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História Ônix - Capítulo 16


Escrita por: CarolMirandaS2

Notas do Autor


Boa leitura a todos.

Capítulo 16 - Capítulo 16


Como já esperava, passei a maior parte do Dia de Ação de Graças sozinha em casa. Minha mãe tinha sido escalada para um plantão duplo, que a obrigaria a trabalhar do meio-dia de quinta até o meio-dia de sexta.

Eu poderia ter ido até os meus vizinhos. Tanto a Dee quanto o Daemon tinham me convidado, mas não me parecera certo invadir a celebração alienígena deles. E, a julgar pelas minhas constantes espiadas furtivas através da janela sempre que a porta de um carro batia lá fora, todos os outros convidados eram extraterrestres. Ash chegou com os irmãos, porém com uma expressão mais condizente com um velório do que com um jantar comemorativo.

Parte de mim não gostou de vê-la ali. Certo, eu estava com ciúmes. Burra.

Ainda assim, não ir foi a decisão certa.

Eu estava uma pilha. Só hoje, tinha virado a mesinha de centro, quebrado três copos e explodido uma lâmpada. Provavelmente não seria muito inteligente participar de nenhum tipo de confraternização, ainda que eu fosse adorar me deixar levar pelas festividades por um tempo. A única boa notícia era que não tinha ficado com uma dor de cabeça de rachar o crânio após minhas demonstrações surtadas de poder.

Por volta das seis, senti o já tão familiar arrepio na nuca segundos antes de o Daemon bater à porta. Um misto de sensações conflitantes se instalou em meu estômago enquanto corria para abri- la.

A primeira coisa que percebi foi uma caixa grande ao lado dele e, em seguida, senti o cheiro de peru assado com batatas-doces.

— Oi — cumprimentou Daemon, segurando uma pilha de travessas cobertas. — Feliz Dia de Ação de Graças.

Pisquei algumas vezes.

— Pra você também.

— Não vai me convidar a entrar? — Ergueu as travessas. — Trouxe alguns presentinhos em forma de comida.

Dei um passo para o lado.

Ainda sorrindo, Daemon entrou e fez um gesto com a mão livre.

A caixa que ficara na varanda elevou-se no ar e entrou atrás dele como um cachorrinho. Ela, então, pousou no chão do vestíbulo.

Enquanto fechava a porta, vi a Ash e o Andrew entrando no carro deles. Nenhum dos dois olhou para minha casa.

Com um bolo se formando na garganta, virei-me para o Daemon.

— Trouxe um pouquinho de tudo. — Ele seguiu para a cozinha.

— Peru, batata-doce, molho de cranberry, purê de batata, caçarola de vagem, uma espécie de torta crocante de maçã e outra de abóbora… Gatinha? Você não vem?

Forcei-me a desgrudar da porta e fui atrás dele. Daemon estava botando a mesa, descobrindo as travessas e… eu não sabia o que pensar.

Ele levantou as mãos e dois castiçais de vidro que mamãe nunca usava vieram flutuando até a mesa. As velas vieram em seguida e, com um simples brandir dos dedos, todas se acenderam.

O bolo na minha garganta ficou maior, ameaçando me sufocar.

Diversas gavetas se abriram e delas saíram pratos, copos e talheres. Em seguida, foi a vez de o vinho da minha mãe deixar a geladeira e encher duas taças de cristal. Com Daemon parado no meio de tudo isso, era como uma cena retirada de A Bela e a Fera. 

Só faltava o bule e as xícaras começarem a cantar.

— Tenho outra surpresa pra você, mas só depois do jantar.

— Tem? — murmurei.

Ele assentiu.

— Mas você precisa comer comigo primeiro.

Aproximei-me da mesa e me sentei, observando-o com olhos enevoados. Daemon serviu um prato para mim e, em seguida, se sentou ao meu lado. Pigarreei para limpar a garganta.

— Daemon, eu… não sei o que dizer. Obrigada.

— Não precisa agradecer — retrucou ele. — Você não quis ir até a minha casa, o que eu entendo perfeitamente, mas achei que não devia ficar sozinha.

Baixei os olhos antes que ele percebesse as lágrimas, peguei a taça e virei de uma vez só o vinho branco rascante. Quando finalmente ergui a cabeça, Daemon me fitava com o cenho franzido.

— Bêbada — brincou.

Dei uma risadinha.

— Talvez… só por hoje.

Ele me cutucou com o joelho por baixo da mesa.

— Coma logo antes que esfrie.

