1. Spirit Fanfics >
  2. Kiss me, Mors >
  3. Serendipidade

História Kiss me, Mors - Serendipidade


Escrita por: MoonyQueen

Capítulo 8 - Serendipidade


Fanfic / Fanfiction Kiss me, Mors - Serendipidade

NAHEE

 Nós podemos ser felizes, só precisamos fazer as escolhas certas.

As palavras de Taehyung ainda ecoavam em minha mente. Por mais que eu odeie admitir, seu discurso havia mexido comigo de uma maneira que nenhum outro fizera antes. Desde aquele dia me pergunto frequentemente se ele não tinha razão; talvez viver uma vida me torturando seria viver uma vida em vão.

Quanto às escolhas... O que eu deveria fazer a partir de agora? Honestamente, nunca parei para pensar na possibilidade de ser feliz, e agora o que eu mais me perguntava era: e se houvesse um jeito?

Escolhas...

“Quem era aquele rapaz do outro dia?” Levantei meu rosto para olhar minha avó após ter meus pensamentos interrompidos. Ela sorria para mim de sua cama enquanto eu despejava a água da jarra em um copo para que ela pudesse beber.

Desde a sua morte, quero dizer, do dia em que supostamente ela morreria novamente, eu a tenho visitado com frequência. Creio que Taehyung tenha razão, talvez minha presença ao seu lado tivesse feito total diferença, já que sua vida tinha se prolongado. Sendo assim, se eu pudesse esticar o tempo só um pouquinho mais... Minha avó era tudo o que eu tinha, por isso temia tanto perdê-la, mas sabia que este dia muito em breve chegaria, e eu deveria estar preparada para ficar sozinha.

“Ah...” Abri minha boca tentando estruturar uma frase convincente. Eu sabia que ela falava de Taehyung, só não sabia como iria me referir a ele. E, caramba, sua saúde não está das melhores, mas sua visão está muito boa, aparentemente. “Um conhecido.” Respondi-lhe com sinceridade.

“Ele parecia estar preocupado com você.” Seus olhos sorrindo em meia lua após eu lhe entregar o copo d’água e sentar-me ao seu lado.

“Ah, não, vovó...” Comentei, rindo de sua inocência. “Você não o conhece.”

Ela riu com mais vontade, como se a inocente, na verdade, fosse eu. Suas mãos enrugadas pelo tempo seguraram as minhas.

“Nahee,” ela começou, seu tom de voz como se fosse uma súplica, “seja feliz, me promete?”

Um nó se formou em minha garganta. Essa pergunta tão simples poderia ter tantas interpretações. Muito provavelmente ela também sabia que seu fim se aproximava, e se assegurar de que eu seria feliz sem ela antes de sua partida era importante, além disso, seu pedido era uma das questões a qual eu debatia mentalmente minutos atrás; eu deveria ser feliz?

Lágrimas se acumularam em meus olhos, mas me controlei para não deixá-las cair; não querendo que minha avó me visse chorando, a abracei.

“Eu prometo.”

_______________

E aquele foi o último abraço que lhe dei. Foi a nossa despedida. Naquela mesma noite, ela faleceu. Chorei por um dia inteiro, mas foi somente isso o que me permiti, agora eu estava sozinha e deveria honrar seu último pedido: ser feliz.

Mas por onde começar?

Eu nem sabia o que almejava, nunca parei para dar atenção aos meus desejos, eu apenas vivia por viver, mas... e agora?

Comecei a pedir aos céus que me enviassem um sinal; qualquer sinal que me indicasse qual caminho seguir.

“É por ali.” Arregalei os olhos ao ouvir uma possível resposta, mas era apenas Yeri apontando a rua para o nosso chefe. Estávamos em uma Van a caminho de um casamento – um buffet havia nos contratado para fazer a entrega de algumas bebidas emergencialmente, já que as que tinham lá estavam chegando ao fim – e Yeri sentava-se no banco da frente guiando nosso chefe enquanto olhava o endereço no celular.

Chegamos ao local, entrando por um portão aos fundos da mansão em que a festa acontecia, e, logo após estacionarmos, começamos a tirar as caixas de dentro do veículo.

“Vamos, rápido!” Nosso chefe começou a nos apressar. “Logo as bebidas da festa vão acabar e eles precisam de um estoque!”

