“Eu sou tóxico para Luna, já a magoei demais, não a mereço. Só quero que ela seja feliz, mesmo que essa felicidade não seja comigo.”
Cancún, México
Dezembro de 2017
Matteo Balsano
Meu coração estava apertado, a dor dilacerava toda a minha alma. Aquela cena que estava diante dos meus olhos destruiu todas as células do meu corpo. Minha menina delivery estava nos braços de outro e por causa do meu orgulho eu perdi a pessoa mais importante da minha vida.
Saí de trás do letreiro que formava o nome da cidade — Cancún — e fui em direção ao hotel. Eu só queria ficar sozinho e pensar que rumo eu daria para minha vida a partir daquele momento.
Eu estava fazendo tudo no automático. Policiando-me a chegar no hotel. Entrar no quarto que eu estava dividindo com o Gastón. Fechar a porta. E por fim, pegar a garrafa de whisky que eu pedi na recepção. Não precisava de copo, cada vez que eu ingeria a bebida alcoólica era como se ela tivesse poder para tirar toda a dor e frustração que se instalaram no meu coração.
Nunca fui um cara muito de beber, mas tenho os meus momentos. E esse é um deles. Não iria culpar a Luna por seguir em frente e por meu coração está rompido. A culpa era minha e eu tinha a total consciência disso. Eu fiz tudo errado, de novo, isso já não era mais novidade.
Minha língua já estava dormente e eu não mais conseguia distinguir o que era verdade do que era invenção da minha cabeça por causa da grande quantidade de álcool que eu já havia consumido. O líquido ainda existente dentro da garrafa de vidro transparente, marcava o quanto que eu já tinha bebido.
Ouvi um barulho vindo da porta e levantei-me rapidamente para verificar quem chegou ali. Pelo estado em que me encontrava, tropecei em algo que estava jogado por ali e por pouco não fui de encontro ao chão. Era Gastón, ele estava dentro do quarto enquanto se despedia de Nina, que se mantinha do lado de fora e de frente para ele.
Eu permanecia parado no mesmo lugar, nenhum dos dois me viram, já que Gastón estava de costas e quem se situava fora não conseguia visualizar o local onde eu me encontrava. Ele fechou a porta e girou os calcanhares na minha direção.
Seus olhos avaliaram toda a extensão do quarto e ao final fixaram-se em mim. O quarto só não estava mais bagunçado que eu, tinha roupas jogadas por todos os lados, assim como alguns objetos do hotel. Quando cheguei eu estava transtornado e precisava descontar minha raiva e angústia em algo.
— Matteo, qual foi o furacão que passou por esse quarto? O que aconteceu com você? — ele perguntou, sua voz transparecendo a dúvida já presente em seus olhos.
Respirei fundo algumas vezes tentando criar coragem para sanar os seus questionamentos. Falar aquilo em voz alta faria tudo se tornar mais concreto. Era como se a realidade estivesse batendo em minha porta pronta para dar na minha cara.
— A Luna está com o Simón — falei de uma vez antes que a pequena coragem que surgiu se esvaísse de uma vez. Confessar aquilo fez a dor existente dentro de mim triplicar. Nunca senti nada assim por ninguém, o meu amor por ela é tão forte que machuca.
— Você tem certeza? Eles são apenas amigos, você pode está confundindo tudo. — Sua voz era calma e ele tentava passar-me esperança. Ah, se não doesse tanto. Naquele momento eu não tinha mais aquilo, a tal da esperança que ele falou.
— Eu vi Gastón — proseei e uma lágrima escorreu por minha bochecha e, não tardei em limpá-la. — E dói, dói tanto que eu não sei se vou suportar viver com isso, com esse amor que existe aqui dentro. Se houvesse uma maneira de arrancá-lo, de fazer meu coração e minha mente esquecerem dos seus toques, dos seus beijos, do seu sorriso encantador, daquelas grandes esmeraldas que são minha perdição. Você pode ter certeza, eu o faria.
Minhas palavras saíram um pouco emboladas porque minha mente ainda era uma enorme confusão causada pela bebida e também pela Luna. Mas ao mesmo tempo elas eram palavras sofridas.
— Eu consigo imaginar o que você está sentindo. Quando eu terminei com a Nina eu também me senti perdido e sem rumo. Mas você parece ainda pior do que eu fiquei — ele disse e sentou ao meu lado na cama, apertando meu ombro em sinal de consolação. — Você deve amá-la muito, já que pela sua dor conseguimos ver todo esse sentimento.
Eu não conseguia proferir mais nenhuma palavra. Grossas lágrimas escorriam por meus olhos e moldavam meu rosto cansado. Meus soluços eram estrangulados, dolorosos. Queria que aquelas lágrimas lavassem a dor que existia dentro de mim, levasse-a para bem longe, mas que as boas memórias que tive junto a ela não fossem apagadas. Mas sei que é impossível.