A comida estava divina. Quaisquer dúvidas que eu pudesse ter sobre os dotes culinários da Dee evaporaram. Tomei mais outra taça de vinho durante nosso pequeno jantar. Também comi tudo o que Daemon colocou no meu prato, inclusive a segunda leva.

Quando finalmente finquei o garfo na fatia de torta de abóbora, já estava tonta o bastante para começar a acreditar que ele talvez estivesse sendo motivado por algo mais do que uma simples conexão. Talvez Daemon realmente gostasse de mim, porque se eu era capaz de lutar contra essa atração — bem, mais ou menos — ele com certeza conseguiria também se quisesse.

Talvez não quisesse. Arrumar a bagunça foi uma experiência estranhamente íntima.

Nossos cotovelos roçaram um no outro diversas vezes. Um silêncio amigável recaiu entre nós enquanto lavávamos a louça, lado a lado.

Senti as bochechas coradas, os pensamentos anuviados.

Tinha tomado vinho demais.

Assim que terminamos de arrumar tudo, segui-o até o vestíbulo.

Ele levou a caixa até a sala sem tocá-la. Alguma coisa tilintou dentro dela. Sentando-me na beirinha do sofá, cruzei as mãos sobre o colo e esperei, sem a menor ideia do que ele pretendia fazer.

Daemon abriu a caixa, retirou um galho verde de pinheiro e me cutucou com ele.

— Acho que temos uma árvore de Natal para armar. Sei que a Parada já acabou, mas acho que está rolando um especial de Ação de Graças do Charlie Brown, o que, bem, não é tão ruim.

Foi a gota d’água. O bolo na garganta voltou, só que dessa vez não consegui segurá-lo. Pulei do sofá e saí correndo da sala.

Lágrimas escorriam por minhas bochechas. Com a garganta fechada de emoção, tentei secar os olhos.

Daemon surgiu na minha frente, bloqueando a escada. Seus olhos estavam arregalados, as pupilas luminosas. Tentei me virar e fugir, mas ele rapidamente me envolveu em seus braços fortes.

— Não tive a intenção de te fazer chorar, gatinha.

— Eu sei. — Funguei. — É só…

— É só o quê? — Envolveu meu rosto entre as mãos e, com a ponta dos polegares, começou a secar as lágrimas. Minha pele formigou com o contato. — Gatinha?

— Acho que você não faz ideia do… que algo assim significa pra mim. — Inspirei fundo, mas as lágrimas idiotas teimavam em escorrer. — Não faço isso… desde que papai estava vivo. Desculpe estar chorando, não é de tristeza. Só não esperava nada assim.

— Não tem problema. — Daemon me puxou para perto de si.

Não reclamei. Ele me apertou com força enquanto eu enterrava o rosto em seu peito. — Eu entendo. Apenas lágrimas de emoção.

A sensação de calor e aconchego dos braços dele parecia tão certa. Queria negá-la, mas pela primeira vez resolvi não lutar —simplesmente aceitei. Não fazia diferença se Daemon me via como um cubo de Rubik gigante que ele precisava resolver ou se era um efeito colateral da cura. Não no momento.

Fechei uma das mãos na camisa dele, aninhando-me ainda mais. Daemon podia achar que sabia o quanto aquilo significava para mim, mas não sabia. Jamais saberia.

Ergui a cabeça, estendi o braço e envolvi a pele macia de seu rosto em minha mão livre. Com uma pequena ajuda, trouxe seus lábios para junto dos meus e o beijei. Um beijo rápido e inocente, mas que me deixou arrepiada até a unha do pé. Afastei-me, ofegante.

— Obrigada. Estou falando sério. Obrigada.

Ele roçou as costas dos dedos em meu rosto, secando o restante das lágrimas.

— Não deixe que ninguém descubra esse meu lado doce. Tenho uma reputação a manter.

Ri.

— Combinado. Agora, vamos lá.

Armar uma árvore de Natal com um alienígena foi uma experiência diferente. Daemon afastou o divã da frente da janela com um mero levantar do queixo. As bolas pendiam no ar, juntamente com um pisca-pisca de luzinhas coloridas que não estavam plugadas na tomada.

Nós dois rimos. E muito. De vez em quando eu sentia a garganta apertar ao pensar na reação de minha mãe quando visse a árvore no dia seguinte. Acho que ela ficaria feliz.

Daemon soltou um festão prateado sobre a minha cabeça enquanto eu pegava uma das bolas penduradas no ar.

— Obrigada.

— Combina com você.

O aroma artificial de pinho impregnou a sala. O espírito das festas se acendeu dentro de mim como um gigante que acorda de um sono mágico. Sorri para ele ao suspender uma bola quase tão verde quanto seus olhos, decidindo que aquela seria a bola dele.