Rapidamente, Yeri, eu, e mais dois de nossos colegas retiramos as caixas com as pesadas e caríssimas bebidas, e seguimos uma das organizadoras do buffet até o local em que deveríamos deixá-las. Fizemos esta viagem algumas vezes e, por sorte, não fomos vistos pelos convidados, já que nosso estado era deplorável. Devido ao suor, meu cabelo estava grudado ao rosto, e eu já tinha me livrado de minha jaqueta do uniforme de trabalho, ficando apenas com a camiseta branca e a calça jeans, claro. Yeri também havia se livrado da jaqueta e tinha feito um coque enquanto se abanava insistentemente.

Assim que terminamos, estava a ponto de ir para fora pegar um ar antes de partirmos, mas Yeri me segurou pelo pulso e me puxou por um corredor.

“O que você está fazendo?” Eu lhe perguntei alarmada. Ela apenas colocou seu dedo indicador sobre os lábios pedindo silêncio.

Após caminharmos pelo corredor e sairmos em outra parte do jardim, me dei conta de que Yeri havia me levado até o local da festa que, diga-se de passagem, era enorme. Mesmo sendo noite e a festa ao ar livre, o local estava muito bem iluminado por velas, o que dava um ar muito mais romântico ao ambiente. Havia flores por todos os lados, a impressão que dava era que, na verdade, a festa acontecia dentro de um bosque encantado.

Yeri me puxou mais para trás de um dos arbustos cuidadosamente podados.

“Vim ver a noiva.” Ela disse finalmente enquanto passava os olhos pela festa. “Você não tem curiosidade?”

Yeri sorria, parecia animada para ver a protagonista da celebração matrimonial.

“Talvez.”

Admiti, voltando a olhar a festa. Na infância, tinha o sonho de me casar, mas obviamente esse sonho foi destruído por um beijo. Ainda assim, achava tudo aquilo muito bonito.

“Ali!” Yeri disse entusiasmadamente em sussurro enquanto apontava para um local próximo à mesa de buffet da festa. “Olha ela ali! Que linda!”

Meus olhos, assim como os de Yeri, brilharam. A noiva era muito bonita, não só por sua aparência física, mas também por seu vestido – todo vestido de noiva parecia ter esse encanto de deixar qualquer mulher mais... celestial. E toda aquela atmosfera contribuía para esta imagem, um perfeito conto de fadas.

“Aah!” Yeri exclamou, se derretendo com a imagem à nossa frente. “Mal posso esperar para me casar também!”

Também gostaria de dizer o mesmo, mas acho que seria difícil encontrar um marido que aceitasse morrer toda vez que me beijasse. Bem, talvez se eu colocasse este pequeno detalhe no meu perfil em algum site de relacionamento...

“Ah, não!” Virei-me rapidamente para olhar Yeri, já que seu tom de voz já não era mais de encanto, mas sim de espanto.

“O que foi?”

“Não acredito!” Ela quase gritou, apontando na mesma direção da noiva enquanto me sacudia. “Ele tem namorada!”

“Quem?”

“Ele!” Ela bradou, apontando para o local com mais veemência. “O host que eu te falei!”

Meus olhos então se fixaram no lugar em que ela apontava. Meu estômago afundou. Lá estava ele, Kim Taehyung em pessoa usando um de seus ternos mais caros enquanto a noiva se aproximava para cumprimentá-lo.

“Ah, não.” Acompanhei o espanto de Yeri deixando escapar um suspiro. Confusa, ela se virou para me olhar, mas escolheu não dizer nada..

Por mais que a coincidência fosse muita – afinal, Seul não era nada pequena, e seguíamos estranhamente nos esbarrando – eu desejei de todo o coração que aquele não fosse o sinal divino que eu tanto pedia. Não, aquela não podia ser minha escolha de felicidade.

“Dá pra acreditar nisso?! E o pior é que a menina é bonita...” Yeri comentou em tom de choro e derrota. Foi então que, finalmente, notei a menina ao lado de Taehyung.

Sem dúvidas aquela devia ser a filha do dono da rede de hotéis a qual Taehyung estava interessado. E ela era bonita. Mais que isso, era linda, bem mais do que eu me lembrava. Mesmo usando um discreto vestido verde-água que ficava um pouco acima dos joelhos, ouso dizer que sua beleza se destacava ainda mais que a da própria noiva com seu vestido branco de princesa e seu cabelo bem arrumado e cheio de brilhos.

