estava seguro, entrou no banho.

Era sexta-feira, então Jeongguk estava se sentindo um pouco melhor. Gostava das sextas. Tinha treino, e um bom exercício lhe faria bem para arejar a cabeça, gastar a energia que andou acumulando nos últimos dias. Toda a raiva, angústia, melancolia e indignação que o haviam afligido a semana toda: tudo se transformaria em suor.

Também, veria Taehyung. Ou, pelo menos, esperava que sim. Ainda que somente ao longe, os cabelos castanhos reluzindo sob o sol do outono, o sorriso satisfeito de lábios cerrados, os olhos concentrados num livro, o corpo enfiado num enorme casaco de neve. Queria vê-lo assim, mesmo que não olhasse para si. Só o fato de estar ali já seria uma confirmação.

A confirmação de que não havia desistido. De que não havia deixado o alma ruim vencer. De que o esperaria.

Mas Taehyung não apareceu na arquibancada e, outra vez, Jeongguk foi deixado com uma mensagem.

Ei, estava indo pra arquibancada, mas já tá frio demais

Não vou conseguir ficar muito tempo do lado de fora, você sabe como eu sou friorento

Vou ficar lendo na biblioteca, tudo bem?

Claro, hyung

Não quero que passe frio

Nem que fique doente

Vou ficar bem :)

Bom treino!

Tome cuidado pra não se machucar

Eu queria ir praí depois

Te ver

Não sei, Jeongguk…

As provas finais estão chegando

A biblioteca está lotada de gente...

Por quê? Jeongguk não conseguia entender determinada atitudes, que pareciam extremas demais. Quando estiveram juntos, no intervalo, Taehyung agiu como em qualquer outro dia. Foi simpático, divertido, adorável. Excêntrico como sempre, falou pelos cotovelos e contou um milhão de suas histórias. Desvendou mais de suas expressões incríveis e intermináveis.

Além disso, estava usando os tênis brancos. Todos os dias, desde o confronto com Baek Geunsuk. Ele usou os tênis brancos todos os dias.

Então, por quê? Entendia que ele quisesse se manter discreto, pelo menos enquanto estivessem dentro do colégio, e não ia incomodar. Já tinha confirmado que sua preocupação exacerbada só servia para piorar tudo. Ia acabar perdendo a cabeça, falando impulsividades a esmo, como um imbecil! Era mais seguro ficar longe. Taehyung com certeza sofria as consequências daquele boato com muito mais intensidade que si, sendo da mesma sala do alma ruim. Com certeza, tinha que ouvir provocações sobre o assunto durante o dia inteiro. Tinha que ouvir os colegas de turma rindo dele, por medo de Geunsuk.

Ele está só se defendendo da forma como pode, dizia a si mesmo. Quando a poeira baixar, ele disse... eu acredito em Taehyung. Quando a poeira baixar. E repetia, incessantes vezes na mente. A cada passo e a cada golpe. Por cada uma das gotas de suor que lhe caíam sobre a grama. Até se convencer que sim.

Taehyung não desistiu de mim.

- Ei, Guk! – Jeongguk ouviu a voz reconfortante de Jimin, assim que o treino acabou. Logo em seguida uma mão pequena e amigável pousou em seu ombro. – Você está bem?

Ele não estava se referindo ao treino.

- Tirando o fato de que ninguém vai querer tomar banho perto de mim no vestiário… – Comentou, e Jimin soltou uma risada frouxa. – Eu já estive melhor, hyung. Mas não é o fim do mundo.

Encarou o melhor amigo, seus olhos pequenos e descomplicados, seu sorriso largo e sincero. Saber que ainda tinha Jimin, apesar de toda aquela bagunça, era um conforto e uma alegria.

- Não é mesmo, Guk. Só que você deve estar precisando conversar. Ou, pelo menos, se distrair um pouco. O que me diz de dormir lá em casa, hein? Fazemos uma noite de vídeo games, e só vamos dormir quando amanhecer. Igual quando a gente era criança!

Jeongguk sorriu, verdadeiro, libertando os dentinhos da frente. Seus olhos se espremeram, e ele sentiu o suor escorrer se suas pálpebras pelas bochechas.

- Acho ótimo, hyung! É a melhor notícia que tive hoje. Vou só passar em casa, pra arrumar minhas coisas. Acho melhor tomar banho lá, também.

Jimin arqueou as sobrancelhas.

- Você vai ficar doente se caminhar todo suado nesse frio.

- Acredite, é melhor do que ter a equipe inteira desconfiada de mim no vestiário.

Soltou uma risada triste. Seria sempre assim, a partir de agora? Teria que passar o próximo ano inteiro indo suado para casa?

De repente, sentiu braços molhados e gelados ao redor da cintura. Park Jimin apoiou a cabeça em seu peito, rindo alto, e seus cabelos louros se grudaram no pescoço de Jeongguk.

- Eu tomo banho com você se quiser, Gukkie… – Ele brincou, os braços fortes espremendo-lhe as costelas. – Só cuidado pra não armar a barraca!

