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História O teste 3 - Sufoco


Escrita por: Lehh-Ama-AlanWalker

Capítulo 9 - Sufoco


Ouço uma voz praguejar. Alguém deve ter descoberto nosso encontro e me seguiu. Para fazer o quê? Não sei, mas tenho certeza de que não quero saber.

 O sangue lateja nos meus ouvidos enquanto corro. Para longe de quem quer que esteja correndo atrás de mim. Para longe da entrada. Para longe do que estou quase certa que significa um fim para um plano no qual mal embarquei.

 Os passos atrás de mim parecem chegar mais perto. Contorno abruptamente as grandes vigas de aço e sigo o corredor, que vira para a esquerda. Sou rápida. A pessoa atrás de mim é mais rápida. E as chances são de que, seja quem for, conheça o prédio muito melhor do que eu. Estou em desvantagem, mas, se meu perseguidor pensa que vou desistir facilmente, está enganado.

 Minha sacola bate do meu lado, enquanto corro. O solavanco me deixa desequilibrada, e passo a alça por cima da cabeça para conseguir segurar a sacola melhor, na lateral. Olho para as portas fechadas por onde passo. Qualquer uma delas poderia me servir de esconderijo, mas, se a porta que eu escolher estiver trancada, meu perseguidor me pegará. 

Vejo um lance de escada à direita, e corro para ela. Meus músculos queimam, enquanto subo. Quando chego ao primeiro patamar, e me dirijo para o segundo lance, arrisco um olhar. Cabelo escuro, jaqueta branca, expressão zangada, olhos escuros fixos em mim. 

Existe algo vagamente familiar nele. Se tivesse tempo pra parar e pensar, poderia conseguir situá-lo, mas por agora aprendi o que deveria saber. O menino no meu encalço não tem uma arma, e está na metade da subida da escada. O primeiro fato me dá a vantagem de que estava me esquecendo. O segundo me diz que, se eu quiser tirar proveito disso, tenho de me mover ainda mais depressa. 

Minha respiração fica difícil e rápida ao subir os degraus um a um, enquanto abro o fecho da minha sacola. Meus dedos encontram o cabo de madeira da minha arma, quando ouço o menino alcançar o patamar abaixo e começar a subir o próximo lance de escada. 

Ótimo. Que venha. Quanto mais alto ele subir, melhor. 

Ao atingir o topo, não me permito pensar. Eu me limito a tirar a arma da sacola e atirar. 

O menino pula para o lado, depois tropeça, e vai rolando pela escada. Geme quando atinge a plataforma com um golpe surdo. O som me faz vibrar de satisfação, enquanto corro pelo corredor à esquerda. Às minhas costas, ouço o menino xingar e começar a subir de novo. Mesmo tendo errado o tiro, a dor e a frustração em sua voz me dizem que ele não está tão rápido como estava, o que é tudo o que eu realmente poderia esperar. Atingir um alvo em movimento enquanto eu também estou em movimento requer muito mais habilidade do que tenho. A única maneira de acertar qualquer coisa é por sorte, mas meu perseguidor não sabe disso. E agora que está ciente de que tenho uma arma, será forçado a se mover com mais cautela.

 Olho para trás e vejo que ele chegou ao alto da escada. Atiro de novo. Desta vez, a bala atinge o chão em algum ponto à sua frente. Ele se atira ao chão. Continuo correndo. Contorno o corredor curvo, até o hall. Eu me viro e atiro mais uma vez para garantir que ele fique confuso, depois me arremesso para a escada que dá para a parte dos fundos do primeiro andar. Se tiver sorte, encontrarei uma saída destrancada e escaparei. Se não, saberei qual a precisão real da minha habilidade em atirar.

 Luto pra respirar. Meus músculos ardem de exaustão. O suor corre pelas minhas costas, enquanto voo escada abaixo. 

Um lance.

 Dois.

 Arremesso-me pelo hall em direção às portas por onde entrei. Olho pra trás para ver se o menino me alcançou, e ouço o farfalhar de um tecido um segundo antes de dar de encontro com alguém.

 Mãos agarram meus braços e luto pra me soltar, enquanto uma voz grita: 

— Jennie? 

Taehyung.

 — Jennie, o que você está fazendo? O que está acontecendo? Alguém no andar de cima, som de passos. 

— Tem alguém lá em cima. Temos de dar o fora daqui.

 — Alguns estudantes poderiam estar trabalhando num projeto. Pensei que o lugar estaria vazio, mas sempre dá pra gente... 

— Não. Tinha alguém esperando eu chegar, e ele está atrás de mim agora. Temos de correr.

 O som de sapatos ressoando na escada de metal faz Tomas olhar pra cima. Do lugar onde estou, vejo uma perna saindo do patamar. Os olhos de Taehyung se arregalam, quando ele vê o rosto da pessoa. 