Como a vida era cruel. Dava muito para alguns, e pouco para outros.

Yeri e eu ficamos tão estupefatas com sua beleza – Yeri com inveja e eu me sentindo injustiçada – que não percebemos quando um estranho se aproximou sorrateiramente por trás de nós.

“Boa noite, meninas.” Uma voz grave logo acima de nossos ombros nos fez virar em um salto. Um rapaz um pouco mais alto que eu, pele branca, cabelos escuros e ligeiramente bagunçados nos olhava com interesse. Tive a impressão de já tê-lo visto antes. Bem, talvez já tivesse feito alguma entrega para ele.

Tanto Yeri quanto eu empalidecemos imaginando que fosse algum parente dos noivos que havia nos pego no flagra e agora nos colocaria vergonhosamente para fora. Não conseguia nem respirar ao me dar conta que poderia até perder o emprego depois disso. Yeri, sua idiota, por que eu a segui até aqui?

Mas então ele estirou seu braço em nossa direção, um celular em sua mão.

“Encontrei isso ali atrás. Alguma das duas deixou cair?” Ele perguntou inocentemente.

Deixamos o ar que estava preso em nossos pulmões escapar e começamos a tatear nossos bolsos em busca de nossos celulares. Yeri encontrou o seu no bolso de trás da calça jeans, já eu seguia tateando meu corpo por todo lado.

“Acho que... é meu.” Concluí com insegurança, ergui minhas mãos para pegar cuidadosamente o celular das mãos do estranho e confirmei que, de fato, era meu. “Obrigada.” Lhe agradeci com a cabeça abaixada – a vergonha era grande. “Desculpe, não foi nossa intenção invadir a festa, nós só...”

Enquanto tentava me desculpar pela invasão, sentia minhas bochechas queimarem, e Yeri mexia com seus dedos nervosamente. Olhei rapidamente para o homem para ver sua reação, mas ele parecia apenas confuso e, então, parecendo se dar conta de algo, começou a rir e a sacudir suas mãos à nossa frente.

“Ah! Não! Não! Só estou aqui trabalhando como vocês. Não sou convidado da festa.”

Yeri rapidamente perdeu sua vergonha e o encarou logo após dar um suspiro.

“Por que não falou logo? Eu já estava quase infartando.” Ela lhe disse, colocando uma de suas mãos sobre o peito.

Silenciosamente, eu também tentava fazer meu coração desacelerar.

Ele apenas continuou rindo e, então, estendeu sua mão novamente para nós, mas dessa vez para que o cumprimentássemos.

“Meu nome é Min Yoongi. Sou músico, e estava tocando naquele piano bem ali...” Ele nos fez olhar para o local que apontava, uma área da festa onde o resto da banda ainda tocava com o saxofone e o violino, mas o pianista estava ausente. “Mas tive que sair para ir ao banheiro.” Ele concluiu, rindo nervosamente.

Deixei um ‘ah’ escapar enquanto meus lábios ficaram ligeiramente entreabertos.

“Sou Nahee, e esta é Yeri.” Nos apresentei. “Nós só viemos fazer uma entrega, já estamos indo embora.”

“Ah, que isso! Aproveitem que estão todos distraídos com a festa e deem uma volta por aí.” Ele disse nos puxando para um outro canto do jardim. “Já viram o lago?”

Ouvi Yeri deixar escapar um ‘uau’ admirada, mas meus olhos ainda não tinham se fixado no lago. De longe, percebi que a noiva se aproximou da tal ’10 bilhões’ - que Taehyung tanto falava - para conversar, enquanto ele se afastava para brincar com algumas crianças... próximo ao lago. Foi aí que reparei naquela água cristalina que refletia a lua. Uma paisagem e tanto.

“Bem, aproveitem a noite, meninas, não é sempre que podemos agradecer por sermos brindados com uma noite tão bela como essa, não é mesmo?”

Agradecer... É verdade, agradecer!

Assim que o tal do Yoongi se despediu e voltou ao seu posto no piano, me virei para Yeri.

“Pode ir, eu preciso fazer algo antes.”

“Fazer o quê?” Ela me olhou confusa. “Nós precisamos ir embora, o chefe já deve estar louco.”