— Você deveria esclarecer as coisas com ela, vocês precisam de uma conversa. A Nina me contou que a Luna também ficou arrasada. — Gastón aconselhou e eu demorei um pouco para juntar todas as palavras ditas por ele e formar algo coerente em minha cabeça. Saber que a Luna não está bem me deixou ainda pior, não consigo imaginá-la triste. A minha vontade foi de sair correndo e de ir abraçá-la, protegê-la de tudo e de todos. Mas não, eu não faria isso.
— Não acho que isso seja o certo. — Neguei veemente. — Eu sou tóxico para Luna, já a magoei demais, eu não a mereço. Só quero que ela seja feliz, mesmo que essa felicidade não seja comigo.
Aquelas palavras foram as mais dolorosas. Eu estava abrindo mão da Luna, agora era definitivo.
A bebida não fazia mais tanto efeito, eu já estava recuperando um pouco a sobriedade. Gastón sorriu, não entendi muito bem o porquê daquele sorriso.
— Você amadureceu muito Matteo, não é mais aquele mauricinho convencido que sabia que tinha todas as garotas aos seus pés e que queria que tudo fosse do seu jeito. A Luna lhe mudou, e isso é bom. — Sorri com as palavras dele.
É a verdade mais sincera, a Luna mudou-me de um forma que eu nunca imaginei, com ela eu passei a me importar mais com as outras pessoas e não só comigo, ela com aquele jeito doce e distraído me ensinou o que é o amor.
— Obrigado, eu estava mesmo precisando de palavras de conforto do meu melhor amigo e que não envolvessem suas piadinhas sem graça — falei e rimos juntos. Gastón foi a primeira pessoa a qual eu criei um vínculo tão grande, e agora tenho certeza que mesmo vivendo em continentes diferentes essa amizade nunca vai acabar.
— Amigos são para essas coisas — ele disse e me abraçou logo em seguida. — E cara, se você acha que o melhor é se manter afastado da Luna, o faça. Se for para vocês ficarem juntos o destino vai se encarregar disso, mas caso não, tem várias garotas que podem fazer você se apaixonar novamente.
Fiz uma careta com as palavras dele, não acreditava nesse lance de destino, se duas pessoas quiserem ficar juntas e não existir nada que as impeça disso, ponto. Não precisam de mais nada. Agora sobre a segunda parte, não acredito que um dia possa chegar a amar alguém na intensidade do amor que sinto pela Luna, é algo surreal, ela me completa de uma maneira incomparável e sempre terá um lugar fixo em meu coração.
Mas era certo, eu precisava manter distância dela e tive uma ideia para fazer isso. Preciso ser rápido e também estar completamente sóbrio para fazê-lo.
Meu corpo estava dolorido e minha cabeça parecia que ia explodir, abri os olhos lentamente para me acostumar com a pouco luz que preenchia o ambiente. Maldita hora que fui inventar de beber. Ainda estou com aquele sentimento de algo quebrado dentro de mim, continuava com a Luna na minha cabeça e no meu coração.
Gastón seguia em um sono profundo na cama ao lado da minha. Levantei devagar e sem fazer barulho, segui para o banheiro da suíte. Despi-me, colocando as roupas que exalavam um odor horrível de suor e de whisky em cima da pia de mármore branco.
Entro embaixo da água gelada para aliviar todo o meu estresse. Passei bons minutos só deixando-a cair e escorrer pelo meu corpo. Olhei para o ralo vendo a água sumindo, queria que levasse junto a ela esse sentimento que sufoca o meu peito. De repente um mal estar se apoderou de meu corpo e senti minha barriga revirar. Em frações de segundos um líquido viscoso e branco saiu pela minha boca, deixando um gosto terrível nela. E viva a ressaca.
Ao terminar meu banho, retirei-me do box e enxuguei-me com uma das toalhas que estavam dobradas dentro do pequeno armário que tinha debaixo do lavatório. Enrolei-a em minha cintura e voltei para o quarto atrás de vestir uma roupa. Precisava tomar um bom café puro e um comprimido.
Não existiam mais lágrimas em meus olhos, devo ter chorado o suficiente noite passada. Foram poucas as vezes que chorei, duas para ser mais exato, ambas por causa da Luna. Nunca fui de me apegar as coisas, mas ela fez com que eu quisesse ter um lugar para deixar o meu coração, e com certeza ele estará em Buenos Aires, junto a ela.
Agora já sóbrio, criei coragem para colocar em prática a decisão que tomei enquanto ainda estava sob efeito do álcool, tendo plena consciência de que aquilo seria o melhor, não apenas para mim, mas principalmente para ela. Decidi sair do quarto para não acordar Gastón, já não bastava o vexame que o fiz passar comigo ontem.
