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História Massapê - Medo e Pesadelo


Escrita por: Nevertheless

Notas do Autor


Olá, bru aqui!
Espero que eu não tenha feito vocês esperarem muito.
Como eu disse, os capítulos que se seguem são rápidos e tensos porque a história está acabando ):

Sim, esse é o penúltimo capítulo de Massapê e depois dele terá um Epílogo pequeno só pra fechar a história com chave de ouro.

Desde já, obrigada pelo apoio. <3

Boa Leitura ~

Capítulo 10 - Medo e Pesadelo


Fanfic / Fanfiction Massapê - Medo e Pesadelo

 

Os primeiros raios de sol infiltravam-se no casebre de madeira e os filetes tímidos tocavam a pele dos corpos desnudos de Kyungsoo e Jongin, que dormiam, talvez, o sono mais tranquilo de suas vidas. Quando a luz tocou os olhos de Kyungsoo de forma insistente, ele despertou no mesmo instante, sentindo-se preguiçoso. Virou-se de frente para Jongin e observou o rosto sereno como de um anjo, que repousava sobre o tecido branco, com os cabelos lisos bagunçados e um delicado sorriso nos lábios, como se sonhasse algo bom.

E Kyungsoo secretamente desejava descobrir o que Jongin sonhava de tão encantador que o fazia sorrir.

O branco não tinha noção de quanto tempo havia se passando quando se perdeu nas formas e contornos dos lábios, do nariz e das pálpebras delineadas que observava tão de perto e corou um pouco quando o moreno despertou aos poucos, como se soubesse que estava sendo consumido por aqueles olhos grandes e expressivos que sempre amou. Agarrando-se a cintura alheia de forma possessiva, Jongin proferiu um bom dia tímido e sonolento, e recebeu um selo leve na bochecha em resposta.

“Bom dia, Jongin” sussurrou Kyungsoo, desejando mais do que nunca gravar em si mesmo aquela sensação única de despertar ao lado do corpo quente do moreno, e de sua pele em contato com a do outro logo nos primeiros minutos da manhã.  

Jongin apenas murmurou manhoso e inclinou-se para esconder o rosto na linha do ombro de Kyungsoo, que fechou os olhos com o toque suave. Não disseram mais nada, pois nada precisava ser dito e a sonolência e o cansaço físico da noite anterior impedia qualquer diálogo mais longo. Kyungsoo estava satisfeito com o privilégio de observar Jongin lutar contra o sono e a vontade de não abandonar aquela cama nunca mais.

“Soo...”

“Hm?” murmurou o menor, brincando com os fios escuros que escondiam os olhos de Jongin quando ele finalmente conseguiu abrir os olhos, desperto.

 “O que faremos agora?”

Jongin não deveria ser tão direto, mas expos exatamente a primeira preocupação que surgiu em sua cabeça na hora em que se deparou com a dura realidade do dia seguinte.

Havia sido uma noite tão intensa que provara aos dois jovens que não era mais possível viverem longe um do outro. O laço que os ligava era maior do que qualquer coisa sentida por eles, fosse o destino, carma, castigo, ou qualquer coisa do gênero. Era desumano, doloroso e injusto pensar na possibilidade de uma nova separação, já que eles já haviam sofrido demais ao longo da vida que havia feito questão de mantê-los tão perto e tão distantes um do outro.

Kyungsoo queria que aquela pergunta fosse simples de ser respondida, mas ele sabia que o que rondava a sua mente não era algo simples de ser feito e ele estava inseguro em fazer tal pedido. Mas era Jongin que estava ali ao seu lado, abraçando-o em um contato íntimo entre as peles de tal forma que seu corpo se aquecia em sua presença.

Como se o moreno pudesse sentir o quanto o menor estava receoso de lhe dizer o que pensava, Jongin  abraçou a cintura do outro com mais força e selou os lábios alheios em um beijo rápido, como se naquele gesto pudesse mostrar que Kyungsoo podia falar o que tanto pensava. Mordendo os lábios, Kyungsoo começou.