“Eu vou... Olhar o lago.” Menti. Em partes. “E já estou no final do expediente, depois daqui eu posso ir embora direto para casa. Sozinha mesmo.”

“Hum... Entendi.” Yeri disse, me olhando desconfiada enquanto começava a se virar para voltar aos fundos do jardim, onde a Van nos aguardava. “Você é louca.”

Após concluir sua fala com esta fascinante constatação, ela finalmente me deu as costas e foi embora.

E eu respirei profundamente. Sabia o que estava a ponto de fazer, só não sabia o porquê. Ou melhor, sabia também o porquê, só não sabia se ele merecia isso. Enfim, muito em breve eu descobriria se Taehyung de fato era um sinal enviado pelos céus ou não. Apesar de ainda duvidar muito. Mas eu precisaria me arriscar.

Desci as escadas de pedra que levavam até o local da festa, bem sorrateiramente, pois temia ser vista por alguém. Todos estavam muito elegantes, se me vissem com meus tênis, calça jeans e camiseta branca, saberiam logo que eu era uma penetra.

Após descer o último degrau, me esgueirei por um caminho de arbustos que levava até o lago, por ser noite, eu conseguia passar despercebida, só tinha que tomar cuidado com a luz do luar; por ser lua cheia, mesmo sem a iluminação da festa ali, tudo estava muito claro.

O lago era circundado por ladrilhos também de pedra, vagalumes voavam aqui e acolá, e sapos coaxavam à distância.

Taehyung estava brincando de pique-pega com as crianças, mas os advertiu para que não chegassem próximos à beira do lago para não caírem. Imaginei que ele estivesse fazendo aquela cena para chamar a atenção da tal garota riquinha, afinal, era uma boa maneira de tentar mostrar seu lado ‘não-babaca’. Mas, surpreendentemente, ele parecia estar se divertindo genuinamente com aquelas crianças, parecia ser mais uma no meio delas, correndo para lá e para cá, mas não deixando de protegê-las para que não caíssem no chão ou no lago. Talvez esse lado ‘não-babaca’ não seja apenas uma peça da minha imaginação.

Assim que as crianças se afastaram um pouco, eu me aproximei mais.

“Hey.” Eu o cumprimentei timidamente após sair detrás do arbusto.

“Ah!” Taehyung exclamou, colocando uma mão sobre seu peito. Começou a olhar à sua volta desesperadamente com os olhos arregalados, e então se dirigiu a mim e me segurou pelo braço, voltando a me arrastar para o arbusto perto do lago. “Aish! O que você tá fazendo aqui?!” Ele perguntou rispidamente. “Não me diga que quer voltar ao passado logo agora?”

As últimas palavras ele disse entre dentes. Girei meus olhos.

“Não. Eu vim fazer uma entrega aqui e, veja que coincidência, infelizmente te encontrei.” Taehyung me olhava com os olhos estreitados e o cenho franzido. Deixei um suspiro escapar. “E aí lembrei... Que eu tinha que te agradecer.”

“Agradecer?” Ele parecia confuso, inclinou sua cabeça ligeiramente para a direita, como um cachorrinho quando não entende o que seu dono diz.

“É...” Comecei a mexer nervosamente na barra de minha camiseta enquanto começava a sentir minhas bochechas queimarem. Ser legal com ele não era tão fácil quanto eu imaginava. Mas eu não deixaria de ser educada. “Por minha avó. Por ter ido ao hospital comigo... Por tudo.” Consegui falar, mas sem olhá-lo nos olhos.

“Ah...” Taehyung deixou um murmúrio de entendimento escapar, seus ombros relaxaram finalmente. “E sua avó, como está?”

“Ela faleceu ainda esta semana... Mas eu meio que já estava tentando me preparar para isso.” Eu lhe disse, dando um sorriso forçado e triste. “Apesar de ter falhado nisso.” Este último disse em um sussurro.

Taehyung somente fez um ‘hum’, parecia não saber muito bem o que falar ou o que fazer, na dúvida, acabou colocando suas mãos dentro dos bolsos da calça enquanto fixava seus olhos em algum lugar do chão.

“Bem, é isso...” Disse, mordendo por alguns breves segundos o lábio inferior. “Eu vou indo.”

“Espera.” Taehyung me parou antes que eu pudesse me virar para seguir o meu caminho. “Será que-.”