- Sai daqui, seu desmiolado! – Jeongguk reclamou, tentando fazer com que o aperto dele se soltasse. – Quer que o colégio comece a falar de você também?

Jimin levantou a cabeça, os olhos vendados pela franja loura e um sorriso enorme estampado nos lábios.

- Se for melhorar essa sua cara, talvez valha a pena.

Olhou para ele, para sua expressão descontraída e reconfortante, e sentiu-se repentinamente comovido. Mesmo depois de toda a confusão com Jimin, da desconfiança e do medo que o melhor amigo havia sentido ao perceber seus sentimentos por outro garoto, ele havia ficado ao seu lado. E agora, ainda que todo o colégio estivesse contaminado por aquele boato, Jimin o abraçava apertado no meio do campo, sem se esconder, sem medo, com olhos tranquilos. Disposto a correr o risco, sabendo das consequências, pela amizade que cultivavam há muitos anos.

E, mesmo no meio do furacão, Jeongguk sentiu-se sortudo.

 

Chegou em casa morrendo de frio, e subiu as escadas correndo para entrar direto no banho. Se sua mãe o visse chegando, suado e tremendo, com certeza levaria uma bronca.

Enfiou-se debaixo da água morna, sentindo-se em seu melhor humor desde segunda-feira. Desde o beijo rápido que havia roubado de Taehyung, atrás da estátua da Virgem, e da história que ele havia lhe contado sobre as lorotas que disse no dia da febre.

“Como você pode ser tão mais bonito assim, bem de perto?”

Balançou a cabeça, tentando afastar esse pensamento. Tinha que se concentrar no agora, em Jimin, em se distrair. O melhor amigo não tinha a menor ideia do favor que lhe estava fazendo. Antes do convite, seus planos para sexta à noite se resumiam em bater a cabeça contra a parede do quarto – na melhor das hipóteses.

Saiu do banho com a mente mais arejada, pôs-se a vestir uma roupa quente – não queria mesmo ficar doente outra vez – e avisou à mãe que passaria a noite fora. Depois, arrumou a mochila para dormir na casa de Jimin.

Foi só ao procurar pelo último item que faltava – seu carregador de celular – que Jeongguk notou um papel dobrado em cima da escrivaninha. Pensou que devia ser uma folha solta de exercícios, que caíra no chão durante a noite, depois que dormira em cima dos materiais escolares. Curioso, mas sem dar muita atenção, desdobrou o papel. Num misto de perplexidade e esperança, reconheceu a caligrafia familiar de Taehyung.

Sentiu o coração disparar no peito, descontrolado, e continuou a olhar para o papel, sem conseguir juntar uma única sílaba, como se tivesse desaprendido a ler. Não era uma das páginas do diário, concluiu de imediato. Era uma folha comum de caderno, com linhas azuis e as pontas tortas e amassadas, arrancadas da espiral. Será que Taehyung poderia ter lhe enviado uma carta? Não. Conforme o choque inicial foi passando, as formas se juntaram em sílabas, e as sílabas em palavras. Logo no título, descobriu que aquela carta não era para si.

Carta para o alma ruim.

Droga, devia ter caído do diário no dia anterior, quando irrefletidamente o retirou de dentro da gaveta de meias. O diário era recheado de folhas soltas, bilhetes de cinema, recortes de jornal. Definitivamente, tinha caído de lá e ido parar direto nas suas mãos trêmulas, sem querer. Merda, merda! Poderia lê-la? Se estava ali, em cima da escrivaninha, muito provavelmente sua mãe devia tê-la encontrado ao arrumar o quarto, jogada em algum lugar no chão. Será que ela chegou a ler? Curiosa como era, Jeongguk não duvidava nem um pouco.

Também, não era tão diferente. Havia puxado alguns traços da personalidade de sua mãe, e a curiosidade era definitivamente um deles. Sentia o sangue borbulhar ao segurar o papel em mãos, ao encarar a letra caligráfica de Taehyung, que parecia meio apressada. Tinha, definitivamente, menos capricho que as passagens do diário. Jeongguk pensou que ele devia estar nervoso ao escrever a carta.

Se aquilo havia caído, assim, sem mais nem menos, talvez devesse ler. Talvez fosse um sinal, qualquer coisa, algo a mais que precisava descobrir sobre o autor incógnito, algo que pudesse ajudar Jeongguk a protegê-lo. Um milagre capaz de resolver a situação difícil que havia se desenrolado essa semana. Devia estar predestinado, como Jimin encontrar aquele desenho amassado ao lado do lixo, o desenho que lhe deu coragem para se confessar. Talvez precisasse ler essa carta para um próximo ato heróico.

Sem conseguir se conter nem um segundo a mais e iludido por novas desculpas esfarrapadas, Jeongguk leu.

Carta para o alma ruim.

Eu odeio odiar, mas você faz dessa uma tarefa árdua. Eu não gosto de guardar rancor, de pensar em coisas ruins, de me sentir mal. Mas é difícil para mim compreender o porquê. Por que você se sente bem ao ver eu me sentir mal? Por que você sorri quando eu sou humilhado, machucado ou enganado?

