História Ossos e nervos ópticos de amor. - Capítulo Único.

eu falo mais sobre amor do que falo da vida. eu falo mais sobre trauma do que falo de bondade. eu falo tanto de amor porque sempre estou buscando, em qualquer canto, em qualquer palavra, mas implorar por amor não muda que não é assim que acontece, e todo mundo sabe o quanto eu já implorei "me ama, por favor". eu queria sentir que posso ser amado. eu não sinto.

até que em um bar, um umbandista me disse que eu era feito de amor. desde os ossos até meus olhos, eu era feito de amor.

eu não entendi o que ele quis dizer, mas eu sempre tive muito amor para dar, eu sempre tive um estoque ilimitado de amor para dar, e mesmo com tanto ódio e tanto rancor, eu sentia amor. eu dava amor, e eu nunca pensei no quanto de amor eu tinha para dar no meio de tanta raiva.

eu não tenho amor por mim, talvez porque eu não me enxergue como uma pessoa, ou uma pessoa que mereça amor, mas eu transbordo.

para os outros, para estranhos, para passageiros, para animais, para motoristas de ônibus que não receberam um mísero bom dia.

talvez eu fosse feito de amor. não que meus pais me amassem ou algo do tipo, mas talvez, fosse isso que eu tinha, o que eu nunca tive.

eu não entendo o porquê tanto amor, mas talvez eu precisasse de alguém que canalizasse meu amor e passasse ele pra mim, eu poderia me amar dessa forma. eu me amo quando amo outros. eu me amo quando amo, eu amo o amor, e eu amo amar.

o quão confuso seria tanto amor pra pouco amor. o quão confuso seria tanto amor pra tanta raiva. quem sabe eu me frustre porque nenhum amor é vomitado em toneladas como o meu.

talvez fosse raiva do amor. o amor que eu não tive. o amor que não chegou em mim. o amor que nunca foi meu, mas ele foi. ele foi porque saiu de mim. e todo esse amor me pertence.

talvez meu sofrimento fosse ter tanto amor acumulado, rompendo onde fica guardado, estourando de tão cheio, e então eu respingo. respingo sangue, amor e vítimas fatais dessa overdose de amor.

eu espero que ser amado seja tão bom quanto amar é.