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História Itália, prisão de cristal - Roma parte I - Curiosidade


Escrita por: MrsReddington

Notas do Autor


Eu voltei meus lindos! Acharam que eu ia abandonar Itália? Acharam errado!
Quero saber como passaram esses tempos? Todo mundo bem? Morrendo de saudades de vocês meu leitores.
Para recompensar vocês, e diminuir o tamanho do capítulo, será dividido em dois que vou postar já já.
Para quem acompanhar a página, já viu esse recado antes e já estava sabendo disso daí auasuhasu.
Sigam a página que está nas notas finais ;D
Lá tem eu tentando ser digital influencer de livros, talvez fracassando e postando uns memes de Itália e há novidades e photoplayers e spoilers.
Peço desculpas pela demora mas esse tempo não foi fácil emocionalmente falando. Um monte de emoções mal resolvidas caíram por cima de mim em forma de cansaço e frustração. Doeu tanto certas coisas que não fui capaz de permanecer estável em tantas funções. Eu falhei com tantas coisas e pessoas, mas fiz o que podia e agradeço o apoio dos meus amigos e principalmente de Deus por ter sobrevivido. Peçam ajuda e ajudem também. As vezes aquele amigo que mais ri e brinca é o que mais precisa conversar e sentir útil de novo. Agora já estou bem melhor e espero continuar assim.
Espero que gostem, Deus abençoe a todos nós <3

Capítulo 28 - Roma parte I - Curiosidade


Trento, 16h17min da tarde.

— Como não fechamos todas as reservas hoje?! — Máximo vociferou para cima das duas mulheres que o observava, socando a mesa e fazendo a cadeira ranger com sua movimentação exagerada.

Kiara e Raena não se incomodaram com a histeria de Máximo e o olhar delas era de pura seriedade e sem nenhuma demonstração de que se tratava de uma brincadeira de mau gosto para lhe punir.

— Eu te falei que essas mudanças todas não fariam bem. Trocar funções, novas regras de funcionamento, horários, toda essa confusão obviamente comprometeria a saúde financeira do restaurante. — Raena enumerava com gestos.  — Estamos na segunda semana em queda livre nas reservas, Máximo!

— O que precisa acontecer pra o senhor perceber que se esses índices continuarem vamos à bancarrota, chefinho? — Kiara desdenhou.

Máximo girou a cadeira ficando com a vista do vitral do escritório. Não podia perder tanto dinheiro. Se pela terceira semana a queda continuasse seriam os seus próprios investimos que iriam para o limbo. Precisava conter a sangria.

Ele voltou a girar a cadeira para encontrar as duas mulheres esperando por uma decisão. Sorriu falsamente.

— O que me sugere Raena. Diga-me o que a sua experiência fala sobre isso.

Raena sentou na cadeira de forma elegante. Estava esperado há um longo tempo por aquele momento.

— Reorganização da cozinha, retirada do cardápio desses tipos novos de comida, somos um restaurante tradicional, não faz sentido algum termos essas coisas pra vender — Apontava para as rosquinhas recém-mordidas por Máximo em cima da mesa. — E recontratação de Caroline. A saída dela, neste presente momento, a segunda maior reclamação dos clientes. Vai ter que aceitar que os novos horários, que no momento só nos dão despesas, prejudicaram ela, e a saída dela prejudicou o restaurante.

— Carol é a rainha da recepção, manter ela não era um cabide de amigos — Kiara sentou no tampo da mesa de Máximo com uma postura de vitória — mas uma necessidade. Os clientes gostam e sempre estiveram satisfeitos com a simpatia e atenção dela. Por mais que eles gostem de Nicolo, ele mesmo não suporta lidar com tanta gente com fome. Pergunte a ele. Ele quer ser cozinheiro Máximo, tirar ele da cozinha não fez sentido algum. E muito pior colocar na função dela. Eu não sirvo para isso, por isso Pepe a contratou...

— Sem Nicolo lá, você deixou a cozinha mais sobrecarregada, os pedidos demoram, os clientes reclamam... — Raena disse com um sorriso desdenhoso de quem sabia estar dobrando Máximo.

Máximo mordeu os lábios, contrariado. Apoiou os braços na mesa ponderando.

— A questão dos horários é adaptável... — Não quis dar o braço a torcer imediatamente. — Nicolo volta para a cozinha já que está insatisfeito na função.

— E quanto a Caroline? — Raena mirava máximo contendo sabiamente a ansiedade em vencê-lo — Você viu. O primeiro-ministro italiano não virá mais aqui, e logo outros políticos irão ao mesmo restaurante que ele. E se você não soube, muitos deles estão frequentando outros locais e não o nosso. Quer que isso continue?

Máximo mordeu as bochechas internamente com o incômodo de lembrar a relação entre Caroline e Giuliano. Não queria readmiti-la, mas precisava.

— Você ganhou. Caroline retorna a sua função, pelo menos por enquanto. Quero que ela se apresente em uma hora.

— Isso não será possível. Caroline não está na cidade. E mesmo assim, ela vai precisar receber o treinamento novo. Logicamente, só poderá estar apta semana que vem. — Respondeu de forma ríspida para disfarçar a insegurança de ter Caroline ali novamente.

— Pra quem precisava tanto do dinheiro ela está muito pouco necessitada. Está até viajando... — Soprou com ironia e logo segurou as mãos de Raena, beijando o dorso de maneira sedutora. — Que seja como queira Raena. Pelo que vejo meu poder aqui não é nada frente ao seu. Espero que agora estejam todos satisfeitos.

— A vida pessoal dos funcionários não é da sua conta e nem gira ao seu redor, Máximo. — Kiara se pronunciou. — E não fez nada além da sua obrigação.

O tom agressivo de Kiara acendeu algo na boca do seu estômago. Mirou-a com cuidado, avaliando o corpo da mulher. Kiara era bem mais alta que Caroline, os cabelos eram lisos e curtos, os traços do rosto bem delicados e a cintura fina chamou-lhe atenção. Não era como ela, mas se assemelhavam em tantas coisas.

— Eu gosto de você Kiara...  — Disse e pela primeira vez a mulher se demonstrou surpresa com algo. — Gosto muito de você.

— E eu não gosto nada de você — Afastou-se da mesa enojada e foi a primeira a sair da sala.

Raena observou com prudência o olhar de Máximo sobre o caminhar seguro de Kiara. Um frio lhe gelou a espinha. Algo errado e muito ruim acabara de se criar frente aos seus olhos. Quando ele voltou a lhe dar atenção com um sorriso mórbido nos lábios seu coração se apertou no peito.

— Vou ver Olívia. Ela está sozinha no meu restaurante. Vejo-te a noite. — Encerrou qualquer possibilidade de assunto e foi até a porta para sair. Trancou-a atrás de si e encostou-se à parede do lado.

Sentiu o medo gélido e penetrante que a incapacitou momentaneamente. Respirou com dificuldade e desceu as escadas de forma temerosa. Encontrou Kiara com os papéis das reservas da noite. Aproximou-se a puxando para o lado de fora do restaurante.

A menina que crescera em suas vistas lhe observava confusa.

— Está tudo bem? A senhora está bem? — Preocupou-se.

Anuiu veementemente e tocou os longos cabelos lisos de Kiara.

— Cuide-se com Máximo.

— Sou vacinada contra babacas. — Piscou bem humorada. Raena não compartilhou de seu conforto. — Relaxa! Máximo só quer chamar atenção.

— Máximo é perigoso, Kiara. Você sabe!  Não dê brechas a ele, por favor. — Continuou mesmo que a expressão de Kiara fosse de calma e de quem podia lidar com aquilo muito bem.

— Não se preocupe. Eu sei que ele não é bom e vou me manter distante. Prometo! — Assegurou e se afastou para atender um cliente.

Raena quis acreditar naquilo quando seus instintos diziam que não, não ficaria tudo bem enquanto a sombra de Máximo estivesse perto dos seus e isso era a única coisa que tinha como certeza. Caminhou pela rua com a mente pesada por permitir que Caroline voltasse, por estar de mal atadas com Kiara e por não ter como comprovar nada do que realmente via mesmo que estranhamente todos de algum jeito soubessem.

Parecia que todos tinham um enorme torpor da realidade.

— O que você faria Pepe? — Buscou na própria memória uma imagem de um conselho dado que não existia. Olhou para o céu querendo uma resposta que só Deus poderia lhe dar. — Se Pepe estivesse aqui... Ele com certeza faria tudo sozinho. Maluco como era... — Sorriu com a tristeza que lhe encheu o peito em meio a toda incapacidade que sentia.

Aparou-se na porta do próprio restaurante o vendo lotado. Olívia estava dando conta sozinha. Ela até parecia mais crescida.

— Está falando com quem mãe? — Ela surgiu com uma bandeja vazia nas mãos.

— Sozinha...  — Deu de ombros, irritada com o estranhamento da filha. — Completamente sozinha!

— A senhora quer conversar não é? — Mordeu os lábios olhando para todos os lados, já insegura.

Raena pensou se realmente deveria contar algo para Olívia, afinal, ela, das duas filhas, era notadamente a mais medrosa que sempre se escondia de problemas. Era do tipo que dava um euro para entrar numa briga e mil euros para nunca participar. Era um misto de covardia com inteligência.

Talvez por ser a caçula, com temperamento mais sensível. Acabava sempre se escondendo na figura mais firme e assertiva de Martina, a sempre acelerada em tudo na vida. Ela engravidou, casou, terminou a faculdade, arranjou trabalho, foi a primeira a deixar seu ninho, a primeira a cometer erros e depois acertar também, a que sempre tomava tudo pra si, até demais. Enquanto Olívia era mais tímida, com acessos de extroversão vez ou outra, menos prudente e mais espontânea que a mais velha, o que a tornava a mais engraçada também. Olívia daria todos os risos do mundo para quem precisasse. Já Martina, precisava se sentir útil e prática como era, resolvia o problema para cessar qualquer choro. Mesmo com a diferença pequena de idade, sempre protegeu a menor com a própria vida, o que fez com que Olívia nunca precisasse se defender sozinha. Sempre tinha sua heroína para apará-la e limpar suas lágrimas.

Sempre soube que Martina voaria cedo, como também sabia que Olívia demoraria mais tempo para fazer isso. Às vezes desejava ter Martina mais perto, e que Olívia crescesse com mais veemência. Mas isso nunca mudou o amor ou as diferenciou em seu coração materno. Cada uma tinha seu próprio jeito de ser e amava cada nova evolução de suas meninas. Não conseguia ver Martina ou Olívia como melhor que a outra. Elas se complementavam perfeitamente, eram unidas e tinham seu próprio jeito de ser e de buscarem seu futuro e satisfação.