— Hyunjin. — Por um instante Taehyung imóvel. Depois, sacode a cabeça enquanto Hyunjin desaba escada abaixo. Taehyung olha em volta do cômodo e dá um passo à esquerda. — Mas se Hyunjin está aqui, então... 

Um tiro atravessa o ar à minha direita, e alguém sai de uma das salas. Não penso. Eu me posiciono, miro e atiro. O grito em resposta me diz que devo ter conseguido atingir alguma coisa. Não espero pra ver em quem atirei, apenas pego no braço de Taehyung grito pra que ele se mexa. Não entendo o que está acontecendo, mas sei que, se Taehyung não tivesse se movido, estaria morto. 

Chegamos ao final do hall. Tiros cortam o ar. Taehyung se encolhe a cada disparo, mas quem quer que esteja atirando deve ser tão bom pra atingir um alvo em movimento quanto eu, porque as balas não chegam perto de onde estamos. É claro que isso poderia mudar a qualquer momento.

 Avisto uma saída à direita, mas Taehyung agarra minha mão e me puxa pelo hall à esquerda. 

— Vamos. 

Ele me leva por uma ampla passagem em arco que dá no centro do estádio. Minha garganta queima a cada respirada. Subo os degraus que levam à entrada da estufa. Taehyung digita um código num painel. A porta abre-se deslizando, e ele me puxa pra dentro. O cheiro de plantas crescendo e de solo adubado me atinge primeiro, seguido por um ar denso de umidade.

 — Por aqui.

 Só estive nesta sala uma vez antes, durante meu primeiro tour pela universidade, e por apenas alguns minutos. Nada aqui me é familiar, e estou ficando sem munição. Só posso torcer para que, qualquer que seja o plano de Taehyung, ele nos tire desta situação. 

Taehyung me leva por várias fileiras de amostras de carvalho, e por uma alameda de juncos perto de uma área envolta por uma cerca pequena, de arame vermelho. 

— Tem uma cabine de controle por este caminho que opera a irrigação, a energia e o clima da estufa. Vá pra lá. 

Ele começa arrancando da terra a cerca vermelha que chega à altura do joelho. 

— Não podemos deixar que Hyunjin e Yeji saiam daqui. A não ser que a gente queira que eles venham atrás de nós de novo, ou nos delatem pra alguém que possa fazer coisa pior. Vá. 

Entendendo o que ele pretende fazer, corro para a área de seis metros quadrados da estufa, e ajudo a arrancar a cerca do chão, removendo as barreiras que alertam as pessoas sobre as plantas ali contidas. Plantas que meu pai passou a vida erradicando: mancenilheiras, hera rosa, papoulas olho de boneca, jasmim vermelho. Flores e plantas que, se forem tocadas ou provadas, podem paralisar o sistema nervoso e provocar parada cardíaca, cegueira, vômito e dezenas de outros efeitos colaterais terríveis. Em alguns casos, é necessário que a planta seja ingerida para que o veneno entre em ação, mas a mancenilheira e a hera rosa só precisam de um simples toque pra que ocorra a infecção. E as frutinhas da papoula olho de boneca podem causar severas alucinações, estreitar as paredes das veias e fazer o coração parar de bater. Plantas terríveis. Mutações causadas pelos produtos tóxicos à solta no mundo. Aquelas que são cultivadas aqui são usadas para estudo, para que os cientistas possam descobrir como erradicar seus efeitos. Hoje, Taehyung e eu precisamos de suas características letais para nos manter vivos.

 Com cuidado para não tocar nas plantas tóxicas, Taehyung  e eu mudamos a cerca pra uma área que contém vegetação comestível. 

— E agora? — pergunto. 

— Agora, temos de fazer com que eles venham nesta direção, e esperar que não reparem no que estão se metendo. Hyunjin está na Engenharia Biológica, mas lida mais com estudo animal do que com plantas. Só gostaria que tivéssemos uma maneira de queimar algumas delas. Alguns laboratórios têm maçaricos, mas não temos tempo pra perder procurando por eles. Talvez...

 — Tenho uma ideia — digo, abrindo minha sacola, pegando os fósforos que tirei do laboratório de Química e o frasco de amostra onde guardei o excesso de pó preto. 

— O que é isso? 

— Uma coisa que pode incendiar as plantas. 

Fico de olho na entrada a distância, enquanto coloco o papel com a substância preta perto do canteiro de plantas que Taehyung que têm a melhor chance de fazer seu plano funcionar. Papoulas olhos de boneca. Queimada, essa planta solta uma fumaça que sobrecarrega o sistema nervoso. Uma coisa que as pessoas da Colônia Pierre aprenderam, quando uma fagulha de uma fogueira acesa ao ar livre por um pesquisador caiu na grama seca, perto de um grande canteiro de plantas com os bulbos brancos que pareciam olhos minúsculos. O fogo e os ventos fortes fizeram com que todos os que moravam nos arredores da colônia sofressem espasmos musculares, cegueira ou, em muitos casos, morressem. 