Coloquei-a logo abaixo da reluzente estrela.

Já era quase meia-noite quando finalmente terminamos.

Sentados no sofá, nossas coxas pressionadas uma contra a outra, admiramos nossa obra-prima. Havia mais festões de um lado do que do outro, mas ela estava perfeita. Um arco-íris de luzinhas iluminava a sala. As bolas de vidro cintilavam.

— Adorei — falei.

— É, ficou muito bonita. — Ele se recostou em mim e soltou um bocejo. — Dee armou a árvore hoje de manhã. Faz questão de ter tudo de uma cor só, mas acho que a nossa ficou mais bonita. Parece uma discoteca.

Nossa árvore. Sorri, gostando do som disso.

Ele me deu uma cutucada com o ombro.

— Sabe de uma coisa? Me diverti muito fazendo isso.

— Eu também.

Meu vizinho semicerrou as pestanas. Meu Deus, eu seria capaz de matar para ter cílios assim.

— Está tarde.

— Eu sei. — Hesitei. — Quer dormir aqui?

Ele ergueu uma sobrancelha.

O convite não tinha soado muito bem.

— Não foi isso o que eu quis dizer.

— Eu não iria reclamar se fosse. — Abaixou os olhos. — Não mesmo.

Revirei os meus, sentindo um aperto no fundo do estômago. Por que eu tinha que sugerir uma coisa dessas? Ele não havia presumido nada tão despropositado. Daemon não me parecia o tipo de cara que tira proveito da ausência dos pais. Lembrei-me da última, e única, vez em que tínhamos dividido uma cama. Rubra de vergonha, levantei do sofá. Não queria que ele fosse embora, mas também não queria… não fazia ideia do que eu queria.

— Vou trocar de roupa — declarei.

— Precisa de ajuda?

— Uau. Você é um verdadeiro cavalheiro.

O sorriso se ampliou, deixando à mostra um par de covinhas.

— A experiência seria proveitosa para ambos. Juro.

Não tinha dúvidas disso.

— Fique aqui — mandei, e subi correndo para o quarto.

Vesti rapidamente um par de shorts de pijama com uma camiseta térmica rosa. Não era uma indumentária exatamente sexy, mas após lavar o rosto e escovar os dentes, cheguei à conclusão de que era a melhor escolha. Qualquer outra coisa daria ideias a ele. Diabos, até um saco de papel seria o suficiente para encorajá-lo.

Estanquei imediatamente ao sair do banheiro. Daemon não me obedecera. Meu sorriso se apagou.

Ele estava parado ao lado da janela, de costas para mim.

— Fiquei entediado.

— Eu não demorei nem cinco minutos.

— Sofro de déficit de atenção. — Fitou-me de relance por cima do ombro, os olhos cintilando. —Belo short.

Dei uma risadinha. Ele tinha estampa de estrelinhas.

— O que você está fazendo no meu quarto?

— Você disse que eu podia dormir aqui. — Virou-se para mim, o olhar recaindo sobre a cama. De repente, o quarto pareceu pequeno demais, e a cama menor ainda. — Não achei que estivesse sugerindo o sofá.

Já não sabia mais o que eu tinha sugerido. Suspirei. O que eu estava fazendo?

Daemon atravessou o quarto e parou diante de mim.

— Não vou morder.

— Bom saber.

— A menos que você queira — acrescentou com um sorrisinho diabólico.

— Ótimo — murmurei, dando um passo para o lado.

Definitivamente, precisava de espaço. Não que tenha adiantado muito. Com o coração martelando no peito, observei-o tirar os sapatos e a camisa. Ele, então, fez menção de desabotoar o jeans.

Meus olhos se arregalaram. — O que… o que você está fazendo?

— Me aprontando para deitar.

— Nu?

Daemon arqueou uma sobrancelha.

— Estou de cueca. Que foi? Você espera que eu durma de calça?

— Da última vez, você dormiu. — Eu precisava me abanar. Ele riu.

— Na verdade, eu estava com a calça do pijama.

E uma camiseta também, mas e daí? Poderia dizer a ele para ir embora, entretanto me virei de costas e fingi estar analisando um livro que deixara sobre a escrivaninha. Um calafrio percorreu minha espinha ao escutar a cama ranger sob o peso dele. Inspirei rápido e superficialmente e me virei de volta. Daemon estava deitado, os braços cruzados sob a cabeça, com uma expressão de inocência estampada no rosto.

— Isso foi uma péssima ideia — murmurei.