Abri a porta e escorei-me na parede adjacente a ela, sentando-me no chão. Desbloqueei o celular e abri a lista de contatos. O contato do meu pai pairou sobre a tela e reuni toda a coragem para realizar a ligação. Os primeiros bips foram ouvidos na medida que coloquei o telefone no ouvido. Ele atendeu no sétimo toque, todo o ar esvaiu-se dos meus pulmões, o que eu falaria agora?
"— Matteo meu filho, será que tem como você falar alguma coisa? — ele perguntou do outro lado da linha mostrando impaciência.
— É sobre a faculdade — criei coragem e falei de uma vez. — Eu já tomei minha decisão papá."
Depois que a ligação foi encerrada passei longos e tortuosos minutos sentado no chão frio, perguntando-me se tinha feito a coisa certa. Mas já era, não tinha mais volta, no fundo eu sabia que era o melhor que eu poderia fazer.
Levantei-me e desci para o hall do hotel onde segui para o restaurante. Precisava de um café bem forte. As mesas estavam quase todas vazias, já que ainda era bem cedo e as pessoas começavam a chegar por lá agora.
Sentei em uma mesa um pouco afastada, não queria chamar atenção e nem que ninguém visse o estado deplorável em que me encontrava.
O garçom aproximou-se e eu realizei o meu pedido: um café puro, uma fatia de torta de chocolate e uma aspirina. Logo em seguida ele saiu para fazer meu pedido e atender as outras mesas.
Com o garfo eu brincava com a fatia da torta que continuava intacta no pequeno pratinho de porcelana, porém, o líquido preto já há muito não existia mais na xícara. Meus pensamentos estavam distantes, então quando alguém se aproximou da mesa eu me assustei.
— Caiu da cama foi? — Gastón sentou-se na cadeira a frente da minha. Permaneci em silêncio, não queria conversar. — Você está melhor? Ontem você estava detonado, não que sua cara tenha melhorado muito hoje.
— Vou ficar. — Esperava. Quis acrescentar, mas permaneci calado, tinha que ser otimista.
— Claro que vai — falou enquanto chamava o garçom para realizar o seu pedido. — Você já soube o que aconteceu com a Luna?
Todas as células do meu corpo pararam de funcionar. Eu não queria pensar na Luna, não queria ouvir falarem dela, não queria vê-la. Não sei se meu coração fraco suportaria mais dor. Ao constatar que eu não ia falar nada ele resolveu continuar com o seu monólogo sobre algo da minha ex, que eu tentava não prestar atenção.
— Ela descobriu sobre o passado que ela tanto buscava. — Meus olhos que estavam vidrados na fatia de torta a minha frente foram diretamente para o Gastón. Pelo pouco que sei, Luna estava focada em descobrir sua verdadeira identidade e saber o motivo pelo qual foi abandonada pelos pais biológicos. — Luna é a Sol Benson.
— Como? — minha voz saiu um pouco alterada chamando a atenção das pessoas que a essa hora já enchiam o restaurante.
Não conseguia acreditar nas palavras dele, não poderia ser verdade. Deve ser alguma pegadinha sem graça do Gastón para ver se eu ainda me importo com ela.
— Eu não sei direito, a Nina me contou por cima. Parece que a tia dela, a Sharon, escondeu isso durante todo esse tempo, ela não queria que Luna descobrisse a verdade por motivos que eu também não sei — a seriedade com que ele falava me assustou. Como alguém é capaz de fazer isso com sua própria sobrinha? Esconder a verdade que ela tanto buscava, isso é doentio.
— Ainda não consigo acreditar. Podemos mudar de assunto? Preciso digerir isso melhor e com calma quando estiver sozinho. — Gastón assentiu e migramos de assunto. Entrando agora em outro conteúdo que eu também não queria falar, mas que não tinha como ficar adiando. Uma hora eu teria que contar.
— Ontem você disse que já sabia o que ia fazer, então, o que decidiu? — ele foi direto na pergunta.
Passei alguns minutos apenas olhando para ele e tentando escolher a melhor maneira de dizer aquilo. Não vai ser difícil para ele digerir isso, está sendo difícil para mim aceitar.
— Eu vou para a faculdade de Oxford, já falei com mi padre sobre isso e ele já tá resolvendo tudo.
Escutei passos atrás de mim e uma voz que transbordava tristeza — mas que não deixava de ser doce e melodiosa — preencheu os meus ouvidos e meu corpo paralisou.
— Como assim você vai para Oxford?
Muitos usuários deixam de postar por falta de comentários, estimule o trabalho deles, deixando um comentário.
Para comentar e incentivar o autor, Cadastre-se ou Acesse sua Conta.