“Jongin ... fuga comigo para a Europa”

O moreno pareceu ter sido pego de surpresa com tal pedido.

“Quando Soo? E como? Você não está ...”

“Eu não vou me casar Jongin, eu simplesmente não posso ...” Resmungou, ajeitando-se sobre a cama para observar melhor as reações de Jongin  

“Não depois de ontem eu...Eu vou para a Europa estudar e você pode vir comigo. Não tem ninguém capaz de fazer mal a ti na Europa e lá poderemos viver em paz”.

O plano era perfeito. Ambos viveriam como meros colegas de faculdades morando em Portugal e estudariam na Universidade de Lisboa, ampliando seus conhecimentos de tal forma que logo seriam aptos a algum emprego na área pública. Com o dinheiro da família que Kyungsoo tinha acesso, poderia sustentar ele e Jongin pelo tempo que precisassem até encontrarem um lugar estável para ficar e criar raízes. Jongin nunca mais iria correr perigo e Kyungsoo estaria livre das pressões da própria família. E tudo o que Kyungsoo mais queria era criar as malditas raízes e dividir uma cama com Jongin para sempre.

“Soo...” Jongin relutou um pouco ao chamar pelo outro, escolhendo bem as palavras que usaria para que o branco não lhe interpretasse de forma errônea. “Hina, minha irmã, está em torno dos sete meses e sua gravidez é de risco. Eu não posso deixá-la”.

 “Podemos levá-la junto, oras”. Kyungsoo engoliu a seco, ignorando o que estava pensando com medo de ser verdade.

“Não sei se ela aguentaria a viagem, Soo. Como eu disse, é uma gravidez de risco e eu sou a única pessoa que ela tem”.

Kyungsoo suspirou e se afastou um pouco, entendendo de forma boba, ele sabia disso, que aquela negativa soava como uma desculpa, ou mais uma barreira que eles teriam que enfrentar e era imposta por Jongin.

“Você não quer ir, não é?”

“Hyung, não seja bobo” respondeu o mais novo no mesmo instante, buscando o corpo pequeno que se afastava com o olhar claramente desapontado. “É claro que eu quero ir, você sabe que fugir é o meu plano desde o inicio de tudo há anos atrás”. Jongin sorria como se explicasse a uma criança mimada porque estava negando-lhe um doce. “Porém, ela é da família, do meu sangue. Não posso simplesmente abandoná-la sem amparo algum”.

“Mas Kai, eu também estou abandonando a minha própria família” Resmungou.

Jongin desfez o sorriso no mesmo segundo, sentindo algo como indignação percorrer seu corpo enquanto olhava para Kyungsoo agindo de forma tão infantil. Levantou-se em sobressalto, ajeitando as costas nos travesseiros brancos enquanto não mediu nem um pouco o que diria ao outro.

“Não compare o que você acredita ser uma família com o que eu tenho. É completamente diferente e eu e você sabemos que o que você tem nem deveria ser nomeado ‘família’ ”.

Era de se esperar que Kyungsoo não gostasse nem um pouco do que Jongin havia lhe dito e isso foi de fato algo que o indignou e o ofendeu. Afinal, apesar de todos os pesares, o que tinha ainda era uma família porque os laços de sangue não podem ser rompidos nem mesmo se o único sentimento que fosse compartilhado fosse ódio ou indiferença. E ele tinha Junmyeon, que era de longe o que mais considerava sua família.

“Não fale assim, Kim Jongin. Você não conheceu todos eles e meu irmão mais velho é alguém que considero muito e o amo por uma família inteira. Entendo o que você quer dizer, mas não seja injusto”.

“Você está falando de injustiça quando acha que está tudo bem deixar a minha irmã aqui, sozinha e grávida? Sabe quantas mulheres morrem no parto? Ela só tem 16 anos! Não posso deixar que isso aconteça”.

