- Harper White. Pov. On. –
Já disse o quanto eu odeio segundas-feiras? Porque eu odeio! E PRA CARALHO!
Separei todo o material da faculdade e coloquei tudo na bolsa, com pressa. Carregador? Ok. Fones de ouvido? Ok. Óculos?...óculos?!
Meu Deus, cadê meus óculos? Eu não sou nada sem eles!
Revirei o quarto todo atrás dos malditos óculos de grau, e NADA. Joguei as minhas cobertas no chão e tateei a cama toda, sem sucesso. Depois, procurei pela escrivaninha, pelo interior do guarda-roupa, nada. Mal começou o mês e eu vou tomar outra nota de atraso!
EU VOU É SER EXPULSA SE CONTINUAR DESSE JEITO!
- Você os deixou na mesa da cozinha ontem à noite. – Holly disse, encostada no batente da porta.
- GRAÇAS À DEUS. – Berrei, aliviada! – Oi e tchau, tô meio atrasada. – Sorri amarelo. Ela riu.
Peguei os óculos da mão dela e já coloquei no rosto, descendo as escadas com a bolsa à tiracolo. Passei pelo Greg, nosso Pinscher branco, e fui direto pra porta de saída, rapidamente.
- De novo, Harper?! O que raios acontece pra você se atrasar todo santo dia? – Meu pai reclamou, ao ver meu desespero enquanto atravessava o jardim. Dei de ombros.
- Também te amo, beijinhos. – Ironizei, entrando no carro.
XXX
Holly e meu pai estão juntos há uns 12 anos. Mais ou menos quando minha mãe decidiu que não estava mais afim de ser mãe e esposa e pediu o divórcio, deixando a guarda pro meu pai. Não é que eu tenha muito ressentimento disso, nem nada do tipo, mas...
Que tipo de mãe entrega a própria filha sem nem lutar?! Como ela pôde ser tão fria?
Ok. Talvez eu tenha um ressetimentozinho sim. De leve, vai.
Estacionei de qualquer jeito o carro e desci, tentando conciliar passos, respiração, visão e tato ao mesmo tempo. Ando meio estressada ultimamente e isso me faz ficar esquecida. Esqueço minhas coisas nos lugares, esqueço compromissos, datas importantes...UM VERDADEIRO CAOS.
- Bom dia, Harper White. – Cameron sorriu, me encontrando na escadaria da universidade.
- Bom dia, Cameron Price. – Sorri de volta.
- Deixa eu adivinhar. Atrasada de novo? – Ele riu, lógico que esse cara ia me zoar.
- Tive uns...uns probleminhas técnicos. – Disse, enquanto lutava com meu armário. – Mas, tudo ficou bem no final. Estou dois minutos adiantada, o que já é uma vitória, não acha?
Desisti de esmurrar o armário e Cameron veio até mim, pegando a chave da minha mão e encaixando de uma maneira que fez meu cadeado finalmente se abrir. Fiquei de boa aberta.
- Você precisa comprar outro cadeado. Esse tá torto. – Ele piscou, se afastando de mim.
- Então tá. – Dei de ombros, enquanto colocava minhas coisas lá dentro.
Terminei o que fazia e fiquei só com o celular e o notebook mesmo. Fechei a porra do armário e segui pelo corredor, finalmente conseguindo respirar. E lá veio a Samantha, toda alegrinha.
- Bom dia, Harper. Não está atrasada? Que milagre é esse? E olha que nem é Natal...
- Se as pessoas dessa faculdade cuidassem da vida como cuidam dos meus atrasos, com certeza já estariam formados. – Respondi, na lata. – E você? O que faz aqui? Que eu saiba, a senhorita tem aula de história da arte no edifício que fica à duas quadras daqui. – Completei.
- Caiu da cama, é? Que mau-humor, porra... – Ela riu, me encarando. – E pra sua informação, sua chata, eu estou aqui pra te fazer um convite irrecusável. Festa na casa do meu irmão que tá chegando amanhã à noite de Atlanta! – Samantha piscou.
- Tô quase reprovando em cálculo II, jamais vou poder ir pra uma festa em pleno meio de semana, gata. Fico te devendo essa. – Sorri, simples.
- AH, VOCÊ VAI SIM. Furou as nossas últimas três noitadas, Harper. E eu não vou deixar você escapar de novo. Se vira no seu cálculo e se vira pra aparecer lá, bom dia. – Samantha rosnou.