— Quero. Preciso da sua ajuda. — Afagou os cabelos de Olívia que a olhou assustada.

— A senhora não quer que eu chame a Martina?— Até a voz soou trêmula.

Raena revirou os olhos. Os papéis das duas eram sempre tão bem definidos que lhe irritava.

— Se eu disse que quero sua ajuda é porque você é a pessoa ideal!

— Mãe... — Roeu uma unha franzindo a testa ansiosamente. — Tem a ver com o Máximo não é?

Raena fez que sim discretamente olhando para os lados.

— Sua irmã quer resolver tudo rapidamente e expondo as cartas. Você com certeza cozinharia tudo em banho-maria e se faz de desentendida muito bem. Por isso preciso de você, alguém com paciência suficiente para não levantar qualquer suspeita.

Roma, 17h02min da tarde.

— Não acho que isso vai dar muito certo... — Caroline se apoiava nos joelhos, esbaforida de tão cansada depois da última tentativa de sacar que terminou com uma bola batendo na rede e voltando quicando no chão.

— Não é tão difícil... — Giuliano disse do outro lado da quadra já com uma expressão de riso enquanto girava a bola de vôlei nas próprias mãos a observando procurar o ar com exaustão totalmente sem fôlego e sem condições de continuar. — O problema é só o seu salto. Se sacar a bola na altura que está indo ela não passa da rede.

— Eu não sei se você percebeu ainda... — Ela girou ao redor de si mesma mostrando o próprio corpo. — Eu nunca vou conseguir saltar o suficiente.

Ele fez uma falsa negação.

— Vai sim, não é só força ou altura, é técnica. Eu acredito em você!

Giuliano passou por baixo da rede e jogou a bola para ela mais uma vez.

— Tenta de novo. A prática leva a perfeição.

— Você é ridículo — Ela jogou a bola nele, que soltou um gemido falso de dor quando a bola triscou no seu braço. — Machucou? — Soou preocupada.

Ele baixou o olhar se fazendo de inocente.

— Doeu. — Esfregou o braço onde a bola passou. — Se tivesse acertado onde você queria, teria machucado de verdade! Ainda bem que sua pontaria é péssima...

— Que engraçado... — Torceu os lábios. — Não alcanço essa rede. Era me humilhar que você queria quando me trouxe pra jogar vôlei com você? — Empurrou-o sem força nenhuma.

— Não exagere. Eu te garanto que me diverti muito nas quedas e nas muitas bolas que passaram por baixo da rede. – Aproximou-se dela. — Me diverti bastante. Se eu soubesse já teria te trazido de Trento pra cá antes.

Caroline o mantinha na mira com os olhos semicerrados.

— Nunca joguei vôlei por motivos óbvios. Aliás, já joguei, mas com a rede mais baixa.

— Imagino a razão...

— Eu não ligo de ser baixinha sabia? — Colocou as mãos na cintura. — Se essa foi uma tentativa de me humilhar com esse esporte de gente gigante igual a você. Estou muito feliz com o meu tamanho! Você não vai conseguir me deixar pra baixo.

— Certamente não vou conseguir te deixar pra baixo... A natureza já fez isso. — Riu de canto.

Caroline ergueu o queixo o desafiando.

— A natureza te fez besta ou foi alguma especialização?

Ele colocou as mãos na cintura dela, desfazendo a pose dela de mulher maravilha barraqueira. Desfez também o queixo erguido com um toque nas bochechas que a fez deitar o rosto em sua mão.

— Não me importo quando me xinga. Até estou começando a gostar quando me chama assim.  — Franziu os lábios e arrumou os cabelos que arrepiavam pelos saltos mal sucedidos dela. — Sua altura não é um problema para o Vôlei, é sua falta de jeito que atrapalha. Está feliz?

Caroline assentiu e beijou a bochecha dele com um saltinho, impulsivamente Giuliano a segurou e ela escorregou até o chão com um rosto cheio de rubor e um sorriso bobo.

— Eu fico feliz só com sua intenção...

Giuliano a tocou no rosto com cuidado, acariciando a pele fina das pálpebras um pouco escuras. Secou o suor que escorria da linha do cabelo na testa e tocou sensivelmente com os próprios lábios os dela. Ela fechou os olhos imediatamente, permitindo o beijo que ele depositaria naquela região.

— O jogo começa em cinco minutos. — Disse mudando de assunto enquanto ela ainda tinha os olhos fechados, esperando por mais que um roubo de ar. Ela abriu os olhos, certamente envergonhada por não ter sua imaginação atendida. — Vou acompanhar o primeiro tempo com você lá em cima, depois vou jogar.

Caroline anuiu concordante com uma expressão perdida. Ele a guiou pelas escadas da arquibancada enquanto era possível ouvir o barulho da multidão de homens para o jogo no corredor de acesso. Chamou-a fazendo com se virasse e rapidamente a puxou para um beijo que não foi dado antes.

Giuliano a puxou para o próprio corpo de forma urgente com o barulho dos visitantes os impelindo a ser rápidos.

Caroline tentou empurrá-lo pelo receio de serem vistos, mas não conseguiu encontrar força em si mesma para tal até que seu autocontrole conseguiu domar as investidas mais profundas de Giuliano e começou a se afastar do corpo dele. Se despedindo, mordiscou com suavidade os lábios dele e virou o corpo para voltar a andar.

Imediatamente a equipe entrou e os dois ainda procurando o ar acenaram para os novos participantes da partida. Com uma troca de olhares de quem estavam fazendo algo errado sentaram um do lado do outro.

— Não deveria me beijar desse jeito na frente das pessoas! — Caroline o censurou mesmo que não tivesse feito nenhuma objeção no momento.

— Não tinha ninguém. — Ele cruzou os braços fingindo que não a olhava. Caroline tinha uma ruga de preocupação no meio da testa. — Estávamos sozinhos.

— As pessoas estavam chegando e poderiam nos ver.

— Eles são de confiança... — Giuliano murmurou sabendo que ela gritaria no minuto seguinte.

— Você é o primeiro-ministro. Não deveria sair beijando as pessoas assim! — Ela aumentou o tom do sussurro. Giuliano riu, sonso.

— A única pessoa que beijo assim é você... — Balançou a cabeça de um lado para o outro, descrente pela bronca. — E eu namoro você. Aqui eu sou só seu namorado. Até quando vamos ficar nisso?

Caroline sorriu mesmo que estivesse brava e envergonhada.

— Desculpa... — Ela baixou o rosto. — Eu tenho medo.

Giuliano passou uma perna pelo outro lado do banco da arquibancada, ficando totalmente de frente a ela. Caroline se encolheu sabendo que indiretamente teria uma repreensão pelo que tinha dito. Contrariando suas expectativas ele apenas a abraçou, deixando que apoiasse seus ombros e rosto no peito dele.

— Eu estou calejado da imprensa, Caroline. — Girou os olhos.

Já havia argumentado consigo mesmo se seria o momento certo para expor as próprias constatações e acabou por decidir pelo silêncio.

Trocou a camisa ainda arquibancada enquanto Caroline parecia surpresa a ponto de virar o rosto para o outro lado. Completamente envergonhada continuou fingindo que nada acontecia, olhando firmemente, ou nem tanto, para o jogo.

Caroline não estava totalmente concentrada em absolutamente lugar nenhum além do tórax masculino, que parecia ter sido pintado por renascentistas, o qual se exibia para sua visão periférica. Sua mente relutava em acreditar que Giuliano Bocarelli, essencialmente o homem ocupado que era, também tinha um porte físico tão agradável os olhos.

— O que acha? — Ele perguntou. — Acho que mereço minha torcida particular.

Caroline não tinha sequer ideia do que ele falava.

—Muito bonito...

Voltou o olhar para o centro dos olhos verdes do homem e intimidada desceu o olhar para o chão, já que todo o resto também lhe causava um pequeno desvio de pensamentos.

— O que é bonito? — Ele olhou para os lados tentando entender pra onde ela estava olhando.

— Sua longa lista de conquistas... Muita cara de pau da sua parte. Quantas mulheres já trouxe aqui? — Mudou de assunto completamente para disfarçar todo e qualquer constrangimento. Giuliano juntou as sobrancelhas ainda sem entender nada. — Sem acusações. Quantas foram?

Giuliano piscou várias vezes desacreditado da ironia de quem acusava dizendo que não estava acusando.

— A única mulher que frequentava essas arquibancadas era Giovana. Ela gostava de Vôlei. Por que a pergunta?

— Nada... — Soprou o ar. Pensou rápido caçando qualquer fala dele que fosse útil. — É que falou em torcida particular... Pensei que seria eu, aí pensei nas outras... E eu não vou torcer por você. Seus amigos são claramente melhores e mais bonitos que você.

Giuliano abriu a boca e fechou.

— Qual deles você acha que joga melhor que eu? — Ele se virou para partida.

Caroline se levantou e cruzou os braços, se protegendo dos próprios pensamentos.

— O ruivo. E ele é uma coisa linda... — Fingiu interesse mesmo que vistoriasse todas as ações de Giuliano pelo canto dos olhos. Ele parecia bastante ofendido. — Eu não acho que deve ser tão bom assim.

— Está me desafiando?!

— Certamente. — Piscou para ele. — O ruivo tem namorada?

Ele balançou a cabeça positivamente

— Ele namora o moreno ali do outro time — Apontou para o rapaz do outro lado da quadra que iria sacar. — Eu sei que quer me provocar com esse joguinho.

— Italiano presunçoso! — Caroline bateu por impulso no peito dele. Giuliano segurou a mão dela, beijando a palma. — Descarado. Aproveitador de corações inocentes! Sedutor, sem vergonha.

— Eu estou te seduzindo então?

— Ok. Essa boa memória é minha. Você é último homem da terra pelo qual eu me interessaria. — Mordeu as bochechas internamente enquanto Giuliano começava a gargalhar. — Não é só você que lembra todos os detalhes.

— Pagou pela língua pelo que vemos aqui e eu já te lembro disso constantemente. — Tocou com o polegar o lábio inferior dela.

— Ainda vai ter que me responder quantas mulheres trouxe aqui. Ou acha que acredito nesse conto de rapaz comportado.

Giuliano fez uma careta.

— Eu falei a verdade. Só Giovana frequentava esse lugar.

— Não estou te julgando. — Esclareceu e continuou no assunto. — Curiosidade. Quantas namoradas já passaram pela sua vida?