Você pode dizer o que quiser de mim e eu não vou mudar. Coloquei isso bem claro na minha cabeça, e já não tiro mais, de jeito nenhum. Eu não vou mudar para que você me aceite. Não vou mudar por você, porque você não merece isso. Porque eu não preciso.

E para todas as pessoas que te escutam caladas, que riem das suas piadas por medo e não por aprovação, que aturam os seus comentários preconceituosos, que se deixam ser compradas pelo seu dinheiro e pela sua popularidade: meus mais sinceros pêsames.

Se o que você ama tanto, com unhas e dentes, a ponto de se agarrar de tal forma que não vê mais as pessoas como pessoas, mas meros objetos, bonecos de pano com os quais você pode fazer o que bem entende, brinquedos das suas vontades, se isso que você tanto adora e preza e cultiva é o poder, então, meus parabéns. Você tem poder.

Você tem o poder de fazer com que as pessoas se sintam feito lixo, sem sofrer consequências. Você tem o poder de destruir tudo por onde passa, de semear a discórdia e fazer brotar a depressão, a desesperança, a baixa estima, a dúvida de que nós, aqueles que estão do outro lado, somos realmente seres humanos, com sentimentos, com valor. Você cultiva a crença ao ponto de nos fazer acreditar que sim, somos seus bonecos, estamos aos seu dispor. E somos impotentes. Não podemos fazer nada.

Mas e você? Como você se sente? Como é se regozijar a partir do sofrimento alheio? Você sorri como se fosse o dono do mundo, a criatura mais feliz e realizada, com tudo o que deseja sempre ali, ao alcance da mão. Há aqueles que digam que você não passa de um mero casulo oco, sem nada dentro. Eu não penso assim. Acho que está corrompido. Existe uma pessoa ali, tem que existir! Alguém que deve estar lutando para sair, clamando pela atenção de desconhecidos, comprando afeto com notas sujas e impondo sua soberania por meio de adjetivos impiedosos e perversos, mas vazios. E eu realmente espero que por trás disso tudo exista uma pessoa.

Eu odeio odiar, mas você traz o pior de mim. E eu estou certo de que você faz questão de trazer o pior de si mesmo.

Jeongguk leu o último parágrafo com os olhos embaçados pelas lágrimas. Assim que terminou elas caíram, ao piscar os cílios, e mancharam a tinta preta no papel. Por um minuto completo, não conseguiu parar de chorar, petrificado. Não sabia o que pensar.

Mas sabia o que fazer.

Largou a carta sobre a escrivaninha, colocou a mochila nos ombros e correu, sem aviso, até Taehyung.

 


Notas Finais


E aí, o que acharam? Tomara que tenham gostado. Espero que estejam ansiosos pra essa próxima cena aí (hehe) porque eu estou louca de vontade pra escrevê-la logo. Na verdade, já tem uma partezinha pronta hihihihi <3
Bom, este capítulo foi lotado de muitos personagens, muitas conversas. O Guk tá passando por algo muito difícil, uma situação que ele já previa e temia (lembram-se?) desde o capítulo 23. Mas acho que ele até que está lidando bem com tudo isso, principalmente graças a Jimin e Hyeyeon. Enfim, estamos começando a caminhar para o desfecho de Incógnito, mas podem ficar despreocupados que ainda nos faltam muitos capítulos. Não se desesperem hahaha.

Pra quem não sabe porque eu desapareci: eu estava na Coreia do Sul, estudando e passeando. Como já contei, novembro/dezembro estava super enrolada com meu TCC, que me deu um baita trabalho e tomou muito do meu tempo. Logo depois (quando entrei de férias e pensei que estaria mais tranquila) começaram os preparativos para a viagem. Meu psicológico também não estava lá dos melhores, já que eu andava muito ansiosa pra ir viajar logo. Aí, no dia 6 de janeiro eu fui, com aquele grupo da World Study e a Thais Midori, sabem? Vou publicar um texto lá na K4US falando todos os detalhes do intercâmbio, se vocês tiverem interesse... Lá na Coreia eu mal tinha tempo de nada, não parei quieta dentro da acomodação, ia pra lá só dormir e tomar banho. Por isso, não escrevi nem uma linha (infelizmente).
Voltei sedenta pra retomar minhas fics, e aqui estamos nós! Espero que vocês compreendam meu sumiço, e quero que saibam que eu jamais abandonaria nenhuma das minhas fanfics. Mesmo que demore, podem ter certeza que eu estarei de volta <3 porque amo muito vocês!

Como vocês devem imaginar, eu estou EM ABSTINÊNCIA de comentários, então.. POR FAVOR, COMENTEM. Nem que seja só um "aleluia, irmãos" mas me deixem um recadinho pra eu saber que vocês estão todos vivos, saudáveis, e que continuam me acompanhando <3

Pra quem quiser fofocar:
twitter @ btsnoona_
curiouscat / btsnoona

playlist de Incógnito no Spotify: https://goo.gl/BV8GwL

Beijocas amoras,
~BtsNoona


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