Eu juro que ia até retrucar, mas a garota já estava longe o bastante pra me ouvir. Merda.
XXX
O dia até que passou rápido. Resisti ao sono na maioria das aulas e, felizmente, a Holly tinha colocado uma deliciosa maçã na minha mochila, hoje de manhã. Esse foi meu lanchinho do intervalo entre as aulas. Aquela mulher é perfeita, simplesmente!
- E lá vem você de novo... – Disse, ao ver Cameron se sentando na minha mesa.
Samantha estava sumida, pra variar. E aí, eu acabei almoçando sozinha mesmo.
- Sempre um amor. – Ele sorriu, de lado. – Cadê a Samantha?
- Tô me fazendo a mesma pergunta. – Respondi, terminando minha maça. – Não devia estar no treino?
Cameron era do time de futebol americano da cidade. A estrelinha de Seattle. É o que dizem.
- Na verdade, era. – Ele sibilou, sem deixar de me olhar. – Mas, tava passando pelo refeitório e te vi aqui, aí vim tirar um tempinho só pra ver você ficar com vergonha. É isso. – Contou.
- E por que eu ficaria com vergonha? – Ri. – Isso não faz nenhum sentido.
- Você sempre fica envergonhada quando eu fico muito perto de você, Harper. Vive desconversando pelos corredores e faz de tudo pra eu não te alcançar na saída. Por que isso?
- É impressão sua. – Fingi normalidade. – E se quer um conselho, acho que devia ir pro treino. Vocês têm jogo no sábado e aposto que o treinador vai ficar louco sem você lá no gramado.
- Um dia, Harper White. Um dia você ainda vai ser forçada à conversar comigo por mais de cinco minutos, anote bem minhas palavras. – Cameron foi enfático, mas sorriu no final.
Um sorriso que me deu uma...uma balançadinha.
- Tchau, Cameron. – Disse, apontando pro campo de futebol, pela janela. Ele piscou.
- Tchau, Harper.
XXX
- Ele tá afim de você.
- Não tá não.
- Qual é, amiga? Ele é o cara mais esforçado que eu já vi! E você nem nota! Mesmo estando com esses óculos enormes bem aí. – Samantha apontou pro meu rosto. – Dá um chance, vai.
- Você tá bem maluca. E além de mais, ele tem namorada.
- A Camila é só um casinho sem importância. Palavras do próprio Cameron. – Ela garantiu. – Eu acho que você devia fazer um teste, sair com ele, mesmo que como amiga. E, se ele avançar o sinal, você já tem sua resposta. – Completou, séria.
- Mais alguma coisa, querida Samantha? – Ri, enquanto ligava o meu carro.
- Sim. Se você continuar chata e insensível desse jeito, vai é morrer solteira!
- Posso lidar com isso numa boa. – Pisquei, dando partida.
XXX
Já em casa e de banho tomado, por algum motivo, ainda estava pensando no convide de Samantha para aquela tal festa besta do irmão dela. Abri meu celular e comecei à stalkear seu irmão misterioso, afinal, eu nunca o vi. Sei que se chama Nolan e é mais velho, até mora em outra cidade. De acordo com a própria Samantha, ele é “empresário”.
Ok. Sei bem que tipo de empresa deve ser essa...
Quem consegue ser tão bem-sucedido antes dos trinta anos?!
Ela acha que engana quem?
Fora que eu sempre desconfiei um pouquinho da família da Sam. Ricos, num bairro valorizado de Seattle, viajam três vezes por ano e ainda tem um Golden Retriever treinado. Sim. E vocês sabem quanto custa um filhotinho esse cachorro? OS OLHOS DA MINHA CARA, EXATAMENTE!
Mas, o que não é da minha conta, também não faz diferença pra mim. E ela é um amor comigo desde que entrei na faculdade. Nos conhecemos no primeiro dia, e ela foi tão simpática!
A verdade é que: Não tem como não se apaixonar por Samantha Murray.
É inevitável e terrivelmente rápido. Quase como amor platônico mesmo.
Fui para o Instagram de Samantha e comecei a stalkear seu irmão. Bonito, cabelos bem escuros, branco, alto e olhos castanhos.
E, pelas legendas das fotos, parecia ser muito engraçado.