— Na minha opinião, foi a mais inteligente que você já teve.

Esfreguei as palmas nos quadris.

— É preciso muito mais do que um jantar de Ação de Graças e uma árvore de Natal para me levar para a cama.

— Merda. Lá se vai o meu plano.

Fitei-o com um misto de fúria, vergonha e expectativa. Não devia ser possível alguém sentir tantas emoções ao mesmo tempo.

Com a cabeça girando, aproximei-me do meu lado da cama — ó céus, desde quando havíamos estipulado lados? — e rapidamente me meti debaixo das cobertas. Não queria saber se ele havia tirado a calça ou não.

— Pode desligar a luz, por favor? — Sem que ele se mexesse, o quarto recaiu na escuridão. Vários momentos se passaram. — Essa é uma habilidade muito útil.

— Concordo.

Foquei os olhos na luz cálida que incidia através das cortinas.

— Talvez um dia eu consiga ser tão preguiçosa quanto você e apagar as luzes sem precisar me mexer.

— É sempre bom sonhar.

Relaxei um tiquinho e sorri.

— Meu Deus, você é tão modesto!

— Modéstia é para os santos e os idiotas. Não sou nenhuma das duas coisas.

— Uau, Daemon, uau!

Ele se virou de lado, e sua respiração começou a brincar com os pelos do meu pescoço. Meu coração veio parar na garganta.

— Não acredito que você ainda não me expulsou daqui.

— Nem eu — sussurrei.

Daemon se aproximou um pouco mais e, ai meu Deus, percebi que tinha se livrado da calça. As pernas nuas roçaram as minhas, fazendo minha pulsação acelerar.

— Realmente não tive a intenção de te fazer chorar.

Virei de barriga para cima e olhei para ele. Daemon havia se erguido num dos cotovelos. Uma franja sedosa lhe cobria os olhos reluzentes.

— Eu sei. Tudo isso que você fez foi realmente fantástico.

— Não gostei de saber que você ia passar o feriado sozinha.

Meu peito subia e descia de forma lenta e ritmada. Tal como quando ele me abraçara lá embaixo e eu o beijara, tentei não pensar em nada. Impossível com aqueles olhos me fitando com a intensidade de mil sóis.

Daemon estendeu o braço e, com a ponta dos dedos, afastou uma mecha de cabelo do meu rosto. Uma corrente de eletricidade percorreu meu corpo. Não havia como negar a atração — o desejo que parecia não querer abandonar nenhum dos dois. Tal como uma viciada, não conseguia desgrudar os olhos daqueles lábios. A lembrança do sabor dele me queimava por dentro. Tudo isso era muito louco. Convidá-lo para ficar, deixá-lo deitar na cama comigo e pensar nele da maneira como estava pensando. Louco. Excitante.

Engoli em seco.

— Acho melhor a gente tentar dormir.

Ele envolveu meu rosto com uma das mãos e desejei tocá-lo de volta. Queria me aconchegar a ele.

— É verdade — concordou.

Erguendo uma das mãos, rocei os dedos por seus lábios. Eles eram macios, porém firmes. Intoxicantes. Ao ver seus olhos faiscarem, senti um buraco no estômago. Daemon abaixou ligeiramente a cabeça e deixou os lábios roçarem o canto dos meus.

A mão escorregou do meu rosto para o pescoço e, quando ele abaixou a cabeça novamente, sua boca raspou a ponta do meu nariz. Ele, então, me beijou. Um beijo lento e ardente que me deixou ansiando por mais, muito mais. Senti como se estivesse sendo tragada por aquele beijo, por ele.

Daemon se afastou com um gemido e se acomodou ao meu lado, passando um braço em volta da minha cintura.

— Boa noite, gatinha.

Com o coração martelando no peito, soltei um longo suspiro.

— Isso é tudo?

Ele riu.

— Isso é tudo… por enquanto.

Mordi o lábio e tentei forçar meu coração a diminuir o ritmo.

Pareceu levar uma eternidade. Por fim, aconcheguei-me a ele, que passou um braço por baixo da minha cabeça. Virei, então, de lado e apoiei o rosto na parte superior do braço. Ficamos assim, olhando um para o outro em silêncio, nossas respirações se misturando, até que ele fechou os olhos. Pela segunda vez naquela noite, reconheci que eu talvez estivesse errada a respeito do Daemon. Talvez estivesse errada a respeito dos meus próprios sentimentos. E, dessa vez, não podia jogar a culpa no vinho.

Peguei no sono imaginando o que ele tinha querido dizer com “por enquanto”.




Notas Finais


2/3
* Sem revisão.


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