“Taehyung?” Pude ouvir uma voz feminina e doce se aproximando de nós, assim como seus saltos batendo sobre o caminho de pedra. “As crianças disseram que você estava aqui...”

Arregalei meus olhos, não sabia o que fazer. Quando olhei para Taehyung ele tinha a mesma expressão que a minha. Okay, ele também não tinha a mínima ideia de como agir.

Decidi me virar e sair correndo em direção à escada em que havia descido. Sairia pelos fundos e ninguém notaria minha presença ali. Mas assim que me virei, senti uma mão firme me segurar pelo braço e me alavancar para o lado. Tudo foi tão rápido que só me dei conta do que havia acontecido quando me vi encharcada, cuspindo água e tentando tirar as mechas de cabelo que tapavam meus olhos. Taehyung havia me jogado no lago.

Esse...

“Que barulho foi esse?” Escutei a garota perguntar, estavam bem acima de mim. Parei de me movimentar para que ela não percebesse minha presença ali. Para conter minha raiva, fechei meu punho com todas as forças. Por sorte o lago não era fundo, então conseguia manter meus pés no chão enquanto me escondia atrás de uma pedra com lodo.

“Não sei...” Ouvi Taehyung dizer. “Um sapo, talvez?”

Sapo...?

Ah, Taehyung...

“Tem sapos aqui?” Ela perguntou parecendo um pouco alarmada. “Enfim... Eu vim aqui me despedir, já pedi ao meu motorista para me buscar.” Motorista, huh?

“Por que não me disse antes?” Ele perguntou. “Eu te acompanho até o carro.”

Após ela aceitar, ouvi os passos dos dois se afastando. Como esse idiota ousava ser tão cavalheiro logo após me jogar em um lago?

Finalmente me levantei, tremendo de frio; na hora em que caí não percebi, mas apesar do tempo ameno que fazia hoje, a água estava gelada. Sentei-me na beira do lago, torci meu cabelo, retirando o excesso de água, também tentei dar um jeito na camiseta e na calça, mas sem sucesso; estava encharcada e demoraria um século para que secassem.

Logo após terminar de tirar a água que tinha se acumulado dentro do tênis, ouvi passos novamente. Pensei em voltar para dentro do lago – afinal, agora não fazia mais diferença mesmo, certo? – mas foi Taehyung quem apareceu. Fechei a cara.

“Você tá bem?” Ele perguntou, abaixando-se para me olhar.

Girei meus olhos.

“Bem, tirando o fato de ter engolido meio litro de água, ter nadado com girinos, estar encharcada e ter que voltar para casa assim, estou bem. Muito bem. Acho que nunca estive melhor.” E então me lembrei de algo. “Ah! Meu celular!” Tateei o bolso detrás e o tirei de lá. Por sorte ele ainda estava vivo e bem. Suspirei aliviada. “Viu? Olha que dia incrível.” Concluí sarcasticamente após lhe mostrar o celular.

Assim que coloquei o tênis me levantei. Taehyung apenas me observava como se eu fosse a coisa mais interessante de toda aquela festa. Que humilhação, e isso tudo porque eu fui dar uma de legal e educada.

“Vou embora.” Anunciei, dessa vez me virando para sair dali de uma vez por todas. Entretanto, Taehyung me olhou estranhamente, seus olhos ligeiramente arregalados.

“Aah... Acho que seria uma melhor ideia você ir lá para casa antes.”

O quê? Voltei a me virar para encará-lo confusa, mas Taehyung não me olhava nos olhos.

“Por que eu faria isso?”

“Porque... Você pode pegar uma gripe...?” Ele disse, sua afirmação parecendo mais uma pergunta no final, logo percebi incerteza em sua voz e coloquei minhas mãos sobre a cintura. “E minha casa é a mais próxima daqui.”

Mordi meu lábio.

“Isso não faz sentido. Eu provavelmente já ficarei gripada de qualquer maneira. Vinte ou trinta minutos a mais até minha casa não farão diferença.”

Girei meus olhos e voltei a lhe dar as costas para ir embora.

“Então toma isso.” Ele voltou a falar, quando me virei, ele estava tirando seu paletó e o entregava a mim. Mas dessa vez desviou seu olhar completamente.

Por um momento me senti tocada por seu ato de bondade, isso não era nada comum nele. Ele estava realmente preocupado comigo?