— Curiosidade mórbida... Ninguém pergunta das ex-namoradas do namorado num encontro. — Revirou os olhos. — Eu não tinha nenhuma namorada há um tempo razoável, Caroline. Não assumia um compromisso, assim com nenhuma delas assumia um comigo. Eu era adepto do relacionamento aberto. Satisfeita?

Ela ouviu atentamente com somente uma ruga no canto dos lábios de surpresa.

— Foram dois. — Explicou-se melhor já que ele fez uma expressão de dúvida. —: Arranquei algo de você, tenho que falar de mim também. Eu só namorei dois homens antes de você.

— Dois?! — Giuliano realmente ficou surpreso. O olhar dele se perdeu por algum tempo dentro da quadra. Voltou a encarar a mulher a sua frente com uma visão totalmente diferente dela naquele momento. — Eu sou o terceiro namorado que teve em toda a sua vida?

— Exatamente. Sinta-se especial. Eu sou difícil... Não entrego meu coração a qualquer um e quando o faço é porque realmente acredito que ele pode ser bem tratado.

Giuliano cobriu a mão dela com a própria e deu um longo suspiro orgulhoso.

— Você era meu sonho impossível... — Ele brincou com o esmalte descascado das unhas dela. — É tão petulante, e mesmo assim atrativa. Vi-me querendo te conhecer e ter por perto. Fui bem idiota no meio do caminho. E sabendo disso agora... Reafirmo meu sentimento de que você jamais daria me daria uma chance.

Ela sentiu o coração tombar na batida. O estômago soltou milhares de borboletas que lhe deixavam enjoada. Respirou profundamente.

— Quer que eu me apaixone mais ainda por você por essas coisas que diz? — Ela mordeu os lábios fazendo um carinho nos ombros dele. — Não deveria fazer isso comigo... E você foi bem persistente.

— Eu Quero. — Asséptico e sem rodeios. — Quero ser admirável o suficiente para que tenha orgulho de mim. Desejo ser digno de ter esses olhinhos, meigos e sorridentes, para mim, enquanto estiver vestida de noiva no nosso casamento. Aviso desde esse exato momento quero ser o terceiro e último homem da sua vida, Caroline.

Caroline piscava aturdida e com o coração saltando mais do que achava que ele poderia fazer. A respiração ofegante mal lhe deixava raciocinar.

— Giuliano, eu sei que é velho... Mas não me diga uma coisa dessas... Uau...  — Sentou no banco novamente. — Está me pedindo em casamento adiantado ou é para agora? Está indo tão rápido... Você não deve gosta de mim tanto assim!

Ele parecia muito tranquilo. Até sorria de satisfação e alívio.

— Considere como um pedido de intenção. E eu nunca falei tão sério... Quando temos algo precioso para nós não o jogamos fora. Acolhemos para sempre. — Acariciou os cabelos até onde eles terminavam, fazendo um nó e a puxando para um selinho. Olhou-a profundamente. — Faça o que eu te pedi. Depois do jogo quero que conheça alguém.

Giuliano desceu para a arena e foi recebido por seus colegas. Ao entrar foi direto para a posição de saque e o fez de maneira magistral. Seu corpo parecia desenhado para o movimento. Não havia nada que pudesse justificar uma execução errada.

— Gente... O que foi que ele me pediu? — Caroline perguntou a si mesma depois de algum tempo entre a realidade e a fantasia.

Ele parecia dizer as coisas com tanta naturalidade e consciência que nem parecia ter ideia do efeito das palavras. Não tinha ideia do que ele lhe tinha pedido, nem se conseguia agir corretamente depois de todas as palavras dele.

Vez ou outra ele lhe lançava um olhar com um sorriso e em outros momentos chegava a rir comentando algo com alguém.

Sua cabeça era um misto de sentimentos entre a alegria e o medo. O ciclo da vida é de turbulências e calmarias. Uma após a outra. E por um momento sentiu medo da tempestade. Afastou os pensamentos da cabeça quando Giuliano a chamou para a quadra.

— O que falava e olhava pra mim? — Perguntou entregando a garrafa de água.

— Eu disse a Jean que achou ele bonito.

— Giuliano! — Colocou a mão no rosto, se cobrindo de vergonha. — Pelo amor de Deus.

— Não vejo nada de errado.

— Não te conto mais nada! — Bateu o pé na quadra.

— Fez o que eu pedi?

— Não. E se tivesse feito, desfaria. — A expressão de Giuliano realmente foi de frustração. — Era algo sério? Desculpa, eu esqueci.

— Pra mim era... — Sacudiu os ombros. — De qualquer forma eu agora não vou esquecer.

Caroline sentiu a ameaça.

— O que vai fazer? — Levantou uma parte dos lábios com a sensação que deveria se preocupar e muito.

— E te disse que nós conheceríamos uma pessoa. Então nós vamos conhecer essa pessoa. Como eu pedi que gravasse o jogo, e você não fez isso, eu vou gravar esse encontro.

Só pela ironia sentia que gravar o encontro era alguma forma de vergonha pública.

— Que pessoa é essa? — Afastou um passo dele.

Giuliano carregou a própria mochila e entregou a dela, fazendo pouca questão de ser cavalheiro de maneira proposital.

— Acho melhor começar a fazer algum tipo de exercícios carregando sua bolsa... Mestre Abel é um treinador exigente.

— Meu Deus... Vai ser pior do que o vôlei?

Giuliano desdenhou com um sorriso de canto da lívida mulher na sua frente antes de saírem pela porta que separava o ginásio do corredor de salas de vidro. Ele caminhou em sua frente, lhe indicando o caminho.

De longe ela viu o homem enorme, e cheio de músculos, dispensar um aluno junto a mulher ao seu lado.

— Abel Weiss é meu treinador. Ele é especialista em várias lutas e é educador físico. Foi também militar israelense, mas já faz alguns anos que deixou. — Explicou antes que entrassem no ambiente.

Caroline anuiu sem saber o que esperar sobre si mesma participando de um treino físico intenso. Não deveria ser menos do que complicado realizar os exercícios que mantinham Giuliano com o corpo que tem.

O problema é que não tinha condição física pra mais nada depois dos saltos do saque.

— Eu faço o que você quiser... Mas por favor, não quero treinar mais. Estou toda dolorida... — Choramingou.

— Certamente ainda existe muita energia em você. — Ele zombou. — E não reclame, mestre Abel não costuma gostar. Quanto mais reclamar, mais pesado ele vai pegar.

— Estou privada da minha única manifestação de desespero?

Parou imediatamente de falar quando o treinador pairou na sua frente. O homem quase gigantesco sobrepunha alguns centímetros a altura de Giuliano, não tendo com certeza menos que dois metros. Caroline engoliu em seco pedindo a Deus pra sair viva daquele lugar.

O espaço era razoavelmente grande e bem organizado. De um lado ficavam tatames e do outro alguns equipamentos com peso de areia e sacos de pancada pendurados. Estava tudo vazio, indicando que o mestre Abel Weiss trabalhava de forma particular.

Giuliano o cumprimentou baixando o tronco, o imitou sem saber muito que fazer. Viu até um ensaio de sorriso no rosto do treinador que parecia tão sisudo. Talvez seu cumprimento foi torto o suficiente para fazer o homem rir.

— Trouxe uma amiga? — O homem questionou a Giuliano.

— Digamos que uma muito amiga minha.  

Caroline inspecionou o local com o olhar enquanto uma conversa baixa, mas calorosa, acontecia do seu lado. Sentiu-se tranquila por um minuto. Não seria nada demais, seria? Giuliano poderia ser vingativo, mas Abel era sério e concentrado no trabalho, não iria além dos seus limites físicos só para satisfazer a vingança desnecessária e boba de Giuliano.

Virou-se para o mestre de forma mais segura.

— E aí, qual vai ser seu Abel? É pra eu fazer o que? — Ok. Isso parecia mais natural em sua cabeça. O homem lhe olhou dos pés a cabeça, medindo clinicamente sua estatura e estrutura corpórea.

— 1,57 e 51 kg não é? — Confirmou desinteressado em realmente saber o que sairia de sua fala, claramente seguro.

Caroline engoliu em seco.

— 52 Kg... Senhor. — O homem lhe olhou sério. Corrigiu-se, aterrorizada.

— 51. — Ele insistiu. — Para balança, por favor.

Até que pelo jeito bruto ele era gentil.

Subiu na balança aos olhos atentos do professor.

— Como? — Quase não terminou a frase de susto.

— Eu disse que era 51Kg.

— Eu tenho pena da sua esposa... Mestre Abel — Corrigiu-se de novo ao ver o olhar sério do homem sobre sua persona tão pequena. — Eu juro que depois dessa eu fico caladinha.

Escutou uma risada baixa de Giuliano atrás de si.

— Não me preocupo muito com isso quando estou com a minha esposa. Vai adorar conhecer ela Caroline. — Ele indicou o centro da sala. — Começamos o treino de Krav Magá pelo aquecimento e alongamento. Tem uma vida sedentária? Seu corpo não indica tanta flacidez, mas não parece saudável.

A primeira parte lhe fez rir orgulhosa, a segunda quase chorar por dentro.

— Eu ando muito, e ando muito de bicicleta também. Eu moro em Trento. — Acabou sorrindo mais do que a situação lhe permitia. — Não sou tão sedentária.

— Ela é. Não faz nenhuma atividade física, só as corriqueiras. Andar de bicicleta às vezes não é bem uma atividade física regular. E caminhar por necessidade também não se enquadra. — Giuliano corrigiu.

— Acho que o mestre Abel deve ouvir a mim, que estou dentro do meu corpo.

Mestre Abel assentiu.

— Se não é sedentária pelo menos mantém um nível leve de atividade... — Ele anotou numa ficha presa na prancheta de madeira.

Caroline mostrou a língua a Giuliano e se voltou ao mestre. A pobre prancheta quase não existia entre os braços do homem e seu corpo tremeu de medo.

— Você deveria me ouvir uma vez na vida sabia? — Giuliano sussurrou.

Caroline o ignorou com um sorriso vitorioso.

— Vinte voltas na sala, Caroline. Depois quero quatro séries de trinta pulos e três de quinze flexões.

— É o que? Moço eu não vou aguentar isso não. Vão ter que chamar o carrinho da emergência pra vir meu buscar. — Quase ajoelhou, mas Giuliano a segurou pedindo com o olhar que não falasse mais nada.

— Quatro séries de cinquenta pulos, então. — Ele sorriu mais uma vez para Caroline. Dessa vez não houve tanta felicidade da parte dela por isso. — Giuliano... Quero o de sempre, aumente mais uma série de flexões dessa vez.