Avancei mais nas minhas pesquisas e vi seu grupo de amigos lá de Atlanta. Eram em cinco, mas eram apenas quatro os que mais apareciam em suas redes sócias, em boates, bares, jogando videogame e por aí vai.
Que fábrica é essa que faz gente tão bonita desse jeito? Meu Deus!
Mas, havia um cara loiro entre eles, e aquele sim chamou a minha atenção. Ele tinha muitas tatuagens pelos braços e dificilmente dava um sorriso aberto nas fotos com os amigos. Usava bastante boné, roupas escuras e, cacete, era gato. Do tipo muito gato. Muito gato mesmo.
Provavelmente ele deve ser mais velho que eu. Não muito, mas o suficiente pra andar com os amigos do Nolan Murray. Ele não tinha redes sociais, e essa foi a parte mais esquisita de tudo.
Que homem como ele não tem no mínimo um Instagram? Aí tem treta...
- Nem fodendo que eu vou pra essa festa, senhorita Samantha. – Estralei o pescoço, decidida.
- HARPER! VEM AQUI NA COZINHA, RÁPIDO!
Meu pai berrou, me dando um baita susto. Pulei da cama, com as mãos no peito.
Precisa fazer todo esse escândalo, caralho?! Esse homem ainda vai me infartar!
Desci do jeito que estava, toda amassada e atropelando meus próprios pés. Quando cheguei até a cozinha, Holly e meu pai já estavam sentados, me esperando para o jantar.
Marcus me deu um sorriso amarelo e minha madrasta acenou, toda fofa.
- Acho bom você ter um motivo decente pra quase ter me matado do coração. – Falei, curta e grossa.
- Eu tenho. – Meu pai garantiu. – Os parentes da Holly vão vir nos visitar amanhã. A Kimberly vai trazer os três filhos dela e o Wayne vai trazer o enteado, e já que você é sempre tão amável com crianças, eu gostaria de te pedir uma pequena ajudinha para...
O cortei, na mesma hora!
- NÃO POSSO. – Berrei, no calor da emoção. Me remexi na cadeira, inquieta. – É que...eu...eu vou à uma... – Merda. Não vai ter jeito. Eu vou ter que usar essa. – Eu vou pra uma festa amanhã com uma amiga da faculdade. É isso. Não posso desmarcar. Infelizmente. – Fechei os olhos.
Eu não acredito no que eu acabei de fazer.
- Como é? – Holly arregalou os olhos, chocada. – Filha, você vai sair? De verdade? E pra uma festa? – Ela repetia, me fazendo ficar mais irritada ainda. – E que amiga é essa, meu Deus?
- Caramba...eu é que não vou atrapalhar um milagre! – Meu pai zombou, na cara dura. – Pode ir minha filha, e não se preocupe em voltar cedo. A gente quer que você aproveite. – Ele sorriu.
- Que amiga é essa? – Holly insistiu, desconfiada.
- Samantha. Filha dos Murray. Vocês não conhecem. – Expliquei. – Ela é uma ótima pessoa.
- Só melhora... – E lá veio meu pai de novo. Pelo jeito, eu sou a piada da noite. – E ainda por cima faz amizade com gente do bem! Minha filha, você é um orgulho! – Ele e Holly riram.
- Vão continuar rindo de mim ou já podemos comer, meu Deus?! – Rosnei, mas acabei rindo.
Nós jantamos e foi mais animado que o normal. O meu pai insistia em saber quem era a tal Samantha, ao passo que a Holly queria saber de todo o resto. Aonde era a festa, quem era o dono do casa, porque as estrelas se alinharam com Júpiter, porque o céu é azul, puta merda...
- Chega de tanto interrogatório. Eu já tenho 20 anos. E sou dona da minha vida. Obrigada e boa noite. – Disse, me levantando. – Até amanhã pra vocês.
Nem deixei os dois malucos terminarem de falar e já fui pro quarto, como se estivesse fugindo da polícia. Mandei mensagem pra Samantha, enquanto meus dedos imploravam pra não digitar aquilo.
“ – Te encontro na sua casa amanhã. Eu vou pra essa festa”.
Não demorou nem cinco segundos e eu já tinha uma resposta.
“ – Caralho, Harper, você chegou na hora pra aula, conversou mais que três palavras com o Cameron, aceitou ir pra uma festa e nem me xingou. Realmente, é um milagre de Natal”!
Fui obrigada à rir daquilo...
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