— Por que não me disse que tinha um namorado?
Estou começando a aceitar a ideia da plaquinha escrita "Não namoro Nishimura Riki".
— Porque eu não tenho um. — Respondi.
— E quem é esse garoto sentado no meu sofá?
— Estamos fazendo um trabalho da escola. — Fechei o livro, impaciente.
— Sei. — Cemicerrou os olhos. — Eu só vim pegar algumas coisas que ficaram... Aqui. — Explicou e seguiu até às escadas, sumindo de nossas vistas.
— Ele parece um pouco assustador. — Disse Niki em um quase susurro.
— Não, ele não tá nem aí pra mim, nunca esteve. — Dei de ombros fitando o livro em minhas mãos.
Ouço a campainha ressoar.
Levanto em um sobressalto e ando até a porta; Abrindo-a.
Encontrei do lado de fora da casa, Steven. Os cabelos ruivos pareciam ainda mais bonitos em meio a pouca luz do sol. Os olhos azuis eram curiosos e ao mesmo tempo receosos, olhando diretamente para algo além de mim antes de fazer qualquer contato.
— O-oi.
— Confesso que fiquei com medo de que você não viesse. — Sorri aliviada e dei espaço para que o ruivo entrasse. — Senta aí. — Apontei a poltrona ao lado do sofá em que estávamos.
— Eai ner... Quer dizer... Steven? Acho que é isso.
O garoto permaneceu em silêncio.
— Escuta Steven, eu posso abrir as janelas se você preferir. — Sugeri atenciosa. Depois que soube dos traumas de Steven, achei melhor fazer o possível para que ele se sentisse confortável.
— Tá tudo bem... Não precisa. — Respondeu inquieto.
Steven mexia freneticamente uma das pernas. Impaciente. Talvez ele esteja desconfortável. Eu deveria fazer algo para melhorar o clima.
Antes que eu pudesse me pronunciar, meu pai apareceu novamente, assustando não só Niki, mas também Steven.
— Tem mais um? — Encarou o Ruivo.
— Olha... Se você já tiver pegado tudo que precisa, pode ir, está atrapalhando as coisas por aqui. — Disse vendo que eles não fariam nada certo com o meu pai por perto.
— E você vai ficar aqui sozinha? — Perguntou. — Com eles?
— É melhor você ir, minha mãe disse que chega mais cedo hoje. Você não quer encontrar ela, ou quer?
— Ela disse? — O mais velho alarmou-se.
Eu sabia exatamente onde deveria atingi-lo.
— Disse sim. — Menti.
— Bom, então eu já vou indo. — Jogou uma mochila por cima do ombro. — Mas saibam que estou de olho em vocês. — Apontou os dois garotos. — Principalmente nesse loirinho aqui.
Apontou Niki. Esse que engoliu em seco. Em seguida caminhou até a porta, sumindo mais uma vez de nossas vistas.
— Sua mãe vai mesmo chegar mais cedo? — Indagou Niki sentindo o território seguro.
— Não, ela faz o possível pra não vir pra casa mais cedo. — Dei de ombros apanhando o livro em cima da mesa de centro.
— Ainda bem. — Suspirou aliviado. — Eu não me dou muito bem com adultos.
— É, deu pra perceber. — Sorri. — E você Steven, conhece a história em que vamos trabalhar?
— E-eu conheço.
— Você tá gaguejando ou é o sotaque? — Disse Niki com desdém.
— Fica quieto. — Bati em seu braço.
— Eu só fiz um comentário!
— Bom, vamos começar.
(...)
Passaram-se cerca de trinta minutos. Steven e eu já havíamos feito grande parte do trabalho, enquanto Niki gastava todo seu tempo girando lápis na mão ou enchendo meu caderno com rabiscos de desenhos aleatórios.
Me pergunto o que ele realmente veio fazer aqui.
— Niki, será que você pode fazer alguma coisa de útil, por favor? — Indaguei sem paciência.
— Mas eu já tô fazendo. Quando eu ficar famoso você pode vender esse caderno por um bom preço! — Brincou.
— Argh, seu insuportável. — Murmurei impaciente. Niki nunca levava nada a sério. — Seu idiota.
Steven me olhou como se eu tivesse insultado o presidente da Coreia. Pra ele deve ser novo ver alguém xingar Nishimura Riki e sair ileso.
— Você fala como se fosse santa.
— Eu não sou uma aluna exemplar, mas sou mais santa que você, isso é certeza. — Retruquei.