— Isso é sério Giuliano? — A voz era mais fina.

— Ele vai aumentar de novo, fica calada. Eu disse para você que era sedentária. Você não quis que eu te ajudasse.

Caroline pegou uma das bolas de ginastica e jogou nele. Giuliano desviou indo para um canto da sala.

Abel Indicou que Caroline ficasse do outro lado e ambos começaram uma corrida ao redor dos tatames. Caroline não conseguia manter sequer as cinco primeiras e começou a caminhar quando mestre Abel estava atento aos movimentos de Giuliano. Ela só voltou a correr quando o treinador ameaçou aumentar a quantidade de voltas.

Enquanto quase morria para terminar as voltas Giuliano já terminava as suas e começava os saltos na corda. Pelas suas contas ele excedeu as suas humildes vinte voltas, mas não parecia nem perto de cansar.

Uma humilhação após a outra.

Realizou o resto de circuito se arrastando. Flexão não era um movimento que sabia executar com perfeição e precisou de ajuda pra terminar. Sentou num canto do tatame sentindo que seu pobre coração sedentário iria parar.

— Isso não acabou Giuliano! — Resmungou o vendo rir do vídeo que fez do seu sofrimento em forma de treino. — Isso é uma ameaça mesmo!

— Eu mal posso esperar por esse dia.

Não soube com certeza em que momento a mulher que agora estava do lado do Mestre Abel reapareceu, com certeza foi depois que começaram a correr. Giuliano levantou para falar com ela enquanto seu corpo só fez o esforço de acenar. Só lhe restara isso de energia.

— Rebeca Weiss. — Ela se apresentou.

— Caroline mortinha Martins... — Sussurrou assustada pela possibilidade de Mestre Abel ouvir.

— Eu sou a esposa do Abel, vim continuar com as demonstrações e a prática.

Caroline despencou novamente no colchão. Estava muito longe de acabar. Rebeca lhe ofereceu uma mão para que se erguesse. Caroline obedeceu mesmo que suas pernas tremessem mais que uma batedeira quando colocou os pés sobre o chão.

Abel os chamou e Rebeca iniciou a fala.

— O Krav Magá tem quatro princípios de vida: A coragem, equilíbrio emocional, paciência e respeito. A coragem se refere a enfrentar os obstáculos da vida, o equilíbrio é o controle das emoções para que elas não impeçam a sua ação. A paciência, já diz por si mesmo o que é. É mais ampla e acontece gradativamente. E o respeito a todas as pessoas e isso inclui seu inimigo. O oponente tem suas qualidades e defeitos, respeite-as.

Caroline mirou de canto de olho a maneira séria com que Giuliano encarava a luta. Quando se tratava de paciência e equilíbrio emocional era claro que ele seguia a risca. E com tudo que deveria acontecer em um dia com Giuliano, ele certamente deveria ter coragem.

Abel pegou uma arma de brinquedo que ficava numa pilha dentro de uma caixa de madeira. Era uma réplica quase real já que até o peso de uma pistola ela simulara com perfeição.

— Vamos imitar uma situação real de combate com um oponente com arma — O mestre se posicionou atrás de Rebeca empunhando a arma na parte de trás de sua cabeça e com um dos braços apertou o pescoço dela.

Foi quase como um filme de ação aos seus olhos. Rebeca com uma cotovelada atingiu o estômago do homem, se agarrou a arma girando o punho dele o forçando a largar e socou o rosto dele tantas vezes que perdeu as contas. Ela ameaçou atirar e obrigou o homem a deitar no chão aos gritos.

— Viram? — Abel levantou como se não tivesse acontecido nada. E de fato o rosto nem estava tão vermelho. — Aqui é uma situação pra ela de vida ou morte, não se reage assim a qualquer tempo e há de se considerar o tipo de arma, o modelo, e o tempo que o disparo leva para acontecer.

Ela apresentou a arma a Caroline e continuou:

— Aqui é o cão da arma, quando coloquei o dedo aqui eu interrompi o disparo. E quando me coloquei para puxar eu não estava na frente do cano, estava mais longe, com o corpo desviado da trajetória. Todo cuidado é necessário, afinal de contas, ele tem mais chances de me matar do que eu de desarmá-lo e sair com vida. Ou seja, não faça isso em qualquer situação para não errar e causar uma morte desnecessária, nesse caso a sua. Afinal, a pessoa pode não querer te matar, mas se você fizer isso e errar, ele terá o motivo e a raiva pra fazer o que antes não queria.

— Não vou fazer de jeito nenhum, pelo amor de Deus. Eu estou toda me tremendo — Caroline colocou a mão no peito e se encostou a Giuliano.

— Vamos repetir o movimento só que mais devagar — Abel instruiu.

E eles repetiram exaustivamente o movimento e seus detalhes, avisando sempre que isso era uma medida extrema e que não deveria ser realizada a qualquer custo. O Krav Magá envolvia equilíbrio emocional, se não houvesse na realização do movimento um controle das emoções você morria. Além do que o tempo de disparo de cada arma interferia diretamente na eficácia de cada golpe treinado. A realidade nua e crua.

Na hora da prática Giuliano executou tudo com uma expressão até entediada. Ele já deveria conhecer aquelas manobras, ao que pareceu ele há anos praticava Krav Magá e outras lutas. Na sua vez errou várias vezes e em alguns momentos até esqueceu que não tinha balas ou disparador de verdade e saiu correndo. Treinou com ele e essa parte foi a única coisa que fez todo mundo rir.

Tudo já se encaminhava para o término de aula. Giuliano estava sentado ao seu lado num banco acolchoado. Ambos bebiam água.

— Faz quanto tempo que treina? — Perguntou.

— Mais de dez anos. — Caroline o olhou procurando as razões. — Fui do exército. Escolhi treinar a autodefesa desde aquela época.

— Foi para o combate direto?

— Acabei participando muito mais na parte estratégica e de ações humanitárias. Ir para o combate exige muito tempo de formação e treinamento.

— Acho que é melhor se aproveitar da sua mente mesmo — Brincou tentando suavizar o clima. — Quanto tempo durou?

— Dois anos.

— Quando voltou foi para Universidade?

— Sim. Imediatamente.

— Fez que curso? — Continuou perguntando.

Giuliano instigaria curiosidade em qualquer pessoa

— Administração. — Respondeu tudo automaticamente como em uma entrevista.

— Terminou rápido então.

Giuliano estranhou a frase ser mais uma afirmação do que uma pergunta.

— Como sabe disso?

 — Vi na internet que com vinte dois anos já estava trabalhando nas indústrias da família... É toda aquela coisa de império industrial da sua família.

— Terminei antes do período regimental, fiz muitas disciplinas no inicio do curso, muito mais do que a grade preconizava e na realidade eu sempre trabalhei com os negócios da família. Pesquisou sobre mim?

— Algumas coisas. Sei que se tornou prefeito de Siena aos vinte e cinco anos.

— Quase vinte e seis — corrigiu. — Fui membro do conselho da cidade, depois prefeito.

— Fez mestrado e doutorado também... Como conseguiu isso tudo? — Parecia de certa forma admirada.

— Já tenho mais que vinte e nove anos — Ignorou os poucos anos a mais com um sorriso descarado. — Não é como se fosse uma coisa muito difícil.

— Como não morreu no mestrado? — A frase soou quase como um pedido de socorro.

Giuliano até riu.

— Você não vai morrer. Você tem outros pesos para carregar. Está em um local diferente, cultura nova, pensando em outro idioma constantemente isso tudo sobrecarrega sua mente e por consequência seu corpo... Exige muito de si mesma. É muito perfeccionista. — Virou o dialogo para falar sobre ela. — E você? Fez arquitetura antes de história.

— Andou pesquisando sobre mim? — Ficou realmente surpresa. — Onde achou isso? Que eu consiga alguma informação sobre você é meio que óbvio, mas eu sou em importância pra esse mundo a terceira pessoa depois de ninguém.

— É bem exagerada também...  Achei no seu currículo lattes. Trancou o curso no segundo semestre.

Caroline ainda estava surpresa.

— Não acredito que me pesquisou no currículo lattes! E sim, eu tranquei o curso. Não me identifiquei como eu achava que seria. Na realidade, acho que eu teria sido uma boa arquiteta se não tivesse meu coração em outro lugar. Não consigo fazer algo que não ame completamente.

— Acho que é feliz e boa no que faz como historiadora também. Principalmente como professora. Eu soube dos elogios que recebeu na turma que deu aula com o Luca... — Jogou outra informação e Caroline lhe olhou surpresa. — Eu tenho um conhecido que tem um neto na turma...

— Isso é sério? — Colocou a mão na cintura mesmo sentada. — Onde soube disso? Laura?

Ele afastou o corpo um pouco da euforia dela.

— O neto do meu colega. Já falei. — Ela não acreditou muito. — Eu ouvi os comentários que as suas atividades eram criativas e que não davam vontade de dormir na aula. Ele gostou de você.

— Qual é o nome dele? — Desconfiou que o portador real da informação fosse Laura ou o próprio Luca e ele só disse aquilo para lhe elogiar. Mas se houve isso mesmo queria saber. — Eu estou ansiosa, vamos, me fala.

Ela praticamente pulava do seu lado mesmo sentada. Era uma cena tão exagerada que não teve outra opção se não achar alguma graça.

— Marcel. O nome dele é Marcel e ele faz economia. Não me pergunte o período porque isso você deve saber mais do que eu.

Ela ficou pensativa caçando mentalmente o nome do aluno e tentando ligar ao rosto de alguém. Seus olhos se iluminaram.

— Sei quem é. Ele realmente tinha uma tendência em dormir na aula. Coisa que eu não julgo muito porque meu estômago sabe que lutei muito contra o sono e meu principal guerrilheiro era o café... — Divagou enquanto Giuliano lhe censurava mentalmente.

— Ao que me aparenta nesse discurso, desenvolveu gastrite... — Interrompeu o raciocínio desconexo dela.

— Tenha toda certeza! — Foi efusiva. — Mas em defesa do café, não foi só ele, foram às frituras, comer bem custa caro, pular muitas refeições...

Ela continuava falando de alguma coisa que certamente não estava prestando atenção, mas balançava a cabeça como se estivesse. Quando em algum momento ela parou para respirar ele aproveitou para interrompê-la.

— Você tem péssimos hábitos de saúde. Eu só confirmei hoje.

— Não me meça pelo tempo de universidade e quando eu escapulia terrivelmente de todo o tratamento — Riu de si mesma e com gosto da própria displicência.