Jongin não olhava nos olhos decepcionados de Kyungsoo porque ele mesmo não compreendia o porquê estava tendo uma reação tão forte e adversa. Ele sentia que se não fosse por Hina, ele não pensaria duas vezes em largar tudo o que tinha para fugir com Kyungsoo, mas por algum motivo agora tudo parecia um tanto egoísta vindo do mais velho. Talvez tivesse medo, talvez não estivesse pronto para deixar tudo aquilo que lutou por tanto tempo para conquistar. Hina o ensinou a lidar com suas dores, suas angustias e a erguer seu próprio negócio, porque mesmo sendo tão nova, tinha uma maturidade que poucas garotas pareciam ter. E ele devia isso a ela.

Kyungsoo não disse mais nada logo que notou como o moreno parecia realmente confuso e imerso em seus pensamentos, e apenas levantou-se da cama em silêncio e caminhou até a cozinha, à procura de um copo d’água e algum pano limpo para que pudesse se lavar.

O mais velho, de fato, não queria agir como uma criança mimada, mas não conseguia conter o desejo de chorar com a negativa do mais novo. Só não queria que o seu egoísmo fosse visto por Jongin enquanto lutava contra as lágrimas, amaldiçoava mentalmente essa criança que viria ao mundo, para claro, sentir-se culpado depois.

Enquanto bebia um copo de água em frente a uma das janelas tampadas com alguns pedaços de madeira, uma mão sorrateira aproximou-se de seu corpo ainda nu e o puxou pela cintura até que os dois corpos se chocassem. O atrito entre as peles expostas era inevitável, e Kyungsoo não resistiu quando Jongin depositou um leve selo em seu ombro e murmurou.

“Desculpe ”.

Kyungsoo mordeu os lábios umedecidos pela água e por algumas lágrimas, e virou-se para selar os lábios de Jongin, desfazendo no toque a angustia que sentia pelo pequeno desentendimento anterior. Não sabia se o pedido era pelo jeito com que Jongin lhe dirigiu a palavra ou por não poder fugir com o outro, mas no momento não importava.

 Beijando-o com calma e carinho, tudo pareceu algo extremamente pequeno diante da maneira como os corpos reagiam, já implorando para que voltasse para a cama e começassem tudo outra vez.

“Tudo bem Kai. Nós vamos dar um jeito nisso”. E Kyungsoo esforçou-se para mostrar ao mais novo que ele acreditava que eles ficariam bem.

 

✘✘✘✘

 

Despedir-se de Jongin não foi uma tarefa fácil, mas os amantes estavam em terreno inimigo e seria desastroso para alguém que acabou de encontrar a plena felicidade simplesmente tê-la destruída por um pequeno deslize infantil. Ainda mais sendo a culpa do eventual deslize a vontade de permanecer naquela cama por mais tempo do que seria fisicamente viável.

Sabendo que por hora nada disso era possível, Kyungsoo forçou um Jongin manhoso para fora da fazenda, prometendo que iriam se encontrar naquele casebre mais vezes, afinal, ela já havia sido eternizada como o ponto de encontro do casal. Depois de um beijo demorado e arriscado, Jongin se foi entre os campos da fazenda dentro de uma sege enquanto Kyungsoo voltava para a casa-grande dando pequenos saltinhos, sem esconder a felicidade estampada em seus olhos que brilhavam, e o sorriso travesso de quem sabe de um segredo e está louco para contar a todo mundo.

Estava tão imerso em sua própria felicidade que não notou a movimentação estranha  da casa-grande e ignorou completamente as duas seges de cor escura paradas na entrada principal de sua própria casa. E que logicamente, não lhe pertenciam.

Ao pisar no tapete de tecido indiano que cobria a sala de estar em toda a sua extensão, deu de cara com Joonmyun com uma de suas expressões mais sérias e uma das mãos apoiadas sobre o rosto enquanto conversava com três figuras bem vestidas a sua frente.