— Não me faça rir Anna. — Me olhou com descaso. — Você sobe em mesas e enfrenta o diretor, não existe grande diferença entre nós.
— Ah, mas eu posso te dar mil e um motivos para sermos completamente diferentes. — Revidei na defensiva.
— Isso é verdade. Eu nunca fui preso, por exemplo. — Sorriu ladino. — Sabia que ela já foi presa? — Indagou para Steven, esse que voltou rápdamente o olhar em minha direção.
— E-eu nunca fui presa!
— Foi sim! Você me disse isso!
— Eu não fui presa seu imbecil! Eu só fiquei na delegacia até minha mãe vir me buscar!
— Alguma coisa você fez pra ir parar lá! — Frisou.
— Eu só fui pra lá porque... — Lembrei-me do acontecido. — Soltei alguns cachorrinhos que estavam sendo levados para uma clínica.
— E por que você fez isso?
— Bom... Naquela época, eu achava que cachorro-quente era realmente feito de cachorro. — Senti minhas bochechas queimarem pela vergonha.
— É sério? — Niki gargalhou.
— Eu tinha sete anos seu idiota!
Levei as mãos até o rosto, sentido o calor da vergonha. Niki realmente não perdoa, ele não perde a chance de zoar alguém. Olhei em volta e vi que até Steven esboçava um pequeno sorriso. Pelo menos fiz ele rir.
— Até você Steven? — perguntei entre o riso do Nishimura.
— Desculpa, é que v-você estava fofa. — Foi a vez do ruivo corar.
Sorri pelas palavras repentinas do garoto. Sentia que ele estava mais a vontade. E isso me deixava feliz.
Niki por sua vez acabou com a chacota e emitiu novamente uma face séria.
— Volta ao trabalho nerd. — O loiro ordenou.
— Niki. — Chamei sua atenção.
— Foi mal, força do hábito. — Ergueu as mãos no ar.
— Então é isso Steven, acho que terminamos. Já que esse garoto claramente não vai fazer nada — Niki sorriu como se fosse algo para se orgulhar —, Vamos apenas dar algo pra ele ler lá na frente.
— Eu sei fazer isso. — Apontou pra mim com o lápis em sua mão.
— Se não soubesse te mandaria de volta pro jardim de infância. — Revirei os olhos.
— Então e-eu já vou indo. — Steven se levantou.
— Será que você arruma alguma coisa pra comer? — Indagou Niki. Mais folgado impossível.
— Não dá, porque você vai embora também. — O puxei pelo braço, fazendo com que ele se levantasse.
— Mal educada, nem oferece nada pras visitas. — Reclamou.
— Você enche meu saco a manhã inteira e ainda quer comer? — O empurrei até a porta.
— Eu gastei meu precioso tempo e você ainda reclama?
— Como se tivesse feito algo de útil. — Retruquei. — Tchau Steven! — Acenei para o ruivo.
— Ah então pra ele você dá tchau? — Niki pergunta como se eu devesse satisfações à ele.
— Tchau. — Bati a porta.
É, talvez eu não tenha usado o pouco de educação que existe em mim, mas o Niki esgotou toda a minha minúscula paciência hoje. Me joguei no sofá, cansada.
Vagueei os olhos pela mesa e encontrei o caderno que Niki rebiscou a manhã inteira. Peguei e o abri, folheando. Parei em uma folha que continha um desenho, olhando direito, até que se parecia comigo. Um sorriso involuntário se formou em meu rosto.
Fechei o caderno e devolvi à mesa. Me ajeitei para me deitar no sofá, mas senti algo incômodo. Me levantei para procurar o que era e vi o celular do Nishimura. Meus olhos foram de imediato à porta. Ele voltaria pra buscar?
(...)
Gastei o resto do meu sábado na frente da tv. Maratonei toda a série que eu vinha procrastinando. Levantei do sofá e caminhei até cozinha, sentindo dores na coluna. Ficar o dia inteiro naquele sofá com certeza não me faz bem.
Abri a geladeira e tirei uma garrafa de água; bebendo-a em seguida. Depois de todas as porcarias que comi não sinto a mínima vontade de jantar.
Retornei ao sofá, reclamando internamente pelas dores nas costas.
Antes que me sentasse, ouvi a campainha tocar.
Por favor que não seja o Niki. Minha mãe tá quase chegando.