Aquilo lhe chamou atenção. Não havia menção nos arquivos da pasta que recebeu de algum tratamento, não diretamente pelo ou menos.

— Que tratamento?

— Hormonal. — Limitou-se como se houvesse realmente algo mais naquilo que ela não gostava de lembrar.

Giuliano decidiu por investigar aquilo mais a fundo depois.

— Eu gostei. Apesar de que fiquei com medo... Principalmente de te machucar de verdade... — Pensou alto.

— Teria que fazer um pouco mais que isso pra me machucar... — Ironizou o jeito despreparado dela de se movimentar.

— Um dos princípios é que não deve subestimar seu inimigo. Não ouviu?

— É muito boa em aprender a teoria, mas não a pratica — Alfinetou de volta.

Fez um esforço para levantar seu saco de músculos doloridos. Esperou Giuliano se levantar para empurrar com pouco esforço o homem sobre o tatame usando exatamente a própria força dele. Ele tentou levantar e Caroline se apoiou no chão por cima dele.

Ela estava brincando feito uma criança.

Giuliano soltou o ar com a visão do queixo prepotente de Caroline e do sorriso convencido dela enquanto os longos cabelos escorregaram do coque mal feito e sacudiram-se no chão.

— Suportei sua arrogância demais, estava na hora de baixar essa sua crista, Giuliano.

Giuliano a desequilibrou em um braço, a fazendo cair sobre seu peito. Em seguida girou o corpo ficando na mesma posição, por cima, se apoiando nos braços e nos joelhos ao redor dela.

Caroline sorria sem ver maldade nas próprias atitudes até que algo nos olhos dele queimou seu peito e espinha por dentro lentamente e seu corpo arqueou com o susto de ter a mão dele em sua cintura. Com um puxão ele a fez se sentar no tatame.

— Eu sei por que se distraiu e não me filmou como eu pedi... — Falou baixo. Um sussurro em sua voz grave e imponente. — Não faça mais isso.

Com o corpo rijo dele tão próximo ao seu era difícil raciocinar, mas a curiosidade foi maior que o senso.

— Por que não?

Os lábios dele se movimentaram como se para falar algo, mas desistiu. Giuliano se afastou para pegar as mochilas e lhe jogou a sua.

Ainda estava aérea então acabou deixando cair.

Foram se alongar para ir embora e Giuliano lhe entregou a bolsa de novo. Para a sua surpresa mestre Abel fechou o local junto a Rebeca e os acompanharam no estacionamento.

Já se aproximava do carro de Giuliano quando Rebeca puxou assunto.

— Não brinque com fogo. — Foi direta. — Dá pra ver que gosta dele. É só olhar pra como olha pra ele e esse conto da amizade não me convenceu nenhum pouco.

— Com que fogo exatamente está falando? — Algo na voz de Rebeca lhe dizia que não era só do fogo carnal que ela falava. — Conhece ele há muito tempo, não é... Quer me falar algo?

Rebeca avaliou Caroline o tempo inteiro e obviamente tinha tudo a falar, todavia, muito a não dizer pela discrição natural de sua própria personalidade e que a situação exigia.

— Dá pra ver que tem pouca experiência em relacionamentos, muito menos com homens como Giuliano...  Ele é uma boa pessoa, só não costuma andar com mulheres tão inocentes. Talvez com você as coisas sejam diferentes... Só tome cuidado pra não se machucar.

— O conhece e sabe as mulheres com que ele andava?

— Ele é amigo do Abel faz muito tempo. Nunca me pareceu um homem com intenções amorosas... Profundas.

A fama realmente o precedia para os mais íntimos.

— Eu já sei um pouco sobre isso... — Respirou cansada de pensar. Por incrível que parecia quanto mais conhecia Giuliano menos o entendia e menos sabia das coisas que o cercavam. Tudo era rodeado de pedidos que tomasse cuidado, como se fosse quebrar a qualquer momento. Falam tanto que obviamente ele deve ser o responsável por muitos corações partidos — Obrigada por tentar me ajudar de algum jeito.

— Não me entenda mal. Não estou te desestimulado...  — Se culpou por dizer o que pensava e sentia.

— Eu sei que está intrigada e quer me ajudar. Eu agradeço.

— Mulheres com o coração e a personalidade que tem... Nunca foi o alvo de escolha preferido dele. Giuliano é arredio, distante... É uma pessoa fechada no geral. Você acha que conhece, mas não conhece de verdade. — Olhou para o marido conversando com Giuliano com certo receio. Na realidade tinha medo por Abel. Assustava a ideia de alguém machuca-lo e isso ter alguma relação com Giuliano.

— Eu sei como é... — Murmurou com conhecimento de causa.

— É como se você conhecesse, mas sempre tivesse algo mais que não sabe. Isso pode ser sedutor para algumas pessoas, mas você gosta de sinceridade. É só olhar pra você que vejo autenticidade. Exige verdade de tudo e todo mundo. Existem algumas dificuldades entre pessoas de caráter tão diferentes. Só cuidado para não colocar o seu coração em risco tentando achar o dele.

— Obrigada.  — Abraçou Rebeca mesmo que ela não fosse o tipo de pessoa que distribui abraços. Ela lhe correspondeu um pouco desconfortável. — Desculpa, é meio que hábito...

— Eu percebi que não é daqui mesmo. Seu sotaque.

— Eu sou brasileira. Vocês não são diferentes de nós, mas é que eu conheço muita gente meio fechada, tipo você, seu marido, Constanza e o Giuliano... Eu meio que atraio essas pessoas assim. Mas obrigada. Espero encontrar vocês em breve que Deus ilumine a mim e a você. Obrigada por ser uma porta-voz dele pra me ajudar.

A mulher sorriu com as palavras dela mesmo que não concordasse em si mesma se deveria ter dito ou não o que disse. O fato era que sua natureza sincera havia ganhado a guerra.

Viena, 18h08min da noite.

Nosso carregamento já foi enviado ao destino? — Norma falou ao telefone com o seu fornecedor mais recente.

Máximo Messina era o nome verdadeiro de um dos narcotraficantes mais poderosos da América do Sul e a pessoa mais próxima a seu mais novo alvo.

 Na verdade Caroline era seu tiro do homem morto, se algo desse errado seria nela que miraria suas esperanças de ganhar contra Giuliano.

Ao ver o nome de Caroline envolvido na polêmica boba da página de Karine soube que em breve Roberta começaria a ruir, Giuliano estava só começando e estava de algum jeito usando a brasileira. Se ele estava indo no caminho para destruir Roberta, ele viria em seu encalço.

Caroline não era só a namorada que Giuliano mantinha em segredo, mas uma mulher com relações muito controversas. Uma intercambista sem eira nem beira, que mesmo sendo uma ninguém conseguia manter ao seu redor pessoas poderosas demais para passar despercebida. Um elo estranho circulava ao redor dela em que ela conseguiu atrair sozinha e inocentemente quem mais poderia protegê-la e também destruí-la.

Matá-la dispararia uma rede, um pavio que logo explodiria se ela evaporasse.

Já sabia que Máximo era obcecado por ela, ele espionava Caroline por todos os lados. Um homem que faria de tudo para poder subjuga-la. Inclusive matar quem ousasse tirá-la dele, e essa loucura certamente a incluía, assim como fez com todas as outras. A paixão e obsessão fugaz são tão intensas quanto o ódio de ser rejeitado.

Uma mínima fagulha e Máximo tiraria Caroline do universo sem pestanejar e sem relacionar de forma concreta Norma a nada.

Ela investigou tudo para saber minimamente que Luca Bocarelli não era somente o orientador de Caroline, mas um homem apaixonado. Era o boato que corria de forma lenta e silenciosa por Anika, uma professora que conviva com os dois. E ele é muito mais perigoso do que a figura de professor universitário conseguia esconder, havia um medo em alguns lugares quando se pronunciava o nome Luca.

E do outro lado havia Giuliano, quem realmente Caroline via com outros olhos. Eles estiveram juntos a tarde inteira numa academia de luxo que Giuliano frequenta.

Giuliano imaginou corretamente que se tirasse Caroline de perto de Máximo seria como atear fogo em gasolina, ficaria tudo mais fácil para si, mas ele esfriou tudo não a tirando do lugar.

Perdeu o sentido das intenções do homem naquele momento.

Estaria ele sacrificando a segurança da mulher que é apaixonado por um jogo mental que poderia salvá-la, mas por outro lado destruí-la? O perfil emocional não indicava que Giuliano se afeiçoaria tanto por alguém para deixa-la exposta. A única coisa que pensou é que ela não era assim tão importante para ele realmente.

Era lógico, e não precisava ser muito inteligente pra isso. Giuliano Bocarelli não era um homem apaixonado o suficiente para se desfazer de toda sua carreira amorosa pregressa por uma mulher tão simples e que não poderia lhe oferecer nada. Era só um caso que em breve passaria.

Todavia, toda a situação lhe diria que por mais fugaz que fosse o relacionamento entre Giuliano e Caroline e desinteressado que fosse o homem pela segurança dela, se algo acontecesse, logo viria à vingança do próprio primo. Sabia por sua investigação que eles brigavam por tudo, decerto manteriam um cabo de guerra por ela também. Toda a situação sinaliza isso.

A própria carne se autodestruiria. Mas se isso não acontecesse, havia mais algumas pessoas naquela equação. Alguém com um amor ainda mais pungente por aquela criatura e que rapidamente culparia Giuliano por ter permitido a presença de Máximo perto dela, como ele já vinha mantendo.

A razão de pensar isso?

A cada dia era mais alarmante a quantidade de pessoas que vigiavam os seus passos quando ameaçava se aproximar de Caroline. Ela tinha uma rede de proteção que provavelmente nem conhecia. E seria aquele mesmo pavio longo de pessoas, que agora lhe observavam, que se viraria para destronar Giuliano se ele lhe destruísse completamente.

As mãos de Norma se desataram quando se deu conta de que a displicência de Giuliano causaria sua própria destruição por aqueles que de fato a protegiam.

Caroline era realmente seu tiro do homem morto e foi criado dentro da falha de Giuliano.

A única coisa que necessitava era fazer com que as pessoas que agora lhe perseguiam por intencionar machuca-la percebessem que Giuliano não se importa. Se algo der errado com ela, serão a ele que irão culpar. Então, a guerra está vencida.

— Já está na estrada querida... — Ele me respondeu galante como sempre.

Se não soubesse o homem insano que habitava no dono daquela voz suave até pensaria em usá-lo para fins mais interessantes.

— Tenho uma viagem para Trento marcada... Podemos nos ver.