“Kyungsoo, por onde andou? Eu e Dora estávamos te procurando como loucos!” Joonmyun desabafou, com um tom que beirava bronca e alívio. A preocupação repentina com seu sumiço era para Kyungsoo algo completamente estranho, já que ninguém costumava se importar por onde andava. No mesmo instante achou que poderia estar encrencado. Engolindo a seco, fez a sua melhor expressão de tédio e desentendimento.

“Estava por aí, como todos os dias” Mentiu, como se dissesse algo completamente óbvio “Por que a preocupação?”  Questionou, porque jogar uma pergunta contra a outra disfarçava a sua situação de um “quase” flagrante.

Foi então que as presenças até então caladas diante dos irmãos chamaram a atenção de Kyungsoo.

Um dos rapazes tinha cabelos alaranjados, um tanto vermelho como se a tinta extraída do mais puro pau-brasil tivesse tingido seus fios. O outro, de olhar mais penetrante, sério e visivelmente mais alto do que todos os presentes,  mantinha o olhar fixo em Kyungsoo, como se o interpretasse e julgasse por completo, o que causou arrepios no menor. Finalmente um rapaz branco e de fios muito claros olhava de um lado para o outro, balançando a cabeça em concordância com qualquer coisa dita até então. Olharam então para  Joonmyun como se esperassem serem  introduzidos à Kyungsoo.

“Soo, esses são Minseok,Kris e Luhan” Apresentou-os formalmente e Kyungsoo cumprimentou com um aceno os três rostos que o encaravam de formas tão diversas. “Acho que eles podem explicar melhor o que está acontecendo”.

E Kyungsoo realmente precisava de respostas com urgência, já que além de não ter ideia de quem eram aquelas figuras, crescia dentro de si uma intuição de que algo ruim estava para  acontecer.

Sentaram-se nos sofás de tecido nobre parecendo bastante relaxados para alguém com olhares tão sérios. Apenas Kris preferiu permanecer de pé, encarando o menor de uma forma que estava o constrangendo. Joonmyun não conseguia relaxar a tensão de seu corpo, e Kyungsoo começou a soar frio quando associou pela primeira vez a farda que os três rapazes estavam vestido com o que vieram fazer. Minseok inclinou-se e encarou-o nos olhos.

“Eu sou o Minseok, meirinho-mor das terras senhoriais dessa região.” Começou dizendo, e Kyungsoo sentiu o ar ao seu redor tornar-se rarefeito. “Luhan e Kris vieram acompanhar o caso junto comigo para que seja resolvido da forma mais correta possível”.

“Caso? Mas que caso?”  Ousou perguntar, já que suas dúvidas eram maiores do que qualquer temor que o uniforme dos representantes do Imperador causava.

“A cidade perdeu uma figura importante para o comércio há alguns poucos dias e no mesmo instante em que o corpo de Tao foi encontrado assassinado na praça meridional, recebemos uma denúncia de que o responsável pertencia à família Do”.

Então a justiça seria de fato feita? A mente de Kyungsoo ia de seu pai, que provavelmente dormia tranquilamente entre uma tosse e outra, até a sensação de que enfim algo seria feito para conter suas armações, intrigas e ameaças à vida de Jongin. Sorrir parecia errado quando o seu mesmo sangue está condenado a passar o resto da pouca vida que lhe restava na cadeira imperial, mas de qualquer forma era uma punição necessária e merecida.

Kyungsoo acreditava na justiça tanto quanto Joonmyun, que se voltou contra Minseok no mesmo segundo de forma agressiva e debochada.

“Kyungsoo não é culpado. Ele estava na casa-grande quando tudo aconteceu e vocês não tem como dizer que isso é mentira”.

E o branco soltou uma exclamação surpresa com a frase do irmão mais velho, que parecia um tanto fora do contexto.

“As denúncias foram claras e detalhadas. O capataz pertence a família Do e ele confessou que foi a mando do jovem rapaz. Kyungsoo ficará detido até que se encontre o que você diz ser o verdadeiro culpado”.