“Por quê...?” Eu lhe perguntei, ainda sem pegar o casaco de suas mãos.

“Aish!” Ele reclamou. “Tentei ser discreto, mas com você não dá!” Ele voltou a me olhar irritado. “Olha para baixo!”

Olhei para meus pés, não reparei em nada de errado a não ser no som irritante que meus tênis agora faziam ao caminhar.

“O que tem?”

“Não aí...” Foi a vez de ele girar os olhos e passar sua mão livre nervosamente pelo cabelo. “Sua camiseta.” Ele voltou a dizer, desviando o olhar.

Baixei meu olhar para onde ele indicava, minhas bochechas imediatamente ficaram vermelhas e eu senti meu rosto ficar em chamas. Em um rápido movimento cobri o peito com meus braços.

Como tinha o costume de usar sempre preto, esqueci que usava a camiseta branca do trabalho, e é de conhecimento geral o que acontece quando uma roupa branca fica molhada; logo, meus peitos e meu sutiã rosa estavam em evidência.

Taehyung jogou seu paletó sobre mim, e eu finalmente o aceitei, dessa vez sem fazer manha ou pirraça. A essa altura eu não conseguia nem pensar direito.

“Vamos.” Ele disse, me segurando pelo braço e me tirando da festa. Evidentemente saímos pelos fundos, chamamos um táxi e – assim como ele disse – em alguns minutos chegamos à sua casa. Fato, a casa dele era bem mais próxima do local da festa do que a minha.

Ao subirmos as escuras escadas de seu prédio, assim que nos aproximamos da porta de seu apartamento, pude sentir um cheiro delicioso e, diga-se de passagem que o cheiro não vinha do restaurante chinês mais abaixo. Taehyung também pareceu sentir o cheiro, parou por um momento em frente à sua porta, e então a abriu. Mas não entrou.

As luzes de seu apartamento estavam acesas, e como ele não entrava – parecia ter sido petrificado – me esgueirei sobre um dos seus braços que estava apoiado no umbral para ver o que acontecia lá dentro.

Uma mulher de cabelos escuros que lhe chegavam até o meio de suas costas se virou; usava um avental e parecia não passar dos 45 anos. Segurava em uma de suas mãos um saleiro, enquanto com a outra mexia no conteúdo de uma panela fumegante. Ao ver Taehyung, sorriu.

“Mãe...” Ele murmurou, parecia levemente surpreso e não lhe devolveu o sorriso.

“Tae, eu estava te esperando para...” Seus olhos então se pousaram sobre mim, e seu sorriso se desfez um pouco, demonstrando confusão. Uma confusão natural, creio eu. O que aquele ser todo molhado estava fazendo com o paletó do filho enquanto se esgueirava por trás dele como um encosto? “Esta é...?”

Foi então que os olhos de Taehyung se voltaram para mim, parecia ter finalmente se lembrado que eu ainda estava ali. Retirou o braço da porta para me dar passagem, e eu, timidamente, dei dois passos adiante com os ombros encolhidos enquanto tentava apertar mais o paletó sobre meu corpo.

“Uma amiga.” Ele se manifestou depois de alguns segundos, e me surpreendi, pois já esperava que respondesse que eu era uma qualquer. Voltei minha atenção à mãe dele, uma bonita mulher que – agora que eu reparava bem – tinha muitos traços dele.

“Song Nahee, muito prazer.” Apresentei-me com um tom baixo e tímido de voz.

Ela voltou a sorrir, mas logo sua expressão se desfez para a preocupação tomar conta de seu rosto.

“Ah, minha nossa! Você está toda molhada!” Ela exclamou, vindo em minha direção para constatar que, de fato, eu estava completamente encharcada, e depois se dirigiu a um dos armários para tirar uma toalha e me passar. “Você pode pegar um resfriado, minha querida.” Ela então olhou para Taehyung. “O que está esperando? Vá pegar alguma coisa para ela vestir.”

Após Taehyung não fazer uma cara muito agradável, ele foi separar algumas mudas de roupa para mim. Enquanto isso, ela me obrigou a sentar em um banco próximo ao balcão da cozinha, e então começou a passar a toalha sobre o meu cabelo, bagunçando-o com a intenção de secá-lo. Ela parecia extremamente preocupada e cuidadosa, e por um instante senti um gostoso calor no peito; há anos eu não recebia esse tipo de cuidado materno.