Com a quantidade de pó que usei, poderia se formar uma chama alta e ampla o bastante pra fazer com que os bulbos brancos que estão por perto peguem fogo. A única estratégia será fazer nossos dois agressores virem nesta direção, e criar um rastilho suficientemente comprido que me permita chegar à saída a dois metros e meio atrás daqui, antes que a fumaça causada pela queima das plantas possa chegar até mim ou Taehyung.

 — Pegue. — Taehyung  me passa uma tira estreita de papel de vinte e cinco centímetros. Não tão longa e tão confiável quanto eu gostaria, mas os gritos que ouço e a figura que irrompe pela porta da estufa me dizem que não tenho tempo. 

Coloco o rastilho no papel e jogo uma camada de pó na extremidade. Cato os fósforos com nervosismo e tiro um do maço. 

— Chame a atenção deles — sussurro, enquanto equilibro o fósforo na parte de riscar. 

Taehyung olha para o pó preto e o fósforo, depois para mim. Levanta-se com um gesto de cabeça, concordando. Dá vários passos em direção à porta da estufa. Finge tropeçar em um arbusto perene e xinga. Basta isto.

 A cabeça de Hyunjin se volta em nossa direção. 

— Eles estão ali. 

Taehyung olha por cima do ombro e se dirige para a saída atrás de nós. Hyunjin e Yeji pisoteiam plantas e contornam árvores pequenas, correndo para onde estamos. Taehyung grita:

 — Jennie, vamos.

 — Meu pé ficou preso — grito de volta. — Vá. Eu te alcanço. Hyunjin e outra pessoa se aproximam. Pela primeira vez, tenho uma visão de Yeji. Eu a tenho visto pelo campus. Acho que até a vi conversando com Taehyung. Seus traços quase característicos são seu sorriso e sua risada contagiante. Ela não está rindo agora, enquanto encurta a distância entre nós. 

Um tiro é disparado. Ouço a bala atingir o chão ao longe, atrás de mim. Dirigida a Taehyung. Outro tiro. Hyunjin e a menina chegam mais perto. Tudo dentro de mim grita pra eu fugir, mas fico onde estou, fingindo esforço pra me soltar da vinha fantasma que me tem refém. Preciso que a atenção deles esteja focada em mim, não nas plantas por perto. Eles se aproximam. Só mais uns segundos. 

Cinco. 

Outro tiro. 

Quatro.

 Hyunjin me avista e grita. 

Três. 

A menina me vê e sorri.

 Dois. 

Risco o fósforo com força e puxo.

 Um.

 O fósforo se acende. Um tiro me faz pular. A bala atinge o chão à minha direita, enquanto encosto a chama no rastilho de papel. Assim que vejo a chama percorrer o papel, eu me levanto e corro. 

Outro tiro. Tropeço e dou um tranco para a frente, com a dor queimando minha panturrilha. Engulo o grito que quer sair de dentro de mim e sufoco o protesto do meu corpo, enquanto me levanto. Yeji chama por Hyunjin. Taehyung grita pra que eu me apresse. Olho pra trás e percebo que passou tempo demais. O rastilho deveria ter incendiado o pó. O plano não funcionou, e Kerrick e a menina estão vindo. 

Forço-me a ir em frente. 

— Vamos, Jennie. 

Um passo. Dois. Mais rápido. 

— O que é isso? — Ouço Hyunjin gritar. 

O cheiro de enxofre chega até mim. Ouço outro tiro e alguém começa a tossir. Não olho pra trás. Limito-me a continuar movendo uma bota à frente da outra, trincando os dentes contra a dor que, caso contrário, me faria ficar de joelhos. Taehyung já abriu a porta da saída. Seus olhos brilham de medo, enquanto estende a mão, fazendo-me sinal. Alguém ainda está correndo atrás de mim. Passo aos tropeções pela porta, e Taehyung a fecha com força. Seus dedos voam pelo painel de controle. A luz acima da porta muda de verde pra vermelho, e agora ela só pode ser aberta pelo lado de fora.

 Uma jogada inteligente, embora uma olhada pelo painel de vidro da porta me mostre que não era necessária. Hyunjin está caído a cinco metros da saída. Seu corpo pula como se estivesse ligado a uma corrente elétrica. Posso ver a agonia em seu rosto, enquanto as toxinas que ele respirou tomam conta dele. Levam seu organismo à falência. Acabam com sua vida.



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