Joonmyun continuou argumentando com tudo o que tinha, mas era uma batalha perdida. Kris aproximou-se do mais novo e o puxou pelo braço, logicamente conduzindo-o para a porta principal e para uma das seges escuras que o aguardavam-no para levá-lo ao seu novo destino: A cadeira imperial.

Por alguns segundos todo o chão sobre seus pés desapareceu. A justiça se desfez entre seus dedos e seu pai continuava a dormir calmamente enquanto o inocente era arrastado sem mais piedade ou cortesias até ao seu destino. Joonmyun tentou, mas Minseok apenas o ignorou enquanto seguia Kris pelas escadas. Luhan mantinha o olhar baixo e parecia no fundo não apreciar a cena, diferente de Minseok que tinha certeza do que estava fazendo. Uma certeza completamente contrária da de Kyungsoo, que arrastado à força, foi cumprir uma punição que não era sua.

Os maus entendidos pareciam estar gravados em seu sangue de tal forma que Kyungsoo estava aceitando aos poucos que não havia nascido para ser feliz. Quando chegaram ao ponto extremo da cidade depois do que pareceram horas ao lado de Kris dentro daquela cabine apertada e quente, o ar que respirou por alguns segundos antes de ser jogado dentro de uma sela rudimentar foi seu único privilégio. Se fosse possível ser otimista, diria que ao menos estava em uma cela sozinho enquanto em outras, vários homens com olhares curiosos, cansados e famintos o encaravam sem entender como alguém da elite se encontrava ali.

Afinal, a elite nunca era punida de forma alguma.

Engraçado como no decorrer dos anos, Kyungsoo se via como um escravo desde o momento em que seu coração entregou-se ao proibido e sua mente passou a não aceitar a ordem natural da época em que tinha nascido. E como um escravo foi tratado ao chegar à cadeira imperial. Arrastado por Kris até a última cela do corredor estreito, onde muitos rostos o encaravam com medo, foi jogado contra as grades e ali permaneceu.

Depois de gritar aos sete cantos escuros a inocência que ninguém parecia disposto a ouvir, Kyungsoo soltou-se das barras de ferro que o assemelhava a um animal encarcerado. O rapaz, vencido pelo cansaço, deixou suas pernas bambas cederem ao chão frio e sujo da cela e não evitou que as lágrimas escorressem livres pelo seu rosto.

Mas ao contrário de todas as outras vezes, não chorou muito. Talvez as lágrimas já fossem insuficientes para tanto sofrimento que ocorria em sua vida. Como as lagrimas, suas forças estavam se esgotando aos poucos e tudo o que ele desejava era fechar os olhos e acordar na cama macia que dividiu com Jongin, algo que já parecia distante tanto quanto aquela manhã feliz.

Os sonhos sempre davam lugares aos pesadelos e eles não pareciam dispostos a abandoná-lo nem ao menos quando achou que encontraria nos meirinhos um símbolo de Justiça.

  

✘✘✘✘

 

Quando Jongin soube pelas bocas sempre maldosas e curiosas que o filho da família mais rica da região havia sido punido por um crime, no mesmo segundo estremeceu. Um dia havia se passado desde o momento em que estivera junto com Kyungsoo, e na mesma hora em que chegou a seus aposentos depois daquela manhã perfeita, escreveu uma carta como uma criança apaixonada, implorando para que pudesse ver o seu pequeno no dia seguinte.

Mas a carta nunca foi respondida e Jongin descobriu da pior maneira o porquê.

Entrou em sua própria casa como um furacão e andou de um lado pro outro com uma das mãos nos cabelos escuros, como se caminhar a passos fortes fosse capaz de invocar algum plano de como libertar Kyungsoo. Ele não sabia quem havia de fato atirado em Tao, mas sabia que o mandante do crime era outro membro da família Do e a injustiça do ato o consumia.

Hina aproximou-se preocupada com o irmão mais velho, que não reagia a nenhuma de suas perguntas ou a suas tentativas de acalmá-lo. Em silêncio, ambos forçaram a mente a procurar uma solução possível e Jongin sempre se via encurralado em confrontos diretos que deveria evitar. O instinto natural era defender sua própria vida, mas a menção de perder Kyungsoo para um destino infeliz fazia com que esse instinto entrasse em colapso.