Pedia intensamente para que não fosse o loiro enquanto caminhava até a porta. Mas parece que a sorte nunca está do meu lado. Era ele.
— Por favor, me diz que o meu celular tá aqui. — Pediu assim que eu abri a porta.
— Ele tá. — Respondi. — Por que não veio mais cedo?
— Só dei falta dele agora.
— Você vive pendurado nesse celular e só lembrou agora?
— É que eu saí com os meninos e não procurei por ele. — Coçou a nuca.
— Eu vou pegar. — Dei as costas para buscar o aparelho.
Procurei em cima da mesa e não encontrei. Devo ter levado pro meu quarto quando fui guardar os materiais.
Subi até meu quarto e encontrei o aparelho em cima da escrivaninha.
Dei um sobressalto ao ver Niki entrar no quarto.
— Tá fazendo o quê aqui?
— Eu ouvi alguém chegar e corri. — Respondeu pegando o aparelho em minha mão.
— Seu idiota, é a minha mãe! — Corri para fechar a porta do quarto.
— Acha que ela vai brigar?
— Brigar? Sabe o que acontece comigo se ela te pegar aqui?
— Não.
— Exato porque eu já era!
— Ela não deve ser tão ruim assim.
— Eu já disse pra não comer biscoitos em cima do sofá sua pirralha! Tá cheio de migalhas! Vem limpar essa sujeira ou vou esfregar sua cara nela até limpar! — Minha mãe gritava da sala.
— Pode ir se quiser. Mas vá por sua conta em risco. — Falei ameaçando abrir a porta.
— Quer saber, não é uma má ideia ficar aqui até ela ir dormir. — Andou alheio pelo quarto.
Graças a Deus eu limpei o quarto ontem depois que cheguei da escola. Uma mulher previnida é tudo.
— Essa é uma boa hora pra você revelar que é o homem aranha e pular pela janela.
— Ou eu posso dormir aqui.
— Quer saber, não importa, eu vou te jogar pela janela de qualquer jeito.
— Acha que ela vai demorar pra sair de lá? — Sentou no banco da escrivaninha.
— Tá brincando? Ela chega do trabalho e ainda fica naquele computador até tarde.
— Nesse caso, ferrou.
— Eu vou lá tentar dar um jeito, fica aqui e-
— "Não meche em nada" — Imitou meu jeito de falar. — Eu já sei.
Respirei fundo controlando minha raiva interior e abri a porta, seguindo para o andar de baixo. Caminhei receosa até a cozinha, onde ela estava sentada na mesa, trabalhando naquele computador, como sempre.
— Mãe... Talvez seja melhor se você subir pra descansar, já tá tarde e-
— Não tá tarde, são só nove horas. — Me interrompeu sem tirar os olhos do computador. — E vê se limpa aquela sujeira antes de ir dormir.
Pensei em argumentar, mas certamente não serviria pra nada. Ela não vai largar essa droga de trabalho agora, nem tão cedo. Me virei e fui até o sofá, limpar a tal sujeira da qual ela falou.
Após terminar subi melancólica até o meu quarto. Eu vou ter que esconder o Niki até quando? Até ela resolver ir dormir?
Abri a porta e adentrei o quarto. Caminhei em passos lentos até a cama, sentindo o olhar do loiro sobre mim. Me sentei e encarei um ponto inexistente pelo quarto.
— Eai, deu certo? — Perguntou Niki curioso.
— Claro que não. — Respondi chateada. — Você não pode mesmo pular a janela?
— Tá querendo me matar?
— Se ela te pegar aqui, quem morre sou eu.
— E agora? — Se levantou e andou alheio até chagar à minha cama.
— Eu não sei. — Me deitei na cama.
— Já que vamos ficar aqui por mais um tempo, vamos fazer algo interessante. — Se deitou ao meu lado.
— Eu não te dei essa liberdade.
— Para com isso. — Se ajeitou. — O que dá pra fazer aqui.
— Por que você não fez nada comigo? — Indaguei repentinamente. Niki parecia não entender sobre o que eu estava falando.
— O que você quer dizer?
— Por que você trancou o Steven no sala de ciências sem ele ter feito nada de ruim pra você, mas me deixou continuar te tratando como bem quisesse?
— Sei lá. É divertido.
— Pra você é divertido ver o sofrimento das outras pessoas? — Talvez eu estivesse um pouco bêbada pelo sono, só talvez.
— É que... Eu...
— E eu? Qual é a diferença entre mim e os outros alunos?
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