Taehyung apareceu com um de seus moletons em mãos e o jogou em meu colo. Logo entendi que aquela devia ser a roupa que eu deveria usar.

Entrei no banheiro e, enquanto trocava as vestimentas, pude escutar a mãe de Taehyung informando que logo a comida estaria pronta.

“Você precisa se alimentar bem.” Ela disse. “Você ainda está trabalhando naquele bar à noite, não é? Espero que não esteja bebendo demais...”

Espera, então a mãe dele não sabia que ele trabalhava em um clube de hosts?

Saí do banheiro o moletom azul tinha ficado largo em mim e comprido nos braços e pernas, mas serviria para que eu não adoecesse. Taehyung estava sentado em seu sofá, sem dizer nada, fitava suas mãos entrelaçadas. Senti-me mal por interromper um momento familiar – um tanto estranho, já que Taehyung estava frio como gelo – e decidi que era hora de ir.

“M-muito obrigada por me ajudarem.” Comecei, dobrando minha roupa molhada para levá-la. “Mas acho que é melhor eu ir agora.”

“Ah, não, não, querida.” A mãe de Taehyung disse, pegando as roupas úmidas de minhas mãos e as colocando sobre um móvel. “Fique para comer, você precisa se alimentar para não ficar doente.”

Abri minha boca, mas não emiti nenhum som. Fiquei sem saber o que fazer, então olhei para Taehyung, que de repente se levantou e se encaminhou para um cofre que ficava próximo ao aquário. Tirou de lá um maço de dinheiro, não sabia exatamente a quantidade que havia ali, mas era muito. Continuei sem entender o que ele queria, até ele jogar sobre a bancada da cozinha o dinheiro, bem em frente à sua mãe.

“Esse é o dinheiro que eu ganho à noite.” Taehyung começou a falar enquanto olhava para sua mãe fixamente, sua mandíbula contraída. “Pode pegar. Em troca, te peço que nunca mais volte a aparecer.”

Meu queixo caiu em choque; como ele podia falar dessa forma com a própria mãe? Os olhos dela se arregalaram, e brilhavam com lágrimas que começavam a se acumular, mesmo assim ela manteve a calma e em um tom sereno voltou a falar com seu filho.

“Não quero dinheiro algum.” Ela afastou com as mãos as notas e engoliu em seco. “Sei que você me odeia por tudo o que aconteceu... Sei que me odeia desde a morte do Taeyang.”

Ela começou a caminhar na direção de Taehyung, e ele lhe deu as costas, passando a mão por seus cabelos loiros impacientemente. Abaixei minha cabeça; como eu desejava não estar ali presenciando aquela cena.

“Mas ele te amava, assim como eu te amo.” Ela continuou. “Eu estou fazendo de tudo para me reaproximar de você e...”

Pelo canto dos olhos, pude ver que Taehyung virou para olhá-la novamente, seu rosto contorcido em fúria.

“Apenas vá embora, por favor!” Ele gritou, interrompendo a fala de sua mãe. Eu me encolhi, abraçando-me e encostando em uma das paredes.

Sua mãe enxugou as lágrimas, tirou o avental que vestia, o colocou pendurado em um gancho na parede, pegou sua bolsa, e saiu sem dizer mais nada.

No apartamento, ficamos só eu, Taehyung e um silêncio sepulcral que estava me matando. O que eu tinha acabado de presenciar? Eu não sabia nada sobre o passado de Taehyung, mas aparentemente ele ainda tinha problemas com sua família depois da morte de seu irmão, imagino. Mesmo assim, achei injusto o modo como ele falou com ela.

Olhei para ele, que agora voltava a se sentar no sofá com os cotovelos apoiados sobre os joelhos, e continuei encolhida em um canto como um animal encurralado.

“Desculpe por isso.” Taehyung murmurou, sua voz em um tom sério e genuíno, ainda continuava a encarar um ponto fixo no chão. “Você não precisava ter presenciado essa cena.”

Dei um passo inseguro adiante, Taehyung então se levantou e foi até a panela, começou com uma colher a retirar o conteúdo – que agora eu via que se tratava de um curry – e a jogá-lo fora.

“O que você tá fazendo?” Eu lhe perguntei, incrédula. Dei mais alguns passos em sua direção, dessa vez mais decidida.

“Não é óbvio? Jogando fora.”