Em um segundo momento, sentiu que sua vida não precisava ser poupada se não tivesse Kyungsoo do seu lado, pois ela seria vivida de uma forma completamente vazia, como se algo estivesse faltando.

Hina poderia não compreender porque o irmão abraçou-a com força e beijou sua cabeça em um gesto de carinho que soava como despedida. Jongin já havia decidido que faria de tudo para que o rapaz pudesse estar ao seu lado e seu ímpeto egoísta se misturava em uma solução altruísta e talvez estúpida. Mais por impulso do que guiado pela razão, Jongin pegou a sege e seguiu rumo a casa-grande que havia fugido há cinco anos.

 

 

 

Joonmyun não era exatamente como havia imaginado o irmão de Kyungsoo, apesar de admitir a si mesmo que a beleza da família era hereditária. O rapaz adentrou a sala de estar e pediu a uma das escravas -  que assustou-se com o tanto que a criança que ali viveu havia crescido - para que pudesse falar com o irmão mais velho da casa.

O branco de pele tão pálida quanto a de Kyungsoo estava acompanhado de Dora, que Jongin reconheceu no mesmo instante ser “a noiva”, já que Tao a descreveu de forma incrível. Indiferente à expressão assustada de Joonmyun e o sorriso simpático da moça, que muito lhe lembrava sua própria irmã, o moreno pediu uma palavra em privado, e todos os três foram para o escritório de Joonmyun, que ficava no corredor oposto ao quarto onde dormia o verdadeiro culpado por todos os problemas que cercou sua vida durante anos.

“Acho que não cheguei a me apresentar formalmente, mas meu nome é Jongin”. Disse a Joonmyun enquanto este puxava a cadeira de trás da escrivaninha para sentar-se de frente ao moreno sem nenhuma barreira. Dora apenas aninhou-se no pequeno divã no canto oposto e ouviu em silêncio os dois rapazes conversarem, sem interrompê-los.

“Eu sei quem você é. Eu sou o Joonmyun, talvez o único filho sensato e bonito da família Do”.

Jongin riu sozinho ao perceber que o rapaz parecia ter bom humor.

“Vou ser direto Joonmyun-shi. Acho que ambos sabemos que o que houve com Kyungsoo é uma injustiça e que o verdadeiro culpado ainda dorme tranquilamente sem sentir a culpa sobre seus ombros”. Disse com a eloquência de quem queria impressionar os membros da elite e provar que não era inferior a nenhum deles, o que de fato aconteceu. Arriscou-se em uma acusação tão direta e teve medo de que o filho defendesse o pai de força fingida, o que de fato não aconteceu.

“Sim, eu tenho esse conhecimento” Confirmou Jonmyun, engolindo a seco a verdade que estava manchando sua família. Criado no seio da Europa revolucionária, ele nunca seria o tipo de homem capaz de desonrar os princípios que tanto prezava.

“Então sabe que precisamos fazer alguma coisa. Não há julgamento, não há provas e não há nada que possa impedir Kyungsoo de passar a vida naquele lugar. A não ser uma confissão do verdadeiro culpado”.

Dora ajeitou-se no divã, os olhos atentos de quem admira a palavra do outro e aprende aos poucos com as experiências da vida. Joonmyun encarou o chão em silêncio, onde apenas os pés de Jongin, que balançavam em ansiedade, eram ouvidos. O tec tec dos sapatos de boa qualidade era como os ponteiros do relógio cuco que ritmicamente mostravam aos presentes que não havia tempo a perder.

 Naquela época, em relação ao sistema punitivo, podia-se identificar uma característica bem nítida: o indivíduo, enquanto mero suspeito de um desvio de conduta via-se totalmente desprotegido diante do Estado, gozando do status de simples objeto de investigação e sujeito a sanções cruéis por vezes, bizarra. E se a igreja se envolvesse e descobrisse o pecado da sodomia que o envolvia, o caso poderia ter proporções absurdamente maiores e Kyungsoo iria sofrer mais. Como se isso fosse possível.