— Seria um enorme prazer recebe-la minha senhora... Não sabia que nossa relação seria tão próxima. Pensei que tudo se resumiria a encontros por telefone ou por nossos emissários.

Norma ri internamente.

— Tenho planos grandes pra você.

— Pode me indicar...

— Na realidade quero te dar muito mais que isso... — Soprou girando a cadeira para apreciar a vista.

Máximo arquejou ansioso.

— E o que seria?

— Sócios. Meu negócio tem rentabilidade alta. Eu gosto do jeito que trabalha e eu posso te dar o que você mais quer, só precisar ser leal, Máximo. Uma sociedade comigo abriria seus horizontes. As coisas aqui funcionam um pouco diferente, trabalhamos de forma mais evoluída.

A proposta encheu os olhos do homem.

— Como eu sei que está falando a verdade? Quero uma prova de confiança.

— É uma troca, você me apresenta algumas portas na América do Sul e eu abro as portas pra você aqui. Será o único fornecedor a trabalhar comigo. E acredite, uma pessoa como eu não se exporia dessa forma se não estivesse falando sério. Essa é maior prova de confiança que posso te oferecer. Revelar a minha verdadeira identidade.

Máximo ponderou.

— Certamente... O que quer de mim?

— O que mais quer Máximo? — Só dominaria Máximo se oferecesse algo que ele prezava mais que o dinheiro. — O que mais enche os seus olhos? Somos sócios, posso lhe oferecer muito. — Seduziu.

— Não pode responder minha pergunta com outra pergunta... Mas como vem de você. A minha bem feitora. Eu quero uma mulher. Uma que tem o meu desejo sobre ela... Mas antes de qualquer coisa eu quero baixar a arrogância de certo professor universitário. Dar a ele uma grande lição.

Norma sorriu. Máximo estava sendo inteligente e ingênuo na mesma proporção.

—Quero saber quem é ela... E ver as possibilidades com seus inimigos. Se efetivarmos a parceria, os seus inimigos serão os meus, e os meus, os seus. Mas, antes, eu quero que você coordene uma ação para mim, quero conhecer sua potencialidade.

— Uma ação? — Ele se interessou.

— Quero que exploda o carro de uma jornalista.

— Que jornalista?

— Sandra Verdelli. Ela está nesse momento na emissora que trabalha. Vai fazer uma participação no jornal noturno. Vou te passar um email, com senha e login, olhe as mensagens que estão no rascunho. Lá terá informações básicas sobre ela... Eu quero terror, a persiga, chame atenção, mas não pode mata-la. Tem uma hora para começar. Se perder, não será digno de mim, e eu infelizmente não correrei o risco de ser exposta por você. Segredo só é segredo quando só eu sei, não é? — Ameaçou. — Se ganhar, eu saberei que está apto o suficiente. Estarei aguardando e sabendo de tudo, se falhar em um único minuto, não conversaremos mais. Se acertar, o nosso contato será feito por esse email, no rascunho.

Era difícil, quase impossível. Mas sabia que Máximo não desistiria. Não quando

— Norma... — Ele hesitou, desconfiado.

— Temos um acordo Máximo?

A vida era cheia de riscos. Era tudo ou nada, mas acertasse, teria tudo o que seu coração mais desejava.

— Sem sombra de dúvidas, Norma.

Quando desligou a ligação, Norma apertou o celular contra o peito.

Sabia que Giuliano correria para proteger a jornalista que o entregou aos lobos por meio de Giovana, afinal, se ela morresse ele seria o primeiro acusado. E o mais coincidente era que com Sandra ele mantinha uma aventura secreta desde a Comissão de Veneza, quando ela era ainda uma simples repórter. Tudo o que precisava era que Giuliano provasse a todas as pessoas que protegiam Caroline que ele não estava com disposição de fazer o mesmo e não demoraria a que eles o retaliassem.

Exporia Giuliano aos seus inimigos da mesma maneira que ele expôs Giovana a Roberta.

Roma, 18h12min da noite.

Apartamento de Giuliano.

Caroline acompanhou abismado o leitor de íris destravar a porta quando Giuliano apresentou suas pedras malaquitas em forma de olhos pra ele. Encolheu-se até envergonhada em ver aquilo realmente acontecendo, achava que só existia em filmes.

Giuliano empurrou a porta grossa de madeira do apartamento, só havia outra porta semelhante naquele andar. Dava pra inferir que só existiam dois apartamentos por andar em todo o prédio. De certa forma, uma exclusividade para poucos.

Entrou completamente envergonhada agarrando a mala de mão prata que trouxe com seus pertences pessoais. O teto era alto, com forro de madeira imitando um telhado e a parede era de pedras vermelhas. Havia duas janelas grandes, mas uma delas dava para uma varanda coberta e larga, de longe só dava para ver algumas flores na sacada e uma mesa com duas cadeiras de vidro.

O sofá era enorme e inteiramente branco, não havia sequer sinal de risco ou mancha nele e do outro lado havia uma cozinha fechada por uma porta de correr de madeira, como estava semiaberta dava pra ver o inox brilhando da geladeira imensa.

Tudo ao seu redor misturava o novo e o velho. Ele parecia estar querendo deixar o apartamento Vintage e moderno ao mesmo tempo, era uma bagunça interessante, mas que funcionava bem. Incrivelmente bem ao ponto de passar uma sensação acolhedora mesmo que pelo cheiro do ambiente ele já estivesse fazia alguns dias desabitado.

Giuliano se deu conta de seu nariz coçando e abriu a janela da varanda e outra que ainda não tinha visto no final da cozinha. Andou atrás dele sem saber muito que fazer.

— O que achou? — Ele até parecia ansioso por sua opinião. — Como quase arquiteta que é.

Caroline até sorriu com a brincadeira. Já não entendia grande coisa de projetos quando deixou o curso no início e depois de tanto tempo, menos ainda.

— É bem menos escandalosamente chique do que imaginei. É acolhedor e não deixa de ser bonito, mas há riqueza nos detalhes. — Apontou com o olhar para o entalhe de madeira na porta de correr da cozinha e em seguida para as cortinas que com certeza deveriam custar mais que seu rim. — É bonito. Tem bom gosto.

Ele parou do seu lado de braços cruzados.

— Vou te mostrar os quartos. — Ele apontou para um lado da sala.

Seguiu atrás dele no corredor largo coberto por tapeçarias nas paredes cobertas por pinturas históricas.

— Retiro o que disse sobre a simplicidade. — Tocou no fio com os olhos brilhantes.

— É herança de família. — Justificou.

— Não significa que não seja caro — Retrucou. — Mas não posso te punir por ser rico, posso? No caso por você e sua família serem podres de rico. — Apertou os ombros dele enquanto ele ainda andava na sua frente.

Giuliano revirou os olhos.

— Não vai se sentir acanhada aqui. É quase no mesmo nível da casa de Trento e lá você já quase quebrou alguns copos. — Recordou. — E eu vou me sentir melhor se não acrescentar o podre antes de rico.

Ele parou em uma porta e a abriu. Havia um colchão sem lençóis e uma janela fechada. A primeira coisa que ele fez foi abri-la e em seguida pegar uns lençóis limpos no armário alto. Deu graças a Deus por aquilo, não iria alcançar sozinha e tinha até medo de arranhar o chão arrastando uma cadeira.

— O apartamento não é grande a ponto de você conseguir se perder, mas aqui do lado é o meu quarto, se precisar de alguma coisa pode bater na porta. — Ele apontou com o queixo para o quarto no final do corredor. — No seu caso vai entrar sem bater mesmo...

— Está me chamando de mal educada?! — Cruzou os braços.

— Espontânea. — Reconsiderou.

Muito habilmente e antes mesmo que percebesse Giuliano já tinha posto os lençóis na cama e as fronhas dos dois travesseiros.

— Eu não sabia que era tão prendado... — Admirou o jeito rápido e zeloso que ele fez tudo. Nem dava para acreditar que um homem daquele tamanho tivesse tanto talento para tarefas domésticas como colocar lençol de elástico, que era a pior coisa que o ser humano inventou no sentido de praticidade em ser posto. — Não me surpreenderia se soubesse que você mantém isso aqui sempre arrumado e não recebe ajuda de ninguém na limpeza. Até que é um ótimo dono de casa... A casa de Trento não era só pra se exibir pra mim não é?

— Tenho muitos mais talentos a ser apreciados... Mas tenho uma pessoa que faz uma limpeza mais pesada uma vez a cada quinze dias, de resto eu mantenho.

Caroline começou a fantasiar em poucos segundos Giuliano de calça moletom, camiseta florida, uma vassoura na mão e uma flanela pendurada no ombro, um som ligado com alguma música antiga e brega e para completar o visual e situação um pano amarrado na cabeça para proteger os cabelos da poeira junto a um balde cheio de água suja e a pose de qualquer velha faxina da mão apoiada no quadril admirando o chão limpo.

Explodiu em risadas e os olhos se encheram de água enquanto Giuliano sem entender a razão das risadas lhe olhava com o semblante cheio de seriedade. A barriga chegou a doer imaginando Amado Batista como trilha sonora para a faxina dele assim como era a da casa das suas tias.

Era tão destoante que se mostrava cômico.

— Desculpa... — Guardou algum ar e se amparou no criado mudo enxugando o suor.

— Posso saber a razão de tanto riso? — Ele realmente nem imaginava o que se passava na cabeça da mulher.

Caroline se aproximou do homem, tocou seus ombros largos e as bochechas firmes. Em seguida foi no cabelo loiro escuro bem arrumado, despenteando os fios que ele insistentemente colocou pra trás enquanto arrumava a cama.

— É que não dá pra imaginar que um homem como você faz faxina... Eu imaginei uma coisa tão cômica que me descontrolei.

— Homem como eu? — Ele cruzou os braços resultando nos músculos do peitoral saltando.

Caroline suspirou vendo que de algum jeito ele parecia ofendido. Roubou um selinho como quem pede sorrateiramente por desculpas e continuou o carinho nos fios lisos da nuca dele.

— É que é tão elegante... tão aristocrático e sofisticado que eu não consigo te imaginar fazendo coisas que nós, os mortais fazemos. Entende?

A tensão do rosto dele suavizou um pouco.

— Eu sou bem mortal Caroline...

— Eu sei que é... A sua postura impenetrável e tão refinada me fazem esquecer um pouco. — Murmurou fazendo charme. — E é um ser humano tão fofo arrumando as coisas... É tão bonito que me deixa desconcertada. E com certeza vou me aproveitar desses seus talentos quando eu tiver uma faxina bem grande pra fazer.