“Não, para com isso.” Segurei seu braço, fazendo-o parar com a ação que eu considerei um tanto quanto imatura de sua parte. Ele me olhou com os olhos semicerrados, e por um instante achei que morreria. Seja lá qual for o problema entre Taehyung e sua mãe, ainda assim ela era sua mãe. Senti pena dela, uma grande dor no peito ao ver que ela estava se dedicando verdadeiramente a ele, enquanto ele lhe respondia com desprezo. Taehyung não sabe o que é perder uma mãe... “Ela veio aqui somente para preparar a sua comida com todo o carinho do mundo.”

Taehyung continuou me encarando, com ódio, mas então, após um suspiro, soltou a colher e a panela, dando as costas para mim e voltando a se sentar no sofá.

Peguei um prato que encontrei em um dos seus armários da cozinha, preenchi com arroz – que estava em outra panela menor – e coloquei o curry ao lado. Em seguida, dessa vez, completamente determinada, fui até ele e estiquei os braços com o prato e a colher em mãos.

“Come.” Ordenei, ele me olhou confuso por um momento, já que parecia não esperar uma atitude dessas vinda de mim, em seguida cerrou as sobrancelhas.

“Não.”

“Vai comer sim.” Engoli em seco, não sabendo bem o que estava fazendo. “Você quer um contrato, não quer? Então essa é a minha parte do contrato, você vai comer agora mesmo, se não, esquece.”

Mordi minhas bochechas internamente, ainda sem acreditar no que eu tinha acabado de propor; no desespero, eu estava barganhando infantilmente.

O rosto de Taehyung relaxou e, para minha surpresa, ele ergueu suas mãos para pegar o prato que eu segurava, em seguida, colocou uma colherada da comida em sua boca, a contragosto.

“Então agora é oficial.” Ele disse com a boca cheia. “Nós temos um contrato.”

Deixei meu corpo cair pesadamente ao seu lado no sofá, a única pergunta que se repetia em minha mente era ‘como eu cheguei a esse ponto?’ Suspirei.

“Também tenho algo a adicionar às cláusulas.” Ele voltou a falar, apontando sua colher para mim. “Você não pode se apaixonar por mim.”

Por um momento fiquei sem reação, depois ri diante daquela ideia ridícula. Que convencido.

“Você nem faz o meu tipo.” Respondi, girando os olhos. “E posso dizer o mesmo a você: não se apaixone por mim.”

Taehyung se engasgou com a comida quando começou a rir, ele gargalhava com tanta vontade que me senti ofendida. Bem, pelo menos o clima pesado que tinha se estabelecido antes agora havia se dissipado.

“Nem você mesma acredita no que disse.” Ele comentou entre risos, olhando-me como se eu fosse a coisa mais divertida do mundo. “E não se preocupe, nunca me apaixonei e nunca vou me apaixonar nessa vida.”

Ele me olhava com um sorriso debochado enquanto proferia essas palavras, então pareceu se lembrar de algo.

“Mas devo admitir que me surpreendi hoje com você.”

“Por quê?” Eu lhe perguntei confusa e curiosa.

“Eu achava que você só usava preto, mas descobri que por baixo você usa peças bem coloridas.” Ele comentou, descendo a vista rapidamente para a região de meus peitos. Arregalei meus olhos. Esse babaca...

Chutei sua canela, ele gritou de dor, mas logo começou a rir e, por mais que eu não queira admitir, também segurei uma risada.

Nenhum de nós dois sabíamos direito em que loucura estávamos nos metendo quando decidimos nos juntar para... sermos felizes?

Mas eu não sabia se era bem a felicidade que nos aguardava no final disso tudo.

_______________

Não chame de destino as consequências de suas próprias escolhas.


Notas Finais


Heey!
Quem lê Stalker: Re viu que eu postei mais um capítulo hoje e agora também temos um de KMM! \o/
Agora Nahee e Taehyung são oficialmente uma "dupla", o que vocês acham? Vai dar tudo certo para os dois?
Espero conseguir postar o próximo capítulo em breve. E, como sempre, muito obrigada pelos comentários! ♥♥♥ Leio todos sempre com muito carinho, e estou agora mesmo indo responder a todos.

Saranghae~♥


Gostou da Fanfic? Compartilhe!

Gostou? Deixe seu Comentário!

Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.

Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.


Carregando...