“Você sabe que parte do que Kyungsoo passou tem a ver com a sua existência, não é?” Joonmyun murmurou, rompendo o silêncio. Apesar de a verdade dura e cruel atingir Jongin como uma facada no peito, o tom do branco era mais de deboche do que de seriedade e isso aliviou o clima tenso.

“Sim, eu sei”. Confessou

“Então sabe que parte disso tem que ser consertado por você”.

“Sim, eu sei”.

“Então Jongin, se quiser nos ajudar” E ele apontou o dedo para Dora e para si, incluindo-a com um sorriso gentil “Ouça bem. Nós pensamos procurar quem fez essa denúncia. Talvez tenha sido o capataz que meu pai mandou atrás de você e no fim abateu o alvo errado. Kyungsoo estava com a mão machucada no dia em que o flagra foi feito e duvido que tenha sido brincando de bola”.

“Como você sabe disso? Ele te contou?”

“Não. Eu sou o guardião dessa casa, então nada escapa aos meus olhos” Disse em um tom de orgulho que contagiou Jongin. Pela primeira vez ele entendia quando Kyungsoo lhe disse que o irmão era a sua única família.

“Certo. Então nós vamos em busca do capataz?”.

“Não Jongin. Eu e Dora vamos. Temos um dos meirinhos dispostos a nos ajudar nessa investigação, o loirinho. Ou seja, gente demais”.

“E o que eu farei então?”

“Você vai buscar a confissão”.

E Jongin não precisou que Joonmyun dissesse mais nada para perceber o quão grande seria a sua função naquela espécie de missão, sem ser capaz de indignar-se com a confiança excessiva do irmão mais velho de que não havia perigo.

Porém, cada poro do corpo de Jongin sentia o perigo.

Jongin sentiu um arrepio frívolo percorrer todo seu corpo ao refletir que aquele confronto estava marcado há muitos anos em seu destino, e ele fugiu como um gato selvagem e arrisco achando inocentemente que nunca voltaria.

Mas como um bom felino, um dia ele retornou ao seu lar.

Jongin acenou com a cabeça e foi deixado sozinho com seus pensamentos enquanto Dora e Joonmyun foram até a cidade em busca de informações. O moreno abaixou a cabeça e sentiu as pernas trêmulas em antecipação com o que teria que fazer.

Só quem já encarou seu próprio medo sabe como é sentir o corpo inteiro entrar em alerta, o coração pulsar forte com o efeito da adrenalina correndo pelo  sangue quente, que só aprendeu a fazer das pernas a sua fuga. Elas queriam correr para o mais distante possível daquilo que ameaçava a sua existência desde o primeiro soco no estômago. É um instinto natural que todos os seres racionais ou não seguem a risca e Jongin sentia-se um rebelde que remava contra a maré ao sair do escritório e forçar seu corpo trêmulo até outra porta.

Ele respirou fundo e permaneceu estático diante da porta de madeira, que parecia mais imponente do que nunca, até ter coragem de segurar a maçaneta e girá-la em um estalo que denunciava a sua entrada.

Ouviu um acesso de tosse e o seu pulmão se comprimiu como se respirasse pela ultima vez.

Assim que pisou os pés dentro do grande quarto de paredes escuras e decoração melancólica, seus olhos miraram diretamente com os do Senhor do Engenho, que arregalados, marcavam a silhueta de Jongin como se visse um fantasma assustador.

 

Finalmente estavam frente a frente.

 

Jongin encarava o seu maior medo e o Senhor de Engenho o seu pior pesadelo.

 


Notas Finais


Massapê será atualizado na Sexta-feira (5/Abril) por volta das 19h e o Epílogo vem de acordo com a recepção do fechamento do capítulo.

Qualquer dúvida, xingamento ou juras de amor n, sabe onde me encontrar ~ @filemyeon


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