Ele sorriu de canto recebendo mais uma vez os lábios dela contra os seus, curvou-se aprofundando o beijo e os dentes pequenos dela lhe proporcionaram uma mordida suave e inocente na ponta dos lábios quando se separaram. Apertou a cintura fina acariciando as costelas sensíveis e insistiu em ter seus olhos escuros nos seus mesmo que ela ameaçasse se afastar.

Não seria assim dessa vez. Não haveria uma despedida tão prematura.

Caroline tinha pouco ar em seus pulmões e eles escaparam mais fortemente quando Giuliano dedilhou seu pescoço e subiu o toque lentamente até suas bochechas, erguendo alguns fios de cabelo e arrepiando seus ombros. O homem tomou sua boca, roubando o resquício de ar, de fôlego e seu coração se assustou novamente e lhe minou o resto da noção do tempo-espaço.

Não existia tanto medo ou insegurança de nenhuma das partes, eram como velhos conhecidos naquela arte que já sabiam exatamente o que fazer, e foi com a intensidade que começaram que se separaram sem que de fato ele soltasse suas costas.

Ela o perguntava com o olhar o que havia acabado de acontecer enquanto seu corpo respondia a insegurança penetrante que lhe tomava se encolhendo e se cobrindo com os braços. O peito subia e descia buscando por ar e alívio para o estômago gelado. Encostou a testa no peito dele torcendo que ele entendesse e lhe amparasse, pois suas pernas trêmulas não estavam com capacidade para tal ato.

— Acho que sentiu muito a minha falta... — Sussurrou com um sorriso letárgico.  

Sentia-se segura. Tão segura ali nos braços tensos de Giuliano que era como se pudesse voar sem sair do lugar.

Sentiu um murmúrio positivo em seu ouvido quando ele enfiou o rosto na curva de seu pescoço e depois a apertou num abraço que quase a tirou do chão.

— Foram muitos dias sem te ver... E o fato de me morder também influenciou... — Disse sabendo que ela deveria estar da cor de um tomate.

— Foi sem querer — Não foi tão sem querer assim, mas não diria aquilo tão alto.

— Uma pena porque gostei...  Sempre gostei. — Puxou o rosto dela do próprio peito. — Sempre fez isso, Caroline, só que dessa vez senti segurança para retribuir a insolência com outra insolência.

— Eu nunca notei que fazia, sabia? — Fez a desacreditada.

— Agora que sabe pode fazer consciente.

Caroline balançou a cabeça e assentiu, recebendo um beijo na testa.

— Aonde quer me levar hoje noite?

— Eu pensei em jantarmos fora, em Tivolli e conhecer a Villa D’Este... Uma parte dele pelo ou menos já que o Palácio é enorme é mais bem apreciado durante um dia de sol.

— Ele não é aberto à noite não é?

Giuliano negou.

— Eu conheço algumas pessoas e estenderam um pouco o horário... Vou te deixar se arrumar.

Ele trancou a porta quando saiu.

Caroline olhou ao redor procurando a malinha que trouxe. Agradeceu aos céus por ter uns sachês de shampoo e condicionador que estavam guardados há pelo menos uns dois anos ainda válidos escondidos num bolsinho. Secou o cabelo com a toalha sabendo que estaria péssimo e todo amassado em algumas horas, mas era o que dava pra fazer.

Pegou o macacão longo preto o vestindo numa correria insana por medo de se atrasar e como a bota não cabia na mala acabou pegando a sapatilha mais coberta que tinha e para não tremer de frio o tempo inteiro pegou o casaco preto e grosso de todos os dias.

Corrigiu as olheiras com a maquiagem e deu algum destaque nos olhos com um lápis preto e um jogo de sombras terrosas claras. Olhou-se no espelho do banheiro e até que não parecia tão mal para algo feito as pressas.

Colocou perfume já no corredor e arrumou a bolsinha de mão encostada na porta do quarto.

— Giuliano — Chamou na porta do quarto que ele indicou que o pertencia. — Já estou pronta. Se quiser ir, já podemos.

— Entra Caroline... — Ouviu ele lhe chamar e estranhou.

Timidamente destrancou a porta e colocou a cabeça para dentro. Ele estava de calça jeans, suéter azul escuro com a gola branca da camisa a mostra. Havia um cardigã preto em cima da cama o esperando e o cheiro do perfume amadeirado pelo ambiente.

O quarto era amplo e uma cama reinava no centro, no canto da parede e ao lado da porta havia uma estante com gavetas e portas, um guarda-roupa aberto.  Outra porta trancada do outro lado deveria ser o banheiro. A parede da cama tinha pinturas em tons de dourados do teto ao chão e as outras eram pintadas em um tom de cinza claro.

E o mais interessante. Não existia uma única poeira fora do lugar.

O pensamento de que Giuliano era o tipo de cara que organiza até as cuecas por cor lhe fez ter que controlar o riso.

— O que foi? — Apertou as próprias mãos, envergonhada quando ele lhe observou por algum tempo. — Não deu pra fazer muito com meu cabelo sem secador... Estamos fazendo de tudo para não passarmos vergonha.

Giuliano se aproximou, beijando sua mão.

— Se eu dizer que está linda me chamará de bajulador... — Acariciou sua bochecha com os olhos presos aos dela. — Você é linda.

— Bajulador... — Acusou, irônica. Arrumou a gola da camisa que estava levemente virada. — Perto de você eu estou no máximo arrumadinha, mas para o grupo de pessoas de beleza abaixo da média, eu pertenço a esse grupo, até que eu estou no nível razoável.

Ele riu balançando a cabeça de um lado a outro.

— Não fale tudo que pensa o tempo todo... E eu tenho um presente. — Ele a viu ficar desconcertada de surpresa. — Eu pensei bastante no que te dar...  Eu sei que se afeiçoa por presentes significativos.

— O que vai me dar Giuliano? Eu não te trouxe nada...

— Feche os olhos... São duas coisas. Eu vou colocar em suas mãos.

Obedeceu com o coração saltitando no peito. Sentiu um peso na mão. Era algo quadrado e bem pesado. Bem mais do que imaginava.

— É um livro? — Parecia um livro ao seu toque mesmo coberto pelo papel liso de presente. — Uma enciclopédia?

— Abre os olhos — Ele instruiu. Caroline rasgou o papel. Os olhos ase arregalaram imediatamente.

— Uma bíblia? — Era talhada com bordado em rosas. O papel era envelhecido e tinha uma trava na frente.

— É a sua cara. Quando encontrei, lembrei imediatamente de você. — Afirmou e ela concordou agarrada com a bíblia como se fosse uma pessoa. — Ela tem 300 anos. É uma antiguidade, está  na família desde que foi escrita a mão.

— Não pode me dar isso... Giuliano ela deve ser uma fortuna e deve ser tão pessoal pra sua família... — Estendeu de volta pra ele. Ele se recusou a receber. — Certo... Desculpe é mal educado recusar um presente.

Ele concordou e pediu que fechasse os olhos novamente.

— Esse vai ficar mais fácil de saber... — Ele soprou colocando um cordão de metal em seus dedos.

Caroline dedilhou o formato do pingente e sem conseguir sequer formular o que seria, abriu os olhos. Lá estava o Aslan, o rosto na verdade. Amava as crônicas de Nárnia, amava C.S Lewis e a maneira como explicava o cristianismo de maneira tão linda em tudo o que escreveu.

— Como sabe que eu gosto?

Ele sentou ao seu lado colocando a bíblia no colo.

— Suas frases de legenda no instagram. Grande maioria frases do filme ou do próprio autor...

— Olhou meu instagram?!

— Sim, inclusive as fotos antigas do ensino médio. — Ela escondeu o rosto entre as mãos. — Na verdade já faço isso faz um tempo. Você me procura no google eu faço o mesmo no instagram.

— Tem instagram mesmo? Com o seu nome real?

— Mantenho dois. Um oficial para a assessoria e um pessoal. Já te pedi solicitação, mas você não me aceitou... Tive que pedir ajuda a Laura, de novo.

— Vou aceitar daqui a pouco quando me mostraro seu Instagram pessoal... Namoramos há tantos dias e não me falou nada disso. Muito obrigada. Eu adorei. — Abraçou Giuliano pelo pescoço.  — Eu agora vou ter que descobrir algo que possa te presentear sem ser minha presença.

— O pingente é promocional do box de livros... — Ele empurrou com uma mão a caixinha lotada até o lado dela. Caroline piscou olhando para os livros e depois para ele como se não percebesse que ele estava lhe dando. — É seu. Pode pegar.

— É SÉRIO?! — Ela agarrou o box o abraçando da mesma maneira que fez com a bíblia. — Vou sair daqui carregada de felicidade! Eu amo os livros dele... Cristianismo puro e simples, cartaz de um diabo ao seu aprendiz... — Leu todos os títulos. — Eu tenho a versão digital que achei pra baixar, mas o cheirinho de livro é melhor, é sempre melhor!

Abraçou-o de novo, dessa vez o desequilibrando fazendo o cair sobre o colchão. Roubou um selinho dele e pegou os livros saindo do quarto.

— Pode deixar tudo no quarto que está. Depois você pega, amanhã na hora de ir...  O cordão pode usar agora, se quiser.

— óbvio que eu vou usar o meu presentinho... — Saio rapidamente colocando as coisas no quarto e retornando. — Agora podemos ir. Estou morrendo de fome...

— Não seria você se não estivesse.

Roma, 19h24min da noite.

O caminho até Tivolli foi feito na morosidade que o clima e as ruas estreitas e loucas de Roma permitiam. Apesar das buzinas, ultrapassagens indevidas e a dificuldade que os motoristas da cidade tinham de dar seta, Giuliano era um poço de calma e tranquilidade, provavelmente bastante acostumado a lidar com o sufoco que era dirigir ali.

— Tirar a carteira em Roma deve ser mais difícil do que em qualquer outro lugar do mundo... — Murmurou segurando no próprio cinto.

— Tirar a carteira não é o difícil... — Soltou o ar, como se estivesse entediado. — Difícil mesmo é viver aqui sem bater.

— Já bateu em alguém aqui?

— Não. — Pensou pouco antes de responder, como se ponderasse algo.

— Alguém bateu em você? — Estranhou. Afinal acidentes deveriam ser corriqueiros.

Giuliano dessa vez a olhou e franziu o nariz, duvidoso.

— Trabalha para o governo? É algum tipo de questionário de mobilidade urbana?

— Você pode ser sempre correto, mas sempre vai haver alguém errado... E a única pessoa do governo aqui é você. Obrigada por lembrar, já estava esquecendo. — Deu de ombros um pouco envergonhada pela própria dúvida.

— Nunca bati em nenhum outro carro. Satisfeita? Por que eu fui falar isso... Vai voltar a me impedir de te beijar porque trabalho para o povo?

Ela negou, balançando a cabeça e sacudindo os ombros num risada envergonhada.

— Bateu em uma pessoa? — Apertou os olhos.

— Quer minha ficha na polícia? Saber se sou um bom motorista? É algum tipo de critério estranho da sua personalidade exótica?

— Informações complementares, só isso. Não precisa responder se não quiser.

— Se eu me recusar a responder isso vai ficar paranoica?

Caroline riu, bem humorada, balançando a cabeça.

— Com certeza.

Ele fez algum silêncio buscando na memória ou tentando formular alguma coisa e depois soltou o ar como se a lembrança fosse pesada.

— Por pouco não atropelei uma moça. Ela atravessou muito rápido na minha frente, quase não consegui frear a tempo, mas eu estava indo devagar. — Caroline lhe olhou como se esperasse mais. — Faz muito tempo. Foi quando voltei de Bolonha para Siena. Tinha acabado de me formar.

— Pensei que tinha matado a moça. Fez uma cara...

Algo no rosto dele pareceu se modificar por alguns segundos e depois retornou a velha face de tranquilidade. Havia algo a mais naquela história que ele não ficava confortável em lembrar.

— É curiosa demais... — Forçou claramente o sorriso e depois suavizou novamente.

Caroline não via nele mais uma mínima ruga de preocupação e ao o mesmo tempo que isso lhe trazia paz, também lhe causava dúvida. Tudo o que Rebeca lhe disse se somava ao que Giampiero já tinha falado e o que ele mesmo disse.

O modelo de relacionamento amoroso que Giuliano levava era muito distante do que era acostumada e isso a tirava do conforto que ele tentava a todo custo lhe passar nos mínimos detalhes.

Ele era acostumado a estar no raso e exigir profundidade em uma relação com alguém como ele sempre terminaria naquela máxima de que era curiosa demais. E de fato era. Mas não conseguia achar que era excesso se estavam namorando, se o propósito de estar ali é que se conheçam.

Sentia-se segura, mas os próprios medos inconscientes somados aos avisos que já recebera e a quantidade de vezes que ele lhe chamou de curiosa giravam na sua mente e mesmo que quisesse ignorar o borbulho de medo, eles estavam ali, muito presentes.

— É um homem muito fechado... Talvez. — Sugestionou.

— Misterioso cairia melhor.

— De fato tem seu charme. — Concordou mesmo que soubesse que havia muita coisa sempre ficaria as suas escusas.

Ao chegarem a Villa D’Este tudo já estava completamente escuro. O lugar era grande, mas tudo que conseguiu ver foi o grande palácio com as fontes com agua se erguendo do chão as alturas. A luz posta em ambientes estratégicos fazia tudo parecer um conto medieval. Ao longe viu a água caindo de uma cascata e dos lados havia duas piscinas enormes.

Giuliano pediu licença brevemente e entregou o celular que vibrava para Magno, que acompanhava toda a movimentação a uma distância segura.

Ele voltou a chamar sua atenção que estava perdida na imensidão de sons e no tamanho do palácio a sua frente.

— Só vai conseguir explorar tudo durante o dia. Podemos vir com mais tempo...

— Eu adoraria.

Caminharam por onde havia mais luz e mostrou algumas esculturas. Caroline parecia querer tocar em tudo e molhar a mão em toda fonte que aparecia, mesmo que isso significasse passar um pouco mais de frio. Voltaram à parte mais alta do palácio, o terraço. No canto, no lado de dentro do palácio, havia uma mesa para dois. A luz incidia naquela parte, mas todo o resto estava na penumbra.

— Vamos comer aqui? — Ela olhou ao redor.

De onde estava dava para ver a vista das piscinas, a fonte caia bem embaixo e os tons amarelados em meio a todo verde dominavam tudo de uma maneira que pareciam estar em um filme antigo. A fumaça gélida que corria todo ambiente só aumentava o clima romântico e as estrelas, perto de toda aquela escuridão, brilhavam muito mais.

Abraçou o corpo de Giuliano e sentiu os braços dele ao seu redor lhe retribuindo o carinho. Observavam a visão construída para encantar e as luzes distantes da cidade em um período de silêncio.

— Parece que acertei no local... — Ele tomou a atenção dela por alguns minutos.

— E como acertou...  — Os olhos dele pareciam brilhar mais ainda pela pouca luz.  — Obrigada.

Encostou o nariz com o dele e o beijou de forma lenta, em agradecimento. Ele apertou os braços ao redor de sua cintura de forma doce e curvou o corpo em sua direção pedindo por mais. Permitiu. Recebeu toda a avidez e doçura que Giuliano poderia ter em um beijo profundo, mas cheio de cuidado, como se fosse sua porcelana que necessitava de proteção.

Antes que o ar realmente fizesse falta, ela abandonou os lábios gelados dele e dedicou um beijo suave no queixo masculino. Giuliano sorriu reconhecendo aquele tipo de carinho.

— Como no nosso primeiro beijo... — Caroline fez carinho na bochecha dele. — Sabe que estamos parecendo um casal apaixonado...

Ele pareceu surpreso.

— E não estamos? Eu já te pedi em casamento, se eu não estiver apaixonado o que mais estou?

— É, estou apaixonada por você. Sem sombra de dúvidas... — Colocou a mão no próprio coração saltitante. — O que te fez se apaixonar por mim?

Ele manteve os olhos semicerrados como quem busca uma resposta um pouco distante, demorando de propósito para falar.

— O cheiro do seu cabelo — Apoiou as mãos no peitoral da sacada, ao redor da cintura dela e roubou o ar que passava fazendo os fios dançarem no vento. Caroline o olhou pedindo que ele falasse sério. — Sua bondade, amor... Esse jeitinho bravo e maluquinho. Atrapalhada, na realidade.

— Se apaixonou por isso? — Cruzou os braços, não intencionalmente limitando o contato com ele. — Se apaixonou pelos meus gritos e rebeldias?

— Me apaixonei no minuto que te vi cheia de raiva quando brinquei com você e o seu amigo...  Eu na realidade não conseguia entender o porquê a maluca que me deu um pisão no pé no meio de um tango e dormiu enquanto tomava café não saia da minha cabeça. Acho que já conversamos sobre isso...

 Caroline gargalhou escondendo o rosto em uma das mãos completamente constrangida.

— Seu coração bate mesmo acelerado quando me vê da mesma maneira que o meu quando te encontra?

 Ameaçou colocar a mão no peito dele. Giuliano segurou a mão que ia ao encontro de sua pele entrelaçou as suas, beijando os nós dos dedos finos dela.

— Exatamente do mesmo jeito.  — Roubou outro selinho. — Vamos jantar?

Caroline concordou e ambos caminharam até a parte coberta do lado de dentro. Giuliano puxou sua cadeira e se atrapalhou um pouco na hora de sentar. Uma mulher vestida de garçonete saiu de dentro de uma tenda com uma bandeja. Ela ofereceu uma taça de vinho a Giuliano e deixou um coquetel Bellini do seu lado da mesa.

— Achei que poderia gostar... — Ele apontou com o queixo para o coquetel de suco de pêssego com Prosseco.

Caroline anuiu mesmo que se fosse pra colocar algo alcoólico na boca preferisse vinho e o mais fraco que houvesse. Tomou minimamente protegendo a própria integridade afinal de contas bebidas com álcool nunca lhe caíram muito bem.

— Gostou? — Limpou um pouco de vinho no canto dos lábios com o lenço branco.

— Até que não é tão ruim quanto eu imaginava...  — Comentou enquanto a mesma moça colocava o antipasto na mesa.

Um prato com um pão molhado ao azeite e um berinjelas ao molho de queijo com alho e vários tipos de pimentão. Era algo um pouco mais adaptado do que já viu Pepe fazer na cozinha do restaurante. Com certeza para não lhe assustar completamente, mesmo que já vivesse na Itália há tempo o suficiente para entender o mínimo da culinária e da etiqueta, por mais que algumas delas não fizessem tanto sentido na sua cabeça. Era a cultura do local e ela deveria ser respeitada.

Comer na Itália era uma experiência a ser realizada com todos os sentidos e isso era feito de forma sagrada naquela mesa. Havia um silêncio confortável para que saboreassem.

Foi ali que notou que Giuliano cumpria todo manual de etiqueta a mesa à risca. Indo de quais lados estaria às taças até o jeito de se comportar e por os talheres.

O primeiro prato que veio logo em seguida foi uma sopa quente, na verdade um capeletti in brodo. O cheiro de alecrim encheu todo ambiente e acabou sendo uma pedida muito coerente pelo frio.

Magno surgiu atrás de Giuliano segurando o celular que ele havia o entregando minutos antes. Giuliano olhou o rapaz com certa dúvida como se buscasse a resposta nele. Magno assentiu e se afastou, se eximindo da responsabilidade.

Naquele ponto, Caroline já observava a situação e sentia que o clima não era o mesmo. Havia uma aura de preocupação em ao redor dos dois homens. Giuliano tinha a testa franzida e os lábios formavam uma linha fina observando a tela do celular, ele pediu licença e levantou da cadeira de uma maneira que mesmo que quisesse perguntar aonde ele iria não teria coragem para tal.

Sentiu um arrepio gelado por suas costas que não era causado pelo frio. Seja lá o que estivesse acontecendo lhe causaria dor mais cedo ou mais tarde. Era um pressentimento. Já havia sentido algo assim, mas esse era diferente. Era como um alerta de que algo maior do que poderia parecer estava acontecendo por suas costas e que em algum momento aquilo lhe maltrataria.

Apertou uma mão sobre o peito e o coração disparou de um jeito ruim que não conseguia entender. Magno tocou seus ombros atenciosamente lhe perguntando se estava tudo bem. Assentiu, afinal não tinha como explicar o que exatamente se passava em sua mente.

— Pode me dizer o que está acontecendo? — Seus olhos clamavam por resposta da única pessoa que poderia lhe dizer qualquer coisa no momento.

Magno balançou a cabeça negativamente.

— Vai ficar tudo bem com ele. Eu prometo. — Afagou seus ombros.

Caroline bebeu toda a taça de água de uma vez para empurrar o bolo que se instalara ali.

— Eu espero que todos fiquem...


Notas Finais


Página de Itália no Insta: @italiaoriginalfic
Beijos e até daqui a pouco. Espero que tenham gostado! <3
Me digam o que estão pensando e o que acharam, é muito importante pra mim receber esse feedback :D


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